Tuesday, June 15, 2010




Preâmbulo um tanto extenso

Pedro J. Bondaczuk

A melhor maneira de fazermos literatura tendo o futebol por inspiração é a de nos valermos de nossas experiências pessoais, preferências e repulsas e, principalmente lembranças a respeito. Aliás, é assim que os textos de alta qualidade, de qualquer gênero, que nos aliciam, prendem e conquistam, são produzidos, não importa qual seja o assunto.
Só agindo dessa maneira, nossa produção literária guardará verossimilhança, porquanto será elaborada sem vacilações e nem equívocos, mas com exatidão e segurança. Por isso, mais uma vez, peço licença ao leitor para tratar da minha experiência pessoal, minhas reminiscências e meus projetos, neste espaço.
Este texto, na verdade, será todo ele uma espécie de preâmbulo para o que pretendo expor nos próximos dias, posto que um tanto extenso. Por isso, rogo a sua compreensão. Na sequência, vocês entenderão a razão de tantas explicações e justificativas.
Tive o privilégio de acompanhar quinze das dezoito Copas do Mundo já disputadas e cada uma delas me causou uma impressão única, peculiar, motivada, logicamente, pela idade que tinha na época de cada uma de suas disputas e, por conseqüência, do meu grau de amadurecimento e de experiência, que cresceu com a passagem do tempo. O Mundial deste ano, na África do Sul, passa a ser o 16º e a forma como o encaro só poderá ser expressada e analisada devidamente ao seu término.
Nos próximos quinze dias, pois, apresentarei as circunstâncias e, principalmente, as emoções que essas Copas do Mundo me provocaram. Espero, amável e precioso leitor, que minhas experiências lhe sirvam pelo menos de mote, de pretexto, de tema para suas próprias reflexões e, quem sabe, produções literárias.
Algumas dessas competições, que se repetem, ininterruptamente, a cada quatro anos, desde 1950, já me inspiraram textos diversos, muitos já publicados e outro tanto inéditos, notadamente contos e crônicas. Outras Copas estão na ordem do dia, devidamente pautadas, para serem dissecadas e darem seu quinhão de inspiração para novas produções literárias.
Não falarei nada sobre três Mundiais de Futebol, por motivos óbvios. Embora tenha inúmeras referências escritas sobre eles, não os acompanhei, e não por eventual desinteresse, mas por razão de força maior, por um motivo irresistível: não havia nascido quando da sua realização.
Poderia, é verdade, especular a respeito, valer-me da imaginação e escrever histórias situadas naquelas ocasiões e tendo por cenário os estádios das competições. A ficção permite-nos essa viagem no tempo, tanto recuos ao passado, ate mesmo aos primórdios de nossa espécie; quanto avanços a um futuro distante vários milênios do hoje. Nada me impede que eu faça esse exercício de imaginação. No entanto, não farei este tipo de “viagem”. Pelo menos não agora.
As Copas que não vi e cuja narração sequer ouvi foram as de 1930, 1934 e 1938, disputadas, respectivamente, no Uruguai, na Itália e na França. Ademais, a imensa maioria dos raros remanescentes dessa época também não viu. A menos que houvesse estado presente nos precários estádios em que os jogos foram disputados.
Nas duas primeiras Copas, não havia televisão em lugar algum. E mesmo se houvesse, as transmissões seriam limitadas, apenas para as cidades em que ocorriam as disputas. A TV via satélite, seria uma façanha que ocorreria, somente, décadas depois. Na segunda metade do século XX.
Outro fator a dificultar o acompanhamento dos mundiais era a carência de transportes. As viagens de avião, por exemplo, eram então raríssimas, aventuras de doidos e poucos podiam usufruir delas ou ousavam fazê-lo.
Na Copa de 1930, no Uruguai, todas as poucas seleções européias que participaram viajaram de navio. Eram viagens longas, demoradas e cansativas e a preparação dos atletas ia pras cucuias. Era algo que fugia de qualquer cogitação.
Nas disputas seguintes, realizadas na Itália e na França, ocorreu a mesma dificuldade de locomoção, mas em relação às seleções das Américas (entre elas a do Brasil, único país a não faltar a nenhuma dessas disputas futebolísticas. Ou seja, a nossa equipe tem a absoluta primazia de haver disputado todas as 18 Copas do Mundo já promovidas).
O rádio já existia na época, mas raros puderam usufruir do privilégio de acompanhar as transmissões dos jogos quer em 1930, quer em 1934 e 1938. Possuir um receptor, naqueles tempos, era um luxo a que pouquíssimas pessoas podiam se dar, mesmo em países economicamente mais avançados e com distribuição de renda mais equânime e justa.
Como se vê, mesmo que eu houvesse nascido, digamos, em 1920, dificilmente teria acompanhado (ou nos estádios, ou por TV que não havia, ou por rádio que era raro) a “pré-história” das Copas do Mundo. Bem que eu gostaria de tê-lo feito.
Conversando a respeito com nonagenários, estes, invariavelmente, confessaram que tomaram ciência daqueles Mundiais muitos anos depois da sua disputa e da mesmíssima forma que eu que nasci décadas mais tarde: ou seja, por textos de jornais.
Por enquanto, fico por aqui. Prometo, porém, se não esgotar, pelo menos me alongar bastante no assunto referente às Copas do Mundo que acompanhei pelos meios que tinha à mão por ocasião da realização de cada uma delas. Rogo-lhes: não deixem de ler.

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