As piores aflições do povo equatoriano
Pedro J. Bondaczuk
O Equador atravessa um período dificílimo de sua história, certamente o mais árduo desde quando, em 10 de agosto de 1830, separou-se da Confederação da Grã-Colômbia (composta ainda pela Colômbia, Venezuela e Panamá, em 1822, sob as liderança do “Libertador das Américas”, Simon Bolívar) e passou a caminhar com as próprias pernas.
Uma sucessão de abalos sísmicos, que começou na madrugada de 6 de março passado, arrasou, em questão de horas, províncias inteiras, destruindo casas, rodovias, pontes e danificando seriamente o oleoduto transequatoriano. Em conseqüência deste último problema, o país vê-se forçado a suspender suas exportações de petróleo, a maior fonte de divisas de que dispunha.
Se até agora a situação social dessa República sul-americana podia ser classificada de “tensa”, doravante tende a acentuar-se bastante e tornar-se “tenebrosa”. Recorde-se que, recentemente, os equatorianos viram suas frágeis instituições democráticas passarem por grave risco, quando um comando de pára-quedistas chegou a seqüestrar o próprio presidente Leon Febres Cordero, numa abortada tentativa de golpe.
O ato somente não se concretizou graças à serenidade e ao patriotismo de sua atual cúpula militar, que não só agiu com exemplar ponderação para conseguir a libertação incólume do governante, como ainda levou às barras da Justiça aqueles que procederam tão mal.
O país, que nunca foi um mar de tranqüilidade, já havia sido colhido antes, em cheio, pela crise que atingiu a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), em outubro de 1985, quando a Arábia Saudita resolveu deflagrar uma desastrosa guerra de preços contra os produtores não ligados ao cartel, em especial os do Mar do Norte, ou seja, Grã-Bretanha e Noruega, através da prática do “dumping”.
Derrubou as cotações do produto, de um patamar de US$ 28 o barril, para cerca de US$ 21, fiando-se na vantagem que teria nos custos de extração. No entanto, não avaliou corretamente a situação do mercado naquele momento. Havia excesso de oferta do produto na ocasião e os principais consumidores estavam com seus estoques abarrotadíssimos.
Dessa redução proposital dos preços, no entanto, a Opep subitamente passou para uma outra fase, a da sua queda acentuada ditada por essa “inundação” de petróleo que havia no mundo. Eles foram despencando, despencando, até atingirem um perigoso patamar de US$ 6.
As economias mais sólidas, ou as que tinham como lastro outros produtos de exportação para garantir divisas, até que conseguiram resistir ao desastre. Mas este, em absoluto, não foi o caso equatoriano. O país acabou se endividando ainda mais do que já estava junto ao sistema financeiro internacional, para continuar cumprindo seus compromissos.
Hoje, o seu endividamento ultrapassa os US$ 8 bilhões. Como o Equador tem 8 milhões de habitantes, equivale a dizer que cada cidadão local, seja qual for a sua idade, condição social ou sua renda, deve, para banqueiros do Exterior, a “bagatela”de US$ 1 mil. Ou seja, praticamente a totalidade da sua renda per capita anual.
O pior de tudo é que as autoridades parecem perdidas após a ocorrência da série de abalos sísmicos. Não se tem sequer uma cifra oficial de mortos e feridos, o que equivale a dizer que muita gente, passados oito dias da tragédia, ainda não recebeu o mínimo socorro.
Muitos podem estar bastante machucados, agonizando e condenados à morte à míngua. Tudo o que se refira a esse desastre natural vem sendo tratado na base do “chutômetro” pelo governo. Parece que as autoridades se preocuparam apenas com as perdas materiais sofridas, com a avaria do maior oleoduto do país, e se esqueceram, do verdadeiro patrimônio nacional: a sua gente.
Pode parecer uma crueldade tecer críticas aos governantes após uma catástrofe do porte da vivida pelo Equador. Mas mais cruel ainda é dar tão pouco valor à vida de pessoas humildes e sem condições de se refazer economicamente.
Porque dificilmente os mais abastados foram atingidos pelos sismos. Eles têm casas sólidas, capazes de resistir à fúria da natureza. Dispõem de recursos próprios para buscar socorro médico em caso de terem sido afetados.
E os pobres camponeses de Napo? E a gente simples, que mal possui uma muda de roupa para vestir e uma pequena gleba párea cultivar? Como fica esse pessoal? É indispensável, pois, que sociedades mais avançadas se movimentem para prestar socorro a essa parcela imensa da população equatoriana. Afinal, são seres humanos que estão sofrendo as conseqüências de algo que ninguém consegue sequer prever, quanto mais evitar.
