Somos visionários
Pedro J. Bondaczuk
Nós, escritores, sem exceção, somos todos visionários. Mesmo que digamos o contrário, acreditamos num mundo melhor, em que a justiça social, a solidariedade e o amor imperem em todas as ocasiões. Mesmo os que aparentam ser rigorosamente céticos, que se mostrem empedernidos pessimistas, na verdade não o são. Se fossem, sequer escreveriam e nem publicariam livros. Para que, se tudo vai acabar? Para que, se num futuro não haverá quem os leia? O simples ato de escrever (e de publicar) é, pois, manifestação explícita, posto que inconsciente, de esperança.
Fôssemos mesmo os realistas que tanto nos preocupamos em apregoar, não faríamos nada que não fosse determinado, única e exclusivamente, por nosso instinto de sobrevivência. Seríamos tomados por uma irremovível catatonia e não moveríamos uma única palha para ajudar a quem quer que fosse. Viveríamos na base do “cada qual por si”. Aliás, a humanidade, em certa medida, age assim, mas, felizmente, há exceções e nós, escritores, estamos entre estas.
Raciocinem comigo. O Planeta se decompõe a olhos vistos, sob os narizes de todos (e claro, dos nossos) e tudo indica que nos encaminhamos para uma catástrofe de proporções imprevisíveis (e, talvez, definitiva). E o que fazemos face à realidade (isto sim é real)? Arranjamos argumentos e mais argumentos para tentar mostrar que as coisas não são bem assim, que os alertas dos especialistas sobre as mudanças climáticas não passam de alarmismo, de um histérico surto de catastrofismo e projetamos sociedades ideais para o futuro, que, a rigor, nem sabemos se teremos (tanto um futuro, quanto uma sociedade).
E por que agimos dessa maneira? Por alienação? Por irresponsabilidade? Por que o instinto tânico, o de destruição, sobrepuja o erótico, o de conservação da espécie? Não, não e não. Porque no fundo das nossas almas, bem no âmago do nosso cérebro, a chama da esperança arde viva e incólume, sem o mínimo risco de se apagar.
Visualizamos uma sociedade ideal, em que não haja triliardários e nem miseráveis. Inconscientemente, somos arautos de um mundo sem opressores e nem oprimidos cuja lei maior seja a irrestrita solidariedade e cuja “Constituição” se restrinja ao amor. Claro que isso não irá acontecer. Muitas vezes, até explicitamos isso em nossos textos. Mas acreditamos nisso? Não, não e não. Se acreditássemos, deixaríamos de escrever e de publicar nossos livros.
Bem que poderia se aplicar a nós a caracterização que o saudoso presidente eleito brasileiro Tancredo Neves (que sequer chegou a tomar posse) atribuiu, um dia, a Tiradentes, ao afirmar que se tratava de um herói “enlouquecido de esperança”. É assim que nós estamos. Ou seja, “enlouquecidos de esperança”.
Faço essa afirmação sem nenhum receio de ser contestado ou de cair em ridículo. Baseio-me em intensa leitura, principalmente de livros aparentemente de um mortal pessimismo que, analisados a fundo, mostram, nas entrelinhas, que o autor não acredita de fato nas previsões catastróficas que faz. O próprio fato de escrevê-los desmente suas palavras, amargas e desiludidas.
Como aceitar que meia dúzia de privilegiados, iguaizinhos a nós em tudo, tão mortais quanto nós, tenham fortunas incalculáveis e absurdas, equivalentes à de países inteiros, enquanto há tantos miseráveis mundo afora, que não possuem sequer os miseráveis andrajos que vestem, sobrevivendo ao deus-dará em abarrotados acampamentos de refugiados (e, muitas vezes, nem isso), à mercê da caridade alheia?
Por que isso acontece? Por que consideramos que essa situação seja “normal”, já que não movemos uma única palha para alterá-la? E pensar que o triliardário irá morrer, da mesma forma que o miserável, que seu corpo irá se decompor igualzinho ao dele e que o cheiro de podridão daí resultante não será o de rosas, mas de carne em decomposição, acre e nauseabundo. E, ainda assim, temos esperanças.
Somos, como me autodefini em uma crônica recente, “contraditórios e múltiplos”. Não temos o menor motivo para esperar um mundo ideal, vemos isso, estamos conscientes disso, a realidade, a todo o momento, nos esfrega isso no nariz, mas, no entanto... Esperamos.
Batalhamos, mesmo que inconscientemente, por essa sociedade ideal. Estamos, na verdade, “enlouquecidos de esperança” e nossas manifestações de pessimismo são, no fundo no fundo, meras manifestações de impaciência face à demora da concretização do que idealizamos. Somos ou não somos, pois, rematados e incorrigíveis visionários?!
Pedro J. Bondaczuk
Nós, escritores, sem exceção, somos todos visionários. Mesmo que digamos o contrário, acreditamos num mundo melhor, em que a justiça social, a solidariedade e o amor imperem em todas as ocasiões. Mesmo os que aparentam ser rigorosamente céticos, que se mostrem empedernidos pessimistas, na verdade não o são. Se fossem, sequer escreveriam e nem publicariam livros. Para que, se tudo vai acabar? Para que, se num futuro não haverá quem os leia? O simples ato de escrever (e de publicar) é, pois, manifestação explícita, posto que inconsciente, de esperança.
Fôssemos mesmo os realistas que tanto nos preocupamos em apregoar, não faríamos nada que não fosse determinado, única e exclusivamente, por nosso instinto de sobrevivência. Seríamos tomados por uma irremovível catatonia e não moveríamos uma única palha para ajudar a quem quer que fosse. Viveríamos na base do “cada qual por si”. Aliás, a humanidade, em certa medida, age assim, mas, felizmente, há exceções e nós, escritores, estamos entre estas.
Raciocinem comigo. O Planeta se decompõe a olhos vistos, sob os narizes de todos (e claro, dos nossos) e tudo indica que nos encaminhamos para uma catástrofe de proporções imprevisíveis (e, talvez, definitiva). E o que fazemos face à realidade (isto sim é real)? Arranjamos argumentos e mais argumentos para tentar mostrar que as coisas não são bem assim, que os alertas dos especialistas sobre as mudanças climáticas não passam de alarmismo, de um histérico surto de catastrofismo e projetamos sociedades ideais para o futuro, que, a rigor, nem sabemos se teremos (tanto um futuro, quanto uma sociedade).
E por que agimos dessa maneira? Por alienação? Por irresponsabilidade? Por que o instinto tânico, o de destruição, sobrepuja o erótico, o de conservação da espécie? Não, não e não. Porque no fundo das nossas almas, bem no âmago do nosso cérebro, a chama da esperança arde viva e incólume, sem o mínimo risco de se apagar.
Visualizamos uma sociedade ideal, em que não haja triliardários e nem miseráveis. Inconscientemente, somos arautos de um mundo sem opressores e nem oprimidos cuja lei maior seja a irrestrita solidariedade e cuja “Constituição” se restrinja ao amor. Claro que isso não irá acontecer. Muitas vezes, até explicitamos isso em nossos textos. Mas acreditamos nisso? Não, não e não. Se acreditássemos, deixaríamos de escrever e de publicar nossos livros.
Bem que poderia se aplicar a nós a caracterização que o saudoso presidente eleito brasileiro Tancredo Neves (que sequer chegou a tomar posse) atribuiu, um dia, a Tiradentes, ao afirmar que se tratava de um herói “enlouquecido de esperança”. É assim que nós estamos. Ou seja, “enlouquecidos de esperança”.
Faço essa afirmação sem nenhum receio de ser contestado ou de cair em ridículo. Baseio-me em intensa leitura, principalmente de livros aparentemente de um mortal pessimismo que, analisados a fundo, mostram, nas entrelinhas, que o autor não acredita de fato nas previsões catastróficas que faz. O próprio fato de escrevê-los desmente suas palavras, amargas e desiludidas.
Como aceitar que meia dúzia de privilegiados, iguaizinhos a nós em tudo, tão mortais quanto nós, tenham fortunas incalculáveis e absurdas, equivalentes à de países inteiros, enquanto há tantos miseráveis mundo afora, que não possuem sequer os miseráveis andrajos que vestem, sobrevivendo ao deus-dará em abarrotados acampamentos de refugiados (e, muitas vezes, nem isso), à mercê da caridade alheia?
Por que isso acontece? Por que consideramos que essa situação seja “normal”, já que não movemos uma única palha para alterá-la? E pensar que o triliardário irá morrer, da mesma forma que o miserável, que seu corpo irá se decompor igualzinho ao dele e que o cheiro de podridão daí resultante não será o de rosas, mas de carne em decomposição, acre e nauseabundo. E, ainda assim, temos esperanças.
Somos, como me autodefini em uma crônica recente, “contraditórios e múltiplos”. Não temos o menor motivo para esperar um mundo ideal, vemos isso, estamos conscientes disso, a realidade, a todo o momento, nos esfrega isso no nariz, mas, no entanto... Esperamos.
Batalhamos, mesmo que inconscientemente, por essa sociedade ideal. Estamos, na verdade, “enlouquecidos de esperança” e nossas manifestações de pessimismo são, no fundo no fundo, meras manifestações de impaciência face à demora da concretização do que idealizamos. Somos ou não somos, pois, rematados e incorrigíveis visionários?!
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