Monday, January 17, 2011




Sob o olhar de um gênio

Pedro J. Bondaczuk

O argentino Adolfo Bioy Casares, que faleceu em 8 de março de 1999, foi um dos mais ilustres e festejados escritores, não apenas do seu país natal (a Argentina), mas da América Latina. Quem tinha particular afeição por ele era seu não menos ilustre conterrâneo, Jorge Luís Borges, de quem, aliás, foi parceiro em obras como “Seis problemas para dom Isidro Parodi”, “Crônicas de Bustos Domecq” e “Libro del cielo e del infierno”, entre outros.
Sua vasta obra caracteriza-se pela criação de ambientes fantásticos, aos quais seu incomparável talento narrativo empresta rigorosa verossimilhança. Autor de romances como “Plan de evasión”, “El sueño de los heroes” e “Dormir al sol”, seu livro mais conhecido, pelo menos no Brasil, é, sem dúvida, “La invención de Morel”, datado de 1940.
Casares está entre os meus autores preferidos e de boa parte dos amantes de boa literatura no País. E por que escrevo tudo isso sobre esse escritor? Bem, a principal razão é porque está sendo lançado um novo livro dele, obviamente póstumo, que mostra outro lado, uma faceta desconhecida do grande público, deste magnífico intelectual: o de fotógrafo e memorialista.
Apesar da obra, intitulada “Unos dias em el Brasil (Diario de Viaje)” ter tudo a ver com nosso país (por razões óbvias), está sendo lançada, em espanhol, na Espanha (pela Editora Páginas de Espuma) e na Argentina (pela La Compañia de Buenos Aires). Logo, logo, estou certo, teremos, também, o privilégio do acesso a esse exercício memorialístico de Bioy Casares.
O escritor argentino esteve no Brasil em 1960, período bastante rico da nossa história, auge dos chamados “anos dourados” por aqui. Foi uma época de muita esperança e imensa euforia para nós, brasileiros, após a inauguração dessa ciclópica obra de Juscelino Kubitschek, que foi a construção de Brasília, tida e havida por muitos, mundo afora, como tarefa “impossível” de se realizar. Pois é, como vimos, não foi.
É interessante conhecer uma visão “de fora” dessa fase tão rica e generosa da nossa trajetória política, econômica, social e, sobretudo, cultural. Ainda mais tratando-se da de um escritor tão arguto, observador atento e detalhista e que se revelou, também, excelente fotógrafo. Casares, em sua vinda ao Brasil, esteve, a convite do PEN Clube argentino (para participar de um congresso de escritores), em São Paulo, no Rio de Janeiro e, claro, na então recém-inaugurada Brasília (e isso já faz 50 anos!).
Manteve contatos, na ocasião, com o que pode ser caracterizado como a “nata da intelectualidade brasileira”, com a qual trocou idéias sobre os destinos do seu país natal, sobre os do seu anfitrião, além dos rumos da América Latina e do mundo.
Essas conversas – como não poderia deixar de ser – suscitaram inúmeras reflexões no ilustre visitante, que teve o cuidado de anotá-las em seu diário. Essas anotações, aliás, permitiram que as lembranças que constam do livro ora lançado fossem detalhadas, precisas, quase que instantâneos daquela época. E tudo ilustrado com nove fotografias de lugares de São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília que mais lhe chamaram a atenção.
Casares, contudo, não fotografou tão pouco nessa sua viagem. “Há milhares de fotografias de Bioy em seus arquivos. Antes de morrer, ele tinha um projeto de fazer uma exposição desse material”, revelou Michel Lafon, autor do texto que acompanha o livro, em entrevista que concedeu á agência de notícias espanhola EFE.
É interessante para o público brasileiro conhecer melhor esse escritor cujo talento não foi devidamente reconhecido, por ele permanecer, por muito tempo, à sombra de Borges, a despeito de haver conquistado, em 1990, o Prêmio Cervantes. Só espero que as editoras brasileiras não tardem em se interessar por este livro e lançá-lo, devidamente traduzido, em nosso país.
Lafon observa o seguinte sobre “Unos dias em el Brasil”: “Este diário tem o objetivo íntimo e pessoal do autor para seguir transformando qualquer dia de sua vida em uma viagem e uma aventura , qualquer lugar do mundo em uma ilha encantada onde tudo é possível”.
A nós, incorrigíveis bibliófilos, não resta outra alternativa a não ser aguardar, e para o mais breve possível, o lançamento desse livro de Bioy Casares entre nós. A não ser, claro, que algum leitor generoso, que viaje para Madri ou para Buenos Aires, se antecipe, adquira a obra e tenha a generosidade de me presentear com ela. Mas aí... já é querer demais, não é mesmo? Porém... nunca se sabe!


Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk

No comments: