Friday, October 15, 2010


É fácil dizer adeus...

Pedro J. Bondaczuk


A Seleção Brasileira estreou na Copa do Mundo da África do Sul em 15 de junho de 2010, no Estádio Ellis Park, em Johannesburgo, contra um adversário fraco, mero figurante, que fazia, apenas, sua segunda apresentação em mundiais, sem nenhuma tradição sequer em seu continente, a Ásia: a Coréia do Norte. Em meu bairro fazíamos, até, apostas sobre de quanto seria a nossa goleada. O palpite mais pessimista no bolão era o de 4 a 0 para o Brasil. Imaginem o mais otimista!
O jogo começou morno, praticamente sem nenhuma emoção e assim terminou o primeiro tempo. “Será que está pintando uma zebra?”, nos perguntamos, já um tanto apreensivos, face à falta de criatividade de nossa equipe. Passou pela cabeça de muita gente (e também da minha, confesso), a surpresa dos norte-coreanos para cima da Itália, na Copa de 1966, quando a seleção asiática humilhou a badalada azzurra.
O ambiente, porém, começou a desanuviar aos 10 minutos do segundo tempo quando Maicon, sem ângulo, desferiu um potente chute e abriu o marcador. “Ufa! Abriu a porteira. Agora é passar a boiada”, pensei. Mas essa não passou. É verdade que Elano fez o segundo aos 26 minutos, num ótimo lançamento de Robinho.
Eu estava já conformado com os 2 a 0 quando a Coréia do Norte, que marcou um único e solitário gol em toda a competição, vazou a que era tida e havida como a melhor defesa do mundo. O autor da façanha foi Ji Yun Nan, aos 43 minutos. E os norte-coreanos conseguiram, ainda, esboçar uma certa pressão, tanto que, quando o árbitro húngaro Viktor Kassai apitou o final da partida, o torcedor brasileiro respirou com alívio, mas sem esconder a decepção e a apreensão.
A escalação brasileira na estréia foi: Júlio César, Maicon, Lúcio, Juan e Michel Bastos; Felipe Melo (Ramires), Gilberto Silva, Elano (Daniel Alves); e Kaká (Nilmar); Robinho e Luís Fabiano.
Para justificar a má partida do Brasil, usou-se a mesma desculpa de sempre: nervosismo da estréia. Ganhar da Coréia do Norte por somente 2 a 1 era uma temeridade, levando-se em conta os adversários do grupo. Caso o Brasil repetisse a mesma performance contra Costa do Marfim e Portugal, corria o risco de sequer se classificar para as oitavas de final. Seria um vexame completo.
Acompanhei essa Copa em casa, sem ninguém ao meu redor para dar palpites ou fazer perguntas inoportunas (quando não cretinas). Continuava (como continuo) na Informática dos Municípios, empenhado na edição do Diário Oficial de Campinas. Recentemente, meu segundo neto, o João Vítor, havia completado seu primeiro ano de vida. Dos meus quatro filhos, três casaram e tocam suas vidas muito bem. Apenas um permanece fazendo-me companhia.
Dois novos livros meus começavam sua trajetória, ainda discretamente como ocorre com todos os lançamentos, que somente “pegam no breu” após um ou dois anos. O Literário, que esteve a pique de ser extinto, após o desligamento do Comunique-se, equilibrou-se, fortaleceu-se, incorporou novos Dom Quixotes à sua aventura maluca de veicular literatura num país com mais de 50% de analfabetos funcionais e já caminha seguro, com as próprias pernas.
Veio, como ia dizendo, o segundo jogo do Brasil, em 20 de junho, no Soccer City de Johannesburgo, perante um público de quase 85 mil pessoas. A Seleção de Dunga não poderia vacilar se não quisesse passar apuros para se classificar, empurrando a decisão da vaga para a partida seguinte contra Portugal.
O adversário, a Costa do Marfim, chegou muito badalado à África do Sul, por causa dos vários jogadores da equipe que atuam nos principais clubes da Europa. Confesso que, como a grande maioria dos brasileiros, também fiquei apreensivo. É verdade que o Brasil jamais perdeu para uma seleção africana em copas do mundo. Mas... sempre há a primeira vez.
A exibição brasileira, no entanto, foi muito melhor do que a da estréia. Não digo que tenha sido um primor, mas o time jogou direitinho. Luís Fabiano desencantou e fez um golaço aos 25 minutos do primeiro tempo. É verdade que o centroavante ajeitou a bola com o braço, e duas vezes. Mas a jogada foi tão bonita, que o árbitro francês (na verdade um baita trapalhão), Stephane Lannoy, validou o lance, para desespero dos marfinenses.
