A modernidade depende das definições feitas a seu respeito. O que é tido como "moderno", hoje, numa fração não conhecida de tempo será obsoleto, antiquado, "demodé". O que se deve buscar, no entanto, é o eterno. Ou seja, aqueles princípios e valores que o passar dos anos, dos séculos, dos milênios não consegue alterar. A liberdade é um desses conceitos. A amizade talvez seja o principal. O amor é outro. E há uma infinidade deles eternizada, depois de provada e comprovada.
Wednesday, June 30, 2010
A batalha de Berna
Pedro J. Bondaczuk
Que a Hungria, em 1954, tinha o melhor futebol do mundo, era quase consensual. Todavia, não concordo e nunca concordei com isso. Não há parâmetro infalível para esse tipo de conclusão. Mas admitamos essa opinião generalizada. Afinal, seus grandes craques, que desertaram para o Ocidente após a invasão das tropas soviéticas, em 1956, ao seu país, fizeram esfuziantes carreiras nos principais times europeus. Isso ocorreu, por exemplo, com Ferenc Puskas, sua maior estrela, que brilhou no todo poderoso Real Madri.
O mesmo ocorreu com Kocsis e Czibor, no Barcelona. Com Hidegutti, que foi jogar na Alemanha Ocidental. E com Warkdorf, que se consagrou no futebol suíço, entre outros. A Seleção Brasileira, em termos técnicos, porém, não ficava nada a dever aos húngaros. É verdade que não contava com disciplina tática. Mas compensava isso com muita habilidade. Carecia, como ainda hoje, de organização. Mas o que faltava era, sobretudo, reconhecimento internacional de suas qualidades e virtudes, que apenas viria em 1962, com o bicampeonato mundial.
Nossos jogadores cometeram um “pecado mortal” no jogo contra a Hungria, de 27 de junho de 1954, disputado no Estádio Wankdorff, em Berna: entraram em campo excessivamente nervosos, sentindo o peso da responsabilidade de tentar apagar o fiasco de 1950.
O público daquele sensacional confronto foi excelente para aquela Copa, de 63.200 pessoas. A arbitragem coube ao inglês Mister Arthur Ellis, que quatro anos antes havia apitado o Mundial do Brasil e havia se saído até que bem. Mas nesse jogo... Foi a figura decisiva, por suas inúmeras lambanças.
Acompanhei a transmissão dessa partida pela Rádio Bandeirantes de São Paulo, na narração meticulosa, brilhante e detalhada de Edson Leite, que então ostentava a sua melhor forma. Sua descrição dos lances era tão perfeita, que podíamos, sem muito esforço, visualizar as jogadas narradas.
Uma de suas características era a de informar o tempo de jogo utilizando este bordão: “O tempo passa, o meu cronômetro Eska marca tantos minutos”. Engraçado é que nunca mais vi ou ouvi qualquer referência a essa marca de relógio.
Embora atualmente tenhamos excelentes narradores esportivos, eles que me perdoem, mas nenhum chega sequer próximo ao Edson Leite de 1954. Dava gosto ouvir suas narrações de jogos. Claro que eu também gostava de Fiori Gigliotti e Pedro Luís. Mas nessa Copa, não tinha pra ninguém.
Mas, como eu ia dizendo, a Seleção Brasileira estava excessivamente nervosa nesse jogo contra a Hungria pelas quartas-de-final. Tanto que, com apenas sete minutos do primeiro tempo, já estava 2 a 0 para os húngaros, que tiveram um início fulminante, com gols de Hidegutti (aos 4) e Kocsis (aos 7).
O Brasil começou, apenas, a reação, aos 18 minutos, com o gol de pênalti, de Djalma Santos. Nessa altura, nossos jogadores conseguiram controlar os nervos e partiram em busca da reação. O jogo ficou tenso, duro, pegado como se diz hoje em dia na gíria dos boleiros, mas, sobretudo, violento. Houve um outro pênalti sobre o ponta-direita Julinho, que sua senhoria preferiu ignorar.
Na volta dos vestiários, para o segundo tempo, Mister Ellis resolveu “operar” nossa equipe sem anestesia. Trocava faltas, deixava os húngaros baterem e irritava o mais calmo e pacato dos nossos atletas com seus erros infantis. O cúmulo veio aos 16 minutos da segunda etapa. O árbitro marcou um pênalti absurdo contra o Brasil, jogando um tonel de água gelada na fervura. Nesse dia, nossa Seleção poderia jogar um futebol perfeito, que jamais venceria aquele jogo. O sujeito de preto e com o apito na boca não deixaria.
Lantos converteu o pênalti, ampliando a vantagem húngara para 3 a 1. No começo deste ano, pude assistir a um filme desse jogo e esse lance polêmico e decisivo ocorreu exatamente como Edson Leite narrou há 56 anos. A falta, de fato, aconteceu, mas a quase dois metros de distância da risca da grande área.
Julinho ainda pôs lenha na fogueira, aos 20 minutos, ao marcar o segundo gol brasileiro. Mas Mister Ellis, que já havia expulsado o lateral esquerdo Nilton Santos, expulsou também o meia Humberto, deixando nossa equipe com apenas nove atletas. Os húngaros perderam, também, um jogador, Bozsik, expulso por jogo violento. Aliás, a tão decantada máquina de jogar futebol apelou para a violência, sob o olhar complacente do árbitro inglês, para parar a habilidade brasileira.
Embora a história não lhe faça justiça, a equipe do Brasil foi valente. Buscou o tempo todo o empate, mesmo com nove contra dez. Até que, aos 42 minutos, Kocsis deu números definitivos ao placar, fazendo 4 a 2.
A violência não se limitou ao campo de jogo. No túnel que levava aos vestiários, húngaros e brasileiros trocaram sopapos. Mas a imprensa, tanto a nossa, quanto a internacional, atribuiu toda a culpa desses lamentáveis incidentes aos nossos atletas, chamando-os de selvagens, de atrasados, de incivilizados e outras tantas coisas mais, eivadas de um rançoso preconceito.
Eu, na oportunidade, a despeito dos meus parcos onze anos e meio, fiquei revoltadíssimo com esse tratamento e me senti impotente para fazer o que quer que fosse. Minha revolta maior foi com muitos brasileiros, que não sabem (e não querem) valorizar o que é seu, que preferiram engolir a versão estrangeira e execrar, por consequ8ência, os nossos atletas.
Até hoje, não li em nenhum texto referente a essa Copa o que Edson Leite narrou, com tanto detalhe e tanta verdade, nesse dia, cuja veracidade pude comprovar nas imagens a que tive acesso desse jogo ao qual faltou a isenção de um árbitro ou muito safado, ou muito ruim, ou ambas as coisas (que é no que acredito). O complexo de vira-latas é fogo!!!!
Que a Hungria, em 1954, tinha o melhor futebol do mundo, era quase consensual. Todavia, não concordo e nunca concordei com isso. Não há parâmetro infalível para esse tipo de conclusão. Mas admitamos essa opinião generalizada. Afinal, seus grandes craques, que desertaram para o Ocidente após a invasão das tropas soviéticas, em 1956, ao seu país, fizeram esfuziantes carreiras nos principais times europeus. Isso ocorreu, por exemplo, com Ferenc Puskas, sua maior estrela, que brilhou no todo poderoso Real Madri.
O mesmo ocorreu com Kocsis e Czibor, no Barcelona. Com Hidegutti, que foi jogar na Alemanha Ocidental. E com Warkdorf, que se consagrou no futebol suíço, entre outros. A Seleção Brasileira, em termos técnicos, porém, não ficava nada a dever aos húngaros. É verdade que não contava com disciplina tática. Mas compensava isso com muita habilidade. Carecia, como ainda hoje, de organização. Mas o que faltava era, sobretudo, reconhecimento internacional de suas qualidades e virtudes, que apenas viria em 1962, com o bicampeonato mundial.
Nossos jogadores cometeram um “pecado mortal” no jogo contra a Hungria, de 27 de junho de 1954, disputado no Estádio Wankdorff, em Berna: entraram em campo excessivamente nervosos, sentindo o peso da responsabilidade de tentar apagar o fiasco de 1950.
O público daquele sensacional confronto foi excelente para aquela Copa, de 63.200 pessoas. A arbitragem coube ao inglês Mister Arthur Ellis, que quatro anos antes havia apitado o Mundial do Brasil e havia se saído até que bem. Mas nesse jogo... Foi a figura decisiva, por suas inúmeras lambanças.
Acompanhei a transmissão dessa partida pela Rádio Bandeirantes de São Paulo, na narração meticulosa, brilhante e detalhada de Edson Leite, que então ostentava a sua melhor forma. Sua descrição dos lances era tão perfeita, que podíamos, sem muito esforço, visualizar as jogadas narradas.
Uma de suas características era a de informar o tempo de jogo utilizando este bordão: “O tempo passa, o meu cronômetro Eska marca tantos minutos”. Engraçado é que nunca mais vi ou ouvi qualquer referência a essa marca de relógio.
Embora atualmente tenhamos excelentes narradores esportivos, eles que me perdoem, mas nenhum chega sequer próximo ao Edson Leite de 1954. Dava gosto ouvir suas narrações de jogos. Claro que eu também gostava de Fiori Gigliotti e Pedro Luís. Mas nessa Copa, não tinha pra ninguém.
Mas, como eu ia dizendo, a Seleção Brasileira estava excessivamente nervosa nesse jogo contra a Hungria pelas quartas-de-final. Tanto que, com apenas sete minutos do primeiro tempo, já estava 2 a 0 para os húngaros, que tiveram um início fulminante, com gols de Hidegutti (aos 4) e Kocsis (aos 7).
O Brasil começou, apenas, a reação, aos 18 minutos, com o gol de pênalti, de Djalma Santos. Nessa altura, nossos jogadores conseguiram controlar os nervos e partiram em busca da reação. O jogo ficou tenso, duro, pegado como se diz hoje em dia na gíria dos boleiros, mas, sobretudo, violento. Houve um outro pênalti sobre o ponta-direita Julinho, que sua senhoria preferiu ignorar.
Na volta dos vestiários, para o segundo tempo, Mister Ellis resolveu “operar” nossa equipe sem anestesia. Trocava faltas, deixava os húngaros baterem e irritava o mais calmo e pacato dos nossos atletas com seus erros infantis. O cúmulo veio aos 16 minutos da segunda etapa. O árbitro marcou um pênalti absurdo contra o Brasil, jogando um tonel de água gelada na fervura. Nesse dia, nossa Seleção poderia jogar um futebol perfeito, que jamais venceria aquele jogo. O sujeito de preto e com o apito na boca não deixaria.
Lantos converteu o pênalti, ampliando a vantagem húngara para 3 a 1. No começo deste ano, pude assistir a um filme desse jogo e esse lance polêmico e decisivo ocorreu exatamente como Edson Leite narrou há 56 anos. A falta, de fato, aconteceu, mas a quase dois metros de distância da risca da grande área.
Julinho ainda pôs lenha na fogueira, aos 20 minutos, ao marcar o segundo gol brasileiro. Mas Mister Ellis, que já havia expulsado o lateral esquerdo Nilton Santos, expulsou também o meia Humberto, deixando nossa equipe com apenas nove atletas. Os húngaros perderam, também, um jogador, Bozsik, expulso por jogo violento. Aliás, a tão decantada máquina de jogar futebol apelou para a violência, sob o olhar complacente do árbitro inglês, para parar a habilidade brasileira.
Embora a história não lhe faça justiça, a equipe do Brasil foi valente. Buscou o tempo todo o empate, mesmo com nove contra dez. Até que, aos 42 minutos, Kocsis deu números definitivos ao placar, fazendo 4 a 2.
A violência não se limitou ao campo de jogo. No túnel que levava aos vestiários, húngaros e brasileiros trocaram sopapos. Mas a imprensa, tanto a nossa, quanto a internacional, atribuiu toda a culpa desses lamentáveis incidentes aos nossos atletas, chamando-os de selvagens, de atrasados, de incivilizados e outras tantas coisas mais, eivadas de um rançoso preconceito.
Eu, na oportunidade, a despeito dos meus parcos onze anos e meio, fiquei revoltadíssimo com esse tratamento e me senti impotente para fazer o que quer que fosse. Minha revolta maior foi com muitos brasileiros, que não sabem (e não querem) valorizar o que é seu, que preferiram engolir a versão estrangeira e execrar, por consequ8ência, os nossos atletas.
Até hoje, não li em nenhum texto referente a essa Copa o que Edson Leite narrou, com tanto detalhe e tanta verdade, nesse dia, cuja veracidade pude comprovar nas imagens a que tive acesso desse jogo ao qual faltou a isenção de um árbitro ou muito safado, ou muito ruim, ou ambas as coisas (que é no que acredito). O complexo de vira-latas é fogo!!!!
Tuesday, June 29, 2010
O escritor Murilo Mendes escreveu: "Muitos homens julgam que a idéia de eternidade reside num plano de mito, de ficção, ou que a eternidade é a vida de além túmulo. Entretanto, a vida eterna começa neste mundo mesmo: o homem que distingue o espírito da matéria, a necessidade da liberdade, o bem do mal, e que aceita a revelação de Cristo como solução para o enigma da vida, este homem já incorpora elementos eternos ao patrimônio que lhe foi trazido pelo tempo". E nem é necessário ser reconhecido pelo nome, pela identidade pessoal, para que se seja eterno. Quem descobriu a maneira de produzir fogo à hora em que desejasse se eternizou nessa descoberta. Não há registro do autor dessa proeza. Todavia, ela significou importante salto nas civilizações. O mesmo aconteceu com o inventor da roda. Não se sabe quem foi este gênio, mas se tem certeza da sua existência. E sua imortalidade reside nesta invenção.
Bom começo, mas...
Pedro J. Bondaczuk
O Brasil estreou muito bem na Copa do Mundo de 1954, na Suíça. Goleou a fraca seleção do México (a mesma que já havia goleado na estréia de 1950), por 5 a 0, no Estádio F. C. Servette, em Genebra, diante de um público estimado de 17.500 espectadores, com arbitragem do suíço Paul Wissling.
Os brasileiros liquidaram o jogo logo na primeira etapa, sapecando, nos 45 minutos iniciais, um categórico 4 a 0, com gols de Baltazar, Didi e dois de Pinga. No segundo tempo, Julinho completaria o placar. Foi um passeio da equipe canarinho e os mexicanos pouco ameaçaram a meta defendida por Castilho.
