Friday, December 10, 2010




O roqueiro escritor

Pedro J. Bondaczuk

O sucesso é, mesmo, caprichoso e nos alcança quando menos esperamos ou estamos preparados para ele. Isso acontece, principalmente, em nossa atividade de escritores. Muitas vezes nos preparamos a vida toda para encarar esse complicado e incerto mundo das letras. Estudamos, desenvolvemos um talento descoberto, muitas vezes, na remotíssima infância, somos criativos, autodisciplinados, de imaginação fértil, produtivos e autocríticos. Produzimos obras irretocáveis, escolhemos uma grande editora, com a melhor das estruturas e perfeita distribuição, para publicá-lo, comparecemos a noites de autógrafos sem fim e... nada acontece. Nossos livros encalham, desgraçadamente, nas prateleiras das livrarias e dão prejuízos imensos para todos os participantes que tornaram viável seu lançamento.
“Onde erramos?!”, perguntamos, atônitos e desesperados. Não cometemos erro algum. As circunstâncias é que nos foram desfavoráveis. Em contrapartida, um sujeito que gosta de escrever, mas nunca se julgou escritor, produz um romance pequeno, de uma história simples que lhe veio à cabeça, mas que tem muito de autobiográfica, edita-o com um esforço inaudito, numa editora nova, minúscula e sem nenhuma tradição ou estrutura, vende-o num esforço pessoal gigantesco, praticamente de casa em casa, mal recupera o investimento que fez e, subitamente... Bum!!! Explode em sucesso.
Transforma-se, da noite para o dia, num best-seller, escritor badalado pela crítica, requisitado pelo público e pela imprensa e assediado por dezenas de grandes editoras, ávidas por conseguirem um contrato para suas próximas produções, oferecendo-lhe, inclusive, polpudos adiantamentos de dinheiro. E, para culminar,. seu livrinho despretensioso conquista um dos mais reputados e cobiçados prêmios literários do mundo. Parece até enredo de um romance ruim, desses dos mais óbvios possíveis. Fantasia? Nem tanto! Isso acaba de acontecer.
Aconteceu, sim, garanto-lhes e juro, e com Paul Harding, de 42 anos, roqueiro, ex-baterista do grupo de rock (relativamente obscuro) Cold Water Flat. O sujeito até que gostava de escrever, e escrevia bem, mas nunca teve oportunidade de divulgar seus textos em qualquer grande veículo de comunicação. Resolveu redigir um romance, por puro prazer da escrita, sem a menor ambição de nem mesmo se tornar famoso. Seu livro ficou pronto, tinha 191 páginas, e achou que ficou bom. Mostrou-o aos amigos e a maioria não lhe deu a menor importância.
Um deles, porém, sugeriu, talvez para se livrar do seu assédio, que o publicasse. Tentou, tentou e tentou chegar às grandes editoras, em vão. Resolver fazer uma última tentativa numa pequenina empresa editorial, a Bellevue Literary Press, afiliada da NYU School of Medicine, com somente três anos de existência, só dois funcionários e sem nenhuma estrutura de distribuição e divulgação. Não teve jeito. Colocou os livros debaixo do braço e saiu por aí vendendo, como um mascate, de porta em porta. Trabalhou feito um camelo, mas vendeu quinze mil exemplares. “Vitória!”, pensou. Mal sabia, porém, o que o aguardava.
“Tinkers”, história de um homem à beira da morte que mantém um relacionamento especial e franco com seu pai, em que ambos descobrem, além, do cotidiano banal, novas formas de compreensão do mundo e da vida, acabou caindo em mãos de críticos literários famosos, de várias partes dos Estados Unidos. Foi como uma chama em um rastilho de pólvora. Bum! Explodiu! O sucesso chegou para Paul Harding.
Primeiro, seu livro, lançado em janeiro de 2009, tornou-se assunto preferencial em todos os círculos literários do país. Choveram elogios e cartas e solicitações de entrevistas. Alguns chegaram a classificá-lo como novo J. D. Salinger, mas sem as esquisitices e idiossincrasias do original. E tudo acabou desembocando em algo maior, muito maior do que o mero sucesso: a consagração e a glória. Paul Harding, com seu livro, conquistou o Prêmio Pulitzer de 2010, na categoria “Ficção”. Quantos gostariam de estar em seu lugar, que lutam há muito mais anos para isso, e não estão e jamais estarão?! Milhares, diria milhões de escritores.
Claro que se ele não tivesse o talento que tem, jamais conseguiria essa façanha. Continuaria como baterista de um conjunto de rock não tão famoso assim, fazendo desgastantes turnês para sobreviver. Estão aí, porém, as tais das “circunstâncias”, citadas pelo filósofo espanhol José Ortega y Gasset, e sobre as quais tenho escrito tanto. Paul Harding estava no lugar certo, na hora certa e com a atitude que era a mais adequada para a ocasião. Deu no que deu: sucesso! E que sucesso!
A esse propósito, o escritor declarou, ao “USA Today”: “De início, minhas possibilidades de êxito eram quase nulas. Afinal, tratava-se de um pequeno livro, de uma editora minúscula, de um escritor estreante e desconhecido, vendido de mão em mão do início ao fim. O Pulitzer confere-me uma sensação de liberdade. Posso me dar o luxo, daqui para frente, de continuar fazendo o que mais amo fazer: escrever”.
Tudo o que Paul Harding vier a conquistar, daqui pra frente, será lucro. E se não conseguir mais nada (o que não acredito que ocorra), pelo menos já sentiu o dulcíssimo sabor do sucesso (e que sucesso!): inscreveu, para sempre, seu nome na Literatura dos Estados Unidos e, provavelmente, na mundial. Que tal pelo menos tentarmos seguir seu exemplo? Pode dar certo, não é mesmo? Pelo menos é o que creio. Como o sucesso é estranho e inesperado!!!!

Acompanhe-me no twitter: @bondaczuk

No comments: