Conflito tribal inibe desenvolvimento
Pedro J. Bondaczuk
O Quênia, com seus 580.367 quilômetros quadrados de território, tem tudo para ser um país modelo, em termos de desenvolvimento, na África negra. Situado no Leste do continente, faz divisa com vizinhos extremamente carentes e por isso violentos, como a Etiópia, Somália, Sudão, Uganda e Tanzânia.
Possui uma agricultura razoavelmente desenvolvida, um setor extrativista mineral de bom porte econômico e algumas indústrias de derivados do petróleo. Sua população é bastante expressiva, em termos continentais, estimada em 22,5 milhões de habitantes e sua capital, Nairobi, com cerca de três milhões de moradores, é uma verdadeira metrópole africana, moderna e progressista.
A inflação queniana raramente atingiu os 20% anuais, o que, em termos terceiromundistas, é uma boa performance e a renda per capita anual no país beira os US$ 410, para uma dívida externa de US$ 4 bilhões.
Como se observa, se o Quênia não é o que se pode chamar de paraíso, em termos de África negra, sua situação até que é razoável. O analfabetismo não chega a 35% e existem cinco jornais diários de grande circulação nacional. Além disso, a população queniana é predominantemente jovem, com mais de 50% de seus habitantes abaixo da faixa etária dos 14 anos.
Todavia, desde 1983, o país vem passando por um período de crescente violência. E tudo se deve à ausência de liberdade, ao desrespeito aos direitos humanos, a um sistema político arcaico e ultrapassado de rígido monopartidarismo.
Boa parte disso se deve às seculares diferenças tribais, nascidas muitas vezes por causa de incidentes banais, como por exemplo a invasão de algum animal: porco, cabra ou vaca, pertencentes a uma tribo, nas plantações de outra.
Esse divisionismo --- característica, aliás, de praticamente toda a África e de muitos outros países de outros continentes, inclusive a Europa, como é o caso da União Soviética, por exemplo, para não falar da Iugoslávia, Checoslováquia e Bulgária --- é que torna esse povo fraco. Impede a promoção de um desenvolvimento mais acelerado e justo. Afinal, o Quênia tem recursos naturais e humanos suficientes para crescer e dar boas condições de vida ao povo.
Desde a sua independência, em 12 de dezembro de 1964, o país teve apenas dois presidentes: Jomo Kennyata, que o governo até 1978 e o atual, Daniel Arap Moi. Ambos pertencem, evidentemente, ao partido único que é permitido, a União Nacional Africana do Quênia, cuja sigla é Kanu.
As ferozes confrontações entre suas 40 tribos, das quais a dos "quicuius" é majoritária, embora haja outras cinco --- suahilis, luos, kalenjins, luias e cambas --- que não são de se desprezar, Kennyata, ao fundar o Kanu, e mantê-lo como partido único, esperava poder aglutinar todos os clãs em torno de um objetivo nacional comum.
Fracassou. Agora seu vice, Jaramogi Oginga Odinga, hoje na oposição, tenta a mesma coisa, por caminho exatamente inverso: o do multipartidarismo. Mas nada disso será possível a menos que os quenianos deixem de lado seu tribalismo e adquiram o verdadeiro sentido de nacionalidade. Afinal, "uma casa dividida não prospera".
(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 16 de março de 1991).
Pedro J. Bondaczuk
O Quênia, com seus 580.367 quilômetros quadrados de território, tem tudo para ser um país modelo, em termos de desenvolvimento, na África negra. Situado no Leste do continente, faz divisa com vizinhos extremamente carentes e por isso violentos, como a Etiópia, Somália, Sudão, Uganda e Tanzânia.
Possui uma agricultura razoavelmente desenvolvida, um setor extrativista mineral de bom porte econômico e algumas indústrias de derivados do petróleo. Sua população é bastante expressiva, em termos continentais, estimada em 22,5 milhões de habitantes e sua capital, Nairobi, com cerca de três milhões de moradores, é uma verdadeira metrópole africana, moderna e progressista.
A inflação queniana raramente atingiu os 20% anuais, o que, em termos terceiromundistas, é uma boa performance e a renda per capita anual no país beira os US$ 410, para uma dívida externa de US$ 4 bilhões.
Como se observa, se o Quênia não é o que se pode chamar de paraíso, em termos de África negra, sua situação até que é razoável. O analfabetismo não chega a 35% e existem cinco jornais diários de grande circulação nacional. Além disso, a população queniana é predominantemente jovem, com mais de 50% de seus habitantes abaixo da faixa etária dos 14 anos.
Todavia, desde 1983, o país vem passando por um período de crescente violência. E tudo se deve à ausência de liberdade, ao desrespeito aos direitos humanos, a um sistema político arcaico e ultrapassado de rígido monopartidarismo.
Boa parte disso se deve às seculares diferenças tribais, nascidas muitas vezes por causa de incidentes banais, como por exemplo a invasão de algum animal: porco, cabra ou vaca, pertencentes a uma tribo, nas plantações de outra.
Esse divisionismo --- característica, aliás, de praticamente toda a África e de muitos outros países de outros continentes, inclusive a Europa, como é o caso da União Soviética, por exemplo, para não falar da Iugoslávia, Checoslováquia e Bulgária --- é que torna esse povo fraco. Impede a promoção de um desenvolvimento mais acelerado e justo. Afinal, o Quênia tem recursos naturais e humanos suficientes para crescer e dar boas condições de vida ao povo.
Desde a sua independência, em 12 de dezembro de 1964, o país teve apenas dois presidentes: Jomo Kennyata, que o governo até 1978 e o atual, Daniel Arap Moi. Ambos pertencem, evidentemente, ao partido único que é permitido, a União Nacional Africana do Quênia, cuja sigla é Kanu.
As ferozes confrontações entre suas 40 tribos, das quais a dos "quicuius" é majoritária, embora haja outras cinco --- suahilis, luos, kalenjins, luias e cambas --- que não são de se desprezar, Kennyata, ao fundar o Kanu, e mantê-lo como partido único, esperava poder aglutinar todos os clãs em torno de um objetivo nacional comum.
Fracassou. Agora seu vice, Jaramogi Oginga Odinga, hoje na oposição, tenta a mesma coisa, por caminho exatamente inverso: o do multipartidarismo. Mas nada disso será possível a menos que os quenianos deixem de lado seu tribalismo e adquiram o verdadeiro sentido de nacionalidade. Afinal, "uma casa dividida não prospera".
(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 16 de março de 1991).
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