As regras daquele Mundial eram pitorescas. Até hoje, considero-as a coisa mais maluca em termos de competição. A França, por exemplo, integrava o nosso grupo. Foi eliminada, porém, sem ter a chance de nos enfrentar. Como havia perdido na estréia para a Iugoslávia (por 1 a 0), mesmo vencendo os mexicanos (por 3 a 2), ficou na dependência do resultado do nosso próximo confronto.
Caso ocorresse um empate entre Brasil e Iugoslávia, ambos se classificariam para as quartas-de-final, e os franceses teriam que voltar para casa. E foi, no final das contas, o que aconteceu. Empatamos com a boa e altamente técnica equipe dos Bálcãs por 1 a 1.
O jogo foi realizado no Estádio La Fontaise, em Lausanne, perante um público estimado de 30 mil pessoas. A arbitragem coube ao escocês Edward Faultless. O Brasil abriu a contagem aos 26 minutos do primeiro tempo através de Didi. A Iugoslávia empatou logo no início da segunda etapa, aos 4 minutos, num dos raros cochilos da nossa defesa.
O curioso é que nem o técnico Zezé Moreira, nem os dirigentes da CBD e muito menos os jogadores sabiam que o empate classificava as duas seleções para as quartas-de-final. Como é que pode uma equipe ir para uma Copa do Mundo (ou para qualquer outra competição) sem conhecer as regras da disputa?!!! Até hoje, não consigo entender tanta incompetência!
Os brasileiros lançaram-se com tudo para o ataque, tentando a vitória a todo o custo. Perderam chances após chances, mas não pararam de atacar, até por volta dos 30 minutos. Os iugoslavos, a todo o momento, faziam sinais desesperados para nossos atletas, para que reduzissem o ímpeto e se limitassem a tocar a bola. Em vão!
Até hoje não sei se nossos jogadores, afinal, compreenderam que o empate era um bom negócio, ou se acabou o gás e eles se cansaram de tanto perder gols. O fato é que o jogo terminou empatado e foi para a prorrogação.
Naquela Copa não havia decisão de vaga na cobrança de tiros livres diretos da marca do pênalti. Isso seria instituído, apenas, nos mundiais seguintes. Caso houvesse empate na prorrogação, portanto, esse seria o resultado definitivo do jogo. E a classificação seria definida pelo saldo de gols. Caiu do céu, portanto, a goleada aplicada sobre o México na estréia.
As regras, então, eram muito diferentes das de hoje. Não havia, por exemplo, substituições durante as partidas. Caso alguém se machucasse, sua equipe teria que continuar o jogo com um a menos (ou dois, ou três, mas no mínimo com seis).
Não havia, também, essa história de cartões, nem o amarelo e nem o vermelho. As expulsões ficavam exclusivamente a critério dos árbitros, o que dava confusões dos diabos. Havia casos (e muitos) em que notadamente os zagueiros davam entradas duríssimas, criminosas, nos atacantes adversários, dessas de rachar o sujeito no meio, e não lhes acontecia absolutamente nada, a não ser a mera marcação da falta, e às vezes nem isso.
As advertências por jogo violento eram verbais e não eram cumulativas. Portanto, não geravam conseqüências para os infratores. Havia jogadores advertidos dezenas de vezes por entradas maldosas nos adversários que nem davam bola para o árbitro. E ficava por isso mesmo. Continuavam batendo, e batendo e batendo adoidado nos atletas habilidosos. Um árbitro ruim (e a maioria era) estragava, fácil, fácil, qualquer espetáculo.
Às vezes uma falta simples, digamos, um pequeno empurrão, coisa de jogo (afinal, futebol é um esporte de contato), resultava em expulsão. Outras, porém, com altíssimo grau de violência, não davam em absolutamente nada. Não raro, o tempo fechava entre os atletas, por causa disso, e os jogos se transformavam em batalhas campais. Vi muitas delas naquela ocasião
Em suma, com uma vitória e um empate, o Brasil classificava-se para as quartas-de-final da Copa de 1954. Bastaria vencer os três jogos restantes para conseguir o que não havia conseguido em 1950. Só que aí é que estava o xis da questão. Aconteceu o que toda a imprensa e a torcida temiam. Para passar adiante, a Seleção Brasileira teria que vencer nada menos que a máquina de jogar bola, a favoritíssima Hungria. Aí... a coisa podia pegar. E, de fato, pegou...
Pedro J. Bondaczuk
O Brasil estreou muito bem na Copa do Mundo de 1954, na Suíça. Goleou a fraca seleção do México (a mesma que já havia goleado na estréia de 1950), por 5 a 0, no Estádio F. C. Servette, em Genebra, diante de um público estimado de 17.500 espectadores, com arbitragem do suíço Paul Wissling.
Os brasileiros liquidaram o jogo logo na primeira etapa, sapecando, nos 45 minutos iniciais, um categórico 4 a 0, com gols de Baltazar, Didi e dois de Pinga. No segundo tempo, Julinho completaria o placar. Foi um passeio da equipe canarinho e os mexicanos pouco ameaçaram a meta defendida por Castilho.
As regras daquele Mundial eram pitorescas. Até hoje, considero-as a coisa mais maluca em termos de competição. A França, por exemplo, integrava o nosso grupo. Foi eliminada, porém, sem ter a chance de nos enfrentar. Como havia perdido na estréia para a Iugoslávia (por 1 a 0), mesmo vencendo os mexicanos (por 3 a 2), ficou na dependência do resultado do nosso próximo confronto.
Caso ocorresse um empate entre Brasil e Iugoslávia, ambos se classificariam para as quartas-de-final, e os franceses teriam que voltar para casa. E foi, no final das contas, o que aconteceu. Empatamos com a boa e altamente técnica equipe dos Bálcãs por 1 a 1.
O jogo foi realizado no Estádio La Fontaise, em Lausanne, perante um público estimado de 30 mil pessoas. A arbitragem coube ao escocês Edward Faultless. O Brasil abriu a contagem aos 26 minutos do primeiro tempo através de Didi. A Iugoslávia empatou logo no início da segunda etapa, aos 4 minutos, num dos raros cochilos da nossa defesa.
O curioso é que nem o técnico Zezé Moreira, nem os dirigentes da CBD e muito menos os jogadores sabiam que o empate classificava as duas seleções para as quartas-de-final. Como é que pode uma equipe ir para uma Copa do Mundo (ou para qualquer outra competição) sem conhecer as regras da disputa?!!! Até hoje, não consigo entender tanta incompetência!
Os brasileiros lançaram-se com tudo para o ataque, tentando a vitória a todo o custo. Perderam chances após chances, mas não pararam de atacar, até por volta dos 30 minutos. Os iugoslavos, a todo o momento, faziam sinais desesperados para nossos atletas, para que reduzissem o ímpeto e se limitassem a tocar a bola. Em vão!
Até hoje não sei se nossos jogadores, afinal, compreenderam que o empate era um bom negócio, ou se acabou o gás e eles se cansaram de tanto perder gols. O fato é que o jogo terminou empatado e foi para a prorrogação.
Naquela Copa não havia decisão de vaga na cobrança de tiros livres diretos da marca do pênalti. Isso seria instituído, apenas, nos mundiais seguintes. Caso houvesse empate na prorrogação, portanto, esse seria o resultado definitivo do jogo. E a classificação seria definida pelo saldo de gols. Caiu do céu, portanto, a goleada aplicada sobre o México na estréia.
As regras, então, eram muito diferentes das de hoje. Não havia, por exemplo, substituições durante as partidas. Caso alguém se machucasse, sua equipe teria que continuar o jogo com um a menos (ou dois, ou três, mas no mínimo com seis).
Não havia, também, essa história de cartões, nem o amarelo e nem o vermelho. As expulsões ficavam exclusivamente a critério dos árbitros, o que dava confusões dos diabos. Havia casos (e muitos) em que notadamente os zagueiros davam entradas duríssimas, criminosas, nos atacantes adversários, dessas de rachar o sujeito no meio, e não lhes acontecia absolutamente nada, a não ser a mera marcação da falta, e às vezes nem isso.
As advertências por jogo violento eram verbais e não eram cumulativas. Portanto, não geravam conseqüências para os infratores. Havia jogadores advertidos dezenas de vezes por entradas maldosas nos adversários que nem davam bola para o árbitro. E ficava por isso mesmo. Continuavam batendo, e batendo e batendo adoidado nos atletas habilidosos. Um árbitro ruim (e a maioria era) estragava, fácil, fácil, qualquer espetáculo.
Às vezes uma falta simples, digamos, um pequeno empurrão, coisa de jogo (afinal, futebol é um esporte de contato), resultava em expulsão. Outras, porém, com altíssimo grau de violência, não davam em absolutamente nada. Não raro, o tempo fechava entre os atletas, por causa disso, e os jogos se transformavam em batalhas campais. Vi muitas delas naquela ocasião
Em suma, com uma vitória e um empate, o Brasil classificava-se para as quartas-de-final da Copa de 1954. Bastaria vencer os três jogos restantes para conseguir o que não havia conseguido em 1950. Só que aí é que estava o xis da questão. Aconteceu o que toda a imprensa e a torcida temiam. Para passar adiante, a Seleção Brasileira teria que vencer nada menos que a máquina de jogar bola, a favoritíssima Hungria. Aí... a coisa podia pegar. E, de fato, pegou...
Monday, June 28, 2010
O poeta Carlos Drummond de Andrade, num de seus poemas, expressou que seu desejo não era "ser moderno, mas eterno". Mal sabia que, em decorrência do bom uso do seu talento, já, àquela altura, havia atingido a pretendida eternidade. Não da forma como os místicos a entendem, como uma outra vida, incorpórea, ou como eventual reencarnação. Se isso existe, ou não, fica no terreno da fé, sem possibilidade alguma de comprovação. Mas todo homem tem uma chance – alguns, maior, outros, muitíssimo menor – de evitar a segunda morte. Aquela representada, não apenas pela extinção física, mas até da lembrança da sua passagem pela Terra, como ocorre com a maioria absoluta da humanidade. Raros, raríssimos indivíduos conseguem deixar alguma obra marcante, a ponto de sobreviver ao tempo e ao esquecimento. Mas nossa obrigação é tentar, tentar e tentar, sem esmorecer.
Desagrado de gregos e troianos
Pedro J. Bondaczuk
O Mundial de 1954, na Suíça, não me empolgou e nem à maioria dos brasileiros, que ainda estava com o fracasso de 1950 entalado na garganta. Dizia-se que o jogador tupíniquim não tinha estrutura emocional, não era competitivo, afinava na hora da verdade. Alguns afirmavam até, em tom de deboche, que nossos craques deveriam se apresentar em circos, como malabaristas, e não em gramados de futebol, numa Copa do Mundo. Confesso que eu não pensava assim.
Eu, porém, naquele ano, estava muito mais preocupado com o fato de ter que passar minhas férias confinado no internato, do que com a possível (e na opinião geral, improvável) boa performance da agora “Seleção Canarinho” em gramados suíços.
Ficou um tanto chato ouvir os jogos no rádio sem a companhia e a cumplicidade dos meus melhores amigos. Praticamente todos os alunos que permaneceram na escola não faziam parte da minha patota. Com alguns, inclusive, eu tinha não só sérias divergências, mas azedas rixas mal-resolvidas.
Resolvi, no entanto, prestar a máxima atenção não apenas à transmissão dos jogos, mas a todo o noticiário referente à seleção, para, em agosto, conversar a respeito com a turma. Teria assunto para o resto do ano ou até mais.
Em 1954, a cidade de São Paulo comemorava o quarto centenário de fundação. Havia festas de todo o tipo e por todos os cantos para celebrar o acontecimento. No futebol, as atenções estavam mais voltadas para o Campeonato Paulista, a ser disputado após a Copa, do que propriamente a esta. Quem seria o campeão do centenário? O que o Ypiranga (então o time do meu coração) poderia fazer para evitar as últimas colocações e o conseqüente rebaixamento?
Dos 22 jogadores convocados para a Seleção, três eram goleiros. A curiosidade é que dois deles eram do mesmo clube, o Fluminense: Castilho (apelidado de “São Castilho”, ou de “Leiteria”, pelas defesas incríveis que fazia) e seu reserva no Tricolor Carioca, Veludo. O outro goleiro era Cabeção, do Corínthians.
Zezé Moreira convocou seis zagueiros: Djalma Santos (Portuguesa de Desportos), Paulinho (Vasco da Gama), Pinheiro (Fluminense), Mauro (São Paulo), Nilton Santos (Botafogo) e Alfredo (São Paulo).
Os médios (hoje chamados de “volantes”, apesarem de não voarem) eram: Brandãozinho (Portuguesa), Bauer (São Paulo), Ely (Vasco), e Dequinha (Flamengo).
E os atacantes que iriam para a Suíça eram: Julinho (Portuguesa), Didi (Botafogo), Baltazar (Corinthians), Pinga (Portuguesa), Rodrigues (Palmeiras), Maurinho (São Paulo), Rubens (Flamengo), Humberto (Palmeiras) e Índio (Flamengo).
A convocação desagradou muita gente, reitero. O Corinthians, por exemplo, (que depois da Copa se tornaria campeão paulista do 4º centenário), cedeu apenas dois jogadores: Cabeção e Baltazar. A surpresa foi o número de convocados da Portuguesa, que tinha, é verdade, um timaço naqueles anos iniciais da década de 50, embora desde 1935 não conquistasse títulos paulistas.
A Lusa cedeu quatro jogadores para a Seleção: Djalma Santos (que mais tarde se consagraria no Palmeiras), Brandãozinho, Julinho (que se transferiria após o Mundial para a Fiorentina da Itália) e Pinga (que jogaria, mais tarde, no Vasco da Gama).
O São Paulo, campeão paulista de 1953, teve, também, quatro convocados: Mauro Ramos de Oliveira (capitão da Copa de 1962 e campeão mundial de clubes pelo Santos anos mais tarde), José Carlos Bauer (apelidado de “O Monstro do Maracanã” por sua performance em 1950), Alfredo e Maurinho (que procedia do Guarani de Campinas).
A torcida, no entanto, reclamava as ausências de Jair da Rosa Pinto, do Palmeiras; de Cláudio Cristóvão do Pinho, do Corinthians; de Luisinho, “O Pequeno Polegar”, também do alvinegro do Parque São Jorge e principalmente de Zizinho, grande destaque do Mundial anterior, uma espécie de Pelé da época, entre outros.
Como se vê, naquele tempo, como hoje, técnico algum conseguiu, consegue ou conseguirá satisfazer a todos, agradar, simultaneamente, a gregos e troianos. É certo que o trio Julinho, Humberto e Didi ostentava grande forma e era esperança de gols na Copa. Mas a torcida não queria nem saber. Eu também não gostei da convocação, embora esse grupo houvesse mostrado muita competência e excelente futebol nas eliminatórias da América do Sul meses três antes do Mundial. A verdade que a cornetagem comia à solta do Oiapoque ao Chuí.
Pedro J. Bondaczuk
O Mundial de 1954, na Suíça, não me empolgou e nem à maioria dos brasileiros, que ainda estava com o fracasso de 1950 entalado na garganta. Dizia-se que o jogador tupíniquim não tinha estrutura emocional, não era competitivo, afinava na hora da verdade. Alguns afirmavam até, em tom de deboche, que nossos craques deveriam se apresentar em circos, como malabaristas, e não em gramados de futebol, numa Copa do Mundo. Confesso que eu não pensava assim.
Eu, porém, naquele ano, estava muito mais preocupado com o fato de ter que passar minhas férias confinado no internato, do que com a possível (e na opinião geral, improvável) boa performance da agora “Seleção Canarinho” em gramados suíços.
Ficou um tanto chato ouvir os jogos no rádio sem a companhia e a cumplicidade dos meus melhores amigos. Praticamente todos os alunos que permaneceram na escola não faziam parte da minha patota. Com alguns, inclusive, eu tinha não só sérias divergências, mas azedas rixas mal-resolvidas.
Resolvi, no entanto, prestar a máxima atenção não apenas à transmissão dos jogos, mas a todo o noticiário referente à seleção, para, em agosto, conversar a respeito com a turma. Teria assunto para o resto do ano ou até mais.
Em 1954, a cidade de São Paulo comemorava o quarto centenário de fundação. Havia festas de todo o tipo e por todos os cantos para celebrar o acontecimento. No futebol, as atenções estavam mais voltadas para o Campeonato Paulista, a ser disputado após a Copa, do que propriamente a esta. Quem seria o campeão do centenário? O que o Ypiranga (então o time do meu coração) poderia fazer para evitar as últimas colocações e o conseqüente rebaixamento?
Dos 22 jogadores convocados para a Seleção, três eram goleiros. A curiosidade é que dois deles eram do mesmo clube, o Fluminense: Castilho (apelidado de “São Castilho”, ou de “Leiteria”, pelas defesas incríveis que fazia) e seu reserva no Tricolor Carioca, Veludo. O outro goleiro era Cabeção, do Corínthians.
Zezé Moreira convocou seis zagueiros: Djalma Santos (Portuguesa de Desportos), Paulinho (Vasco da Gama), Pinheiro (Fluminense), Mauro (São Paulo), Nilton Santos (Botafogo) e Alfredo (São Paulo).
Os médios (hoje chamados de “volantes”, apesarem de não voarem) eram: Brandãozinho (Portuguesa), Bauer (São Paulo), Ely (Vasco), e Dequinha (Flamengo).
E os atacantes que iriam para a Suíça eram: Julinho (Portuguesa), Didi (Botafogo), Baltazar (Corinthians), Pinga (Portuguesa), Rodrigues (Palmeiras), Maurinho (São Paulo), Rubens (Flamengo), Humberto (Palmeiras) e Índio (Flamengo).
A convocação desagradou muita gente, reitero. O Corinthians, por exemplo, (que depois da Copa se tornaria campeão paulista do 4º centenário), cedeu apenas dois jogadores: Cabeção e Baltazar. A surpresa foi o número de convocados da Portuguesa, que tinha, é verdade, um timaço naqueles anos iniciais da década de 50, embora desde 1935 não conquistasse títulos paulistas.
A Lusa cedeu quatro jogadores para a Seleção: Djalma Santos (que mais tarde se consagraria no Palmeiras), Brandãozinho, Julinho (que se transferiria após o Mundial para a Fiorentina da Itália) e Pinga (que jogaria, mais tarde, no Vasco da Gama).
O São Paulo, campeão paulista de 1953, teve, também, quatro convocados: Mauro Ramos de Oliveira (capitão da Copa de 1962 e campeão mundial de clubes pelo Santos anos mais tarde), José Carlos Bauer (apelidado de “O Monstro do Maracanã” por sua performance em 1950), Alfredo e Maurinho (que procedia do Guarani de Campinas).
A torcida, no entanto, reclamava as ausências de Jair da Rosa Pinto, do Palmeiras; de Cláudio Cristóvão do Pinho, do Corinthians; de Luisinho, “O Pequeno Polegar”, também do alvinegro do Parque São Jorge e principalmente de Zizinho, grande destaque do Mundial anterior, uma espécie de Pelé da época, entre outros.
Como se vê, naquele tempo, como hoje, técnico algum conseguiu, consegue ou conseguirá satisfazer a todos, agradar, simultaneamente, a gregos e troianos. É certo que o trio Julinho, Humberto e Didi ostentava grande forma e era esperança de gols na Copa. Mas a torcida não queria nem saber. Eu também não gostei da convocação, embora esse grupo houvesse mostrado muita competência e excelente futebol nas eliminatórias da América do Sul meses três antes do Mundial. A verdade que a cornetagem comia à solta do Oiapoque ao Chuí.
Sunday, June 27, 2010
Cada um de nós vem ao mundo com duplo compromisso. O primeiro (nossa maior obrigação na vida) é o de sermos felizes. O segundo, não menos importante, é o de acrescentarmos conhecimentos e experiências ao patrimônio cultural comum, que vem sendo engrossado e enriquecido desde o surgimento da humanidade civilizada. A esse propósito, Jacques Maritain observa: "Por ser capaz de adquirir conhecimentos o homem não progride na sua vida específica...sem a experiência coletiva, previamente acumulada e preservada, e sem a transmissão normal de conhecimentos adquiridos". E para esse usufruto e esse acréscimo ao "estoque" cultural humano, convenhamos, não podemos "construir nossa casa na floresta" do isolamento. A comunicação eficaz e competente é fundamental na construção de um mundo melhor. Daí a importância desse nosso amistoso contato diário que, além de reforçar nossa amizade, nos induz a maduras e sábias reflexões.
Lei da selva substitui o direito
Pedro J. Bondaczuk
A invasão de determinados países considerados mais fracos por parte de tropas de outros, que lhes são militarmente superiores, sem que haja nenhuma declaração formal de guerra, começa a se tornar uma perigosa rotina. Essa prática, há muito, vem sendo exercida pela África do Sul, especialmente nos "bantustans" que seu regime vive apregoando se tratarem de nações independentes e soberanas. Mas não foi somente ali que seus soldados entraram, a pretexto de tentarem destruir bases e outras instalações guerrilheiras do grupo Congresso Nacional Africano. Suas incursões mais freqüentes, neste segundo caso, sempre foram desfechadas, no passado, contra Moçambique e Botswana. Ontem, além deste último, os agredidos foram Zâmbia e Zimbabwe.
Angola também foi vítima, em inúmeras oportunidades, dessa prática. Mas no caso angolano, o pretexto mais comum foi a represália contra o apoio desse país à Swapo, única entidade guerrilheira em todo o mundo a contar com o respaldo e o reconhecimento da Organização das Nações Unidas, como legítima representante do povo da Namíbia, ex-colônia alemã na África, à qual os sul-africanos recusam em conceder a independência. Em algumas dessas incursões, as tropas do Estado racista causaram sérios prejuízos econômicos, além de inúmeras mortes e aldeias inteiras destruídas, sem que o agressor sofresse nenhuma espécie de punição.
Frise-se, em abono ao regime de Pretória, que não é apenas a África do Sul que age dessa maneira ilegal e atrabiliária. Recorde-se que as tropas soviéticas mantêm, por quase sete anos, o Afeganistão, outrora soberano, sob ocupação militar. Fora os russos, que já pintaram e bordaram pela Europa Oriental, invadindo a Hungria e a Checoslováquia e interferindo acintosamente nas questões internas da Polônia, a outra superpotência (os Estados Unidos) já agiu assim.
É desnecessário lembrar a sua desastrosa intervenção no Vietnã, prolongando um conflito que poderia ter sido breve e com resultados menos desastrosos, se eles não houvessem se intrometido na questão. Em 1983, os "mariners" de Tio Sam repetiram a dose, entrando na pequena ilha de Granada, um ponto tão pequeno no mapa do Caribe, que chega a ser virtualmente ilocalizável.
Há 34 dias, a Armada norte-americana deu um exemplo, dos mais eloqüentes, de desrespeito à soberania alheia, quando escudada apenas em suspeitas, atacou duas cidades líbias, causando um número razoável de vítimas. Dessa maneira, pode-se dizer (e nós frisamos esse aspecto na ocasião), firmou-se uma perigosa jurisprudência, que teve, ontem, um novo reforço, com a ação agressiva da África do Sul contra três de seus pobres e indefesos vizinhos.
Não importa quais sejam os pretextos, esses atos armados implicam em intoleráveis ações de guerra. Representam incompreensível retrocesso no campo do Direito Internacional, restabelecendo a "lei da selva", a regra do "quem pode mais chora menos". E não foi isso o que fez a Áustria, em 1914, quando quis punir os sérvios pelo assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando?
Não foi o pretexto de Hitler, ao invadir a Polônia e deflagrar a Segunda Guerra Mundial, com a desculpa de que os poloneses haviam agredido a Alemanha ao, presumivelmente, terem hostilizado cidadãos germânicos naquela aberração que se chamava "Corredor Livre de Dantzig" (atual Gdansk)?
Quantas agressões desse tipo, como as perpetradas ontem, serão necessárias para que a comunidade internacional recobre o juízo? Quanta carnificina terá que ser praticada, para que a diplomacia volte a ser a única maneira civilizada de se resolver controvérsias de quaisquer espécies?
Será necessária uma crise de grandes proporções para que o mundo se conscientize que, tão errado como uma ação terrorista, é esta forma de resposta, atingindo, tal qual nos atos extremistas, dezenas de pessoas inocentes? Ou é preciso surgir um outro Vietnã ou outro Afeganistão para devolver os líderes mundiais à razão?
(Artigo publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 20 de maio de 1986)
Pedro J. Bondaczuk
A invasão de determinados países considerados mais fracos por parte de tropas de outros, que lhes são militarmente superiores, sem que haja nenhuma declaração formal de guerra, começa a se tornar uma perigosa rotina. Essa prática, há muito, vem sendo exercida pela África do Sul, especialmente nos "bantustans" que seu regime vive apregoando se tratarem de nações independentes e soberanas. Mas não foi somente ali que seus soldados entraram, a pretexto de tentarem destruir bases e outras instalações guerrilheiras do grupo Congresso Nacional Africano. Suas incursões mais freqüentes, neste segundo caso, sempre foram desfechadas, no passado, contra Moçambique e Botswana. Ontem, além deste último, os agredidos foram Zâmbia e Zimbabwe.
Angola também foi vítima, em inúmeras oportunidades, dessa prática. Mas no caso angolano, o pretexto mais comum foi a represália contra o apoio desse país à Swapo, única entidade guerrilheira em todo o mundo a contar com o respaldo e o reconhecimento da Organização das Nações Unidas, como legítima representante do povo da Namíbia, ex-colônia alemã na África, à qual os sul-africanos recusam em conceder a independência. Em algumas dessas incursões, as tropas do Estado racista causaram sérios prejuízos econômicos, além de inúmeras mortes e aldeias inteiras destruídas, sem que o agressor sofresse nenhuma espécie de punição.
Frise-se, em abono ao regime de Pretória, que não é apenas a África do Sul que age dessa maneira ilegal e atrabiliária. Recorde-se que as tropas soviéticas mantêm, por quase sete anos, o Afeganistão, outrora soberano, sob ocupação militar. Fora os russos, que já pintaram e bordaram pela Europa Oriental, invadindo a Hungria e a Checoslováquia e interferindo acintosamente nas questões internas da Polônia, a outra superpotência (os Estados Unidos) já agiu assim.
É desnecessário lembrar a sua desastrosa intervenção no Vietnã, prolongando um conflito que poderia ter sido breve e com resultados menos desastrosos, se eles não houvessem se intrometido na questão. Em 1983, os "mariners" de Tio Sam repetiram a dose, entrando na pequena ilha de Granada, um ponto tão pequeno no mapa do Caribe, que chega a ser virtualmente ilocalizável.
Há 34 dias, a Armada norte-americana deu um exemplo, dos mais eloqüentes, de desrespeito à soberania alheia, quando escudada apenas em suspeitas, atacou duas cidades líbias, causando um número razoável de vítimas. Dessa maneira, pode-se dizer (e nós frisamos esse aspecto na ocasião), firmou-se uma perigosa jurisprudência, que teve, ontem, um novo reforço, com a ação agressiva da África do Sul contra três de seus pobres e indefesos vizinhos.
Não importa quais sejam os pretextos, esses atos armados implicam em intoleráveis ações de guerra. Representam incompreensível retrocesso no campo do Direito Internacional, restabelecendo a "lei da selva", a regra do "quem pode mais chora menos". E não foi isso o que fez a Áustria, em 1914, quando quis punir os sérvios pelo assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando?
Não foi o pretexto de Hitler, ao invadir a Polônia e deflagrar a Segunda Guerra Mundial, com a desculpa de que os poloneses haviam agredido a Alemanha ao, presumivelmente, terem hostilizado cidadãos germânicos naquela aberração que se chamava "Corredor Livre de Dantzig" (atual Gdansk)?
Quantas agressões desse tipo, como as perpetradas ontem, serão necessárias para que a comunidade internacional recobre o juízo? Quanta carnificina terá que ser praticada, para que a diplomacia volte a ser a única maneira civilizada de se resolver controvérsias de quaisquer espécies?
Será necessária uma crise de grandes proporções para que o mundo se conscientize que, tão errado como uma ação terrorista, é esta forma de resposta, atingindo, tal qual nos atos extremistas, dezenas de pessoas inocentes? Ou é preciso surgir um outro Vietnã ou outro Afeganistão para devolver os líderes mundiais à razão?
