Thomaz Perina vive na memória
Pedro J. Bondaczuk
O artista, qualquer que seja sua arte, desenvolve com anos de exercício a aptidão de explorar sutilmente o subconsciente à cata de emoções que lhe sirvam de matéria-prima para maravilhosas obras. Sons, imagens, odores, sensações agradáveis ditadas pelos cinco sentidos etc. são transformados por esses magos criadores (que valorizam e dão nobreza à vida humana) em melodias, telas, esculturas ou palavras que formam metáforas bem ajustadas e harmoniosas. Com o talento de que são dotados, nos transmitem suas emoções, às quais agregamos as nossas, ditadas por nossa própria experiência pessoal.
Os grandes artistas tendem a exercer uma influência decisiva na formação da nossa personalidade e caráter, permitindo-nos conhecer situações, comportamentos e circunstâncias os mais diversos e extremos, sem que precisemos passar por essas experiências pessoalmente. E quando algo análogo ao que tratam nos ocorre, contamos com caminhos e alternativas já conhecidos para sairmos de enrascadas ou para usufruirmos plenamente os episódios benignos e favoráveis que surgirem.
Os grandes artistas estabelecem, sobretudo, sua identidade, que refletem nas obras que criam. Generosos, nos ofertam a possibilidade de libertação do espaço, do tempo e até da morte que, se não a evitam (e não nos ensinam a evitar, pois é inevitável) sugerem como aceitá-la serenamente, como realidade impossível de ser mudada.
Um desses criadores de beleza e transcendência foi, sem dúvida, o campineiro Thomaz Perina, que nos deixou num 28 de novembro de 2009, prestes a completar 89 anos de idade, vividos plena e produtivamente. Legou-nos uma obra magnífica e consolidada. Para que os leitores tenham uma idéia, basta informar que, além de centenas e centenas de obras vendidas, que hoje constam das melhores galerias e mais sofisticadas e completas coleções particulares, seu acervo pessoal ainda é formado por cerca de duas mil peças!!! Trata-se, como se vê, de intensíssima produção que se notabilizou não apenas pela quantidade (imensa, como se vê) mas, sobretudo, pela qualidade.
Thomaz Perina foi uma figura queridíssima na cidade em que nasceu e sempre viveu. Conquistou simpatia e admiração por onde passou. Para que sua memória não morresse com ele, parentes, amigos, discípulos e admiradores criaram o instituto que ostenta o seu nome. Nada mais justo e meritório. E, justamente na véspera do aniversário da sua morte, a instituição inaugurou sua sede própria, que irá centralizar exposições, palestras e outros tantos eventos alusivos ao notável artista plástico. Fui convidado para a inauguração, mas compromissos inadiáveis impediram-me de estar presente. Peço desculpas aos dirigentes do instituto. Ainda assim... estive lá, posto que em espírito.
Ademais, não me faltarão oportunidades para visitar a sede do Instituto Thomaz Perina, já que esta fica a apenas dois quarteirões da minha casa, na Rua Santo Antonio Claret, 229, no bairro do Castelo, aqui em Campinas. Na cerimônia de ontem, foram abertas duas exposições. A primeira leva o título de “Retratos de Perina, olhares sob a forma de arte”, que é uma seleção de obras de diversos autores e realizadas em técnicas variadas, para retratar a imagem e a personalidade do notável artista homenageado. A segunda intitula-se “O restauro do livro de Thomaz Perina”. É uma exposição sobre o processo de restauração do “Livrão”, ou seja, do livro que o artista elaborou de 1949 a 1999.
Mais dois eventos foram realizados, um no dia 28 de novembro e outro no dia 29. O primeiro foi a missa rezada às 9h30 em memória de Thomaz Perina, na Catedral Metropolitana de Campinas. No dia 29 ocorre palestra, na sede recém-inaugurada do instituto. A palestrante será a museóloga especialista em restauro de papéis e bens culturais e mestre em Ciência da Informação, professora Ingrid Beck. O tema a ser abordado é “O restauro do livro de Perina”.
Não cabe, aqui, reproduzir a biografia desse célebre artista plástico (quem é entendido nesse tipo de arte sabe, de sobejo, de quem se trata), mas nunca é demais dar uma ou outra referência aos que o desconhecem. A jornalista Maria Alice Cruz (que saudade, querida!), em matéria que publicou no “Jornal da Unicamp”, edição de 9 a 14 de novembro, intitulada “Os caminhos de Perina”, escreve em determinado trecho: “Na infância, Thomaz Perina gostava de desenhar na rua de sua casa, bem na frente da sua porta, na Vila Industrial, para ouvir os comentários elogiosos dos funcionários das fábricas que passavam por lá na volta do trabalho. Logo, o traço leve do artista migrou do chão de terra para o papel, mas sem deixar de lado a imagem da cidade de Campinas, especialmente a região da Vila Industrial, onde viveu todos os dias da sua vida”.
Thomaz Perina nunca freqüentou nenhuma escola de arte. Seu talento é inato, puro, brotado da alma. Pelo contrário, ele foi, na verdade, um grande mestre para toda uma geração de ótimos artistas plásticos campineiros. Ele próprio comentou o seguinte, a respeito, em uma de suas derradeiras entrevistas: “Por ser autodidata, não tenho formulações teóricas. Com elementos simples, com tratamentos simples, reduzindo a cor a um estado quase neutro, busco uma dimensão, um movimento por percepção, induzindo a relação da paisagem, nome que dou aos meus trabalhos, não só como indicação de um problema, mas também por caráter afetivo”.
Quem quiser conhecer mais a respeito de Thomaz Perina – e asseguro que vale a pena por se tratar, sem favor algum, de um dos melhores e mais apreciados artistas plásticos brasileiros de todos os tempos, com inúmeras exposições e prêmios, quer no Brasil, quer no Exterior, em seu currículo – não pode deixar de adquirir o super-hiper-mega-tera e todos os superlativos que vocês imaginarem bem produzido DVD intitulado “Eu quero o mínimno para falar – Trajetória de Thomaz Perina”, patrocinado pela “CPFL Cultura”, gravado antes que se manifestasse a doença que findou por matar o querido e saudoso artista. Basta entrar em contato ou com o Instituto Thomaz Perina ou com o Departamento de Cultura da Companhia Paulista de Força e Luz, em sua sede de Campinas. Eu tenho esse DVD, assisti-o muitas veze4s e considero-o uma das peças mais preciosas do meu (já considerável) acervo de arte.
Uma das coisas que eu mais quis ser na vida foi artista plástico, embora almejasse, também, ser músico (e médico, e piloto de avião e jogador de futebol). Não fui nem uma coisa e nem outra. Admiro demais tudo o que não consigo fazer. Respeito e valorizo quem faz (desde que sua obra seja realizada com conhecimento de causa, talento e, sobretudo, com competência). O fato de eu não praticar determinada arte não implica em que eu a desconheça ou não a aprecie. Muitíssimo pelo contrário. Fiz, por exemplo, curso de artes plásticas, embora não para ser artista de modalidade (para a qual, reitero, não tenho o mais remoto talento), mas para fundamentar comentários na qualidade de crítico de arte. Thomaz Perina encerrou a última entrevista que concedeu aos meios de comunicação (foi à EPTV, em janeiro de 2009), com este desabafo, em tom de queixa: “Eu só pinto nesta vida!!!”. E seria preciso fazer mais alguma coisa, dotado de tamanho talento e magia como foi?!!!! Ora, ora, ora. Claro que não!!!
Acompanhe-me no twitter: @bondaczuk
Pedro J. Bondaczuk
O artista, qualquer que seja sua arte, desenvolve com anos de exercício a aptidão de explorar sutilmente o subconsciente à cata de emoções que lhe sirvam de matéria-prima para maravilhosas obras. Sons, imagens, odores, sensações agradáveis ditadas pelos cinco sentidos etc. são transformados por esses magos criadores (que valorizam e dão nobreza à vida humana) em melodias, telas, esculturas ou palavras que formam metáforas bem ajustadas e harmoniosas. Com o talento de que são dotados, nos transmitem suas emoções, às quais agregamos as nossas, ditadas por nossa própria experiência pessoal.
Os grandes artistas tendem a exercer uma influência decisiva na formação da nossa personalidade e caráter, permitindo-nos conhecer situações, comportamentos e circunstâncias os mais diversos e extremos, sem que precisemos passar por essas experiências pessoalmente. E quando algo análogo ao que tratam nos ocorre, contamos com caminhos e alternativas já conhecidos para sairmos de enrascadas ou para usufruirmos plenamente os episódios benignos e favoráveis que surgirem.
Os grandes artistas estabelecem, sobretudo, sua identidade, que refletem nas obras que criam. Generosos, nos ofertam a possibilidade de libertação do espaço, do tempo e até da morte que, se não a evitam (e não nos ensinam a evitar, pois é inevitável) sugerem como aceitá-la serenamente, como realidade impossível de ser mudada.
Um desses criadores de beleza e transcendência foi, sem dúvida, o campineiro Thomaz Perina, que nos deixou num 28 de novembro de 2009, prestes a completar 89 anos de idade, vividos plena e produtivamente. Legou-nos uma obra magnífica e consolidada. Para que os leitores tenham uma idéia, basta informar que, além de centenas e centenas de obras vendidas, que hoje constam das melhores galerias e mais sofisticadas e completas coleções particulares, seu acervo pessoal ainda é formado por cerca de duas mil peças!!! Trata-se, como se vê, de intensíssima produção que se notabilizou não apenas pela quantidade (imensa, como se vê) mas, sobretudo, pela qualidade.
Thomaz Perina foi uma figura queridíssima na cidade em que nasceu e sempre viveu. Conquistou simpatia e admiração por onde passou. Para que sua memória não morresse com ele, parentes, amigos, discípulos e admiradores criaram o instituto que ostenta o seu nome. Nada mais justo e meritório. E, justamente na véspera do aniversário da sua morte, a instituição inaugurou sua sede própria, que irá centralizar exposições, palestras e outros tantos eventos alusivos ao notável artista plástico. Fui convidado para a inauguração, mas compromissos inadiáveis impediram-me de estar presente. Peço desculpas aos dirigentes do instituto. Ainda assim... estive lá, posto que em espírito.
