Tuesday, December 21, 2010




Só talento basta?

Pedro J. Bondaczuk

Qual é o principal ingrediente que determina o sucesso profissional, seja qual for a atividade que se considere (e, no nosso caso, a de escritor)? Para muitos, é sorte. Para outros, é ter e saber aproveitar as oportunidades. Para um terceiro grupo, é ter talento. Essas opiniões são corretas?
Há alguma fórmula infalível e universal para sermos bem-sucedidos no que quer que façamos? Ouso dizer que não! Há atitudes e circunstâncias que ajudam (como as que citei), mas ao iniciarmos uma empreitada, nunca temos e nem teremos nenhuma certeza de que chegaremos a bom termo.
Há pessoas que fazem tudo certinho, são audaciosas, aplicadas, preparadas, disciplinadas, talentosas e.... fracassam. Em contrapartida, há outras para as quais, mesmo quando fazem tudo errado, as coisas sempre acabam se encaixando e dando certo. Por que? É inexplicável. Mas a experiência mostra que é assim que acontece.
Um dos maiores e mais comuns enganos a esse propósito é achar que basta se ter talento para se obter sucesso. Este, todavia, por si só, nada resolve. Primeiro, tem que ser detectado. Segundo, precisa ser desenvolvido e aperfeiçoado. Terceiro, deve ser exercido em sua plenitude. O talento não passa de determinada aptidão que temos (pode, claro, ser mais de uma), de um potencial que, se não for devidamente posto em prática, de nada nos servirá.
Escrevi, tempos atrás, uma crônica sobre uma pessoa que conheço bem, e há anos, talentosíssima na arte de compor poesia. Sua esposa apostou todas as suas fichas nessa sua aptidão, sustentando o marmanjo, um tremendo vagabundo, que passa os dias nos bares da cidade se exibindo, fazendo versos em troca de uma dose (na verdade, várias) de cachaça. A mulher, coitada, rala o dia todo, como balconista de uma loja de calçados, para que o marido tenha tranqüilidade, encontre “inspiração” e escreva o livro que promete escrever há anos, mas que sequer esboçou. Nunca irá esboçar, claro.
Li vários dos versos que o tal sujeito compôs – sem sequer pensar muito, assim, num piscar de olhos – e são muito bons. Ele, contudo, jamais se deu o trabalho de nem mesmo transcrevê-los e colecioná-los, para compor a tal obra-prima, que vive prometendo. Literalmente, pode-se dizer que esbanja talento. Mas este lhe é inútil, como o próprio safado o é.
Falta-lhe vontade, disciplina, assiduidade, responsabilidade (principalmente esta) e tantas e tantas outras coisas. Na verdade, não passa de um inútil e só ele e a esposa não se dão conta dessa inutilidade. De que lhe vale o tal do talento? Rigorosamente de nada.
Aliás, o escritor italiano, Giovanni Papini, ficava sumamente irritado quando lhe diziam que era talentoso. Achava, até, que o ofendiam, quando o chamavam assim. Excentricidades a parte, escreveu o seguinte a propósito, no livro “O homem liquidado”: “Quem entre nós não tem talento? Mesmo aqueles que nada têm, têm talento, até os políticos – até os jornalistas. Fique, pois, dito, de uma vez para sempre: quem me disser que eu tenho talento, ofende-me, quem me disser que sou um homem de talento, aflige-me”.
Por que essa reação que, cá para nós, é um tanto descabida, despropositada e irracional? Mera excentricidade do escritor? Até pode ser, mas não é só isso. É que, em seu tempo, via tanto talento desperdiçado, ou mal-aproveitado, que a palavra adquiriu para ele conotação rigorosamente pejorativa. Ademais, sabia o quanto havia se esforçado, estudado, trabalhado e se dedicado à literatura para conseguir relativo sucesso como escritor.
E Papini diz mais a propósito: “O talento é aquela forma superior de inteligência que todos podem compreender, apreciar e amar. O talento é aquela mistura saborosa de facilidade, de espírito, de lugares-comuns, di filiotismo um tanto brilhante que agrada às senhoras, aos professores, aos advogados, aos mendigos, às famosas pessoas cultas, em suma, a todos os que estão meio por meio entre o céu e a terra, entre o paraíso e o inferno, a igual distância da animalidade profunda e do gênio grande”.
Prefiro, como Papini, a capacidade de criar, mas que não se restrinja ao mero potencial. Que se desenvolva, se espraie, atue e produza obras e mais obras, sem sequer se importar com a opinião alheia e muito menos com os resultados, que podem nem mesmo vir.
Não, leitor, ser criativo não é a mesma coisa que ter talento. Este pode gerar resultados ou não, na dependência de ser ou não exercido. Já a criatividade é o que impulsionou e segue impulsionando o homem ao progresso e, sem ela, este animal estranho e contraditório ainda estaria nas cavernas, vegetando, como bicho, que é.
Afinal de contas, demos voltas e mais voltas e retornamos ao princípio destas considerações. E permanece sem resposta a pergunta inicial que fiz: qual é a fórmula do sucesso? Eu não conheço nenhuma. Se você conhecer, amável leitor, por obséquio, revele-me qual é, com a devida e correspondente comprovação de eficácia, logicamente.

Acompanhe-me no twitter: @bondaczuk

No comments: