Pedro J. Bondaczuk
A Bossa Nova completou, em maio passado, 50 anos (nossa, como o tempo passa! Parece que foi ontem!), mas sua batida diferente, sincopada, exótica, mistura de samba e de jazz, ainda pode ser ouvida mundo afora, na voz ou nos instrumentos dos mais renomados artistas nacionais e internacionais. O brasileiro que viaja para o exterior, por exemplo, não raro a ouve em alguma requintada casa de espetáculos de Nova York, Paris, Londres ou Estocolmo e sequer se dá conta que se trata de coisa nossa, deste “país tropical, descoberto por Cabral, e bonito por natureza”. Uma pena que haja tanta desinformação.
Vira e mexe, a garotada de hoje “redescobre” esse movimento e há muito garotão de bom-gosto, de verdes dezoito anos, que passa a curtir o ritmo, como se fosse uma grande novidade, junto com o rock e outros tantos ao gosto dos adolescentes.
E por que maio, especificamente, é tido e havido pelos historiadores de música popular como o marco inicial dessa revolucionária maneira de compor, tocar e cantar? Porque foi nesse mês, no já distante (meio século) e memorável ano de 1958 (o da conquista da primeira Copa do Mundo de futebol, pelo Brasil, nos gramados da Suécia) que foi lançado, pelo selo Copacabana, o LP “Canção do amor maior”, na interpretação da que foi e é considerada (com toda justiça) a “diva” do movimento, Elizete Cardoso.
Os desinformados podem estar perguntando, ora admirados, ora irônicos: “Quem???!” Desconhecem, certamente, essa cantora, que foi mito de mais de uma geração, cujos discos venderam aos milhões e cuja voz sensual e precisa embalou muitos e muitos romances.
O repertório desse disco foi todo dedicado às composições da dupla Antonio Carlos Brasileiro Jobim e Vinicius de Moraes. Nas faixas “Chega de saudade” e “Outra vez”, a Divina foi acompanhada por ninguém menos do que João Gilberto, tido e havido como o criador dessa “batida diferente” que caracterizou a Bossa Nova.
A posteridade costuma ser cruel com os artistas de sucesso, não importa se escritores, pintores, escultores, músicos, compositores ou cantores. Tão logo morrem (e não raro ainda em vida) são esquecidos pelo público, o mesmo que se embeveceu com seu trabalho, que os aplaudiu, idolatrou e prestigiou. A fama é para lá de efêmera, embora todos a busquemos, nem que seja pelos “quinze minutos” tão amiudamente citados, de uma declaração feita pelo artista plástico “pop” norte-americano, Andy Warhol.
Os escritores (e também, diga-se de passagem, pintores e escultores) se forem bons, acabam resgatados por alguém, às vezes um século ou mais depois da sua morte, quando, então, se tornam, não raro, até muito mais populares do que quando estavam vivos. Sempre haverá algum pesquisador, ou acadêmico, ou editor que se valerá de suas obras para escrever ensaios, crônicas, teses etc. O mesmo, porém, não ocorre (e se acontecer, é extremamente raro), com cantores.
No caso de cantoras, o esquecimento é, ainda, mais contundente. A MPB teve o privilégio de contar com intérpretes sensacionais, como Ellis Regina, Linda e Dircinha Batista, Dalva de Oliveira, Carmem Miranda, Maysa Matarazzo, Dolores Duran, Silvinha Telles, Alaíde Costa, Marisa “Gata Mansa”, Isaurinha Garcia, Narinha Leão e tantas e tantas e tantas outras (os parentes das que não mencionei que me perdoem, mas minha memória é como a de todo o mundo, ou seja, falha).
Um escritor, se for razoável, ganha destaque até mesmo ainda em vida. Vejam o meu caso. Sou pouquíssimo conhecido nos meios literários (embora não seja tão anônimo assim no jornalismo e na internet). Sem ser nenhum Machado de Assis (quem me dera!) ou Rubem Braga (que pretensão a minha!), já tive textos meus usados na formulação de questões de Português, em exames vestibulares, umas três ou quatro vezes ao que saiba (e com os devidos créditos).
Aproveito para pedir escusas aos vestibulandos que eventualmente se deram mal na interpretação do que escrevi. Parodiando o narrador esportivo da Rádio Bandeirantes de Campinas, Carlos Batista (sem favor algum, um dos melhores, se não o melhor do interior), utilizo o seu bordão, um tanto modificado, para dizer: “este é o meu jeito de escrever”!
A injustiça das injustiças, no meu modo de entender, é o esquecimento popular de Elizete Cardoso. Há anos que não ouço ninguém dizer ou escrever seu nome nos meios de comunicação. Sua voz privilegiada e seu modo terno e marcante de cantar, então, pouquíssimas pessoas desta geração conhecem. Meu filho Alexei, que tem 27 anos, por exemplo, nunca tinha ouvido sequer falar da “Divina”. Quando ouviu uma de suas centenas de interpretações, se apaixonou de imediato por ela e hoje é seu fã de carteirinha.