Ademais, não me faltarão oportunidades para visitar a sede do Instituto Thomaz Perina, já que esta fica a apenas dois quarteirões da minha casa, na Rua Santo Antonio Claret, 229, no bairro do Castelo, aqui em Campinas. Na cerimônia de ontem, foram abertas duas exposições. A primeira leva o título de “Retratos de Perina, olhares sob a forma de arte”, que é uma seleção de obras de diversos autores e realizadas em técnicas variadas, para retratar a imagem e a personalidade do notável artista homenageado. A segunda intitula-se “O restauro do livro de Thomaz Perina”. É uma exposição sobre o processo de restauração do “Livrão”, ou seja, do livro que o artista elaborou de 1949 a 1999.
Mais dois eventos foram realizados, um no dia 28 de novembro e outro no dia 29. O primeiro foi a missa rezada às 9h30 em memória de Thomaz Perina, na Catedral Metropolitana de Campinas. No dia 29 ocorre palestra, na sede recém-inaugurada do instituto. A palestrante será a museóloga especialista em restauro de papéis e bens culturais e mestre em Ciência da Informação, professora Ingrid Beck. O tema a ser abordado é “O restauro do livro de Perina”.
Não cabe, aqui, reproduzir a biografia desse célebre artista plástico (quem é entendido nesse tipo de arte sabe, de sobejo, de quem se trata), mas nunca é demais dar uma ou outra referência aos que o desconhecem. A jornalista Maria Alice Cruz (que saudade, querida!), em matéria que publicou no “Jornal da Unicamp”, edição de 9 a 14 de novembro, intitulada “Os caminhos de Perina”, escreve em determinado trecho: “Na infância, Thomaz Perina gostava de desenhar na rua de sua casa, bem na frente da sua porta, na Vila Industrial, para ouvir os comentários elogiosos dos funcionários das fábricas que passavam por lá na volta do trabalho. Logo, o traço leve do artista migrou do chão de terra para o papel, mas sem deixar de lado a imagem da cidade de Campinas, especialmente a região da Vila Industrial, onde viveu todos os dias da sua vida”.
Thomaz Perina nunca freqüentou nenhuma escola de arte. Seu talento é inato, puro, brotado da alma. Pelo contrário, ele foi, na verdade, um grande mestre para toda uma geração de ótimos artistas plásticos campineiros. Ele próprio comentou o seguinte, a respeito, em uma de suas derradeiras entrevistas: “Por ser autodidata, não tenho formulações teóricas. Com elementos simples, com tratamentos simples, reduzindo a cor a um estado quase neutro, busco uma dimensão, um movimento por percepção, induzindo a relação da paisagem, nome que dou aos meus trabalhos, não só como indicação de um problema, mas também por caráter afetivo”.
Quem quiser conhecer mais a respeito de Thomaz Perina – e asseguro que vale a pena por se tratar, sem favor algum, de um dos melhores e mais apreciados artistas plásticos brasileiros de todos os tempos, com inúmeras exposições e prêmios, quer no Brasil, quer no Exterior, em seu currículo – não pode deixar de adquirir o super-hiper-mega-tera e todos os superlativos que vocês imaginarem bem produzido DVD intitulado “Eu quero o mínimno para falar – Trajetória de Thomaz Perina”, patrocinado pela “CPFL Cultura”, gravado antes que se manifestasse a doença que findou por matar o querido e saudoso artista. Basta entrar em contato ou com o Instituto Thomaz Perina ou com o Departamento de Cultura da Companhia Paulista de Força e Luz, em sua sede de Campinas. Eu tenho esse DVD, assisti-o muitas veze4s e considero-o uma das peças mais preciosas do meu (já considerável) acervo de arte.
Uma das coisas que eu mais quis ser na vida foi artista plástico, embora almejasse, também, ser músico (e médico, e piloto de avião e jogador de futebol). Não fui nem uma coisa e nem outra. Admiro demais tudo o que não consigo fazer. Respeito e valorizo quem faz (desde que sua obra seja realizada com conhecimento de causa, talento e, sobretudo, com competência). O fato de eu não praticar determinada arte não implica em que eu a desconheça ou não a aprecie. Muitíssimo pelo contrário. Fiz, por exemplo, curso de artes plásticas, embora não para ser artista de modalidade (para a qual, reitero, não tenho o mais remoto talento), mas para fundamentar comentários na qualidade de crítico de arte. Thomaz Perina encerrou a última entrevista que concedeu aos meios de comunicação (foi à EPTV, em janeiro de 2009), com este desabafo, em tom de queixa: “Eu só pinto nesta vida!!!”. E seria preciso fazer mais alguma coisa, dotado de tamanho talento e magia como foi?!!!! Ora, ora, ora. Claro que não!!!
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