A “terapia” do FMI
Pedro J. Bondaczuk
A dívida externa vem submetendo a frágil democracia em alguns países da América do Sul a duros testes. Enquanto o Uruguai ensaia, timidamente, o seu retorno a um sistema de governo escolhido pelo povo, mormente após as eleições presidenciais de domingo passado, o Peru, a Bolívia, a Colômbia e o Equador estão vivendo momentos de muita tensão (e até de suspense), com sucessivas manifestações de descontentamento popular, diante de medidas saneadoras da economia, tomadas de acordo com a ortodoxa receita ditada pelo Fundo Monetário Internacional.
Parece que o FMI tem verdadeira “tara” contra salários, pois em todo o país em que fornece seu “remédio salvador”, debilita de tal forma o paciente, ao ponto de o deixar morimbundo. A fórmula desse organismo multilateral (que há muito vem requerendo adaptações aos tempos atuais), quando aplicada, traz o efeito oposto às necessidades de todos os endividados do Terceiro Mundo.
Quase a totalidade dos débitos contraídos teve o objetivo de acelerar o desenvolvimento do país tomador dos empréstimos, para queimar etapas e estreitar a diferença existente existente em relação às sociedades industrializadas. Ao recomendar um brutal “achatamento” de salários, o FMI não somente desestabiliza regimes democráticos não consolidados (afinal o continente não tem, infelizmente, tradição nessa prática), como aniquila o mercado interno dos Estados tomadores de dinheiro.
A única opção que resta para os desesperados honrarem seus compromissos com os insensíveis credores, é a de se desfazer, da melhor maneira que puderem, de suas parcas riquezas. Dessa forma, os empréstimos, de remédios salvadores, findam por se tornar em venenos letais.
Os devedores sofrem perdas crescentes e progressivas nos seus Produtos Internos Brutos e, para culminar com suas desgraças, ainda conservam o compromisso de pagar parcelas ascendentes do endividamento, já que caíram na ingenuidade de emprestar a juros flutuantes.
Isso está acontecendo, entre outros, também com o Peru. Toda a riqueza acumulada através de sua história (US$ 12 bilhões) seria insuficiente, hoje, para liquidar o principal de sua dívida, de US$ 13 bilhões. Para tentar frear uma inflação galopante, o FMI recomenda o de sempre, ou seja, um “achatamento” de salários. E o governo peruano, a ferro e fogo, obedece cegamente a essa receita suicida.
Conseqüência? Greves, passeatas, descontentamento geral e a necessidade cada vez maior do uso de instrumentos de exceção. Essa situação é campo fértil para aventureirismos ideológicos. Mas também é pretexto certo para que novos caudilhos apareçam e, sob a desculpa, velha e conhecida, de restabelecerem a ordem pública, na verdade assumam o poder, embora visivelmente não estejam preparados para o seu exercício.
E o ciclo fechamento-abertura recomeça, com raras variações de intensidade, marcando o estilo da América Latina. Que tal se os países envolvidos nessa armadilha diabólica se unissem, não apenas para terem maior poder de barganha junto aos credores, mas para que eles próprios, exclusivamente com recursos continentais, promovessem o indispensável desenvolvimento? É o mínimo que a lógica e o bom senso recomendam!
(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 29 de novembro de 1984).
Pedro J. Bondaczuk
A dívida externa vem submetendo a frágil democracia em alguns países da América do Sul a duros testes. Enquanto o Uruguai ensaia, timidamente, o seu retorno a um sistema de governo escolhido pelo povo, mormente após as eleições presidenciais de domingo passado, o Peru, a Bolívia, a Colômbia e o Equador estão vivendo momentos de muita tensão (e até de suspense), com sucessivas manifestações de descontentamento popular, diante de medidas saneadoras da economia, tomadas de acordo com a ortodoxa receita ditada pelo Fundo Monetário Internacional.
Parece que o FMI tem verdadeira “tara” contra salários, pois em todo o país em que fornece seu “remédio salvador”, debilita de tal forma o paciente, ao ponto de o deixar morimbundo. A fórmula desse organismo multilateral (que há muito vem requerendo adaptações aos tempos atuais), quando aplicada, traz o efeito oposto às necessidades de todos os endividados do Terceiro Mundo.
Quase a totalidade dos débitos contraídos teve o objetivo de acelerar o desenvolvimento do país tomador dos empréstimos, para queimar etapas e estreitar a diferença existente existente em relação às sociedades industrializadas. Ao recomendar um brutal “achatamento” de salários, o FMI não somente desestabiliza regimes democráticos não consolidados (afinal o continente não tem, infelizmente, tradição nessa prática), como aniquila o mercado interno dos Estados tomadores de dinheiro.
A única opção que resta para os desesperados honrarem seus compromissos com os insensíveis credores, é a de se desfazer, da melhor maneira que puderem, de suas parcas riquezas. Dessa forma, os empréstimos, de remédios salvadores, findam por se tornar em venenos letais.
Os devedores sofrem perdas crescentes e progressivas nos seus Produtos Internos Brutos e, para culminar com suas desgraças, ainda conservam o compromisso de pagar parcelas ascendentes do endividamento, já que caíram na ingenuidade de emprestar a juros flutuantes.
Isso está acontecendo, entre outros, também com o Peru. Toda a riqueza acumulada através de sua história (US$ 12 bilhões) seria insuficiente, hoje, para liquidar o principal de sua dívida, de US$ 13 bilhões. Para tentar frear uma inflação galopante, o FMI recomenda o de sempre, ou seja, um “achatamento” de salários. E o governo peruano, a ferro e fogo, obedece cegamente a essa receita suicida.
Conseqüência? Greves, passeatas, descontentamento geral e a necessidade cada vez maior do uso de instrumentos de exceção. Essa situação é campo fértil para aventureirismos ideológicos. Mas também é pretexto certo para que novos caudilhos apareçam e, sob a desculpa, velha e conhecida, de restabelecerem a ordem pública, na verdade assumam o poder, embora visivelmente não estejam preparados para o seu exercício.
E o ciclo fechamento-abertura recomeça, com raras variações de intensidade, marcando o estilo da América Latina. Que tal se os países envolvidos nessa armadilha diabólica se unissem, não apenas para terem maior poder de barganha junto aos credores, mas para que eles próprios, exclusivamente com recursos continentais, promovessem o indispensável desenvolvimento? É o mínimo que a lógica e o bom senso recomendam!
(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 29 de novembro de 1984).
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