Thursday, March 22, 2007

Alienação às avessas


Pedro J. Bondaczuk


O cidadão, em especial o brasileiro (que é o que conheço e o que posso analisar), é bombardeado, diariamente, por uma carga brutal de más-notícias, como denúncias de corrupção em vários níveis da administração pública, aumento de preços e de impostos, surtos periódicos de desemprego, crescimento da miséria com seus dolorosos reflexos sociais, catástrofes de toda a sorte e violências de todos os tipos etc.
Este volume enorme de informação negativa, difundido por jornais, revistas, rádio, televisão, portais e blogs da internet, age sobre as pessoas, predispondo-as ao pessimismo, ao negativismo, ao desânimo e ao mau-humor. Pudera! Não há fortaleza de espírito que resista a tanta desgraça e patifaria juntas! Daí a onda de descrença generalizada que se observa no cotidiano e que nada constrói. Qual a opção dos meios de comunicação?
Esconder os fatos negativos, mantendo a população alienada? Passar uma imagem falsa da realidade, dando a entender que as coisas andam às mil maravilhas, quando de fato não estão assim? Evidentemente, não! Discordo dos que criticam o trabalho jornalístico, afirmando, (sem base nos fatos) que somos meros robôs dos patrões e que distorcemos a verdade a nosso bel prazer. Não somos perfeitos (ninguém é), mas salvo exceções (e estas existem em tudo e em todas as profissões), realizamos com competência e senso ético a nossa tarefa de informar. Todavia, dar a entender que só existem coisas e pessoas ruins, também é alienar. Devemos fugir dessa tentação. A palavra chave para os editores, como para todas as pessoas de bom-senso, em qualquer aspecto da vida, é: equilíbrio!
Compete aos analistas (supostamente formadores de opinião), que costumeiramente tratam destes temas, tentar orientar leitores (ou ouvintes, ou telespectadores, ou usuários da internet) para que dêem o devido peso a cada uma dessas informações. É sua tarefa fazer a contextualização exata dos fatos. Corrupção, desgraças, misérias, violência e injustiças sempre existiram e vão existir, porquanto caracterizam um dos lados do ser humano, o negativo, o imperfeito, o animal, o que precisa ser burilado.
Os tempos atuais, em termos qualitativos, não são nada piores do que as eras passadas. Se assim parece, é porque hoje há maior quantidade de pessoas (cerca de 6,5 bilhões) e infinitamente maiores facilidades de difusão de informações. Fica (claro) essa impressão, dado o volume avassalador de más-notícias despejado sobre cada um de nós (e que nós, editores, repassamos para os consumidores delas). Afinal, em época alguma o aparato comunicativo foi tão ágil, abrangente e instantâneo como agora, transformando, de fato, o mundo na tão apregoada “aldeia global” de que tanto o papa das comunicações, o canadense Marshall McLuhan, falou, em especial na década de 60 do século passado.
No século XIX, o poeta norte-americano Robert Frost constatou, a propósito de más-notícias: “Impacienta-me a idéia de que esta época é uma das piores da história do mundo. Já no seu tempo, Matthew Arnold, reclamava tal honra para a sua época, anterior à nossa. Wordsworth reclamava para a época retrasada. E assim vai, literatura afora. É falta de modéstia do homem imaginar-se sucumbido diante das piores forças já mobilizadas por Deus”.
O cidadão contemporâneo precisa se acostumar, pois, com a carga de más-notícias que recebe e saber como agir em relação a isso. Quando se tratar, por exemplo, de um escândalo envolvendo o patrimônio público, deve exercer seu direito de cidadania e cobrar providências. No caso da miséria, compete-lhe ser solidário e participar, de alguma forma, para que esta venha a ser, senão erradicada, pelo menos atenuada. E vai por aí afora.
Escândalos sempre existiram e provavelmente sempre existirão. O dramaturgo irlandês George Bernard Shaw constatou: “A verdade real é que não só é bom para as pessoas ficarem escandalizadas de vez em quando, mas também é absolutamente necessário que se escandalizem freqüentemente”.
O que não dá mais para suportar é ter de carregar um complexo de culpa permanentemente, apenas pelo fato de ser brasileiro. A imagem que se pinta de nós no exterior é constrangedora, ofensiva e irritante. Descamba para o estereótipo e, mais do que este, para o preconceito. No entanto, não somos piores (e nem melhores) do que ninguém. Corrupção, por exemplo, há em toda a parte, e em maior volume e proporção do que no Brasil. Os meios de comunicação estão aí para comprovar.
Claro que o fato de existirem corruptos em todas as partes do mundo não justifica a impunidade para os daqui. Todavia, agir como se todo o brasileiro, sem atentar para quem seja, pelo simples fato de nascer no País, é desprovido de senso ético e não passa de uma reprodução mais ou menos fiel daquele personagem sem-caráter de Mário de Andrade, Macunaíma, é, não somente uma injustiça, mas uma tremenda burrice, para não dizer uma monumental sacanagem. E é isso que boa parte do mundo pensa de nós.

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