Sonho de liberdade vira pesadelo
Pedro J. Bondaczuk
A Libéria, pequeno país da África Ocidental, vive um terrível drama, ao cabo de quase oito meses de uma sangrenta guerra civil, que está perto da sua culminância com o ataque rebelde à sua capital, Monróvia, cidade de cerca de 500 mil habitantes, e que vive momentos de caos e de incerteza, como ademais a nação inteira.
Todos os ministros do presidente Samuel Doe, que assumiu o poder em 12 de abril de 1980, mediante um golpe de Estado, já abandonaram o território liberiano. O mesmo aconteceu com o comandante do Exército, deixando soldados enlouquecidos e muito bem armados sem nenhum comando ou qualquer disciplina.
O povo está passando fome, tendo que comer raízes e folhas de árvores para não morrer. Ainda assim, bebês e pessoas idosas não estão conseguindo escapar da morte por inanição. Triste situação para um país que nasceu sob o signo da liberdade (daí dever o seu próprio nome). Que foi criado por pacifistas tão apaixonados, que compraram o território onde se situa a República, em 1822, para que os escravos libertos dos Estados Unidos pudessem ter uma pátria onde vivessem em paz e harmonia com os vizinhos sem se indispor contra ninguém.
A Libéria obteve a independência em 27 de julho de 1824, e seu primeiro presidente foi um mestiço, nascido no Estado norte-americano da Virgínia, que batizou a capital com o nome de James Monroe: Monróvia.
Quando em abril de 1980 o então sargento Samuel Kanyon Doe, logo após o golpe de Estado que comandou, mandou executar o presidente deposto, William Tolbert, nós comentamos que chegaria também o seu dia de ter de sair pela porta dos fundos do palácio presidencial.
Ele não teve o mínimo senso de humanidade para com o adversário vencido. Não o prendeu, nem o julgou, sequer com a pantomima de julgamento que os ditadores como ele costumam encenar. Simplesmente colocou o veterano político, que estava no governo há nove anos (conduzido pela vontade do povo nas urnas) à frente de um pelotão de fuzilamento, com os olhos vendados, num arrabalde de Monróvia e deu cabo de sua vida, num frio e rancoroso assassinato.
Agora, Doe está tendo o dissabor de ver os parasitas que por tanto tempo viveram à sua sombra, privando da sua confiança, “abandonando o navio”, prestes a naufragar. Caso não fuja da Libéria, certamente seu ex-aliado, e hoje principal inimigo, Charles Taylor, comandante dos rebeldes, lhe dará o mesmo destino que ele deu a Tolbert. Tudo leva a crer, portanto, que a “pátria da liberdade” plantada na África por sonhadores norte-americanos, ex-escravos, vai continuar sendo ainda por algum tempo (só Deus sabe quanto) o autêntico “umbral do inferno”.
(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 6 de julho de 1990).
Pedro J. Bondaczuk
A Libéria, pequeno país da África Ocidental, vive um terrível drama, ao cabo de quase oito meses de uma sangrenta guerra civil, que está perto da sua culminância com o ataque rebelde à sua capital, Monróvia, cidade de cerca de 500 mil habitantes, e que vive momentos de caos e de incerteza, como ademais a nação inteira.
Todos os ministros do presidente Samuel Doe, que assumiu o poder em 12 de abril de 1980, mediante um golpe de Estado, já abandonaram o território liberiano. O mesmo aconteceu com o comandante do Exército, deixando soldados enlouquecidos e muito bem armados sem nenhum comando ou qualquer disciplina.
O povo está passando fome, tendo que comer raízes e folhas de árvores para não morrer. Ainda assim, bebês e pessoas idosas não estão conseguindo escapar da morte por inanição. Triste situação para um país que nasceu sob o signo da liberdade (daí dever o seu próprio nome). Que foi criado por pacifistas tão apaixonados, que compraram o território onde se situa a República, em 1822, para que os escravos libertos dos Estados Unidos pudessem ter uma pátria onde vivessem em paz e harmonia com os vizinhos sem se indispor contra ninguém.
A Libéria obteve a independência em 27 de julho de 1824, e seu primeiro presidente foi um mestiço, nascido no Estado norte-americano da Virgínia, que batizou a capital com o nome de James Monroe: Monróvia.
Quando em abril de 1980 o então sargento Samuel Kanyon Doe, logo após o golpe de Estado que comandou, mandou executar o presidente deposto, William Tolbert, nós comentamos que chegaria também o seu dia de ter de sair pela porta dos fundos do palácio presidencial.
Ele não teve o mínimo senso de humanidade para com o adversário vencido. Não o prendeu, nem o julgou, sequer com a pantomima de julgamento que os ditadores como ele costumam encenar. Simplesmente colocou o veterano político, que estava no governo há nove anos (conduzido pela vontade do povo nas urnas) à frente de um pelotão de fuzilamento, com os olhos vendados, num arrabalde de Monróvia e deu cabo de sua vida, num frio e rancoroso assassinato.
Agora, Doe está tendo o dissabor de ver os parasitas que por tanto tempo viveram à sua sombra, privando da sua confiança, “abandonando o navio”, prestes a naufragar. Caso não fuja da Libéria, certamente seu ex-aliado, e hoje principal inimigo, Charles Taylor, comandante dos rebeldes, lhe dará o mesmo destino que ele deu a Tolbert. Tudo leva a crer, portanto, que a “pátria da liberdade” plantada na África por sonhadores norte-americanos, ex-escravos, vai continuar sendo ainda por algum tempo (só Deus sabe quanto) o autêntico “umbral do inferno”.
(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 6 de julho de 1990).
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