Monday, December 27, 2010




Imersos em símbolos

Pedro J. Bondaczuk

A inteligência “humana” (e coloco a distinção entre aspas, por entender que outros animais também a tenham, posto que em estágio primaríssimo), considerada em seu sentido lato, ou seja, o da capacidade de “entender” o que se passa quer no interior da própria mente, quer ao redor e alhures, é toda baseada em símbolos.
Por outro lado, os relacionamentos entre todas as pessoas e a totalidade das estruturas sociais têm por fundamento convenções universais. Se ambos não existissem, provavelmente nós também não. Quando digo ambos, refiro-me aos símbolos e às convenções. Ou se existíssemos, seríamos guiados exclusivamente pelos instintos, dos quais os dois básicos são, inclusive, antagônicos, ou seja, o erótico, de preservação individual e da espécie, e o tânico, de destruição do que seja interpretado pelo inconsciente como ameaça e perigo (mesmo que não o seja).
Sem os símbolos, não conseguiríamos nem mesmo nos comunicar. Não haveria, por exemplo, a linguagem (e, por conseqüência, os idiomas, estimados, atualmente, em por volta de vinte mil, quando considerados os dialetos). É por causa da convenção que, quando emitimos com o nosso aparelho fonador determinado som, as pessoas ao nosso redor entendem de imediato o que queremos expressar. Afinal, o que são as palavras, se não símbolos adredemente convencionados? E sequer me refiro à escrita. Esta é para lá de óbvio que compõe um conjunto de intrincada simbologia.
As letras de qualquer alfabeto o que vêm a ser? E os números? E essa ciência rigorosa e exata, que é uma das maiores manifestações de inteligência do bicho homem, a matemática, o que é? A resposta é óbvia: símbolos... meros símbolos. E as artes? E as filosofias? E a literatura, objeto primordial da nossa preocupação (e paixão)? São todos símbolos, assim como a política, a economia, a administração, a religião e vai por aí afora.
E essa simbologia toda e a infinidade de convenções que a consubstancia e a torna universalmente entendida é passada, de geração a geração, por esse processo bastante amplo e complexo, muito falado e pouco compreendido, que é a educação (interpretada, equivocadamente, por muitos, como mera instrução), impedindo que o homem, enquanto espécie, retroaja à barbárie e à sua original animalidade.
Exemplifiquemos o conceito de convenção, para facilitar o entendimento. Tomemos a palavra de origem latina “rosa”. Ao mencioná-la, o que virá de imediato à mente das pessoas que se utilizam de idiomas neolatinos? Evidentemente, uma determinada flor, e só aquela. Claro que há nuances que devem ser acrescentadas para esclarecer a que rosa se está referindo. Afinal, ela pode ser de várias cores, vermelha, amarela e até da tonalidade que tem esse nome exatamente por causa da flor, ou seja, a cor-de-rosa (parece que alguém conseguiu a façanha de, através da manipulação genética, produzir uma que é de coloração azul).
Por que essa palavra nos remete de imediato e automaticamente àquela planta? Porque se “convencionou” que fosse assim. Ao falarmos a palavra rosa, não imaginamos (ou seja, não formamos a “imagem” na nossa mente) um elefante, um besouro, uma tartaruga ou uma cadeira. A idéia imediata que se forma é a dessa flor, e só dela, e também não da dália, do crisântemo, da margarida, do dente de leão ou de outra qualquer. Não ficou claro? Sem dúvida que sim!
E o que são as regras (literárias ou esportivas, não importa), as normas, as leis, os códigos, os dogmas, a Bíblia, o Alcorão, a Torá e vai por aí afora? São, obviamente, todos convenções. E, antes e acima de tudo, são símbolos. Estamos todos, pois, imersos, ininterruptamente, do nascimento à morte, num oceano infinito de simbologia. E é ela, exclusivamente ela, que nos tornou estes seres inteligentes, racionais, criativos e especiais. Enfim... humanos!

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