Sunday, February 03, 2008

DIRETO DO ARQUIVO


Brecha no muro da intolerância


Pedro J. Bondaczuk


O acordo de paz, firmado anteontem à noite, na capital guatemalteca, pelos cinco presidentes da República da América Central, mesmo que jamais venha a ser implementado, tem um caráter histórico. Demonstra que, a despeito das divisões ideológicas e antagonismos regionais, os países desse conturbado e pobre continente sabem encontrar soluções próprias, e criativas, para as suas pendências, quando há um sincero empenho nesse sentido.
Pode-se argumentar que a simples assinatura de um documento não significa que a violência será extirpada na zona. Há, ainda, muitos, e sérios obstáculos a superar, para que o plano do presidente costarriquenho, Oscar Arias, possa vir a ser, de fato, implementado.
O principal empecilho continuam sendo os “contras”, que já mandaram um duro recado, avisando que não pretendem depor as armas, caso não sejam incluídos nas negociações. Existem, por outra parte, grandes ressentimentos e desconfianças entre os próprios signatários do pacto.
Os salvadorenhos, por exemplo, reiteram suas acusações contra a Nicarágua, de que esse país seria o grande abastecedor dos guerrilheiros que combatem o governo de El Salvador. Os sandinistas, por seu turno, replicam que as operações de abastecimento e rearmamento dos rebeldes nicaragüenses partem, via de regra, de território salvadorenho.
O próprio país proponente do acordo, a Costa Rica, é ré, ao lado de Honduras, de uma ação movida por Manágua, na Corte Internacional de Justiça de Haia, por emprestar seu solo a guerrilheiros que desejam derrubar, pelas armas, o governo de Daniel Ortega.
Mas o importante em tudo isso é que uma brecha foi aberta no até aqui sólido muro de intolerância que separa povos em tudo iguais: em miséria, em violência, em caudilhismo e em tantos outros aspectos, alguns, inclusive, bastante positivos, como costumes, tradições, aspirações e história comuns.
Basta, agora, que com uma diplomacia que realmente mereça essa classificação, e com um trabalho muito sério de mútua aproximação, com cada parte cedendo um pouquinho, essa fresta, aberta anteontem, possa ser paulatinamente ampliada, até que toda a América Central caminhe para uma plena integração. O que não se pode é ceder aos interesses das superpotências na região, que não condizem com os das populações locais.

(Artigo publicado na página 24, Internacional, do Correio Popular, em 9 de agosto de 1987)

No comments: