A brincadeira mais divertida
Pedro J. Bondaczuk
A criança que um dia fomos permanece dentro de nós enquanto vivermos. Sei que, ao fazer essa afirmativa, não disse nada de original, inteligente ou criativo e nem essa era a minha intenção. Isso já foi dito tantas vezes, por tantas e diferentes pessoas, que já se transformou em clichê. Todavia, como isso serve aos meus propósitos, no tema em que o convido a refletir comigo, uso-o sem nenhum constrangimento.
E por que me vali de uma afirmação tão surrada, constante e, sobretudo, óbvia? Para chamar a atenção para um comportamento amplamente disseminado mundo afora e não somente entre crianças e adolescentes, mas também (sinto-me tentado a dizer principalmente) entre adultos e pessoas idosas. Refiro-me às brincadeiras, características de ambientes que agrupem várias pessoas (trabalho, escola, clubes, círculos literários etc.).
São aquelas “caçoadas”, que se pretende inocentes, mas que, não raro (para não dizer sempre) escondem razoável dose de veneno. Se alguém está pensando que isso acontece apenas entre meninos ou adolescentes, é porque não observa o próprio comportamento e muito menos o que ocorre ao seu redor. Até em asilos de idosos isso acontece e sempre com a mesma conotação. Pretende-se que seja uma ação inocente, sem intenção alguma de ofender. Será?
Os apelidos não são outras coisas senão brincadeiras. O melhor método para eles “colarem”, o caminho mais seguro para que isso ocorra, é os apelidados se mostrarem incomodados com eles. Quanto mais ficam bravos com os epítetos que lhes são atribuídos, maior força esses ganham. Há pessoas que carregam apelidos de infância pelo resto da vida. Muitas sequer são conhecidas pelo nome verdadeiro, aquele que lhes foi atribuído pelos pais ao nascerem.
E experimente se rebelar contra alguma dessas “brincadeiras!” que fizerem com você, mesmo que sejam de notório péssimo gosto! O vilão da história não será, jamais, quem caçoou de você, mas você “que não sabe brincar”. Farão com que se sinta um estranho no ninho, o indesejável dos indesejáveis, apenas por tentar salvaguardar o amor próprio.
Diga com sinceridade: não é o que você vê (e talvez faça) amiúde nos ambientes que freqüenta? Não seja mentiroso e nem hipócrita, admita. É o comportamento mais comum que existe e, reitero, não importa a idade que as pessoas tenham. Claro, para que isso aconteça, é necessário que haja certo grau de intimidade no ambiente.
Você, certamente, não sairá pelos corredores de onde trabalha apelidando, a torto e a direito, o presidente da empresa da qual é empregado. Se o fizer, já sabe o que irá acontecer. Terá que preparar convenientemente os fundilhos das calças para receber um solene pontapé no traseiro e procurar urgentemente seu currículo para buscar novo emprego. Mas com os colegas de trabalho você brinca, e o tempo todo, e a brincadeira lhe parece ainda mais divertida se a vítima se chateia com ela.
Mesmo as caçoadas (aparentemente) mais inocentes escondem juízos de valores de quem brinca com você. Determinadas coisas, que as pessoas não teriam a menor coragem de dizer a sério, dizem-nas brincando. Se você já estiver acostumado com isso, engolirá a seco o que for dito a seu respeito e preparará, com certeza, a desforra, na mesma medida ou, se possível, com maior intensidade, mas no mesmo tom de “brincadeira”.
Outro dia, quando expus aos colegas de redação o meu programa diário de vida, sem tempo sequer para respirar, um deles se voltou para mim e disse, sorrindo: “Você é louco, Pedrão!”. Dissesse isso a sério, certamente eu o agarraria pelos colarinhos e lhe daria uns bons tapas, para aprender a se comportar e a não caluniar os outros. Mas não, ele disse “brincando”. Claro que dei um sorriso amarelo, embora desse a entender que ignorei essa observação, e retruquei-lhe na mesma moeda, chamando-o de vagabundo.
Para uma pessoa de brio, isso seria motivo mais do que suficiente para nos engalfinharmos, em selvagem troca de sopapos. Mas foi o que aconteceu? Claro que não! Fiz-lhe essa ofensa em tom de “brincadeira” e ficou o dito pelo não dito. Tudo terminou em barulhentas gargalhadas (para irritação do sisudo e irritado editor-chefe) no fumódromo do jornal, onde fazíamos uma pausa para suportar o restante da edição.
E esse comportamento não é recente. Não é coisa desta geração e nem das pelo menos dez que a antecederam. É antigo, antiqüíssimo, impossível de ter as origens determinadas. Tanto que o escritor George Bernard Shaw escreveu a respeito: “A minha maneira de brincar é dizer a verdade. É a brincadeira mais divertida do mundo”. Será que há alguém que não proceda assim? Se vocês conhecerem quem, por favor, apresentem-me essa raridade, que será personagem ideal para uma boa matéria de comportamento. Talvez receba, até mesmo, o troféu de “Santo do Ano”, quem sabe.
Pedro J. Bondaczuk
A criança que um dia fomos permanece dentro de nós enquanto vivermos. Sei que, ao fazer essa afirmativa, não disse nada de original, inteligente ou criativo e nem essa era a minha intenção. Isso já foi dito tantas vezes, por tantas e diferentes pessoas, que já se transformou em clichê. Todavia, como isso serve aos meus propósitos, no tema em que o convido a refletir comigo, uso-o sem nenhum constrangimento.
E por que me vali de uma afirmação tão surrada, constante e, sobretudo, óbvia? Para chamar a atenção para um comportamento amplamente disseminado mundo afora e não somente entre crianças e adolescentes, mas também (sinto-me tentado a dizer principalmente) entre adultos e pessoas idosas. Refiro-me às brincadeiras, características de ambientes que agrupem várias pessoas (trabalho, escola, clubes, círculos literários etc.).
São aquelas “caçoadas”, que se pretende inocentes, mas que, não raro (para não dizer sempre) escondem razoável dose de veneno. Se alguém está pensando que isso acontece apenas entre meninos ou adolescentes, é porque não observa o próprio comportamento e muito menos o que ocorre ao seu redor. Até em asilos de idosos isso acontece e sempre com a mesma conotação. Pretende-se que seja uma ação inocente, sem intenção alguma de ofender. Será?
Os apelidos não são outras coisas senão brincadeiras. O melhor método para eles “colarem”, o caminho mais seguro para que isso ocorra, é os apelidados se mostrarem incomodados com eles. Quanto mais ficam bravos com os epítetos que lhes são atribuídos, maior força esses ganham. Há pessoas que carregam apelidos de infância pelo resto da vida. Muitas sequer são conhecidas pelo nome verdadeiro, aquele que lhes foi atribuído pelos pais ao nascerem.
E experimente se rebelar contra alguma dessas “brincadeiras!” que fizerem com você, mesmo que sejam de notório péssimo gosto! O vilão da história não será, jamais, quem caçoou de você, mas você “que não sabe brincar”. Farão com que se sinta um estranho no ninho, o indesejável dos indesejáveis, apenas por tentar salvaguardar o amor próprio.
Diga com sinceridade: não é o que você vê (e talvez faça) amiúde nos ambientes que freqüenta? Não seja mentiroso e nem hipócrita, admita. É o comportamento mais comum que existe e, reitero, não importa a idade que as pessoas tenham. Claro, para que isso aconteça, é necessário que haja certo grau de intimidade no ambiente.
Você, certamente, não sairá pelos corredores de onde trabalha apelidando, a torto e a direito, o presidente da empresa da qual é empregado. Se o fizer, já sabe o que irá acontecer. Terá que preparar convenientemente os fundilhos das calças para receber um solene pontapé no traseiro e procurar urgentemente seu currículo para buscar novo emprego. Mas com os colegas de trabalho você brinca, e o tempo todo, e a brincadeira lhe parece ainda mais divertida se a vítima se chateia com ela.
Mesmo as caçoadas (aparentemente) mais inocentes escondem juízos de valores de quem brinca com você. Determinadas coisas, que as pessoas não teriam a menor coragem de dizer a sério, dizem-nas brincando. Se você já estiver acostumado com isso, engolirá a seco o que for dito a seu respeito e preparará, com certeza, a desforra, na mesma medida ou, se possível, com maior intensidade, mas no mesmo tom de “brincadeira”.
Outro dia, quando expus aos colegas de redação o meu programa diário de vida, sem tempo sequer para respirar, um deles se voltou para mim e disse, sorrindo: “Você é louco, Pedrão!”. Dissesse isso a sério, certamente eu o agarraria pelos colarinhos e lhe daria uns bons tapas, para aprender a se comportar e a não caluniar os outros. Mas não, ele disse “brincando”. Claro que dei um sorriso amarelo, embora desse a entender que ignorei essa observação, e retruquei-lhe na mesma moeda, chamando-o de vagabundo.
Para uma pessoa de brio, isso seria motivo mais do que suficiente para nos engalfinharmos, em selvagem troca de sopapos. Mas foi o que aconteceu? Claro que não! Fiz-lhe essa ofensa em tom de “brincadeira” e ficou o dito pelo não dito. Tudo terminou em barulhentas gargalhadas (para irritação do sisudo e irritado editor-chefe) no fumódromo do jornal, onde fazíamos uma pausa para suportar o restante da edição.
E esse comportamento não é recente. Não é coisa desta geração e nem das pelo menos dez que a antecederam. É antigo, antiqüíssimo, impossível de ter as origens determinadas. Tanto que o escritor George Bernard Shaw escreveu a respeito: “A minha maneira de brincar é dizer a verdade. É a brincadeira mais divertida do mundo”. Será que há alguém que não proceda assim? Se vocês conhecerem quem, por favor, apresentem-me essa raridade, que será personagem ideal para uma boa matéria de comportamento. Talvez receba, até mesmo, o troféu de “Santo do Ano”, quem sabe.
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