Sunday, January 20, 2008

DIRETO DO ARQUIVO


Nazismo ressurge das cinzas


Pedro J. Bondaczuk


A Alemanha festeja, hoje, o primeiro aniversário da reunificação do país com algumas importantes vitórias no esforço de integração do Leste empobrecido de seu território, mas com um perigoso espectro que se está desenhando em seu horizonte político.
No primeiro caso, a despeito do desemprego gerado pelo saneamento financeiro no setor Oriental e dos naturais descontentamentos sociais gerados pelas duras medidas que o chanceler Helmut Kohl foi obrigado a adotar, as dificuldades estão muito longe de ser a catástrofe prevista por alguns analistas apressados no ano passado.
No segundo, observa-se um dramático renascimento do nazismo, especialmente na antiga Alemanha Oriental, num perigoso contraponto ao comunismo que imperou ali por quase 45 anos.
Caso esse nacionalismo exacerbado se caracterizasse apenas por uma ou outra atitude preconceituosa, que não implicasse em violência física, embora condenável, seria até tolerável, pois ninguém é obrigado a gostar de ninguém. Ocorre que o radicalismo hoje é mais do que um sentimento, extrapolando para o terreno da ação.
Grupos direitistas, nos últimos dias, vêm empreendendo sucessivos ataques, com covardes cenas de agressão, a vários centros que albergam estrangeiros. Claro que se trata de um ato criminoso e sobretudo irracional. Tal violência é movida pelo pior sentimento que um ser humano pode abrigar, que é a discriminação de seus semelhantes por motivo de raça, cor, religião, ideologia ou seja lá o que for.
Embora os ataques estejam se estendendo também à Alemanha Ocidental – ontem ocorreu um em Bad Honnef, nos arredores de Bonn – a maioria deles é comandada por alemães orientais que ainda durante o período comunista no Leste do país fugiram para o Ocidente.
É verdade que sua vida, nos primeiros tempos de exílio, também não foi fácil. Tais cidadãos sofreram discriminação – ostensiva ou velada, não importa – de seus irmãos ocidentais. Até hoje ainda existe um ligeiro ranço de preconceito em relação aos que habitavam a antiga Alemanha Oriental.
Isto, no entanto, é inevitável nesse período de ajuste entre as duas comunidades. Foi assim quando da união original dos secularmente dispersos Estados germânicos no século passado. Em pouco tempo, todavia, a homogeneidade será recuperada, como foi no passado, e esses probleminhas serão superados.
Todavia, a exacerbada xenofobia, o rancor patológico aos estrangeiros, em especial asiáticos, africanos e imigrantes do Leste europeu, é um comportamento mais grave, que compete a toda a sociedade conter e eliminar. Aliás, a Alemanha não é o único país em que esse fenômeno se verifica.
Em todo o antigo bloco soviético a tendência na direção da ultradireita é bastante perceptível. Até mesmo, ou principalmente, na URSS, onde as diversas etnias que compõem essa heterogênea e tensa federação usam o frustrado golpe de 19 de agosto passado como pretexto para que ódios seculares venham de novo à tona.
O jornalista da agência Reuter, Tom Heneghan, num comentário sobre esse primeiro ano de reunificação alemã, citou o ex-prefeito de Hamburgo, Kalus von Dohnanyi, que em recente entrevista afirmou: "Uma série de acontecimentos nos últimos seis meses mostrou que a Alemanha unificada não consegue fugir do fantasma do nazismo".
É indispensável que esse fenômeno seja trazido à baila pela opinião pública, e não escondido "debaixo do tapete", discutido, avaliado e que se ressaltem, principalmente, as desastrosas conseqüências que esse sistema absurdo trouxe à nação germânica, na primeira metade do século.
O chanceler Helmut Kohl já vem empreendendo essa tarefa. É preciso, no entanto, que todo o país se mobilize nesse sentido e que os delinqüentes que vêm tumultuando a vida das pessoas sejam enquadrados e punidos conforme preceituam as leis. Só assim a Alemanha será um país "normal" em termos de política externa, acatado e respeitado pela comunidade internacional.

(Artigo publicado na página 18, Internacional, do Correio Popular, em 3 de outubro de 1991).

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