Elizete Moreira Cardoso, para os que a desconhecem, nasceu, na cidade do Rio de Janeiro (próximo da Mangueira) em 16 de julho de 1920. Sua estréia artística foi bastante precoce, já que se deu quando sequer ainda havia completado seis anos de idade, cantando no rancho “Kananga do Japão”. E a carreira não parou (felizmente para nós, seus admiradores), nessa primeira apresentação. Cedíssimo, tomou gosto pelo sucesso e aos oito anos, já cantava, pode-se dizer, “profissionalmente”, pois se apresentava para a meninada do bairro, mas não de graça: cobrava ingresso (dez tostões) para suas apresentações, em que interpretava os sucessos da época de Vicente Celestino.
Elizete Cardoso cantou no rádio, em clubes, cinemas, circos e em todo e qualquer lugar em que houvesse alguém disposto a ouvi-la, principalmente boates, como “táxi-girl”, atividade que exerceu por muito tempo. Apareceu em vários filmes e gravou discos e mais discos, hoje autênticas preciosidades de colecionadores.
Foram incontáveis suas aparições na televisão. Foi, por exemplo, a principal estrela do programa “Bossaudade”, lançado pela TV Record em agosto de 1965 e que ficou no ar por dois anos, com enorme sucesso. Houve uma época em que Elizete chegou a ser unanimidade nacional, tida e havida como a maior intérprete brasileira de todos os tempos, amada não somente pelo público, mas no meio artístico, por praticamente todos os cantores, compositores, críticos musicais, apresentadores de rádio e televisão etc.etc.etc.
Recebeu vários e carinhosos apelidos, que dão exata amostra do seu prestígio e popularidade, como “Noiva do Samba Canção”, “Lady do Samba”, “Machado de Assis da Seresta”, “Mulata Maior” e “A Magnífica”. Mas nenhuma dessas qualificações lhe assentou tão bem como a que lhe foi dada por Haroldo Costa, de “A Divina”, que se tornou uma espécie de sobrenome de Elizete Cardoso.
Nesta ocasião, em que as pessoas de bom-gosto e sensibilidade celebram o cinqüentenário da Bossa Nova, nada mais justo, portanto, do que trazer à tona não somente o nome da verdadeira “diva” do movimento, mas, sobretudo, sua voz e suas interpretações. Está aí uma sugestão para os produtores, discotecários e apresentadores de programas musicais de rádio. Que tal programar uma apresentação especial sobre nosso mais marcante movimento musical, que completa 50 anos, tendo Elizete Cardoso como homenageada especial? “A Divina” merece não apenas essa, mas muitas e muitas outras homenagens, pelo que significou para essa bossa que nunca envelhece, mas que é e será sempre nova!
A Bossa Nova completou, em maio passado, 50 anos (nossa, como o tempo passa! Parece que foi ontem!), mas sua batida diferente, sincopada, exótica, mistura de samba e de jazz, ainda pode ser ouvida mundo afora, na voz ou nos instrumentos dos mais renomados artistas nacionais e internacionais. O brasileiro que viaja para o exterior, por exemplo, não raro a ouve em alguma requintada casa de espetáculos de Nova York, Paris, Londres ou Estocolmo e sequer se dá conta que se trata de coisa nossa, deste “país tropical, descoberto por Cabral, e bonito por natureza”. Uma pena que haja tanta desinformação.
Vira e mexe, a garotada de hoje “redescobre” esse movimento e há muito garotão de bom-gosto, de verdes dezoito anos, que passa a curtir o ritmo, como se fosse uma grande novidade, junto com o rock e outros tantos ao gosto dos adolescentes.
E por que maio, especificamente, é tido e havido pelos historiadores de música popular como o marco inicial dessa revolucionária maneira de compor, tocar e cantar? Porque foi nesse mês, no já distante (meio século) e memorável ano de 1958 (o da conquista da primeira Copa do Mundo de futebol, pelo Brasil, nos gramados da Suécia) que foi lançado, pelo selo Copacabana, o LP “Canção do amor maior”, na interpretação da que foi e é considerada (com toda justiça) a “diva” do movimento, Elizete Cardoso.
Os desinformados podem estar perguntando, ora admirados, ora irônicos: “Quem???!” Desconhecem, certamente, essa cantora, que foi mito de mais de uma geração, cujos discos venderam aos milhões e cuja voz sensual e precisa embalou muitos e muitos romances.
O repertório desse disco foi todo dedicado às composições da dupla Antonio Carlos Brasileiro Jobim e Vinicius de Moraes. Nas faixas “Chega de saudade” e “Outra vez”, a Divina foi acompanhada por ninguém menos do que João Gilberto, tido e havido como o criador dessa “batida diferente” que caracterizou a Bossa Nova.
A posteridade costuma ser cruel com os artistas de sucesso, não importa se escritores, pintores, escultores, músicos, compositores ou cantores. Tão logo morrem (e não raro ainda em vida) são esquecidos pelo público, o mesmo que se embeveceu com seu trabalho, que os aplaudiu, idolatrou e prestigiou. A fama é para lá de efêmera, embora todos a busquemos, nem que seja pelos “quinze minutos” tão amiudamente citados, de uma declaração feita pelo artista plástico “pop” norte-americano, Andy Warhol.
