Sunday, September 06, 2009

DIRETO DO ARQUIVO


Muita retórica, pouca ação

Pedro J. Bondaczuk


A Assembléia Geral das Nações Unidas, pelo 44º ano consecutivo, iniciou, ontem, seu período de debates, trazendo à baila, virtualmente, os mesmos temas debatidos em sua sessão de fundação. Ou quase isto, já que naquele tempo ninguém ouvia falar de Síndrome de Imunodeficiência Adquirida, embora outras doenças, que continuam ceifando milhares de vidas humanas pelo mundo afora, fossem enfocadas.

O que aconteceu nestas quase quatro décadas e meia do pós-guerra, portanto, não passou de mera variação em torno dos mesmos temas. É verdade que agora os discursos dos principais personagens, Estados Unidos e União Soviética, estão livres do ranço da Guerra Fria, que consumiu tantos esforços e tanto tempo, em troca de nada.

Há, pelo menos, a vantagem, neste momento, de se dar uma atenção muito maior a problemas gravíssimos, praticamente críticos, que se fossem enfocados antes com o realismo que mereciam talvez já tivessem até sido equacionados, ou pelo menos não agravados.

Este é o caso do narcotráfico. Ao contrário do que se pensa, o assunto está muito longe de ser novo. Ele foi causa, inclusive, de um conflito armado entre a Grã-Bretanha e a China, que custou aos chineses a perda de Hong Kong. Foi a chamada “guerra do ópio”.

Durante muito tempo não se encarou o assunto com a seriedade que ele sempre deveria ter merecido. O vício chegou mesmo a entrar na “moda”, na década de 1960, numa atitude insensata e burra de muitos ditos intelectuais, que somente favoreceram os traficantes, que se fortaleceram e fizeram fortuna às custas de sua estreiteza de visão. Agora, essa atividade sinistra já chega a ameaçar, virtualmente, a toda a humanidade.

Aliás, mesmo o propalado desarmamentismo atual não é algo novo. E ninguém tem a completa segurança de que seja sincero ou esteja mesmo em andamento. Há alguns anos, Erich Fromm, em seu livro “Ter ou Ser?”, observou: “Como é possível que o mais forte de todos os instintos, o de conservação da existência, pareça ter deixado de nos motivar? Uma das explicações mais óbvias é que os dirigentes empreendem muitas atividades que lhes possibilitam dar a entender que estão fazendo algo eficaz para evitar uma catástrofe: intermináveis conferências, resoluções, acordos de desarmamento. Tudo isso dá a impressão de que os problemas estão identificados e que alguma coisa está sendo feita para solucioná-los. Contudo, nada de real importância acontece; mas tanto dirigentes como dirigidos anestesiam suas consciências e seu desejo de sobrevivência dando impressão de conhecer o caminho e andar no sentido certo”.

Algo mudou, pois, nestes últimos 44 anos? Talvez somente o tom, mas não a substância.

(Artigo publicado na página 15, Internacional, do Correio Popular, em 26 de setembro de 1989).

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