Sunday, February 24, 2008

DIRETO DO ARQUIVO


Desenvolvimento deve ter prioridade


Pedro J. Bondaczuk


A República africana de Angola está próxima, bem às portas, de um fato absolutamente inédito em sua história de país independente: ter um período de paz. Essa possibilidade foi aberta ontem, em Gbadolite, no Zaire (a terra natal do presidente zairense, Mobuto Sese Seko), com o anúncio de um cessar-fogo nos combates entre o exército angolano, respaldado por cerca de 20 mil cubanos, e a Unita, guerrilha comandada por Jonas Savimbi e apoiada pelos Estados Unidos.

Pode ser muito pouco ainda, é verdade. Mas não deixa de ser o primeiro passo positivo. Afinal, a população desse país africano, de língua portuguesa, de 9,5 milhões de habitantes, desde 1956 (portanto há 33 anos) não sabe o que é viver pacificamente.

Primeiro foram constituídos três grupos de guerrilheiros para a luta pela independência. Quando esta chegou, no entanto, as facções não conseguiram unir esforços para a construção de uma pátria rica e forte. E sobretudo, livre. Passaram a lutar entre si, de forma dura e encarniçada.

Hoje, a situação de impasse chegou a tal ponto que, militarmente, nenhum dos dois lados têm condições de dar o golpe fatal e decisivo que lhe assegure a vitória. Por essa razão, vários líderes africanos prepararam um plano de paz, apresentado agora numa reunião de cúpula levada a efeito no Zaire.

Caso ele seja bem sucedido, e o primeiro passo foi dado ontem, com o cessar-fogo, vai ser uma grande, imensa e importantíssima vitória da democracia continental. Representará, sobretudo, a maturidade política da África, quando a maioria de suas nações parte para a terceira década de independência e a segunda geração de líderes começa a surgir. E pelo visto, esta tende a ser mais pragmática, menos presa a ideologias e a revanchismos em relação aos antigos colonizadores.

Angola tem tudo para desenvolver-se e contribuir para o desenvolvimento de seus parceiros e vizinhos mais pobres. Mas precisa de estabilidade. Necessita de paz para poder investir recursos, que já não são muitos, em infraestrutura. Principalmente na educação e na saúde.

Neste último aspecto, o que ocorre no país é uma lástima. Por exemplo, uma epidemia de cólera varreu, no ano passado, o seu território, deixando pelo menos cinco mil mortos. A guerra civil espantou seus melhores cérebros. Muita gente preparada e criativa foi viver em Portugal e alguns de seus médicos, professores, engenheiros e pesquisadores vieram parar no Brasil.

É indispensável que essa elite pensante seja atraída de volta, com garantias de que terá liberdade de movimentos e paz para trabalhar. Só assim Angola poderá vir a ser considerada um país viável.

(Artigo publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 24 de junho de 1989).

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