(Artigo publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 20 de maio de 1986)
Saturday, June 26, 2010
O ensaísta norte-americano Ralph Waldo Emerson, autor, entre outros, de dois livros hoje considerados clássicos no mundo da cultura, "Ensaios" e "Diários"‚ é , ao lado de Henry David Thoreau e de Montaigne, um dos meus preferidos. Essa preferência pelo escritor de Boston deve-se, exatamente, ao fato dele ser uma espécie de contraponto a esses dois. Trata-se de um intelectual positivo, que crê na racionalidade humana e põe como limite ao talento e à criatividade – não especificamente literários – "as estrelas". Ou seja, recomenda que ousemos, que busquemos esgotar nossas potencialidades, que sejamos autoconfiantes, auto-disciplinados e até obstinados na busca do topo, do ápice, do cume da nossa atividade. Thoreau, por outro lado, é amargo em determinados ensaios, embora defensor radical da individualidade. E Montaigne é um verdadeiro "cirurgião da alma humana".
Soneto à doce amada – LXXVI
Pedro J. Bondaczuk
Tangem sinos, tangem tristes sinos
nesta quietude crepuscular.
Seus tons, ora graves, ora finos,
são convites para recordar.
Sinos que comovem a minha alma,
sons que a quietude da tarde cortam,
impõem silêncio...e paz...e calma...
Ora nos lamentam, ora exortam.
Sinos de tragédias e vitórias,
depositários, fiéis guardiões
de lendas, de mitos e de histórias.
Saudades de uma era passada...
Lembranças urgentes, peremptórias,
do seu corpo, de você amada...
(Soneto composto em Campinas, em 16 de outubro de 1965).
Pedro J. Bondaczuk
Tangem sinos, tangem tristes sinos
nesta quietude crepuscular.
Seus tons, ora graves, ora finos,
são convites para recordar.
Sinos que comovem a minha alma,
sons que a quietude da tarde cortam,
impõem silêncio...e paz...e calma...
Ora nos lamentam, ora exortam.
Sinos de tragédias e vitórias,
depositários, fiéis guardiões
de lendas, de mitos e de histórias.
Saudades de uma era passada...
Lembranças urgentes, peremptórias,
do seu corpo, de você amada...
(Soneto composto em Campinas, em 16 de outubro de 1965).
Friday, June 25, 2010
Bertrand Russell, em sua "História da Filosofia Antiga", observa: "Quando nos lembramos, as lembranças nos ocorrem agora, e não são idênticas ao acontecimento lembrado. Mas a lembrança nos fornece uma 'descrição' do acontecimento passado e, para a maioria dos fins práticos, não é necessário distinguir entre a descrição e aquilo que é descrito". Por isso, não costumo me fiar muito na exatidão da chamada "Literatura Memorialística". Encaro o que é descrito como "ficção calcada em fatos reais". A menos que se trate de diário, reproduzido na íntegra, sem tirar e nem pôr, literalmente como foi escrito, dia por dia. Mesmo então, a carga de subjetividade é muito grande. O mesmo fato pode ser encarado e descrito de formas diferentes, dependendo do observador. Quando os textos são bem escritos e os episódios são interessantes, esse é um dos tipos de literatura que mais aprecio. Mas nunca tomo a narrativa em sentido literal.
Fugindo do bicho papão
Pedro J. Bondaczuk.
A Copa do Mundo de 1954, disputada na Suíça, entre 16 de junho e 4 de julho, antes mesmo de ser iniciada, apresentava uma favorita disparada, uma espécie de bicho papão, de quem todos queriam distância, que era a Seleção da Hungria, uma das melhores de todos os tempos. Todavia – e isso não é segredo para ninguém – essa máquina de triturar adversários não foi a campeã daquele ano e de nenhum outro. Igualou-se, nesse aspecto, por exemplo, à Holanda de vinte anos depois, a tal “Laranja Mecânica” de 1974. Acabou derrotada pela “zebra” alemã (o que, coincidentemente também aconteceu com os holandeses), à qual havia massacrado, na fase de classificação, por 8 a 3.
Futebol tem dessas coisas. Os húngaros sentiram, na carne, coisa parecida com o que os brasileiros haviam sentido em 1950, frente ao Uruguai, posto que com menos dramaticidade do que a derrota do Brasil.
Acompanhei esse Mundial fora de casa, no primeiro dos três internatos pelos quais passei em minha vida. A exemplo da competição de quatro anos antes, ouvi os jogos dessa também pelo rádio, pela Bandeirantes de São Paulo, que encabeçava a famosa “Cadeia Verde e Amarela”, na voz vibrante e característica do locutor Edson Leite.
O período de disputa da Copa coincidia com o do início das férias escolares. Nos anos anteriores, eu havia ido para casa nessa época. Contudo, em 1954, não fui. Não sei explicar por qual razão. Talvez meu pai quisesse me punir pelo meu mau comportamento, notadamente em sala de aula. Eu era o “cabeça” da turma da bagunça. Não posso garantir que tenha sido isso, mas tudo leva a crer que foi.
O internato, a essa altura, estava vazio, com um ou outro gato pingado que por alguma razão não pôde ir para casa, além dos funcionários da instituição. A disciplina ficava afrouxada e, pelo menos, podia-se respirar. Nessa ocasião, eu estava com onze anos e meio.
O futebol já havia entrado em meu sangue para nunca mais sair. A essa altura, eu torcia para um clube que, embora ainda exista, há muito extinguiu o futebol profissional, o Ypiranga da Capital (grafado assim mesmo, com “Y”), conhecido como “Vovô da Colina Histórica”. Foi apenas após a extinção desse time que comecei a torcer pela Ponte Preta de Campinas, paixão essa que já passa de meio século.
A Fifa aceitou 38 inscrições para essa Copa, a primeira a ser disputada na Europa do pós-guerra, que vivia a difícil fase da reconstrução. Estabeleceu, pois, torneios eliminatórios para determinar os 14 melhores, que se juntariam ao país anfitrião, a Suíça, e ao Uruguai, o campeão anterior, para a formação de quatro grupos, com quatro integrantes cada.
Após apurados os competidores, já valendo pelo Mundial, jogariam, em seus respectivos grupos, todos contra todos, classificando-se os dois melhores de cada um deles para a etapa do mata-mata. Eles já iam diretamente para as quartas-de-finais.
Nessa fase, não poderiam haver empates. Caso acontecessem, haveria prorrogações para apurar um vencedor. A fórmula de disputa, portanto, era rigorosamente a mesma adotada neste ano na África do Sul. A diferença é que agora participam 32 seleções, divididas em oito grupos de quatro e então eram apenas 16.
Nas eliminatórias do Grupo 12, da América do Sul, disputadas em fevereiro e março de 1954, o Brasil teria pela frente Paraguai e Chile, em jogos de ida e volta. A Argentina, a exemplo do que fizera em 1950, sequer se inscreveu, bem como Peru e Bolívia. Colômbia, Equador e Venezuela nem cogitavam de disputar um Mundial. E o Uruguai, reitero, estava automaticamente classificado, como o último campeão.
O Brasil venceu duas vezes o Chile (2 a 0 em 28 de fevereiro em Santiago e 1 a 0 em 14 de março no Maracanã) e duas vezes o Paraguai (1 a 0 em 7 de março em Assunção e 4 a 1 em 21 de março no Rio) carimbando, assim, seu passaporte para a Suíça.
Apesar de termos boa seleção, com apenas seis remanescentes de 1950 (Bauer, Ely, Castilho, Nilton Santos, Baltazar e Rodrigues), a imprensa, “vacinada” com o que havia ocorrido quatro anos antes, se mostrava entre cética e esperançosa.
Dizia-se que se o Brasil não cruzasse com a Hungria e caso essa tropeçasse pelo caminho, teria alguma chance. Caso contrário... Mas foi o que (infelizmente) aconteceu. Tombamos frente aos húngaros nas quartas-de-finais, com uma arbitragem no mínimo contestável do inglês Mister Arthur Ellis, que por anos permaneceu na boca do torcedor brasileiro como sinônimo de “ladrão”.
Mas... não vamos nos precipitar. Contemos essa história melhor e sem pressa. Nesse ano, o técnico escolhido foi um ex-goleiro, Alfredo Moreira Junior, ou Zezé Moreira, que em 1952 havia conseguido a façanha de ganhar o primeiro título brasileiro no exterior, o Panamericano do Chile, com direito, inclusive, de derrotar os uruguaios por 4 a 2.
Para impedir que o bairrismo atrapalhasse nossa performance, o treinador convocou exatamente 11 paulistas e 11 cariocas. Naquele tempo, eram permitidas, apenas, 22 inscrições.
A Copa da Suíça seria a primeira em que o Brasil utilizaria a agora tradicional camisa amarela. Os locutores aproveitaram a deixa para passarem a chamar a equipe de “seleção canarinho” e o apelido logo pegou. Estava na cara que pegaria. O desastre do Maracanã, de 1950, levou a então CBD a aposentar de vez o uniforme inteiramente branco, que nunca mais voltaria a ser uti8lizado. Será que na Copa de 2014 alguém terá coragem de resgatá-lo? Duvido!
Pedro J. Bondaczuk.
A Copa do Mundo de 1954, disputada na Suíça, entre 16 de junho e 4 de julho, antes mesmo de ser iniciada, apresentava uma favorita disparada, uma espécie de bicho papão, de quem todos queriam distância, que era a Seleção da Hungria, uma das melhores de todos os tempos. Todavia – e isso não é segredo para ninguém – essa máquina de triturar adversários não foi a campeã daquele ano e de nenhum outro. Igualou-se, nesse aspecto, por exemplo, à Holanda de vinte anos depois, a tal “Laranja Mecânica” de 1974. Acabou derrotada pela “zebra” alemã (o que, coincidentemente também aconteceu com os holandeses), à qual havia massacrado, na fase de classificação, por 8 a 3.
Futebol tem dessas coisas. Os húngaros sentiram, na carne, coisa parecida com o que os brasileiros haviam sentido em 1950, frente ao Uruguai, posto que com menos dramaticidade do que a derrota do Brasil.
Acompanhei esse Mundial fora de casa, no primeiro dos três internatos pelos quais passei em minha vida. A exemplo da competição de quatro anos antes, ouvi os jogos dessa também pelo rádio, pela Bandeirantes de São Paulo, que encabeçava a famosa “Cadeia Verde e Amarela”, na voz vibrante e característica do locutor Edson Leite.
O período de disputa da Copa coincidia com o do início das férias escolares. Nos anos anteriores, eu havia ido para casa nessa época. Contudo, em 1954, não fui. Não sei explicar por qual razão. Talvez meu pai quisesse me punir pelo meu mau comportamento, notadamente em sala de aula. Eu era o “cabeça” da turma da bagunça. Não posso garantir que tenha sido isso, mas tudo leva a crer que foi.
O internato, a essa altura, estava vazio, com um ou outro gato pingado que por alguma razão não pôde ir para casa, além dos funcionários da instituição. A disciplina ficava afrouxada e, pelo menos, podia-se respirar. Nessa ocasião, eu estava com onze anos e meio.
O futebol já havia entrado em meu sangue para nunca mais sair. A essa altura, eu torcia para um clube que, embora ainda exista, há muito extinguiu o futebol profissional, o Ypiranga da Capital (grafado assim mesmo, com “Y”), conhecido como “Vovô da Colina Histórica”. Foi apenas após a extinção desse time que comecei a torcer pela Ponte Preta de Campinas, paixão essa que já passa de meio século.
A Fifa aceitou 38 inscrições para essa Copa, a primeira a ser disputada na Europa do pós-guerra, que vivia a difícil fase da reconstrução. Estabeleceu, pois, torneios eliminatórios para determinar os 14 melhores, que se juntariam ao país anfitrião, a Suíça, e ao Uruguai, o campeão anterior, para a formação de quatro grupos, com quatro integrantes cada.
Após apurados os competidores, já valendo pelo Mundial, jogariam, em seus respectivos grupos, todos contra todos, classificando-se os dois melhores de cada um deles para a etapa do mata-mata. Eles já iam diretamente para as quartas-de-finais.
Nessa fase, não poderiam haver empates. Caso acontecessem, haveria prorrogações para apurar um vencedor. A fórmula de disputa, portanto, era rigorosamente a mesma adotada neste ano na África do Sul. A diferença é que agora participam 32 seleções, divididas em oito grupos de quatro e então eram apenas 16.
Nas eliminatórias do Grupo 12, da América do Sul, disputadas em fevereiro e março de 1954, o Brasil teria pela frente Paraguai e Chile, em jogos de ida e volta. A Argentina, a exemplo do que fizera em 1950, sequer se inscreveu, bem como Peru e Bolívia. Colômbia, Equador e Venezuela nem cogitavam de disputar um Mundial. E o Uruguai, reitero, estava automaticamente classificado, como o último campeão.
O Brasil venceu duas vezes o Chile (2 a 0 em 28 de fevereiro em Santiago e 1 a 0 em 14 de março no Maracanã) e duas vezes o Paraguai (1 a 0 em 7 de março em Assunção e 4 a 1 em 21 de março no Rio) carimbando, assim, seu passaporte para a Suíça.
Apesar de termos boa seleção, com apenas seis remanescentes de 1950 (Bauer, Ely, Castilho, Nilton Santos, Baltazar e Rodrigues), a imprensa, “vacinada” com o que havia ocorrido quatro anos antes, se mostrava entre cética e esperançosa.
Dizia-se que se o Brasil não cruzasse com a Hungria e caso essa tropeçasse pelo caminho, teria alguma chance. Caso contrário... Mas foi o que (infelizmente) aconteceu. Tombamos frente aos húngaros nas quartas-de-finais, com uma arbitragem no mínimo contestável do inglês Mister Arthur Ellis, que por anos permaneceu na boca do torcedor brasileiro como sinônimo de “ladrão”.
Mas... não vamos nos precipitar. Contemos essa história melhor e sem pressa. Nesse ano, o técnico escolhido foi um ex-goleiro, Alfredo Moreira Junior, ou Zezé Moreira, que em 1952 havia conseguido a façanha de ganhar o primeiro título brasileiro no exterior, o Panamericano do Chile, com direito, inclusive, de derrotar os uruguaios por 4 a 2.
Para impedir que o bairrismo atrapalhasse nossa performance, o treinador convocou exatamente 11 paulistas e 11 cariocas. Naquele tempo, eram permitidas, apenas, 22 inscrições.
A Copa da Suíça seria a primeira em que o Brasil utilizaria a agora tradicional camisa amarela. Os locutores aproveitaram a deixa para passarem a chamar a equipe de “seleção canarinho” e o apelido logo pegou. Estava na cara que pegaria. O desastre do Maracanã, de 1950, levou a então CBD a aposentar de vez o uniforme inteiramente branco, que nunca mais voltaria a ser uti8lizado. Será que na Copa de 2014 alguém terá coragem de resgatá-lo? Duvido!
Thursday, June 24, 2010
A memória costuma nos pregar peças incríveis e se confiarmos cegamente nela, estaremos sujeitos a cair em ridículo, principalmente se, além de "desmemoriados", formos também teimosos. Daí a necessidade do historiador, que pretenda narrar os acontecimentos de maneira científica (se é que isso é possível), com milimétrica exatidão, de contar com um arquivo consistente, que registre os principais fatos com os detalhes essenciais, para que uma realidade que deseja preservar não seja transformada em mera ficção. Nem tudo (ou quase nada) do que "lembramos" aconteceu exatamente da maneira que achamos. O tempo deturpa detalhes, modifica circunstâncias, suprime ou acrescenta personagens e assim por diante, alterando pontos essenciais do acontecimento, embora tenhamos a convicção íntima de estarmos certos em nossa descrição. Em assuntos banais, nada disso tem muita importância. Mas quando se trata de algo sério...
Lembranças de um fracasso – VII
Pedro J. Bondaczuk
A decisão da Copa do Mundo de 1950, a primeira das quinze que acompanhei em minha vida (acompanho, agora, a décima sexta), e tinha então, sempre é oportuno lembrar, apenas sete anos e meio de idade, suscitou-me, na época (e suscita ainda hoje), uma série de reflexões.
Naquela oportunidade, saí chorando da casa do Zé Gordo, onde acompanhei pelo rádio, com um bando de gente (creio que, entre crianças e adultos, éramos umas quarenta pessoas) a transmissão do jogo, tão logo este terminou, com a surpreendente vitória uruguaia por 2 a 1.
Aliás, meu choro quase provoca confusão em casa. Meu pai queria saber quem havia me batido, para tirar satisfação. “Ninguém me bateu”, murmurei, entre soluços. E seria difícil alguém fazê-lo, porquanto eu era bom de briga. “Então por que você está chorando?”, perguntou, asperamente. “Por que o Brasil perdeu”, respondi, fazendo acompanhar minhas palavras com outra crise de choro, ainda mais intensa.
Na verdade, eu não era o único a chorar. Na rua, a caminho de casa, pude observar vários adultos se desmanchando em lágrimas, enquanto outros deblateravam contra o goleiro Barbosa, chamado de “frangueiro”, ou acusando os jogadores de “covardes” por, supostamente, haverem “afinado” face à propalada “raça” dos adversários. Tudo isso era bobagem!
O Brasil havia dominado o jogo e perdido um caminhão de gols. Barbosa quase não foi exigido. O time correu, lutou, batalhou, buscou a vitória. Não se limitou à defesa, o que poderia ter feito, já que jogava pelo empate. Mas o acaso e as circunstâncias jogaram contra nós. Em mil novas tentativas, Ghiggia erraria todas, jamais faria o gol que fez e que deu a vitória, e o título, à sua seleção. Insisto neste ponto, mesmo remando contra a maré.
Obdúlio Varela, tempos depois, em entrevista que deu, alertou: “Que ninguém se iluda. Se jogássemos mais cem vezes contra o Brasil, perderíamos 99. O melhor futebol era jogado pelos brasileiros”. Pois se era, por que eles não venceram aquele jogo, que estavam ganhando até os 22 minutos do segundo tempo, com a vantagem do empate para serem campeões? Há coisas que não têm explicação, e esta é uma delas.
“Sim, por que o Brasil não ganhou?”, era a pergunta que, molequinho, atarantado, abobalhado, pasmo e não acostumado a perder nem em jogo de futebol de botão, eu fazia para mim mesmo, sem achar a resposta.
Juro que não atribuí o fracasso ao clima de “já ganhou”, que estava insuportável, pelo exagero, aliás criado pela imprensa (que hoje aposta no mais condenável ainda “já perdeu”), que contaminou torcida e jogadores. Juro que não culpei Barbosa (creio que fui dos raros que não o fizeram) por não ter defendido as duas bolas que entraram e nem o zagueiro Bigode, vencido nos lances dos dois gols. Juro que não culpei o técnico Flávio Costa pelo excesso de confiança que, mesmo quando o Brasil estava vencendo a partida, nem pensou em garantir o resultado, mandando o time para o ataque, acreditando numa goleada.
A posteridade foi (e continua sendo) sumamente injusta com a Seleção de 1950, tratando-a como um grupo de perebas, de pernas de pau, que houvesse perdido todos os jogos e sido desclassificada ainda na primeira fase, que não foi o que aconteceu. Embora o brasileiro não valorize, aquela equipe foi vice-campeã mundial!
Aquela Copa contou, é verdade, com apenas 13 participantes, enquanto que as atuais têm 32. E daí? Os desavisados podem pensar que o Brasil, por esse motivo, enfrentou moleza. Nada disso! Na África do Sul, o time, para ser campeão, fará sete jogos. Pois bem, e quantos a nossa seleção fez em 1950? Fez seis! Marcou 21 gols, com média de quase quatro por partida e sofreu seis. É como se vencesse todos seus jogos por 4 a 1. Além disso, teve o artilheiro da Copa, Ademir de Menezes, com nove gols. Em resumo, venceu quatro jogos, empatou um e perdeu apenas um. Mas justo o que não poderia perder.
E o Uruguai, o que fez para ser campeão? Jogou quatro vezes. Venceu três e empatou uma. Marcou 15 gols (oito só contra a Bolívia) e sofreu cinco. E foi campeão.
A principal lição que a Copa de 1950 me deixou é óbvia: é a de que, nem sempre, tanto no futebol quanto na vida, o melhor vence. Lembro-me que meu pai, para acalmar o desconsolado menininho de sete anos e meio, disse, antes de dar um forte, carinhoso e protetor abraço: “Filho, a perda de uma batalha não significa, necessariamente, a derrota na guerra. O sábio extrai lições dos fracassos para construir sólidos e múltiplos sucessos à frente”.
E como o meu querido velho, meu guru, meu herói estava certo (quanta saudade sinto dele!). Oito anos depois, o Brasil iniciaria um ciclo de conquistas que o tornaria o maior vencedor de Copas de todos os tempos, calando a boca dos pessimistas e dos que adoravam seu complexo de vira-latas. Tornar-se-ia, de lambuja, o único país a participar, por seus méritos e sua competência, de todas, absolutamente todas as Copas do Mundo.
E o Uruguai, o que aconteceu com ele? Foi vítima da “maldição do Maracanã”. Desde que ganhou aquele mundial em cima de nós, não voltou a conquistar mais coisíssima alguma. E a nossa tristeza, na oportunidade, foi tamanha que chegou a contaminar a alegria deles, tão profunda e patética que foi.
Orlando Duarte, em sua excelente “Enciclopédia dos Mundiais de Futebol”, registra esta declaração de Obdúlio Varela: “Não gostei de ver aqueles 200 mil torcedores tristes; não gostei de ver o Rio às escuras e sem carnaval. É a vida. Era campeão e no hotel em que estávamos, eu não sentia uma total alegria pelo feito”. Que, aliás, nunca mais se repetiu. Nossa tristeza foi passageira. Já a deles... Dura sessenta anos!
Pedro J. Bondaczuk
A decisão da Copa do Mundo de 1950, a primeira das quinze que acompanhei em minha vida (acompanho, agora, a décima sexta), e tinha então, sempre é oportuno lembrar, apenas sete anos e meio de idade, suscitou-me, na época (e suscita ainda hoje), uma série de reflexões.
Naquela oportunidade, saí chorando da casa do Zé Gordo, onde acompanhei pelo rádio, com um bando de gente (creio que, entre crianças e adultos, éramos umas quarenta pessoas) a transmissão do jogo, tão logo este terminou, com a surpreendente vitória uruguaia por 2 a 1.
Aliás, meu choro quase provoca confusão em casa. Meu pai queria saber quem havia me batido, para tirar satisfação. “Ninguém me bateu”, murmurei, entre soluços. E seria difícil alguém fazê-lo, porquanto eu era bom de briga. “Então por que você está chorando?”, perguntou, asperamente. “Por que o Brasil perdeu”, respondi, fazendo acompanhar minhas palavras com outra crise de choro, ainda mais intensa.
Na verdade, eu não era o único a chorar. Na rua, a caminho de casa, pude observar vários adultos se desmanchando em lágrimas, enquanto outros deblateravam contra o goleiro Barbosa, chamado de “frangueiro”, ou acusando os jogadores de “covardes” por, supostamente, haverem “afinado” face à propalada “raça” dos adversários. Tudo isso era bobagem!
O Brasil havia dominado o jogo e perdido um caminhão de gols. Barbosa quase não foi exigido. O time correu, lutou, batalhou, buscou a vitória. Não se limitou à defesa, o que poderia ter feito, já que jogava pelo empate. Mas o acaso e as circunstâncias jogaram contra nós. Em mil novas tentativas, Ghiggia erraria todas, jamais faria o gol que fez e que deu a vitória, e o título, à sua seleção. Insisto neste ponto, mesmo remando contra a maré.
Obdúlio Varela, tempos depois, em entrevista que deu, alertou: “Que ninguém se iluda. Se jogássemos mais cem vezes contra o Brasil, perderíamos 99. O melhor futebol era jogado pelos brasileiros”. Pois se era, por que eles não venceram aquele jogo, que estavam ganhando até os 22 minutos do segundo tempo, com a vantagem do empate para serem campeões? Há coisas que não têm explicação, e esta é uma delas.
“Sim, por que o Brasil não ganhou?”, era a pergunta que, molequinho, atarantado, abobalhado, pasmo e não acostumado a perder nem em jogo de futebol de botão, eu fazia para mim mesmo, sem achar a resposta.
Juro que não atribuí o fracasso ao clima de “já ganhou”, que estava insuportável, pelo exagero, aliás criado pela imprensa (que hoje aposta no mais condenável ainda “já perdeu”), que contaminou torcida e jogadores. Juro que não culpei Barbosa (creio que fui dos raros que não o fizeram) por não ter defendido as duas bolas que entraram e nem o zagueiro Bigode, vencido nos lances dos dois gols. Juro que não culpei o técnico Flávio Costa pelo excesso de confiança que, mesmo quando o Brasil estava vencendo a partida, nem pensou em garantir o resultado, mandando o time para o ataque, acreditando numa goleada.
A posteridade foi (e continua sendo) sumamente injusta com a Seleção de 1950, tratando-a como um grupo de perebas, de pernas de pau, que houvesse perdido todos os jogos e sido desclassificada ainda na primeira fase, que não foi o que aconteceu. Embora o brasileiro não valorize, aquela equipe foi vice-campeã mundial!
Aquela Copa contou, é verdade, com apenas 13 participantes, enquanto que as atuais têm 32. E daí? Os desavisados podem pensar que o Brasil, por esse motivo, enfrentou moleza. Nada disso! Na África do Sul, o time, para ser campeão, fará sete jogos. Pois bem, e quantos a nossa seleção fez em 1950? Fez seis! Marcou 21 gols, com média de quase quatro por partida e sofreu seis. É como se vencesse todos seus jogos por 4 a 1. Além disso, teve o artilheiro da Copa, Ademir de Menezes, com nove gols. Em resumo, venceu quatro jogos, empatou um e perdeu apenas um. Mas justo o que não poderia perder.
E o Uruguai, o que fez para ser campeão? Jogou quatro vezes. Venceu três e empatou uma. Marcou 15 gols (oito só contra a Bolívia) e sofreu cinco. E foi campeão.
A principal lição que a Copa de 1950 me deixou é óbvia: é a de que, nem sempre, tanto no futebol quanto na vida, o melhor vence. Lembro-me que meu pai, para acalmar o desconsolado menininho de sete anos e meio, disse, antes de dar um forte, carinhoso e protetor abraço: “Filho, a perda de uma batalha não significa, necessariamente, a derrota na guerra. O sábio extrai lições dos fracassos para construir sólidos e múltiplos sucessos à frente”.
E como o meu querido velho, meu guru, meu herói estava certo (quanta saudade sinto dele!). Oito anos depois, o Brasil iniciaria um ciclo de conquistas que o tornaria o maior vencedor de Copas de todos os tempos, calando a boca dos pessimistas e dos que adoravam seu complexo de vira-latas. Tornar-se-ia, de lambuja, o único país a participar, por seus méritos e sua competência, de todas, absolutamente todas as Copas do Mundo.
E o Uruguai, o que aconteceu com ele? Foi vítima da “maldição do Maracanã”. Desde que ganhou aquele mundial em cima de nós, não voltou a conquistar mais coisíssima alguma. E a nossa tristeza, na oportunidade, foi tamanha que chegou a contaminar a alegria deles, tão profunda e patética que foi.
Orlando Duarte, em sua excelente “Enciclopédia dos Mundiais de Futebol”, registra esta declaração de Obdúlio Varela: “Não gostei de ver aqueles 200 mil torcedores tristes; não gostei de ver o Rio às escuras e sem carnaval. É a vida. Era campeão e no hotel em que estávamos, eu não sentia uma total alegria pelo feito”. Que, aliás, nunca mais se repetiu. Nossa tristeza foi passageira. Já a deles... Dura sessenta anos!
Wednesday, June 23, 2010
Como o exercício da meditação deve ser feito? Existem técnicas, momentos e lugares adequados? Quais os requisitos exigidos? Jiddu Krishnamurti responde: "A meditação não é consciente, nem requer determinadas posturas. Aquele que medita não tem consciência de que está meditando. Se alguém medita deliberadamente, essa é uma outra forma de desejo". A condição básica, portanto, para a meditação é esse expurgo da mente. É o relaxamento, a serenidade, a respiração lenta, profunda e pausada. Pois como destaca o guru indiano: "Quando a mente está toda vazia, em completo silêncio, ela é capaz de renovar-se inteiramente, sem pressões externas, alheia a circunstâncias. Então ela é clara, cristalina e há nela uma alegria que não é mero prazer".
Lembranças de um fracasso – VI
Pedro J. Bondaczuk
A algazarra era infernal naquele 16 de julho de 1950, antes do início do jogo decisivo do Brasil contra o Uruguai, num Maracanã hiper-lotado. O público oficial divulgado foi de 173.850 pagantes, mas a maioria jura que havia muito mais torcedores presentes. Os mais exagerados chegaram a estimar em 210 mil pessoas. Menos, gente, menos...
