Thursday, January 24, 2008

Supergênio renascentista


Pedro J. Bondaczuk

(CONTINUAÇÃO)


I – Atleta, filósofo, sobretudo, artista

Leoni Batista Alberti nasceu em 1404, na cidade de Gênova. Sua trajetória de vida comprova a exatidão daquilo que Albert Camus afirmou, no livro “Notebooks 1942-1951”: “A grandeza consiste em tentar ser grande. Não há outro meio”. E o genovês tentou, não somente em um campo específico, mas em todos os empreendimentos que uma pessoa curiosa e empreendedora possa tentar. Resultado? Foi, sem favor algum, o maior sábio do seu tempo.
Direcionou sua insaciável curiosidade a todos os campos do conhecimento de então. Incursionou e aprofundou-se em todas as artes conhecidas e se destacou em cada uma delas. Em geral, o intelectual, dado o tempo que despende na aquisição de cultura, se descuida do físico. Raramente um gênio artístico, ou científico, ou filosófico é, também, atleta sequer razoável, quanto mais excepcional. Em geral, abarrota os neurônios de sabedoria, mas não dá vazão à energia que tem, determinada pelos hormônios.
Leoni, todavia, foi fora do comum nesse aspecto. Cultivou, com o mesmo empenho e a mesma competência, o físico e o intelecto. Suas habilidades atléticas igualaram-se (e em determinadas fases da juventude até superaram) os dotes de seu privilegiado intelecto. Tentou ser apenas grande e acabou sendo magnífico (diríamos, assombroso).
Ninguém conseguia, por exemplo, vencê-lo em uma corrida, fosse qual fosse a distância. Tinha resistência fenomenal, podendo exercitar-se por horas, sem demonstrar qualquer sinal de fadiga. Com os pés juntos, conseguia realizar um feito que os atletas de hoje, detentores de recordes olímpicos, não conseguem, ou seja, o de saltar sobre os ombros de uma pessoa, sem nenhum ponto de apoio e sem tocar no obstáculo.
Na catedral de Gênova, lançava uma moeda para o alto e a ouvia retinir nas mais elevadas abóbadas. Seus cinco sentidos eram extraordinariamente aguçados e desenvolvidos. Além de tudo, cavalgava como ninguém. Seus contemporâneos deixaram registrado que os cavalos mais vigorosos e rebeldes estremeciam, e ficavam aterrorizados, quando cavalgados por Alberti, tamanhas eram a sua energia e a sua perícia como ginete.
Sua facilidade para aprender, o que quer que fosse, era assombrosa. Tinha memória fantástica, fotográfica. Foi músico, matemático, poeta, novelista, orador, pintor, arquiteto, escultor, filósofo, físico e historiador, entre outras tantas coisas.
Alberti aprendeu música, sem nunca ter tido professor. E tocava vários instrumentos, não somente de ouvido, mas mostrando a mais refinada técnica musical. Tanto que compôs diversas peças, admiradas pelos mais renomados músicos de então.
Em um esforço fora do comum, aprendeu praticamente todos os ofícios conhecidos em seu tempo, desde o de sapateiro ao de médico. Todavia, com todos esses talentos e aptidões, faltava-lhe um, indispensável neste mundo repleto de distorções: o de ganhar dinheiro. Era pobre, muito pobre. Premido por essa pobreza, dedicou-se ao estudo dos dois ramos de Direito então ensinados: o Civil e o Canônico. Afinal, advogar, nessa época, era considerado um grande negócio.
Alberti dedicou-se de tal forma a esse empreendimento, que acabou se debilitando e sofreu severo esgotamento físico e mental. Quando tinha 24 anos de idade, foi advertido pelos médicos que seus membros, outrora tão rijos e que lhe haviam possibilitado realizar tantas e tamanhas façanhas, estavam se enfraquecendo.
Todavia, os seus sentidos e, principalmente, o seu raro senso de objetividade, permaneceram intactos. Para testá-los, Alberti dedicou-se à Física e à Matemática, com pleno sucesso. Em pouquíssimo tempo, aprendeu todas as teorias e técnicas conhecidas e imagináveis dessas disciplinas. Tornou-se uma espécie de consultor artístico, contando com inúmeros discípulos. Interrogava os sábios da época e discutia com eles. E tentava, tentava e tentava aprender mais, sempre mais, sobre todos e sobre tudo.
O poeta norueguês Piet Hein escreveu, no poema “O caminho da sabedoria”: “A via da sabedoria,/a verdadeira via,/é fácil de indicar:/errar, errar, errar,/fazer erros grandes e pequenos,/mas sempre menos/sempre menos”. Alberti, certamente, era assim. Quando se propunha a aprender o que quer que fosse, tentava, tentava e tentava. E, claro, errava, errava e errava...mas sempre menos...sempre menos. Quem nunca erra é aquele que nada faz, nada tenta, nada procura.
Depois dos 40 anos, o nosso personagem voltou o eixo do seu interesse, definitivamente, para as artes. Foi graças à sua produção artística que sobreviveu ao tempo e ao esquecimento. Do Alberti atleta, por exemplo, há raríssimas e esparsas referências, em velhos e esquecidos alfarrábios, encontrados, apenas, em um ou outro sebo da Itália. Do cientista, não restou o mínimo registro, embora tenha dedicado tanto tempo ao estudo e à pesquisa. Mas do artista, sobreviveram magníficos trabalhos de arquitetura, que podem ser admirados e apreciados até hoje.

(CONTINUA)

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