Os escritores (e também, diga-se de passagem, pintores e escultores) se forem bons, acabam resgatados por alguém, às vezes um século ou mais depois da sua morte, quando, então, se tornam, não raro, até muito mais populares do que quando estavam vivos. Sempre haverá algum pesquisador, ou acadêmico, ou editor que se valerá de suas obras para escrever ensaios, crônicas, teses etc. O mesmo, porém, não ocorre (e se acontecer, é extremamente raro), com cantores.
No caso de cantoras, o esquecimento é, ainda, mais contundente. A MPB teve o privilégio de contar com intérpretes sensacionais, como Ellis Regina, Linda e Dircinha Batista, Dalva de Oliveira, Carmem Miranda, Maysa Matarazzo, Dolores Duran, Silvinha Telles, Alaíde Costa, Marisa “Gata Mansa”, Isaurinha Garcia, Narinha Leão e tantas e tantas e tantas outras (os parentes das que não mencionei que me perdoem, mas minha memória é como a de todo o mundo, ou seja, falha).
Um escritor, se for razoável, ganha destaque até mesmo ainda em vida. Vejam o meu caso. Sou pouquíssimo conhecido nos meios literários (embora não seja tão anônimo assim no jornalismo e na internet). Sem ser nenhum Machado de Assis (quem me dera!) ou Rubem Braga (que pretensão a minha!), já tive textos meus usados na formulação de questões de Português, em exames vestibulares, umas três ou quatro vezes ao que saiba (e com os devidos créditos).
Aproveito para pedir escusas aos vestibulandos que eventualmente se deram mal na interpretação do que escrevi. Parodiando o narrador esportivo da Rádio Bandeirantes de Campinas, Carlos Batista (sem favor algum, um dos melhores, se não o melhor do interior), utilizo o seu bordão, um tanto modificado, para dizer: “este é o meu jeito de escrever”!
A injustiça das injustiças, no meu modo de entender, é o esquecimento popular de Elizete Cardoso. Há anos que não ouço ninguém dizer ou escrever seu nome nos meios de comunicação. Sua voz privilegiada e seu modo terno e marcante de cantar, então, pouquíssimas pessoas desta geração conhecem. Meu filho Alexei, que tem 27 anos, por exemplo, nunca tinha ouvido sequer falar da “Divina”. Quando ouviu uma de suas centenas de interpretações, se apaixonou de imediato por ela e hoje é seu fã de carteirinha.
Elizete Moreira Cardoso, para os que a desconhecem, nasceu, na cidade do Rio de Janeiro (próximo da Mangueira) em 16 de julho de 1920. Sua estréia artística foi bastante precoce, já que se deu quando sequer ainda havia completado seis anos de idade, cantando no rancho “Kananga do Japão”. E a carreira não parou (felizmente para nós, seus admiradores), nessa primeira apresentação. Cedíssimo, tomou gosto pelo sucesso e aos oito anos, já cantava, pode-se dizer, “profissionalmente”, pois se apresentava para a meninada do bairro, mas não de graça: cobrava ingresso (dez tostões) para suas apresentações, em que interpretava os sucessos da época de Vicente Celestino.
Elizete Cardoso cantou no rádio, em clubes, cinemas, circos e em todo e qualquer lugar em que houvesse alguém disposto a ouvi-la, principalmente boates, como “táxi-girl”, atividade que exerceu por muito tempo. Apareceu em vários filmes e gravou discos e mais discos, hoje autênticas preciosidades de colecionadores.
Foram incontáveis suas aparições na televisão. Foi, por exemplo, a principal estrela do programa “Bossaudade”, lançado pela TV Record em agosto de 1965 e que ficou no ar por dois anos, com enorme sucesso. Houve uma época em que Elizete chegou a ser unanimidade nacional, tida e havida como a maior intérprete brasileira de todos os tempos, amada não somente pelo público, mas no meio artístico, por praticamente todos os cantores, compositores, críticos musicais, apresentadores de rádio e televisão etc.etc.etc.
Recebeu vários e carinhosos apelidos, que dão exata amostra do seu prestígio e popularidade, como “Noiva do Samba Canção”, “Lady do Samba”, “Machado de Assis da Seresta”, “Mulata Maior” e “A Magnífica”. Mas nenhuma dessas qualificações lhe assentou tão bem como a que lhe foi dada por Haroldo Costa, de “A Divina”, que se tornou uma espécie de sobrenome de Elizete Cardoso.
Nesta ocasião, em que as pessoas de bom-gosto e sensibilidade celebram o cinqüentenário da Bossa Nova, nada mais justo, portanto, do que trazer à tona não somente o nome da verdadeira “diva” do movimento, mas, sobretudo, sua voz e suas interpretações. Está aí uma sugestão para os produtores, discotecários e apresentadores de programas musicais de rádio. Que tal programar uma apresentação especial sobre nosso mais marcante movimento musical, que completa 50 anos, tendo Elizete Cardoso como homenageada especial? “A Divina” merece não apenas essa, mas muitas e muitas outras homenagens, pelo que significou para essa bossa que nunca envelhece, mas que é e será sempre nova!
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