O clima de euforia e de empolgação tomava conta do Brasil inteiro, do Oiapoque ao Chuí. Na casa do Zé Gordo, onde eu ouviria o jogo, a batucada havia começado cedo. Nós, crianças (nunca é demais repetir que eu tinha sete anos e meio na ocasião) brincávamos do que era comum na época antes de partidas de futebol. Cada um de nós assumia o papel de algum jogador da Seleção (de mentirinha, claro). “Eu sou o Ademir”, gritou antes de todos o Neuclair. “E eu sou o Zizinho!”, gritamos, simultaneamente, eu e o Eduardo, um garoto um ano mais velho que eu. “Falei primeiro!”, garanti. “Não, fui eu!”, retrucou meu companheiro.
Os colegas foram chamados a desempatar a controvérsia e deram razão ao meu competidor. Relutei em aceitar a decisão, mas acabei gritando, de surpresa, antes que outro o fizesse: “Então sou o Friaça!”. E fiz excelente escolha, pois o ponta direita faria um dos gols nesse jogo prestes a começar.
Subitamente, um adulto gritou: “Silêncio! A partida começou!”. Cessou o burburinho. Todos nós, meninos, nos calamos, reservando energia para gritarmos o primeiro gol do Brasil que tínhamos certeza de que não tardaria. E, logicamente, para as comemorações do título que prometiam não apenas varar a madrugada, mas se estender por dias, por semanas ou por meses, até.
Assim que o árbitro inglês, Mister George Reader, apitou o início da partida, havia imensa carga de tensão no ar. Não era de medo, certamente, mas de ansiedade pelo momento de soltar o grito de gol e, principalmente, o de “é campeão!”
Empurrada pelo maior público que já se fez presente em qualquer tipo de espetáculo – e não somente de futebol – em qualquer tempo e lugar, a seleção partiu para o ataque. Não precisava, pois jogava pelo simples empate. Contudo, se mandou toda para a frente. Martelou, martelou e martelou, perdeu chances atrás de chances e nada do gol sair. E assim terminou o primeiro tempo. Ou seja, sem que o placar fosse mexido.
Agora faltavam, apenas, 45 minutos para a consagração. A batucada, na casa do Zé Gordo, recomeçou. Muitos dos adultos presentes já estavam pra lá de Marrakesh, ou seja, visivelmente embriagados, não dizendo coisa com coisa.
Nós, crianças, fazíamos apostas, valendo bolinhas de gude, peões e principalmente figurinhas, sobre quem marcaria o gol da vitória brasileira. Eu ganhei. Friaça marcou. Contudo, não seria o da vitória como desejava que fosse. Naquele momento, porém, isso nem passava pela nossa cabeça. Seu gol foi o que colocou um vidro inteiro de pimenta malagueta no “banquete”, que em vez de satisfação, causou, no fim das contas, indigestão e dor de barriga.
A abertura do placar ocorreu aos 13 minutos do segundo tempo. Como já disse, foi Friaça que marcou. Daí, até os 22, ou seja, por nove minutos consecutivos, ninguém mais na sala da casa do Zé Gordo ouviu a voz do locutor. O samba comeu solto a todo o vapor, de um lado; nós, a meninada, gritávamos do outro e a algazarra era geral. Desconfio que o barulho poderia ser ouvido até da Lua.
Até que alguém, que estava com o ouvido bem colado ao rádio, gritou: “Silêncio! Os uruguaios empataram!” Foi recepcionado, claro, com uma vaia geral. Ninguém acreditou. Mas outras pessoas, não tão confiantes quanto nós, foram conferir. De fato, era verdade. Aos 22 minutos do segundo tempo, Ghiggia venceu o zagueiro Bigode na corrida, tocou a bola para Schiafino, que a mandou para as nossas redes.
Aos poucos, um silêncio tenso foi se instalando na sala. A batucada cessou. Nenhum de nós ousava dar um pio. Lembro-me, como se fosse hoje, que pensei, de fato, no pior. Seria intuição? Provavelmente sim. “E se eles fizerem como fizeram contra a Suécia e virarem o jogo?”, pensei, aflito. “Não, não vai acontecer”, disse para mim mesmo, mas duvidando das minhas palavras.
E... Outra vez Ghiggia venceu Bigode na corrida e chutou sem ângulo, parece que apenas para se livrar da bola (foi a impressão que tive). Mil chutes daquele local, estou plenamente convicto, iriam ou pela linha de fundo ou bateriam na trave, quando muito. Mas aquele... Caprichosamente entrou no gol brasileiro, sem que o goleiro Barbosa nada pudesse fazer para evitar.
Todos culparam o nosso guarda-metas (que por sinal, nasceu aqui em Campinas), atribuindo-lhe toda a responsabilidade pela perda do título. Tremenda burrice fazer isso. Se houve alguém que nada poderia fazer no lance, pela rapidez com que ele ocorreu, foi o goleirão.
O gol da virada uruguaia aconteceu aos 35 minutos do segundo tempo. O Brasil tinha dez para reagir, mas os nervos não deixaram. Quando Mister Reader soou o apito, encerrando o jogo e a Copa do Mundo, estava consumado o que passou a ser conhecido como “!Maracanazo”. Atônitos, não acreditando no que havia acontecido, os brasileiros, do Oiapoque ao Chuí, se calaram. Reinava, em todo o País, um incômodo e doloroso “silêncio ensurdecedor” que me incomoda até hoje, sessenta anos depois.
Pedro J. Bondaczuk
A algazarra era infernal naquele 16 de julho de 1950, antes do início do jogo decisivo do Brasil contra o Uruguai, num Maracanã hiper-lotado. O público oficial divulgado foi de 173.850 pagantes, mas a maioria jura que havia muito mais torcedores presentes. Os mais exagerados chegaram a estimar em 210 mil pessoas. Menos, gente, menos...
O clima de euforia e de empolgação tomava conta do Brasil inteiro, do Oiapoque ao Chuí. Na casa do Zé Gordo, onde eu ouviria o jogo, a batucada havia começado cedo. Nós, crianças (nunca é demais repetir que eu tinha sete anos e meio na ocasião) brincávamos do que era comum na época antes de partidas de futebol. Cada um de nós assumia o papel de algum jogador da Seleção (de mentirinha, claro). “Eu sou o Ademir”, gritou antes de todos o Neuclair. “E eu sou o Zizinho!”, gritamos, simultaneamente, eu e o Eduardo, um garoto um ano mais velho que eu. “Falei primeiro!”, garanti. “Não, fui eu!”, retrucou meu companheiro.
Os colegas foram chamados a desempatar a controvérsia e deram razão ao meu competidor. Relutei em aceitar a decisão, mas acabei gritando, de surpresa, antes que outro o fizesse: “Então sou o Friaça!”. E fiz excelente escolha, pois o ponta direita faria um dos gols nesse jogo prestes a começar.
Subitamente, um adulto gritou: “Silêncio! A partida começou!”. Cessou o burburinho. Todos nós, meninos, nos calamos, reservando energia para gritarmos o primeiro gol do Brasil que tínhamos certeza de que não tardaria. E, logicamente, para as comemorações do título que prometiam não apenas varar a madrugada, mas se estender por dias, por semanas ou por meses, até.
Assim que o árbitro inglês, Mister George Reader, apitou o início da partida, havia imensa carga de tensão no ar. Não era de medo, certamente, mas de ansiedade pelo momento de soltar o grito de gol e, principalmente, o de “é campeão!”
Empurrada pelo maior público que já se fez presente em qualquer tipo de espetáculo – e não somente de futebol – em qualquer tempo e lugar, a seleção partiu para o ataque. Não precisava, pois jogava pelo simples empate. Contudo, se mandou toda para a frente. Martelou, martelou e martelou, perdeu chances atrás de chances e nada do gol sair. E assim terminou o primeiro tempo. Ou seja, sem que o placar fosse mexido.
Agora faltavam, apenas, 45 minutos para a consagração. A batucada, na casa do Zé Gordo, recomeçou. Muitos dos adultos presentes já estavam pra lá de Marrakesh, ou seja, visivelmente embriagados, não dizendo coisa com coisa.
Nós, crianças, fazíamos apostas, valendo bolinhas de gude, peões e principalmente figurinhas, sobre quem marcaria o gol da vitória brasileira. Eu ganhei. Friaça marcou. Contudo, não seria o da vitória como desejava que fosse. Naquele momento, porém, isso nem passava pela nossa cabeça. Seu gol foi o que colocou um vidro inteiro de pimenta malagueta no “banquete”, que em vez de satisfação, causou, no fim das contas, indigestão e dor de barriga.
A abertura do placar ocorreu aos 13 minutos do segundo tempo. Como já disse, foi Friaça que marcou. Daí, até os 22, ou seja, por nove minutos consecutivos, ninguém mais na sala da casa do Zé Gordo ouviu a voz do locutor. O samba comeu solto a todo o vapor, de um lado; nós, a meninada, gritávamos do outro e a algazarra era geral. Desconfio que o barulho poderia ser ouvido até da Lua.
Até que alguém, que estava com o ouvido bem colado ao rádio, gritou: “Silêncio! Os uruguaios empataram!” Foi recepcionado, claro, com uma vaia geral. Ninguém acreditou. Mas outras pessoas, não tão confiantes quanto nós, foram conferir. De fato, era verdade. Aos 22 minutos do segundo tempo, Ghiggia venceu o zagueiro Bigode na corrida, tocou a bola para Schiafino, que a mandou para as nossas redes.
Aos poucos, um silêncio tenso foi se instalando na sala. A batucada cessou. Nenhum de nós ousava dar um pio. Lembro-me, como se fosse hoje, que pensei, de fato, no pior. Seria intuição? Provavelmente sim. “E se eles fizerem como fizeram contra a Suécia e virarem o jogo?”, pensei, aflito. “Não, não vai acontecer”, disse para mim mesmo, mas duvidando das minhas palavras.
E... Outra vez Ghiggia venceu Bigode na corrida e chutou sem ângulo, parece que apenas para se livrar da bola (foi a impressão que tive). Mil chutes daquele local, estou plenamente convicto, iriam ou pela linha de fundo ou bateriam na trave, quando muito. Mas aquele... Caprichosamente entrou no gol brasileiro, sem que o goleiro Barbosa nada pudesse fazer para evitar.
Todos culparam o nosso guarda-metas (que por sinal, nasceu aqui em Campinas), atribuindo-lhe toda a responsabilidade pela perda do título. Tremenda burrice fazer isso. Se houve alguém que nada poderia fazer no lance, pela rapidez com que ele ocorreu, foi o goleirão.
O gol da virada uruguaia aconteceu aos 35 minutos do segundo tempo. O Brasil tinha dez para reagir, mas os nervos não deixaram. Quando Mister Reader soou o apito, encerrando o jogo e a Copa do Mundo, estava consumado o que passou a ser conhecido como “!Maracanazo”. Atônitos, não acreditando no que havia acontecido, os brasileiros, do Oiapoque ao Chuí, se calaram. Reinava, em todo o País, um incômodo e doloroso “silêncio ensurdecedor” que me incomoda até hoje, sessenta anos depois.
Tuesday, June 22, 2010
Meditar era prática corriqueira dos grandes místicos, dos guias espirituais que transformaram a humanidade e serão venerados por todos os tempos pelo legado de santidade que nos deixaram. Jesus Cristo, após seu batismo no Rio Jordão, retirou-se para o deserto por quarenta dias para esse fim. Sidarta Gauthama atingiu o estado de "Buda" (iluminação) através desse meio. Maomé teve o encontro com o anjo Gabriel, quando recebeu a revelação, durante um retiro espiritual. Jiddu Krishnamurti explica a esse respeito: "Meditar é purgar a mente de todas acumulações, é a eliminação do poder de juntar, de identificar, de tornar-se; desistência natural do auto-crescimento, do auto-preenchimento; meditar é livrar a mente da memória e do tempo". É apenas através do caminho da meditação que chegaremos às grandes verdades transcendentais, à unidade cósmica que é a essência da divindade, à harmonia universal.
Lembranças de um fracasso – V
Pedro J. Bondaczuk
Acompanhei o jogo decisivo da Copa do Mundo de 1950 pelo rádio, na casa do meu melhor amigo de então (cuja amizade já persiste por 60 anos, apesar da distância e da falta de contato), o José Fernandes, que todos chamávamos de Zé Gordo, embora fosse magrinho e não justificasse o apelido. Torno a lembrar que, na oportunidade, eu só tinha sete anos e meio (meu aniversário é no começo do ano, em janeiro, no dia 20).
Por pouco fiquei privado de ouvir a transmissão desse momento que então acreditava que seria o mais feliz da minha vida de torcedor, que recém começava a se apaixonar pelo futebol. E que paixão! Meus pais não queriam que eu “perturbasse” os vizinhos. Mas em casa, proibiram que eu convidasse os amigos, principalmente depois da algazarra que nós aprontamos antes, durante e depois dos dois jogos anteriores, contra a Suécia e a Espanha, respectivamente.
O que eles queriam? Que ouvíssemos as transmissões dessas exibições fantásticas do Brasil caladinhos, como as pessoas adultas acompanham uma ópera? E, afinal de contas, éramos todos crianças, entre os sete e os doze anos. Tínhamos saúde, energia e muito, muito entusiasmo mesmo.
Depois de tanta birra, manha e choro, reprimidos com ameaças de boas chineladas, finalmente fui autorizado a ir à casa do Zé, onde a família dele preparara uma festa de arromba, principalmente com muitos doces e refrigerantes para nós, meninos. Os adultos – e havia mais de vinte deles reunidos na sala em torno de um potente rádio da marca Philco – se viravam com vários tipos de salgadinhos e cerveja, muita cerveja.
Uma semana antes, como já disse, eu e minha turminha havíamos acompanhado a transmissão das goleadas contra a Suécia e a Espanha. O grande destaque do Brasil, nos 7 a 1 impingidos à boa equipe sueca, num Maracanã lotado, com 138.386 pagantes, foi Ademir de Menezes. Fez quatro gols nesse jogo, façanha que só seria superada 44 anos depois, na Copa de 1994, nos Estados Unidos, por um atacante russo (cujo nome não me recordo), que balançou as redes adversárias por cinco vezes numa só partida.
Foi uma atuação soberba dos comandados de Flávio Costa – que tinha, então, no banco, como auxiliar técnico, alguém que oito anos depois conquistaria, contra essa mesma Suécia, e na casa dela, o primeiro título mundial do Brasil: o paulista Vicente Feola.
