Thursday, March 06, 2008

Apaixonadas e guerreiras


Pedro J. Bondaczuk


A mulher é um ser bastante especial, fonte de vida, de beleza e de amor. É ela que dá sentido e encanto à existência. É ela que tem o maravilhoso dom da maternidade. Clarice Lispector diz tudo isso de uma forma mais talentosa e inteligente do que sei expressar: “No princípio, o mundo não existia. As trevas tudo cobriam. Quando não havia nada, uma mulher brotou de si mesma”. E eu acrescentaria: “E dela surgiu a vida!”.
Este preâmbulo vem a propósito do Dia Internacional da Mulher, comemorado em 8 de março de cada ano. A data foi instituída, recorde-se, em 1910, na Conferência Internacional das Mulheres Socialistas, realizada naquele ano em Copenhague, na Dinamarca. Destinava-se, originalmente, a homenagear as 139 operárias mortas em um incêndio criminoso numa tecelagem de Nova York, represália dos patrões ao protesto realizado pelas trabalhadoras daquela fábrica para reivindicar condições minimamente decentes de trabalho. A tragédia em questão ocorreu em 8 de março de 1857, há, portanto, 151 anos.
Hoje a data serve como uma espécie de termômetro, para medir o alcance e a intensidade das conquistas femininas e avaliar, proceder a periódicos balanços do que ainda tem que ser feito para que se chegue, finalmente, à tão sonhada (e justa) igualdade de direitos e deveres entre os gêneros.
De 1910 para cá, não há como negar, muita coisa mudou. Se para melhor ou para pior, ainda é cedo para se avaliar. Muito abuso ainda ocorre, ao redor do mundo, (notadamente em algumas sociedades), em relação a essa que deveria ser considerada nossa eterna parceira, jamais antagonista. Mas em alguns aspectos, houve sensível evolução. Em outros... nem tanto.
A “revolução feminista” acentuou-se, à revelia, até, das próprias mulheres, a partir da metade da Segunda Guerra Mundial, por volta de 1943. Naquela oportunidade, as norte-americanas tiveram que ser convocadas para substituir seus maridos (que lutavam nos campos de batalha da Europa contra a ameaça nazista) nas fábricas, principalmente nas indústrias de material bélico. E elas se mostraram à altura da situação. Foram aplicadas, produtivas e responsáveis, sem que ficassem, inclusive, nada a dever à tradicional mão-de-obra masculina.
Findo o conflito, as mulheres não se conformaram em voltar à condição anterior, ou seja, de meras “domésticas de luxo” ou de simples “parideiras” o que, no seu entender, se constituía em retrocesso. Ampliaram, por conseguinte, sua luta pela igualdade de direitos e, pouco a pouco, dando um passo por vez, ora com maior velocidade, ora mais lentamente, foram conquistando, e ampliando, seu espaço na sociedade. Adquiriram, inicialmente, direitos políticos: o de votar e serem votadas. Passaram a freqüentar escolas, academias e universidades e, atualmente, já são maioria nos bancos escolares (pelo menos no Ocidente), preparando novas gerações de guerreiras.
Mas o passo maior foi dado com o advento da pílula anticoncepcional. Com esse recurso à mão, ficaram livres, subitamente, da “ditadura da maternidade”. Não que abrissem mão desse sublime e fundamental papel que a natureza lhes destinou. Pelo contrário, ele foi valorizado. Isso porque as mulheres passaram a ter condições de decidir quando e quantos filhos desejavam ter. Ou seja, a maternidade tornou-se decisão voluntária e não imposição masculina ou mero “acidente” da natureza. Este foi, sem dúvida, um dos passos mais importantes que as mulheres deram rumo à independência em relação aos homens.
O filósofo norte-americano Will Durant escreveu, a esse propósito, em seu clássico “Filosofia da Vida”: “Livres dos cuidados da prole e, portanto, da última tarefa que podia fazer do lar um ninho, as mulheres sofregamente invadiram os escritórios, as fábricas, o mundo. Orgulhosamente se sentaram par a par do homem na vida dos negócios, realizando os mesmos trabalhos, pensando os mesmos pensamentos, pronunciando as mesmas palavras”.
É certo que, de início, houve certo exagero. Partiu-se de uma distorção (a completa sujeição) a outra (a masculinização feminina), trazendo às mulheres muito mais ônus do que vantagens. Em vez de assumirem um novo papel, passaram, na verdade, a acumular dois. Conservaram (salvo exceções) as tarefas domésticas que já tinham anteriormente e assumiram, de quebra, as que não tinham até então, ou seja, as do trabalho fora de casa, posto que voluntariamente. E isso, com remuneração sempre inferior à do homem da mesma função e com idêntica produtividade (o que, a rigor, na maioria dos casos, persiste ainda hoje).
Durant observou a respeito: “A emancipação iniciou-se via imitação. Um a um foram assimilando os hábitos, bons ou maus, do macho tradicional e já fora da moda; imitaram-nos na fumaça, nas profanações, no agnosticismo, no corte dos cabelos, no vestuário; as calças deixaram de ser distintivo masculino. O convívio diário efeminou os homens e masculinizou as mulheres; ocupações iguais, ambientes os mesmos, estímulos idênticos: isso acabou afeiçoando os dois sexos num tipo só”.
As mulheres estão pagando um duro preço por isso. Doenças que antes eram raras entre elas, por exemplo, ditadas pelo estresse e pelos maus-hábitos – como as circulatórias e coronarianas, o câncer de pulmão, a cirrose hepática, e tantas outras – lhes são cada vez mais comuns. Os relacionamentos amorosos são cada vez mais frágeis e menos duradouros e a família, como a conhecemos há milênios, está em perigo.
Como se vê, há muito que se conquistar e muito problema ainda a se resolver. Mulheres, por exemplo, continuam sendo vítimas de agressões físicas e/ou morais em suas casas, quando não de assassinatos, por parte de seus parceiros, a despeito de esforços crescentes de legisladores e governos para pôr fim a esses intoleráveis abusos. Todavia, essas guerreiras, que lutam com bravura pelos seus direitos, sem perder a suavidade e a ternura, que tantas conquistas já tiveram, em tão pouco tempo, saberão conquistar tudo o que lhes é de direito.
Parabéns a você, querida leitora, pelo seu dia.

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