Tuesday, March 27, 2007

Tipos inesquecíveis


Pedro J. Bondaczuk


A revista "Seleções", muito popular no País nos anos 50 e 60, tinha, entre suas reportagens, artigos e inúmeras seções, uma que eu apreciava particularmente. Chamava-se "Meu tipo inesquecível". Estampava depoimentos de personalidades norte-americanas a respeito de grandes amizades. Ou de pessoas marcantes, heróicas, extraordinárias, raras, dessas que mesmo não conhecendo pessoalmente, não conseguimos deixar de nos sentir amigos.

Eram pais sábios e compreensivos, avós maravilhosos, irmãos devotados, professores abnegados, médicos desprendidos e essa espécie de seres humanos cada vez mais rara, e por isso imprescindível, cuja vida é dedicada a tornar a existência de todos mais fácil e melhor.

O escritor Mário da Silva Brito escreveu, em uma de suas reflexões publicadas no "Suplemento Literário de O Estado de São Paulo", pelos idos do início dos anos 60: "Nunca fui eu só, ou só eu. Mas todos os outros. Os antepassados, os que me rodeiam, os que pertencem ao meu tempo. Os que amo e até os desconhecidos. Estou feito de pedaços. Sou uma soma de múltiplas parcelas humanas. Consigo somar até‚ quantidades heterogêneas".

Eu também, Mário. Sou uma colcha de retalhos de idéias, conceitos, palavras, emoções e impressões. E você está incorporado em mim, como um pedaço de minha personalidade, mesmo que jamais (para infelicidade minha) nossos caminhos tivessem se cruzado.

Sou um pouco da minha primeira professorinha, dona Helena, quando internado no Lar Escola São Francisco, em São Paulo, que me abriu o mundo do saber. Um grande pedaço da dona Ester Freeman, que vislumbrou, no menino deslumbrado com as primeiras letras, um poeta (bondade dela) e me incentivou a continuar escrevendo. Uma parcela imensa dos meus mestres do Ginásio Adventista Campineiro de Hortolândia (atual Instituto Adventista São Paulo), do Colégio Cesário Motta, da Pontifícia Universidade Católica de Campinas.

Incorporei em minha estrutura mental, em meu acervo de experiências e emoções, filósofos, poetas, escritores e compositores que viveram anos, séculos, até milênios antes de mim.

Homero, Píndaro,Virgílio,Cícero, Sêneca, Aristóteles, Sócrates, Heráclito, Santo Agostinho, Santo Tomás, São Francisco de Assis... Beethoven, Chopin, Tchaikowsky, Wagner, Schubert... Eça de Queiroz, Júlio Diniz, Alexandre Herculano, Fernando Pessoa...

Balzac, Hugo, Verlaine, Mauriac, Maurois... Morin, Scott Fitzgerald, Ezra Pound, Hemingway, John dos Passos, James Joyce... Octávio Paz, Jorge Luís Borges, Mário Vargas Llosa, Gabriel Garcia Marquez... Guimarães Rosa, Graciliano Ramos, Machado de Assis, Érico Veríssimo...

Drummond, Bandeira, Quintana, Mário de Andrade, Cecília Meirelles... Benedito Sampaio, Mauro Sampaio, Uassyr Martinelli, Maurício de Moraes... Retalhos... Meros retalhos, que compõem um todo, complexo, às vezes complicado, quase sempre contraditório e polêmico.

Meu avô paterno, Hilarion, está entre estes meus tipos inesquecíveis. Meu pai é outro. Meus companheiros de república, em Barão Geraldo, que se transformaram nos irmãos que jamais tive... Meus quatro filhos... Meus milhares de amigos, em especial os que consegui no jornalismo...Meus colegas de rádio...Meus fantasmas interiores...Meus...São tantos os meus tipos inesquecíveis, que muitos deles até esqueci.

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