Além do centroavante do Vasco, Chico marcou duas vezes e Maneca completou o placar. Embora não tenha feito nenhum gol, Zizinho, o Mestre Ziza, fez um partidaço. Abriu verdadeiras avenidas na defesa sueca com seus dribles geniais e desconcertantes.
Esse jogo foi apitado pelo árbitro inglês Mister Arthur Ellis. No mesmo dia, no Pacaembu, o Uruguai livrou-se, por pouco, de uma derrota para a Espanha, empatando por 2 a 2. Os uruguaios terminaram o primeiro tempo perdendo por 2 a 1. Livraram-se da derrota, na segunda etapa, graças a um gol salvador de Obdúlio Varela.
Foi também num Maracanã lotado, com 152.772 pessoas, que o Brasil disputou seu segundo jogo no quadrangular final, e quatro dias após haver goleado a Suécia. O adversário era a perigosa Espanha. Perigosa? Que nada! Nossos craques humilharam os espanhóis, sapecando outra goleada histórica, desta vez por 6 a 1, com direito até a olé.
O Brasil fez 3 a 0 logo na primeira etapa, com um gol de Ademir (sempre ele!) e dois de Chico. E repetiu a dose na segunda etapa, com tentos de Jair, Zizinho e outro do centroavante do Vasco e artilheiro da Copa. O baile foi dos mais animados, com a torcida cantando, em coro, a marchinha carnavalesca de Alberto Reis e Braguinha, “Touradas de Madri”.
Creio que foi ali (mas não tenho certeza) que a Espanha recebeu o apelido que ostenta até hoje, de “A Fúria”. Certamente, era uma referência ao touro, o papel que representou naquela oportunidade, já que o de toureiro coube ao Brasil.
Quando o árbitro inglês, Mister Reginald Leafe soou o apito, terminando a partida, duvido que houvesse em todo o País alguém ainda cético, que duvidasse que a seleção brasileira já era a campeão da Copa de 1950 e que o jogo com o Uruguai não passaria de mera formalidade. Eu e minha turminha brava, com certeza, não tínhamos a menor dúvida disso!
Pedro J. Bondaczuk
Acompanhei o jogo decisivo da Copa do Mundo de 1950 pelo rádio, na casa do meu melhor amigo de então (cuja amizade já persiste por 60 anos, apesar da distância e da falta de contato), o José Fernandes, que todos chamávamos de Zé Gordo, embora fosse magrinho e não justificasse o apelido. Torno a lembrar que, na oportunidade, eu só tinha sete anos e meio (meu aniversário é no começo do ano, em janeiro, no dia 20).
Por pouco fiquei privado de ouvir a transmissão desse momento que então acreditava que seria o mais feliz da minha vida de torcedor, que recém começava a se apaixonar pelo futebol. E que paixão! Meus pais não queriam que eu “perturbasse” os vizinhos. Mas em casa, proibiram que eu convidasse os amigos, principalmente depois da algazarra que nós aprontamos antes, durante e depois dos dois jogos anteriores, contra a Suécia e a Espanha, respectivamente.
O que eles queriam? Que ouvíssemos as transmissões dessas exibições fantásticas do Brasil caladinhos, como as pessoas adultas acompanham uma ópera? E, afinal de contas, éramos todos crianças, entre os sete e os doze anos. Tínhamos saúde, energia e muito, muito entusiasmo mesmo.
Depois de tanta birra, manha e choro, reprimidos com ameaças de boas chineladas, finalmente fui autorizado a ir à casa do Zé, onde a família dele preparara uma festa de arromba, principalmente com muitos doces e refrigerantes para nós, meninos. Os adultos – e havia mais de vinte deles reunidos na sala em torno de um potente rádio da marca Philco – se viravam com vários tipos de salgadinhos e cerveja, muita cerveja.
Uma semana antes, como já disse, eu e minha turminha havíamos acompanhado a transmissão das goleadas contra a Suécia e a Espanha. O grande destaque do Brasil, nos 7 a 1 impingidos à boa equipe sueca, num Maracanã lotado, com 138.386 pagantes, foi Ademir de Menezes. Fez quatro gols nesse jogo, façanha que só seria superada 44 anos depois, na Copa de 1994, nos Estados Unidos, por um atacante russo (cujo nome não me recordo), que balançou as redes adversárias por cinco vezes numa só partida.
Foi uma atuação soberba dos comandados de Flávio Costa – que tinha, então, no banco, como auxiliar técnico, alguém que oito anos depois conquistaria, contra essa mesma Suécia, e na casa dela, o primeiro título mundial do Brasil: o paulista Vicente Feola.
Além do centroavante do Vasco, Chico marcou duas vezes e Maneca completou o placar. Embora não tenha feito nenhum gol, Zizinho, o Mestre Ziza, fez um partidaço. Abriu verdadeiras avenidas na defesa sueca com seus dribles geniais e desconcertantes.
Esse jogo foi apitado pelo árbitro inglês Mister Arthur Ellis. No mesmo dia, no Pacaembu, o Uruguai livrou-se, por pouco, de uma derrota para a Espanha, empatando por 2 a 2. Os uruguaios terminaram o primeiro tempo perdendo por 2 a 1. Livraram-se da derrota, na segunda etapa, graças a um gol salvador de Obdúlio Varela.
Foi também num Maracanã lotado, com 152.772 pessoas, que o Brasil disputou seu segundo jogo no quadrangular final, e quatro dias após haver goleado a Suécia. O adversário era a perigosa Espanha. Perigosa? Que nada! Nossos craques humilharam os espanhóis, sapecando outra goleada histórica, desta vez por 6 a 1, com direito até a olé.
O Brasil fez 3 a 0 logo na primeira etapa, com um gol de Ademir (sempre ele!) e dois de Chico. E repetiu a dose na segunda etapa, com tentos de Jair, Zizinho e outro do centroavante do Vasco e artilheiro da Copa. O baile foi dos mais animados, com a torcida cantando, em coro, a marchinha carnavalesca de Alberto Reis e Braguinha, “Touradas de Madri”.
Creio que foi ali (mas não tenho certeza) que a Espanha recebeu o apelido que ostenta até hoje, de “A Fúria”. Certamente, era uma referência ao touro, o papel que representou naquela oportunidade, já que o de toureiro coube ao Brasil.
Quando o árbitro inglês, Mister Reginald Leafe soou o apito, terminando a partida, duvido que houvesse em todo o País alguém ainda cético, que duvidasse que a seleção brasileira já era a campeão da Copa de 1950 e que o jogo com o Uruguai não passaria de mera formalidade. Eu e minha turminha brava, com certeza, não tínhamos a menor dúvida disso!
Monday, June 21, 2010
A mais fascinante (e importante) descoberta que um homem pode fazer ao longo da sua vida não se refere a algum princípio científico, ou processo tecnológico, ou localização de planetas ou galáxias desconhecidos. É a da sua própria pessoa. Não nos conhecemos, embora achemos que sim. Não sabemos qual é o nosso verdadeiro potencial e sequer temos noção da quantidade (e qualidade) do acervo de informações, sensações e emoções "estocado" em nosso subconsciente. A forma de realizarmos esta aventura, essa caça ao tesouro, essa busca da pedra filosofal da suprema sabedoria, é uma só: a meditação.
Lembranças de um fracasso - IV
Pedro J. Bondaczuk
Ao começar o quadrangular decisivo, a Copa do Mundo de 1950 estava próxima de atingir o clímax. A forma de disputa, por pontos corridos, ao menos teoricamente, privilegiava a regularidade, ao contrário do sistema mata-mata atual. Afinal, quem perdesse uma partida, dependendo dos resultados dos outros jogos, ainda teria chances de recuperação, o que já não ocorre no sistema de apuração do campeão utilizado hoje em dia.
O que viria na sequência seria tão despropositado e sem lógica, que se fosse uma história inventada, um texto de ficção, enredo de algum conto, novela, romance ou mesmo peça de teatro ou roteiro de cinema, faria com que seu autor caísse em ridículo. Ninguém lhe daria crédito, nem o mais ingênuo dos ingênuos. Sua história seria ridicularizada pela inverossimilhança. Pois é, mas a realidade... Essa vive nos pregando peças. A vida real, ah, a vida real, quantas vezes não é absurda, ridícula e rigorosamente nonsense?
Claro que os detalhes desse dramalhão fantástico, que faria mexicanos e argentinos morrerem de inveja, que tive a oportunidade (diria privilégio, a despeito de tudo) não só de testemunhar, mas de ser protagonista, de viver e sentir na pele, só é possível de descrever com a ajuda dos meus arquivos.
Vocês não iriam querer que um garotinho de sete anos e meio guardasse tantas minúcias na memória, e ainda mais por sessenta anos! Todavia, a leitura das anotações dá cor, cheiro e vida às lembranças, não tão agradáveis assim, é verdade. À medida que as leio vou recordando de detalhes, de rostos, de vozes, de sensações e emoções e até do sabor do copo de toddy preparado por minha mãe, que estavam escondidos, adormecidos, em algum compartimento secreto da mente.
Hoje ouço, frequentemente, críticas aos meus contemporâneos – mais novos, da minha idade e os bem mais velhos que eu – pelo clima de “já ganhou” que então predominava, do Oiapoque ao Chuí. Contudo, duvido que os leitores mais jovens, caso vivessem naquela época, agissem de maneira diferente da nossa. Estou convicto de que não agiriam. E não agiriam mesmo.
Tudo, absolutamente tudo contribuía para o otimismo superlativo, levado ao grau máximo de intensidade que, passados sessenta anos, parece maluco e despropositado, mas que então não parecia assim.
Vejam bem, o nosso derradeiro adversário, o Uruguai, estava em crise. Quase não compareceu ao Mundial. Dias antes do seu embarque, houve uma greve dos seus jogadores e foi mandado para cá, praticamente, o time do Peñarol. Os atletas dos outros clubes recusaram-se a servir a seleção do seu país. E o time auri-negro (sua camisa é amarela e negra) havia perdido, recentemente, três jogos consecutivos para o Vasco da Gama (base da nossa seleção) um dos quais por goleada. Era, pois, um grupo desunido e revoltado com sua confederação e desmotivado.
Enquanto o Uruguai estava em crise, o Brasil estava “voando baixo”. Vinha de duas goleadas histórica, de 7 a 1 na Suécia e 6 a 1 na Espanha, em que fizera 13 gols e levara apenas dois. Um mês antes do Mundial, os uruguaios disputaram conosco a Copa Rio Branco. Foram três jogos. É verdade que no primeiro, em 6 de maio de 1950, no Pacaembu, eles venceram, por 4 a 3. Todavia, a nossa seleção venceu as duas partidas seguintes, ambas no Estádio de São Januário, no Rio, por 3 a 2 e 1 a 0, respectivamente, e ficou com o título.
Ademais, todos os jogadores do nosso último e decisivo adversário da Copa, como Máspoli, Tejera, Obdúlio Varela, Júlio Perez, Ghiggia e vai por aí afora eram conhecidíssimos dos brasileiros. Haviam participado, no ano anterior, de vários jogos da chamada Taça Rio Brasil, disputados tanto em São Paulo, quanto no Rio, e nenhum deles se destacou.
Posso dizer, sem medo de errar, baseado em dados concretos, que essa seleção do Uruguai, se disputasse cem jogos contra o Brasil, certamente perderia noventa e nove. Pensava isso aos sete anos e meio de idade e penso a mesma coisa sessenta anos depois.
Outro detalhe esquecido pelos que escrevem sobre aquela Copa é que, por pouco, o jogo final do quadrangular decisivo não se transformou num amistoso de luxo, em mero cumprimento de tabela, em exibição para a entrega de faixas de campeões aos nossos jogadores. Explico.
Se o Uruguai, em seu penúltimo compromisso, não vencesse a Suécia, isto é, perdesse ou mesmo empatasse, o Brasil seria campeão com uma rodada de antecedência. E isso estava acontecendo até os 30 minutos do segundo tempo, quando o placar era de 2 a 1 para os suecos que, além de tudo, jogavam melhor.
Começamos a perder o Mundial de 1950, porém, sem jogar, nos quinze minutos finais desse confronto entre uruguaios e suecos. A Celeste Olímpíca conseguiu uma sensacional e inesperada virada, vencendo por 3 a 2, mesmo jogando mal.
Ainda assim, o Brasil iria para o último jogo precisando, “apenas” de um simples e reles empate. Bastava não levar nenhum gol para a Jules Rimet ficar por aqui. Pergunto-lhe, meu jovem e crítico leitor: Como conter a euforia nessas circunstâncias, com tantas vantagens a nosso favor? Você conteria? Duvido!!!!
Como, então, esperar de uma criança de sete anos e meio, que ainda nem tinha noção do mundo em que estava, que carecia do mínimo e mais primitivo senso crítico, que não se empolgasse e não considerasse a vitória como favas contadas, ainda mais quando o Brasil inteirinho, e principalmente a totalidade dos meios de comunicação (rádios, jornais e revistas) consideravam?
Estavam montados, pois, o cenário e o clima para um dramalhão de fazer inveja aos mais hábeis e criativos dramaturgos da Grécia Antiga, criadores da comédia, da tragédia e, enfim, do teatro como o conhecemos.
Pedro J. Bondaczuk
Ao começar o quadrangular decisivo, a Copa do Mundo de 1950 estava próxima de atingir o clímax. A forma de disputa, por pontos corridos, ao menos teoricamente, privilegiava a regularidade, ao contrário do sistema mata-mata atual. Afinal, quem perdesse uma partida, dependendo dos resultados dos outros jogos, ainda teria chances de recuperação, o que já não ocorre no sistema de apuração do campeão utilizado hoje em dia.
O que viria na sequência seria tão despropositado e sem lógica, que se fosse uma história inventada, um texto de ficção, enredo de algum conto, novela, romance ou mesmo peça de teatro ou roteiro de cinema, faria com que seu autor caísse em ridículo. Ninguém lhe daria crédito, nem o mais ingênuo dos ingênuos. Sua história seria ridicularizada pela inverossimilhança. Pois é, mas a realidade... Essa vive nos pregando peças. A vida real, ah, a vida real, quantas vezes não é absurda, ridícula e rigorosamente nonsense?
Claro que os detalhes desse dramalhão fantástico, que faria mexicanos e argentinos morrerem de inveja, que tive a oportunidade (diria privilégio, a despeito de tudo) não só de testemunhar, mas de ser protagonista, de viver e sentir na pele, só é possível de descrever com a ajuda dos meus arquivos.