O Brasil continuou jogando bem, sem dar nenhuma chance ao adversário, que se valia da violência para deter nosso time. O mesmo Luís Fabiano fez o segundo gol brasileiro logo aos 5 minutos do segundo tempo, desta vez regularíssimo. Elano, aos 17, comprovou seu oportunismo e utilidade, fazendo o terceiro. Poucos minutos depois, contudo, sofreu uma entrada criminosa de um avante marfinense (e o árbitro sequer marcou falta no lance), que o tirou não apenas da partida, mas do restante da Copa. Foi uma tremenda baixa numa seleção que não contava com suplentes à altura dos titulares.
Haveria, ainda, a expulsão de Kaká, em outra lambança de Lannoy. O jogador brasileiro foi agredido por um marfinense, mas o árbitro viu coisa muito diferente daquela que até o mundo mineral havia testemunhado. Ou seja, interpretou que o nosso meia é que agrediu o avante da Costa do Marfim. Consequência? Cartão vermelho para Kaká (justo ele, que é um bom moço!).
Nosso melhor jogador, o único capaz de decidir, num lance individual, uma partida, ficaria, pois, de fora do confronto com Portugal. Era uma tremenda baixa, mesmo considerando-se que ele atuava nesse mundial com apenas 50% de sua capacidade física. Drogba ainda diminuiria para os marfinenses, aos 34 minutos, mas nosso adversário não teria forças pára ir além disso. E o placar ficou, mesmo, no 3 a 1.
O Brasil atuou com: Júlio César, Maicon, Lúcio, Juan e Michel Bastos; Felipe Melo, Elano (Daniel Alves), Gilberto Silva e Kaká; Luís Fabiano e Robinho (Ramires).
O adversário seguinte era Portugal, que havia feito 7 a 0 na Coréia do Norte, enquanto que nós havíamos vencido os norte-coreanos por magérrimos 2 a 1. Bastava-nos um empate para passarmos à fase seguinte e em primeiro lugar. O jogo, realizado em 25 de junho, no Estádio Moses Mabhida, em Port Elizabeth, teve a arbitragem do mexicano Benito Archundia.
O “espetáculo” foi muito ruim, do ponto de vista técnico. Brasileiros e portugueses não queriam nada com nada e o resultado não poderia ser diferente: um melancólico empate, sem que ninguém mexesse no placar. Até então, o Brasil não justificara sua condição de favorito. Mas... Quem sabe! O time de Dunga era mesmo assim: vencia, mas raramente convencia.
A seleção entrou em campo, contra Portugal, com: Júlio César, Maicon, Lucio, Juan e Michel Bastos; Daniel Alves, Felipe Melo (Josué), Gilberto Silva e Júlio Batista (Ramires); Luís Fabiano (Grafite) e Nilmar.
Aos trancos e barrancos, chegamos às oitavas de final. E nosso adversário era ninguém mais ninguém menos do que um tradicional “freguês”, quer em copas do mundo, quer em outros tipos de competição: o Chile. Os chilenos estavam com moral elevado. Foram os vice-campeões das eliminatórias sul-americanas. Nos dias que antecederam o jogo houve muito diz-que-diz-que dos chilenos, muita provocação, mas na hora da verdade... deu a lógica.
O jogo ocorreu em 28 de junho de 2010, no Estádio Elis Park, de Johannesburgo, com arbitragem do inglês Howard Webb. O Brasil não tomou conhecimento dos chilenos e, sem fazer muita força, sapecou um 3 a 0, com gols de Juan aos 34 e Luís Fabiano aos 37 do primeiro tempo e de Robinho aos 24 do segundo. Dunga mandou a campo estes jogadores: Júlio César, Maicon, Lucio, Juan e Michel Bastos; Daniel Alves, Gilberto Silva, Kaká (Kleberson) e Ramires; Luís Fabiano (Nilmar) e Robinho (Gilberto).
Bem ou mal, o fato é que o Brasil chegou às quartas de final. Teria pela frente um adversário se não de outros carnavais, pelo menos de outros mundiais: a Holanda. Em 1974, os holandeses haviam nos eliminado na Alemanha. Vinte anos depois, em 1994, nós que os eliminamos nos Estados Unidos e conquistamos o tetra. Em 1998, foi Taffarel, defendendo pênaltis, que eliminou a equipe européia. E agora, o que daria?
