Friday, March 23, 2007

Uma arte em extinçãi


Pedro J. Bondaczuk


O homem contemporâneo vive, hoje, entre tantas contradições, uma que chama, em especial, a atenção. Este fim de milênio, caracterizado pela comunicação de massas, é igualmente o período em que as pessoas mais se sentem solitárias. Nunca o mundo teve tanta gente como agora. Afinal, são cerca de 5,5 bilhões de seres humanos disputando o espaço de um planeta de pequeno porte.

Em época alguma houve tantas cidades gigantescas. São cerca de 90 com mais de um milhão de habitantes. E no entanto, o homem está cada vez mais só. A saudável arte da conversação, embora encontre ainda um ou outro grupo heróico que a pratique, está em extinção.

O filósofo Ivan Illich constatou: "Cinqüenta anos atrás, a maior parte das palavras que um homem ouvia eram ditas pessoalmente a ele por alguém com quem conversava". E hoje? Atualmente este quadro é muito diferente, Ouve-se, é verdade, conversa o dia todo. Todavia, o que é ouvido é dito à distância.

São aparelhos de rádio, receptores de televisão, gravadores e vai por aí afora que nos enchem os ouvidos e a cabeça. Pessoalmente, em diálogo de qualquer espécie, as palavras ditas são minoria. Os meios de comunicação eletrônicos ditam um enervante monólogo.

Otto Lara Rezende constatou, numa de suas crônicas: "Até um cidadão que não dispunha de um televisor, ou de um rádio transistor, acaba sendo alvo do bombardeio de notícias que está no ar o dia todo, todo dia. Ninguém escapa, com raras exceções, à onipresença da notícia".

É verdade que estar bem informado é fundamental para qualquer cidadão. Todavia, nem todo o tipo de informação veiculado é do interesse de todos. A seleção, contudo, torna-se virtualmente impossível. O homem contemporâneo consome, voluntária ou involuntariamente, uma overdose de notícias, em geral desgastantes --- sobre corrupção, crise econômica, assassinatos, seqüestros e outras aberrações sociais --- que lhe despertam medo, ira, revolta e ressaltam sobretudo sua absoluta impotência.

Mesmo os que ainda reservam tempo para um papo com amigos, entre um chopinho e outro, no fim do expediente diário ou das aulas no colégio, não conseguem mais escapar dos temas dirigidos. E estes são, invariavelmente, os mesmos: inflação, futebol, maledicências sobre a vida alheia, bravatas sobre conquistas amorosas quase nunca verdadeiramente concretizadas e outras banalidades do gênero. Tempo para tratar de assuntos relevantes, para aprender e ensinar algo, nunca sobra.

E no entanto, jamais as pessoas sentiram tanta falta de diálogos construtivos. Ou de, pelo menos, ouvir alguém falar sobre coisas importantes para suas vidas. Palestras, conferências, simpósios e seminários multiplicam-se, para tratar de temas que há apenas meio século ou menos as pessoas levantavam em conversas nas varandas de suas casas, de forma amena e descontraída.

John Dewey constatou que "os homens vivem em comunidade em virtude das coisas que têm em comum; e a comunicação é o meio por que chegam a possuir coisas em comum". Só que, se comunicar, é uma via de duas mãos. Ou seja, um contínuo dar e receber. E é isto que está faltando nos dias de hoje, tornando as pessoas tão solitárias e arredias.

No comments: