Monday, March 19, 2007

Amizades curtidas


Pedro J. Bondaczuk


A amizade é, dos sentimentos humanos, um dos que mais prezo. Claro, refiro-me à autêntica, à genuína, à prazerosa para ambos e à absolutamente desinteressada. Dado o meu temperamento expansivo, tenho uma certa facilidade em fazer amigos. E não é indispensável que haja afinidade de gostos e de idéias entre nós. Isto desmente o provérbio latino "simile simila". Ou seja, que "semelhante procura semelhante". Não é uma condição "sine qua non". Alguns amigos permanecem nessa especial condição por toda a vida. Tempo e espaço não são obstáculos para que o mútuo sentimento se mantenha vivo e até cresça. É o caso da turma do Rapa, de São Caetano do Sul, sobre a qual já tive oportunidade de escrever inúmeras crônicas. São amigos onipresentes. Moram dentro do coração.
No outro extremo, em virtude do meu temperamento ser um tanto explosivo e de eu ter a tendência, ou imprudência, de dizer tudo o que penso, sem medir as palavras, perco com facilidade algumas amizades. As falsas, evidentemente. Quando isso ocorre, não lamento muito. Às vezes até comemoro. O verdadeiro amigo não se melindra com pouca coisa. Sabe distinguir uma brincadeira, mesmo que de mau gosto, de uma crítica maldosa ou ferina. Sabe interpretar corretamente um "não".
Aqueles que querem me mudar, me moldar à sua feição, me despersonalizar, obviamente não gostam de mim. Não, pelo menos, da maneira que eu sou. Seria forçar muito a barra admitir que sejam meus amigos. Claro que não são. Não podem ser. No máximo, quando muito, são colegas, nada mais. Considero tais perdas, quando ocorrem, portanto, como normais e às vezes até como fatos positivos. Evitam decepções futuras. Trata-se de uma "seleção natural da espécie".
O escritor Mário da Silva Brito observou: "Olha, amizade é como picles: tem que ser curtida pelo tempo para bem se impregnar dos temperos que lhe dão sabor". E não é?! Nada mais verdadeiro! É certo que as recentes também são prazerosas. Estão repletas de descobertas. Na verdade, a amizade prescinde de regras, etiquetas e salamaleques. Dispensa formalidades. Não requer explicações. Existe porque existe e pronto. É intemporal (ou atemporal?). Nem é necessário que o amigo esteja presente para que continue sendo considerado como tal. Muitas vezes o distanciamento até aumenta a amizade. Quando ocorre o reencontro, é como se nunca tivesse havido separação. Um conhece os gostos e desgostos do outro. E, sobretudo, respeita-os. Trata-se de um sentimento em geral confundido com coleguismo. Mas está muito longe de ser apenas isso.
Colegas tenho aos montes. Nem sempre (ou quase nunca) posso confiar neles. Amigos tenho poucos, alguns muito antigos, outros de véspera. Mas todos preciosíssimos. Todos de confiança. Sua principal característica é a lealdade. São pessoas nas quais confio cegamente. Deposito, sem pestanejar, minha própria vida em suas mãos. Nem todos são da mesma faixa etária minha. Alguns são muito mais velhos. Outros, têm idade para ser meus filhos. Todos, no entanto, são absolutamente confiáveis. São leais. São sinceros. São gente...
Entre os amigos da juventude estão os fartamente citados em meus textos, por haverem se incorporado à minha vida e se acrescentado à minha pessoa, como o Zé Gordo, o Neuclair, o Eduardo "Patinhas", o Celso, o Marinho, o Paulo "Búlgaro", o João "Apedeuta" e vai por aí afora, numa sucessão de nomes (em geral acompanhados de apelidos carinhosos) quase que interminável. Entre os relativamente recentes, de uns dez a quinze anos para cá, alinham-se na maioria jornalistas. E isso tem explicação lógica. Há muito que o meu mundo se restringe a redações de jornais.
Entre estes posso citar o Hermano Pini, o Maurício de Moraes, o Roquenberg Duarte, o Josué Menezes, o Celso Bodstein, o Hermas Santos, o Mauro Sampaio etc. (que me perdoem os não mencionados, mas minhas amizades são tantas, que se fosse nomear a todas, passaria escrevendo horas sem fim). Alguns ocupam posições de destaque nos meios de comunicação. Outros, ou estão em fim de carreira ou, como eu, marcam passo e nunca saem do lugar. Nossa amizade, contudo, não envolve nenhuma espécie de interesse secundário. Existe porque existe e isso basta.
Um não quer e nem espera nada do outro, a não ser lealdade e sinceridade. Tenho amigos (talvez a maioria) que pensam e agem de maneira absolutamente diferente da minha. Mas sabemos conciliar nossas divergências. Respeitamos e até cultivamos nossas diferenças. Somos faces distintas da mesma moeda. É essa diversidade que dá tempero e substância à amizade.

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