Na verdade, nessa copa, nenhuma das duas seleções mostrou futebol que justificasse ir tão longe na competição. Ambas jogavam com garra, com vontade e muito vigor físico, mas apenas isso não basta para um time ser campeão. E não bastou para nenhum dos dois.
O jogo aconteceu em 2 de julho, no Estádio Nelson Mandela Bay, na Cidade do Cabo, com arbitragem do japonês Yuishi Nishimura. Era um árbitro fraquinho para partida de tamanha envergadura. A Seleção Brasileira começou arrasadora e fez um primeiro tempo de entusiasmar o mais cético dos torcedores. Robinho fez um belo gol aos 10 minutos, num lançamento genial de Felipe Melo, personagem desse confronto.
Os holandeses distribuíam pancada a torto e a direito e Nishimura não estava nem aí. Alguns jogadores nossos caíram na besteira de partir para o revide e eles, sim, eram devidamente amarelados pelo horroroso árbitro japonês. Um dos que receberam o cartão amarelo foi Felipe Melo.
Todo o mundo pensou que ele seria substituído no intervalo. Não foi. Vai daí... O sujeito não é mau jogador, mas tem, digamos, apenas dois neurônios, um dos quais pifado. Numa jogada sem nenhum perigo, na lateral do campo, Felipe Melo deu um baita pisão proposital em Robben, que o vinha provocando e... não deu outra. O bananão japonês expulsou-o. É verdade que nesta ele acertou. Se com onze jogadores já estava difícil, com um a menos então a coisa pegou de vez para nós.
Só que antes de ser expulso, Felipe Melo fez a lambança mor, para a bobagem se tornar histórica e completa, marcando, aos 8 da segunda etapa, um gol contra. No lance, é mister que se diga, o melhor goleiro do mundo, Júlio César, falhou, e na hora em que o Brasil mais precisava dele. A Holanda viraria a partida, aos 23 minutos, através de Sneijder de cabeça, numa falha coletiva de toda a defesa (tida e havida como excepcional, mas que tomou dois gols de bola parada).
Daí para frente, os brasile3iros se perderam por completo em campo. Ninguém entendia ninguém. Todos queriam virar heróis e conquistar o gol de empate. O time, é verdade, não foi apático, como havia ocorrido em 2006, diante da França. Mas foi nervoso, atabalhoado, sem imaginação e nenhuma inspiração.
Kaká, mesmo sem fazer o seu melhor jogo (e muito menos um mundial brilhante), foi, disparado, o melhor jogador brasileiro contra a Holanda. Foi nessa hora que o torcedor em São Paulo, no Rio de Janeiro, em Porto Alegre, no Recife, em Belo Horizonte e em Campinas mais lamentou as ausências de Neymar, com seus dribles moleques; de Ronaldinho Gaúcho, com seus lançamentos mágicos e, sobretudo, de Paulo Henrique Ganso, com sua ousadia e passes precisos.
Essa partida me lembra a caráter uma canção da MPB, consagrada pelo cantor Miltinho, intitulada “É fácil dizer adeus”. E em copas do mundo, isso é facílimo. Por se tratar de uma copa, e não de um campeonato, não há como recuperar-se de uma jornada infeliz, de uma derrota não prevista, num jogo naqueles dias em que nada dá certo. Foi o que aconteceu com o Brasil na África do Sul. E o árbitro japonês... (que horror!) se não foi responsável por esse nosso fracasso, deu lá sua contribuição para isso.
O Brasil disse adeus à Copa da África do Sul com: Júlio César, Maicon, Lúcio, Juan e Michel Bastos; Gilberto (Daniel Alves), Felipe Melo, Gilberto Silva e Kaká; Luís Fabiano (Nilmar) e Robinho.
Fica, agora, a expectativa de um reencontro da nossa seleção com seu verdadeiro futebol. Não esse que vem jogando de 1990 para cá, imitando o que se faz na Europa. O que se reivindica é aquela forma de jogar toda nossa, eficiente fulminante, mas simultaneamente moleque e alegre como uma roda de samba, aquela que assombrou e que encantou o mundo e em cinco ocasiões conquistou o topo do pódio, fazendo do Brasil o maior campeão de todos os tempos. Tornaremos a rever nosso autêntico futebol em 2014? É Mano Menezes que está com a palavra. Ou melhor, está com a ação.

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