Vocês não iriam querer que um garotinho de sete anos e meio guardasse tantas minúcias na memória, e ainda mais por sessenta anos! Todavia, a leitura das anotações dá cor, cheiro e vida às lembranças, não tão agradáveis assim, é verdade. À medida que as leio vou recordando de detalhes, de rostos, de vozes, de sensações e emoções e até do sabor do copo de toddy preparado por minha mãe, que estavam escondidos, adormecidos, em algum compartimento secreto da mente.
Hoje ouço, frequentemente, críticas aos meus contemporâneos – mais novos, da minha idade e os bem mais velhos que eu – pelo clima de “já ganhou” que então predominava, do Oiapoque ao Chuí. Contudo, duvido que os leitores mais jovens, caso vivessem naquela época, agissem de maneira diferente da nossa. Estou convicto de que não agiriam. E não agiriam mesmo.
Tudo, absolutamente tudo contribuía para o otimismo superlativo, levado ao grau máximo de intensidade que, passados sessenta anos, parece maluco e despropositado, mas que então não parecia assim.
Vejam bem, o nosso derradeiro adversário, o Uruguai, estava em crise. Quase não compareceu ao Mundial. Dias antes do seu embarque, houve uma greve dos seus jogadores e foi mandado para cá, praticamente, o time do Peñarol. Os atletas dos outros clubes recusaram-se a servir a seleção do seu país. E o time auri-negro (sua camisa é amarela e negra) havia perdido, recentemente, três jogos consecutivos para o Vasco da Gama (base da nossa seleção) um dos quais por goleada. Era, pois, um grupo desunido e revoltado com sua confederação e desmotivado.
Enquanto o Uruguai estava em crise, o Brasil estava “voando baixo”. Vinha de duas goleadas histórica, de 7 a 1 na Suécia e 6 a 1 na Espanha, em que fizera 13 gols e levara apenas dois. Um mês antes do Mundial, os uruguaios disputaram conosco a Copa Rio Branco. Foram três jogos. É verdade que no primeiro, em 6 de maio de 1950, no Pacaembu, eles venceram, por 4 a 3. Todavia, a nossa seleção venceu as duas partidas seguintes, ambas no Estádio de São Januário, no Rio, por 3 a 2 e 1 a 0, respectivamente, e ficou com o título.
Ademais, todos os jogadores do nosso último e decisivo adversário da Copa, como Máspoli, Tejera, Obdúlio Varela, Júlio Perez, Ghiggia e vai por aí afora eram conhecidíssimos dos brasileiros. Haviam participado, no ano anterior, de vários jogos da chamada Taça Rio Brasil, disputados tanto em São Paulo, quanto no Rio, e nenhum deles se destacou.
Posso dizer, sem medo de errar, baseado em dados concretos, que essa seleção do Uruguai, se disputasse cem jogos contra o Brasil, certamente perderia noventa e nove. Pensava isso aos sete anos e meio de idade e penso a mesma coisa sessenta anos depois.
Outro detalhe esquecido pelos que escrevem sobre aquela Copa é que, por pouco, o jogo final do quadrangular decisivo não se transformou num amistoso de luxo, em mero cumprimento de tabela, em exibição para a entrega de faixas de campeões aos nossos jogadores. Explico.
Se o Uruguai, em seu penúltimo compromisso, não vencesse a Suécia, isto é, perdesse ou mesmo empatasse, o Brasil seria campeão com uma rodada de antecedência. E isso estava acontecendo até os 30 minutos do segundo tempo, quando o placar era de 2 a 1 para os suecos que, além de tudo, jogavam melhor.
Começamos a perder o Mundial de 1950, porém, sem jogar, nos quinze minutos finais desse confronto entre uruguaios e suecos. A Celeste Olímpíca conseguiu uma sensacional e inesperada virada, vencendo por 3 a 2, mesmo jogando mal.
Ainda assim, o Brasil iria para o último jogo precisando, “apenas” de um simples e reles empate. Bastava não levar nenhum gol para a Jules Rimet ficar por aqui. Pergunto-lhe, meu jovem e crítico leitor: Como conter a euforia nessas circunstâncias, com tantas vantagens a nosso favor? Você conteria? Duvido!!!!
Como, então, esperar de uma criança de sete anos e meio, que ainda nem tinha noção do mundo em que estava, que carecia do mínimo e mais primitivo senso crítico, que não se empolgasse e não considerasse a vitória como favas contadas, ainda mais quando o Brasil inteirinho, e principalmente a totalidade dos meios de comunicação (rádios, jornais e revistas) consideravam?
Estavam montados, pois, o cenário e o clima para um dramalhão de fazer inveja aos mais hábeis e criativos dramaturgos da Grécia Antiga, criadores da comédia, da tragédia e, enfim, do teatro como o conhecemos.
Sunday, June 20, 2010
Se na conversação informal, naquela que utilizamos no dia-a-dia, no lar, no trabalho e em nossas relações sociais; a comum, trivial, corriqueira e na maioria das vezes eivada de incorreções vocabulares e gramaticais, e que quase nunca é policiada, temos enorme responsabilidade por tudo o que dizemos (embora sequer atinemos), dadas as conseqüências produzidas, muito mais importante se torna, é evidente, o que escrevemos, e como o fazemos. Nunca sabemos, por exemplo, em que mãos esses textos vão cair, qual o uso que deles será feito e, principalmente, por quem.
Apartheid, podre na base, desmorona
Pedro J. Bondaczuk
O presidente sul-africano, Frederik de Klerk, é um desses raros políticos que surgem, de quando em quando, para tirar suas respectivas sociedades nacionais do buraco. Embora tenha desenvolvido toda a sua carreira de homem público dentro das regras do apartheid, teve a lucidez suficiente para perceber que a tirania, por mais força que possua, não consegue prevalecer eternamente.
Por isso, desde quando se candidatou à presidência, em agosto de 1989, colocou, como principal objetivo, como uma questão de honra, o fim do vergonhoso regime de segregação racial em seu país. Pouca gente, na ocasião, deu importância às suas promessas. Afinal, todo político, seja de que parte do mundo for, costuma prometer céus e terras, principalmente quando em campanha.
De Klerk assumiu a presidência em setembro de 1989, portanto há 21 meses. Nesse relativamente curto espaço de tempo, fez mais pela democracia de seu país do que todos seus antecessores juntos. Libertou, por exemplo, Nelson Mandela, que estava preso há 27 anos --- depois de um arremedo vergonhoso de julgamento --- em 20 de fevereiro de 1990.
Dali por diante, a sucessão de atos tendentes a pôr fim ao racismo institucionalizado foi de tal sorte rápida, que surpreendeu o mais ferrenho dos militantes dos grupos anti-apartheid, tanto internos, quanto no Exterior.
Não é difícil de se prever, contudo, que suas ações não deverão ficar sem reação. Grupos de extrema direita mobilizam-se, pregando abertamente a guerra civil para manter um sistema apodrecido nas bases, moralmente condenável até pelo mais pervertido dos homens, um absoluto anacronismo num tempo em que a humanidade se prepara para ingressar no terceiro milênio da Era Cristã. Certamente, qualquer atitude violenta dos racistas não ficará sem a devida resposta.
O próprio Nelson Mandela, na histórica coletiva de imprensa que concedeu em 10 de fevereiro de 1990, horas depois de libertado, deixou isso bastante claro. O líder nacionalista afirmou, na ocasião: "Nossa marcha para a liberdade é irreversível. Eu lutei contra a dominação branca e lutei contra a dominação negra. Acalentei o ideal de uma sociedade livre e democrática, na qual todas as pessoas pudessem viver em harmonia e com oportunidades iguais. É um ideal pelo qual eu pretendo viver e que pretendo conquistar. Mas se preciso for, é um ideal pelo qual estou preparado para morrer".
É incrível que 46 anos após a derrota de Hitler, gente que pensa como ele ainda tenha espaço na vida pública. Ressalte-se que de Klerk, pelo que tem dito e feito, não aprecia e nem deprecia os negros. Trata-se de um homem pragmático e íntegro que percebeu o absurdo que é o sistema racista. Por isso, parece seguir o conselho do bispo anglicano sul-africano, ganhador do Prêmio Nobel da Paz de 1984, Desmond Tutu, que sentenciou: "Não se pode reformar o regime do apartheid. É preciso eliminá-lo".
(Artigo publicado na página 44, Especial de contracapa, do Correio Popular, em 20 de junho de 1991).
Pedro J. Bondaczuk
O presidente sul-africano, Frederik de Klerk, é um desses raros políticos que surgem, de quando em quando, para tirar suas respectivas sociedades nacionais do buraco. Embora tenha desenvolvido toda a sua carreira de homem público dentro das regras do apartheid, teve a lucidez suficiente para perceber que a tirania, por mais força que possua, não consegue prevalecer eternamente.
Por isso, desde quando se candidatou à presidência, em agosto de 1989, colocou, como principal objetivo, como uma questão de honra, o fim do vergonhoso regime de segregação racial em seu país. Pouca gente, na ocasião, deu importância às suas promessas. Afinal, todo político, seja de que parte do mundo for, costuma prometer céus e terras, principalmente quando em campanha.
De Klerk assumiu a presidência em setembro de 1989, portanto há 21 meses. Nesse relativamente curto espaço de tempo, fez mais pela democracia de seu país do que todos seus antecessores juntos. Libertou, por exemplo, Nelson Mandela, que estava preso há 27 anos --- depois de um arremedo vergonhoso de julgamento --- em 20 de fevereiro de 1990.
Dali por diante, a sucessão de atos tendentes a pôr fim ao racismo institucionalizado foi de tal sorte rápida, que surpreendeu o mais ferrenho dos militantes dos grupos anti-apartheid, tanto internos, quanto no Exterior.
Não é difícil de se prever, contudo, que suas ações não deverão ficar sem reação. Grupos de extrema direita mobilizam-se, pregando abertamente a guerra civil para manter um sistema apodrecido nas bases, moralmente condenável até pelo mais pervertido dos homens, um absoluto anacronismo num tempo em que a humanidade se prepara para ingressar no terceiro milênio da Era Cristã. Certamente, qualquer atitude violenta dos racistas não ficará sem a devida resposta.
O próprio Nelson Mandela, na histórica coletiva de imprensa que concedeu em 10 de fevereiro de 1990, horas depois de libertado, deixou isso bastante claro. O líder nacionalista afirmou, na ocasião: "Nossa marcha para a liberdade é irreversível. Eu lutei contra a dominação branca e lutei contra a dominação negra. Acalentei o ideal de uma sociedade livre e democrática, na qual todas as pessoas pudessem viver em harmonia e com oportunidades iguais. É um ideal pelo qual eu pretendo viver e que pretendo conquistar. Mas se preciso for, é um ideal pelo qual estou preparado para morrer".
É incrível que 46 anos após a derrota de Hitler, gente que pensa como ele ainda tenha espaço na vida pública. Ressalte-se que de Klerk, pelo que tem dito e feito, não aprecia e nem deprecia os negros. Trata-se de um homem pragmático e íntegro que percebeu o absurdo que é o sistema racista. Por isso, parece seguir o conselho do bispo anglicano sul-africano, ganhador do Prêmio Nobel da Paz de 1984, Desmond Tutu, que sentenciou: "Não se pode reformar o regime do apartheid. É preciso eliminá-lo".
(Artigo publicado na página 44, Especial de contracapa, do Correio Popular, em 20 de junho de 1991).
Saturday, June 19, 2010
Boa parte dos "best-sellers" de hoje vai constituir, fatalmente, a "legião dos esquecidos" de amanhã. Como em tudo na vida, o modismo também tem grande influência na literatura. Há livros até gostosos de se ler, mas que, ao cabo da leitura, se revelam vazios, ocos, frívolos, mero festival de "pirotecnia verbal". Há outros, em oposição, cujo estilo não é atrativo. Exigem do leitor, além de sólida cultura, enorme autodisciplina e capacidade de concentração para não desistir na metade. No entanto, são obras magistrais, atemporais, consagradas, marcos da literatura universal, ou pela criatividade, ou pela linguagem revolucionária, ou pela relevância do tema, quando não por todas estas características juntas. O escritor de talento e que sabe o que diz representa uma ponte entre gerações, garantindo a continuidade e perenidade da cultura. Deixa sua marca característica e indelével no tempo...
Soneto à doce amada - LXXV
Pedro J. Bondaczuk
Você trouxe tanto encanto e alegrias,
deu nova dimensão à minha vida,
trouxe-me esperanças de novos dias
de paz, de fé, de luz e amor, querida.
Você foi aquilo que eu sempre quis:
apaixonada onda de emoção,
doce momento, lembrança feliz,
mulher maravilha, magna visão.
Ainda hoje não sei, de verdade,
se você existe, ou se foi miragem,
se é real ou, simplesmente, imagem
do meu ideal de felicidade.
Amada, da sua mágica passagem
só restaram fragmentos de saudade
(Soneto composto em 31 de dezembro de 1963 em São Caetano do Sul).
Você trouxe tanto encanto e alegrias,
deu nova dimensão à minha vida,
trouxe-me esperanças de novos dias
de paz, de fé, de luz e amor, querida.
Você foi aquilo que eu sempre quis:
apaixonada onda de emoção,
doce momento, lembrança feliz,
mulher maravilha, magna visão.
Ainda hoje não sei, de verdade,
se você existe, ou se foi miragem,
se é real ou, simplesmente, imagem
do meu ideal de felicidade.
Amada, da sua mágica passagem
só restaram fragmentos de saudade
(Soneto composto em 31 de dezembro de 1963 em São Caetano do Sul).
Friday, June 18, 2010
Mesmo os bons escritores, às vezes, se precipitam e publicam livros que repudiam anos mais tarde, quando adquirem maior experiência e consolidam um estilo. Na escolha de um texto, para leitura e reflexão, raramente nos detemos no conteúdo. E nem podemos. Apegamo-nos, muito mais, ao estilo do autor (em geral com um nome já firmado) mesmo que o teor seja um lixo. Até porque, a menos que conheçamos outras obras do mesmo autor, nunca sabemos (é claro, antes de ler), o que determinado livro contém. Evidente que o sucesso ou fracasso de um escritor independe apenas do seu talento e da qualidade e substância do seu texto. O "marketing", por exemplo, conta muito, assim como a exposição na mídia e uma crítica favorável, fatores, aliás, que nos induzem freqüentemente ao erro e nos levam a comprar "gato por lebre". Ou seja, a adquirir obras sofríveis como sendo autênticos "pilares da cultura".
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