Um pleito histórico
Pedro J. Bondaczuk
O Uruguai vive um clima de intensa (e justificada) euforia, diante da iminência do país retornar, a partir de domingo, quando ocorre o aguardado pleito presidencial, à plena normalidade democrática. Os pouco mais de 3 milhões de uruguaios, num exemplo de conscientização política digno de ser ressaltado e cantado em verso e prosa, estão tomados de um fervor cívico poucas vezes visto em termos de América Latina, realizando uma campanha presidencial absolutamente sem violências.
Aliás, e nunca é demais ressaltar, os períodos de exceção nesse país foram raros, sendo o atual o mais longo e penoso de sua história. Apenas para citar um exemplo, de 1899 a 1931, o Uruguai teve 8 presidentes eleitos. Exatamente um em cada quatro anos, no período mais longo de normalidade democrática já registrado em país da América Latina (excluindo o México). E todos completaram regularmente seus mandatos e passaram, sem qualquer problema, a faixa presidencial ao sucessor escolhido livremente nas urnas.
De 1952 a 1963 o país foi governado num sistema colegiado de presidência, em que a condução dos negócios de Estado estava entregue a nove cidadãos, uma forma de governo parecida, apenas, com a da Suíça e com a atualmente em vigor na Iugoslávia, criada pelo marechal Tito, visando a manter a salvo a unidade nacional da federação iugoslava.
Quanto mais se analisa as instituições anteriores que vigoraram no Uruguai, pelo menos até 1967, quando da volta do sistema presidencialista e da eleição de Oscar Gestido (que faleceu naquele mesmo ano, passando o governo automaticamente ao vice, Jorge Pacheco Areco), menos se entende o que aconteceu àquela até então exemplar sociedade nacional.
Os uruguaios tinham um dos sistemas de proteção social mais avançados do mundo. Sua legislação trabalhista era simplesmente modelar e a estabilidade econômica era tamanha, a ponto do país ser freqüentemente mencionado na imprensa com o título (obviamente elogioso) de “Suíça da América do Sul”.
Bastaram, entretanto, dois ou três anos maus em sua economia para que os grupos de pressão explorassem um momentâneo descontentamento popular, fermentassem a discórdia na classe trabalhadora e terminassem por desestabilizar um regime que parecia sólido, à prova de desestabilização.
O que aconteceu no Uruguai, a partir de 1967, deve servir de lição a todos aqueles que entendem que o homem apenas pode prosperar num clima de ordem, respeito às leis e em plena liberdade (implicando essa, em seu próprio bojo, na correspondente responsabilidade).
A democracia, por mais que seja desejada por todos, é bastante frágil se, com ela, não se criarem mecanismos de autodefesa. Exemplos como os dos EUA e da Suíça são sempre mencionados, justamente por serem raros.
Mais do que nunca, se espera que a redemocratização uruguaia prospere, crie raízes e frutifique. E que esse país volte a servir de exemplo à maioria dos povos da América Latina, que ainda não tiveram o privilégio, que o Uruguai teve por tantos anos, de conviver em plena concórdia, cada um zelando pelos seus direitos, mas respeitando fanaticamente seus imprescindíveis deveres pessoais, familiares e sociais.
(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 22 de novembro de 1984).
Pedro J. Bondaczuk
O Uruguai vive um clima de intensa (e justificada) euforia, diante da iminência do país retornar, a partir de domingo, quando ocorre o aguardado pleito presidencial, à plena normalidade democrática. Os pouco mais de 3 milhões de uruguaios, num exemplo de conscientização política digno de ser ressaltado e cantado em verso e prosa, estão tomados de um fervor cívico poucas vezes visto em termos de América Latina, realizando uma campanha presidencial absolutamente sem violências.
Aliás, e nunca é demais ressaltar, os períodos de exceção nesse país foram raros, sendo o atual o mais longo e penoso de sua história. Apenas para citar um exemplo, de 1899 a 1931, o Uruguai teve 8 presidentes eleitos. Exatamente um em cada quatro anos, no período mais longo de normalidade democrática já registrado em país da América Latina (excluindo o México). E todos completaram regularmente seus mandatos e passaram, sem qualquer problema, a faixa presidencial ao sucessor escolhido livremente nas urnas.
De 1952 a 1963 o país foi governado num sistema colegiado de presidência, em que a condução dos negócios de Estado estava entregue a nove cidadãos, uma forma de governo parecida, apenas, com a da Suíça e com a atualmente em vigor na Iugoslávia, criada pelo marechal Tito, visando a manter a salvo a unidade nacional da federação iugoslava.
Quanto mais se analisa as instituições anteriores que vigoraram no Uruguai, pelo menos até 1967, quando da volta do sistema presidencialista e da eleição de Oscar Gestido (que faleceu naquele mesmo ano, passando o governo automaticamente ao vice, Jorge Pacheco Areco), menos se entende o que aconteceu àquela até então exemplar sociedade nacional.
Os uruguaios tinham um dos sistemas de proteção social mais avançados do mundo. Sua legislação trabalhista era simplesmente modelar e a estabilidade econômica era tamanha, a ponto do país ser freqüentemente mencionado na imprensa com o título (obviamente elogioso) de “Suíça da América do Sul”.
Bastaram, entretanto, dois ou três anos maus em sua economia para que os grupos de pressão explorassem um momentâneo descontentamento popular, fermentassem a discórdia na classe trabalhadora e terminassem por desestabilizar um regime que parecia sólido, à prova de desestabilização.
O que aconteceu no Uruguai, a partir de 1967, deve servir de lição a todos aqueles que entendem que o homem apenas pode prosperar num clima de ordem, respeito às leis e em plena liberdade (implicando essa, em seu próprio bojo, na correspondente responsabilidade).
A democracia, por mais que seja desejada por todos, é bastante frágil se, com ela, não se criarem mecanismos de autodefesa. Exemplos como os dos EUA e da Suíça são sempre mencionados, justamente por serem raros.
Mais do que nunca, se espera que a redemocratização uruguaia prospere, crie raízes e frutifique. E que esse país volte a servir de exemplo à maioria dos povos da América Latina, que ainda não tiveram o privilégio, que o Uruguai teve por tantos anos, de conviver em plena concórdia, cada um zelando pelos seus direitos, mas respeitando fanaticamente seus imprescindíveis deveres pessoais, familiares e sociais.
(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 22 de novembro de 1984).
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