Tuesday, June 08, 2010




Futebol & Literatura

Pedro J. Bondaczuk

Neste um mês e tanto de disputa da Copa do Mundo, farei um descompromissado “passeio”, sem nenhum planejamento ou método, por um tema sempre oportuno num País em que as crianças já nascem chutando bola. Tudo bem que eu já disse isso antes, mas não me custa reiterar, até à guisa de explicação para os que esperam minha abordagem de outros tantos assuntos versando sobre o foco principal deste espaço.
Muitos intelectuais, certamente, irão torcer o nariz e passar batidos desses textos e, se os lerem, farão mil restrições, principalmente por entenderem que o futebol não é coisa “séria” para ser debatida com pompa e circunstância. Estão enganados, sem dúvida.
Aviso, liminarmente, que não gosto de crônicas temáticas, de assuntos datados, pautados, apenas, em decorrência de determinados eventos especiais. Todavia, aceitei o desafio que me foi feito, por e-mail, por um leitor. Não sou um sujeito de fugir da raia. Prometo, porém, que procurarei ser o mais criativo possível, fugindo de obviedades e trazendo ângulos novos sobre futebol e literatura. Algumas das abordagens poderão parecer excêntricas, exageradas ou meio que malucas, mas... o que fazer? É o meu jeito de ser e de pensar
Nos próximos dias, vários livros serão citados, mas não se impressionem com os elogios que lhes farei. Isso tem explicação. Não me proponho, neste espaço, a fazer crítica literária (um dos gêneros mais nobres e mais “técnicos” da Literatura), embora esteja habilitado a isso, por ter exercido, e por muito tempo (acredito que com sucesso) a função de crítico.
Não farei, também, sinopse de nenhuma obra que abordar. Os textos que vier a produzir serão meras impressões pessoais de leitura, sem compromisso, portanto, com nada e ninguém. Alguns podem ter continuidade em outros dias, por me ensejarem reflexões que exijam mais linhas do que o normal. Para outros livros, talvez dedique mero e único parágrafo, se tanto. E se isso ocorrer, não quer dizer que a obra seja ruim. Quer dizer, somente, que não me inspirou a dizer mais do que foi dito. A falha, portanto, certamente será minha.
E por que não criticarei os livros sobre os quais me proponho a discorrer? Por haver perdido o senso crítico? Para puxar o saco dos autores ou fazer média com as editoras? Claro que não! Ocorre que os livros sobre os quais vou discorrer foram criteriosamente selecionados e são todos do meu inteiro agrado. Aqueles que, eventualmente, merecerem restrições, por me desagradarem, por um ou outro motivo, não citarei nem de passagem. Não serei eu a destruir as ilusões e os sonhos dos seus autores. Outro que faça a “tarefa suja”. Sei que este preâmbulo é exagerado, mas combina comigo. Eu também sou.
O livro que lhes sugiro, hoje, é “Passe de Letra – Futebol & Literatura”, de Flávio Carneiro, publicado pela Editora Rocco. O autor, nascido em Goiânia, em 1962 (mas que reside em Teresópolis, na zona serrana do Rio de Janeiro) escreve sobre o que entende. Afinal, já bateu sua bolinha, e razoavelmente bem. É um ex-praticante do “esporte das multidões” (foi ponta-direita, e dos bons, nos tempos em que eles ainda existiam).
Esta é a sua quarta obra. Antes, já havia publicado (todos pela Editora Rocco) os livros “Da matriz ao beco e depois” (contos), “No país do presente: ficção brasileira no início do século XXI” (ensaios) e “A confissão” (romance).
Como todo brasileiro que se preze, Flávio é, obviamente, um torcedor. Contudo, não se limita a torcer. Resolveu escrever sobre as duas paixões da sua vida (e da minha também), que são tão díspares e, aparentemente imiscíveis, mas que soube misturar tão bem, como hábil químico ou, quem sabe, alquimista.
Finda a leitura de “Passe de Letra – Futebol e Literatura”, concluímos, até surpresos, que ambas as atividades têm tudo a ver. O esporte mais popular do Planeta é fonte inesgotável de assunto para escritores criativos e atentos, em dia com a realidade do seu país e do mundo.
Flávio é crítico literário e professor universitário (e de Literatura Brasileira, dominando, portanto, quer a teoria, quer a prática). Contudo, age com sabedoria e abre mão da tentação de teorizar sobre o assunto. Opta, isso sim, por descer ao fundo da memória e de lá extrair as recordações da infância e da juventude, as assombrosas peripécias de Pelé, por exemplo (e olhem que sequer testemunhou o “rei” em seu auge), as diabruras do Mane da Perna Torta, o inesquecível (e até lírico) Garrincha e os feitos e brincadeiras irreverentes de Dada Maravilha, o que “voava como beija-flor” (que envergou, com brilho, o manto sagrado da minha Ponte Preta).
O resultado é um livro delicioso, que nos desperta nostalgia e saudade, desses que a gente lê num único sopro e, ao término, fica com aquela sensação de “quero mais”. Que tal se Flavio publicasse uma segunda, terceira, quarta partes etc. dessas suas vívidas (e tão bem-expostas) reminiscências?! Viria a calhar.
As crônicas, destaco, foram todas, originalmente, publicadas no jornal literário “Rascunho”, de Curitiba. E antes que algum chato questione o meu gosto, me apresso em informar que o livro agradou, e muito, também ao escritor (meu conterrâneo) Luís Fernando Veríssimo, que inclusive redigiu o texto de apresentação na orelha dessa obra oportuna e apaixonante.

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