(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 13 de março de 1987).
Pedro J. Bondaczuk
O Equador atravessa um período dificílimo de sua história, certamente o mais árduo desde quando, em 10 de agosto de 1830, separou-se da Confederação da Grã-Colômbia (composta ainda pela Colômbia, Venezuela e Panamá, em 1822, sob as liderança do “Libertador das Américas”, Simon Bolívar) e passou a caminhar com as próprias pernas.
Uma sucessão de abalos sísmicos, que começou na madrugada de 6 de março passado, arrasou, em questão de horas, províncias inteiras, destruindo casas, rodovias, pontes e danificando seriamente o oleoduto transequatoriano. Em conseqüência deste último problema, o país vê-se forçado a suspender suas exportações de petróleo, a maior fonte de divisas de que dispunha.
Se até agora a situação social dessa República sul-americana podia ser classificada de “tensa”, doravante tende a acentuar-se bastante e tornar-se “tenebrosa”. Recorde-se que, recentemente, os equatorianos viram suas frágeis instituições democráticas passarem por grave risco, quando um comando de pára-quedistas chegou a seqüestrar o próprio presidente Leon Febres Cordero, numa abortada tentativa de golpe.
O ato somente não se concretizou graças à serenidade e ao patriotismo de sua atual cúpula militar, que não só agiu com exemplar ponderação para conseguir a libertação incólume do governante, como ainda levou às barras da Justiça aqueles que procederam tão mal.
O país, que nunca foi um mar de tranqüilidade, já havia sido colhido antes, em cheio, pela crise que atingiu a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), em outubro de 1985, quando a Arábia Saudita resolveu deflagrar uma desastrosa guerra de preços contra os produtores não ligados ao cartel, em especial os do Mar do Norte, ou seja, Grã-Bretanha e Noruega, através da prática do “dumping”.
Derrubou as cotações do produto, de um patamar de US$ 28 o barril, para cerca de US$ 21, fiando-se na vantagem que teria nos custos de extração. No entanto, não avaliou corretamente a situação do mercado naquele momento. Havia excesso de oferta do produto na ocasião e os principais consumidores estavam com seus estoques abarrotadíssimos.
Dessa redução proposital dos preços, no entanto, a Opep subitamente passou para uma outra fase, a da sua queda acentuada ditada por essa “inundação” de petróleo que havia no mundo. Eles foram despencando, despencando, até atingirem um perigoso patamar de US$ 6.
As economias mais sólidas, ou as que tinham como lastro outros produtos de exportação para garantir divisas, até que conseguiram resistir ao desastre. Mas este, em absoluto, não foi o caso equatoriano. O país acabou se endividando ainda mais do que já estava junto ao sistema financeiro internacional, para continuar cumprindo seus compromissos.
Hoje, o seu endividamento ultrapassa os US$ 8 bilhões. Como o Equador tem 8 milhões de habitantes, equivale a dizer que cada cidadão local, seja qual for a sua idade, condição social ou sua renda, deve, para banqueiros do Exterior, a “bagatela”de US$ 1 mil. Ou seja, praticamente a totalidade da sua renda per capita anual.
O pior de tudo é que as autoridades parecem perdidas após a ocorrência da série de abalos sísmicos. Não se tem sequer uma cifra oficial de mortos e feridos, o que equivale a dizer que muita gente, passados oito dias da tragédia, ainda não recebeu o mínimo socorro.
Muitos podem estar bastante machucados, agonizando e condenados à morte à míngua. Tudo o que se refira a esse desastre natural vem sendo tratado na base do “chutômetro” pelo governo. Parece que as autoridades se preocuparam apenas com as perdas materiais sofridas, com a avaria do maior oleoduto do país, e se esqueceram, do verdadeiro patrimônio nacional: a sua gente.
Pode parecer uma crueldade tecer críticas aos governantes após uma catástrofe do porte da vivida pelo Equador. Mas mais cruel ainda é dar tão pouco valor à vida de pessoas humildes e sem condições de se refazer economicamente.
Porque dificilmente os mais abastados foram atingidos pelos sismos. Eles têm casas sólidas, capazes de resistir à fúria da natureza. Dispõem de recursos próprios para buscar socorro médico em caso de terem sido afetados.
E os pobres camponeses de Napo? E a gente simples, que mal possui uma muda de roupa para vestir e uma pequena gleba párea cultivar? Como fica esse pessoal? É indispensável, pois, que sociedades mais avançadas se movimentem para prestar socorro a essa parcela imensa da população equatoriana. Afinal, são seres humanos que estão sofrendo as conseqüências de algo que ninguém consegue sequer prever, quanto mais evitar.
(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 13 de março de 1987).
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