Monday, August 04, 2008

Necessidade conselheira


Pedro J. Bondaczuk

A inveja é um dos sentimentos (ou comportamentos) mais comuns no mundo e apresenta vários tipos e graduações. Há aquela extrema, doentia, praticamente uma obsessão, que leva as pessoas a cometerem desatinos e loucuras para se igualarem, ou superarem (pois essa é a sua meta), aquele que é invejado.
Não raro, esses grandes invejosos, quando não têm talento e capacidade para chegarem ao mesmo patamar de riqueza, beleza (ou seja o que for) da vítima, buscam derrubá-la, de todas as formas, para que não se sintam tão inferiores. Há uma forma de inveja, no entanto, que chega a ser sadia e que gostaria que os outros tivessem por mim. Recebe o nome de “admiração”.
Invejo, por exemplo, vários escritores, cujos passos procuro imitar e raramente consigo. Jamais tentaria destruí-los e não permitiria nunca que alguém tentasse ou fizesse isso. Claro que apenas os bem-sucedidos são invejados. Ninguém, óbvio, inveja um fracassado...
Por mais confiança que tenhamos em nosso preparo, talento e capacidade (tanto física quanto mental), há ocasiões em que nos mostramos indecisos diante de determinadas tarefas, desafios ou obstáculos, sem sabermos como proceder. Isso é normal. Não há quem não tenha encarado, alguma vez, situação em que não sabia como proceder e teve que se guiar, apenas, pela intuição.
Anormal, porém, é fazer da indecisão uma prática comum, uma atitude corriqueira, um hábito. É não saber (ou não querer) decidir as coisas mais comezinhas e elementares da vida, como, por exemplo, que roupa vestir, o que dizer quando indagado por alguém a qualquer propósito e outras coisas do mesmo tipo.
Embora pareça exagero, há pessoas (e não poucas) que agem assim com freqüência, quando não o tempo inteiro. Há, contudo, um remédio infalível (posto que amargo) para a indecisão. Chama-se “necessidade”. Quando realmente precisamos de algo, nosso cérebro improvisa ações e nos impele a agir.
Se o mais adequado para o momento for pedir ajuda, por mais orgulhosos que sejamos, “calçamos as sandálias da humildade” e pedimos. Se a situação exigir esforço físico, desdobramo-nos ao nosso limite e fazemos o que tem que ser feito. Nessas circunstâncias, a indecisão vai para o espaço, por mais indecisos que sejamos habitualmente. Não há, portanto, conselheira melhor do que a necessidade.
Algumas pessoas, em momentos de extrema aflição pelos quais todos passamos algum dia, julgam terem perdido tudo o que tinham, quer no plano material, quer no espiritual, inclusive a esperança. Estão enganadas, claro! Desconhecem o momento seguinte, o próximo segundo, em que, à sua revelia, tudo pode mudar para melhor. A vida é assim, constituída de imprevistos.
Ademais, é essa imprevisibilidade que lhe dá encanto, pelo sabor de aventura. A esperança, mesmo que não acreditemos, nunca nos deixa. Às vezes esconde-se, como uma garotinha travessa, à espera de ser encontrada. Mas está sempre ali, presente, nos cutucando as costas e nos forçando a agir. É fidelíssima e não nos abandona em nenhuma circunstância. E acabamos agindo, se estivermos em estado de necessidade.
É verdade que nem sempre aquilo que necessitamos é de caráter material. Não raro, são a paz e a felicidade o que mais ansiamos por obter. São duas condições intangíveis, abstratas e um tanto vagas. Mas são necessidades concretas que cada um tem que conquistar sozinho. Ninguém pode nos conceder nenhuma das duas.
Há pessoas, é verdade, que contribuem (e decisivamente) para a sua conquista e manutenção. Mas trata-se de tarefa individual, de cada um de nós, mediante nossas atitudes e, principalmente, nossa predisposição espiritual. A paz e a felicidade são tão solitárias quanto o nascimento e a morte.
O filósofo português, Agostinho da Silva, escreve o seguinte, a esse propósito, em seu livro “Textos e ensaios filosóficos”, cuja leitura recomendo: “Nem paz nem felicidade se recebem dos outros nem aos outros se dão. Está-se aqui tão sozinho como ao nascer e no morrer, como de um modo geral no viver, em que a única companhia possível é a daquele Deus a um tempo imanente e transcendente”.
E Ele está sempre presente na vida, inclusive dos descrentes, acalmando seus corações nos momentos mais agudos de dor e desespero e os predispondo à alegria e felicidade, mesmo à sua revelia. Mas estas somente serão obtidas, de fato, se sentirmos incontida necessidade delas.

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