Sunday, November 11, 2007

Guerra dos sexos - Parte III


Pedro J. Bondaczuk

(CONTINUAÇÃO)


III

Estupros em guerras


Se as mulheres são vítimas de tantos estupros, em tempos de paz, conforme revelam as estatísticas, as coisas se tornam muito piores, nesse aspecto, em períodos de guerra. Soldados de todos os países, ao conquistarem, ou invadirem, território inimigo, consideram como uma espécie de "prêmio", de "troféu", de "medalha" a que se julgam merecedores, essas relações sexuais forçadas, sem se importar com a idade, a posição social ou a condição civil das vítimas. Não são raros, até, os casos de invasão de conventos, com o conseqüente estupro de todas freiras lá confinadas.

Episódios desse tipo, ressalte-se, foram registrados, recentemente, na ex-Iugoslávia, conforme denúncia de organizações de defesa dos direitos humanos. Esses ataques sexuais, descabidos e covardes, embora condenados pelas leis internacionais, continuam ocorrendo, invariavelmente, em grande profusão, da mesma forma que ocorriam em passado remoto, com as legiões gregas, romanas, persas, babilônias, etc. Repetiram-se em profusão na Bósnia-Herzegovina, em Kosovo, na Chechênia e talvez estejam ocorrendo, de novo, no Afeganistão. Nem sempre, no entanto, a opinião pública toma conhecimento desses crimes.

Na Segunda Guerra Mundial, por exemplo, cerca de 200 mil mulheres, a maioria coreanas, chinesas e de outros países do Sudeste asiático (então ocupados pelos japoneses), foram incorporadas à força pelo exército imperial do Japão e depois obrigadas a se prostituir em bordéis militares.

Hoje, as sobreviventes estão recorrendo à justiça comum, e invariavelmente ganhando os processos, obtendo milionárias indenizações. É certo que o dinheiro não apaga as humilhações a que foram submetidas, nem a terrível afronta que sofreram.

Além disso, os condenados não são os verdadeiros culpados, os estupradores de fato, quase nunca identificados e a maioria, pelo menos neste caso, já morta. As indenizações vêm sendo pagas pelo governo japonês. Ainda assim, essas punições são válidas e têm o principal mérito de chamarem a atenção para os crimes de estupro cometidos por soldados.

Apesar da aprovação da Convenção de Genebra, de 1949 --- a lei internacional básica, que pretendia proteger os civis em tempos de guerra, mais especificamente contra o estupro --- esse conjunto de normas continua, após tanto tempo, não passando de mera "letra morta".

Nenhuma acusação, por exemplo, envolvendo esse tipo de delito, foi feita durante o julgamento de crimes de guerra, perante o Tribunal de Nuremberg, na Alemanha, ou no Tribunal de Tóquio, depois da Segunda Guerra Mundial.

Milhões de mulheres (e de crianças) pelo mundo afora, tanto na Europa, quanto na Ásia; tanto dos países vencedores, quanto dos perdedores, foram vítimas impotentes dessa covarde violência sexual. E milhões de filhos ilegítimos e não desejados nasceram, dessas relações traumatizantes e não consentidas, sem que os governos dos países a que pertenciam os soldados infratores contribuíssem com um único centavo para o seu sustento.

Agora abre-se, no entanto, uma perspectiva favorável --- graças ao eficiente trabalho de diversas organizações internacionais de defesa dos direitos humanos, notadamente da Anistia Internacional --- para que esse grave delito seja, doravante, exemplarmente punido. E para que seja considerado aquilo que realmente é: crime hediondo. E principalmente para que deixe de se constituir em prática comum, considerada, tacitamente, como procedimento normal, ou pelo menos aceitável, em tempos de guerra.

Parte considerável das acusações de crimes de guerra, cometidos na ex-Iugoslávia, em especial na Bósnia-Herzegovina, perante o Tribunal Especial de Crimes de Guerra em Haia, refere-se exatamente a estupros praticados por soldados sérvios.

Quem sabe agora seja, finalmente, feita justiça para com milhares e milhares de mulheres, nos Bálcãs, no Cáucaso, na Ásia ou seja lá onde for, gravemente injuriadas por bandidos, travestidos de militares. E que as sentenças que forem dadas em Haia possam, sobretudo, firmar jurisprudência para o futuro. É o mínimo que se pode esperar, a bem da civilização.

(CONTINUA)

(Textos do meu livro, inédito, "Guerra dos Sexos").

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