Admirável paixão que contagia
Pedro J. Bondaczuk
O jovem colunista do Literário, Fernando Narciso Silveira, encerra a entrevista que concedeu a esta revista eletrônica recomendando o seguinte: “Façam o que quiserem de suas vidas, mas façam com convicção e paixão”. Achei essa recomendação tão pertinente, lúcida e madura, que a escolhi como título dessa matéria e não fiz nada mais do que o óbvio. É exatamente isso o que se espera de escritores e, por extensão, de todos os agentes literários (incluindo, claro, os leitores) e por maior extensão ainda, de todas as pessoas de bom-senso, não importando a atividade que exerçam.
É isso aí, Fernando. Convicção e paixão são as principais estratégias dos vencedores. É verdade que nem todos se apaixonam pelo que lhes seja adequado, conveniente ou mesmo útil. Há quem nutra, por exemplo, fanática paixão por clubes de futebol e fazem dela a razão de ser de suas vidas. Não passam de tolos, de rematados imbecis, de alienados.
Há, ainda, quem se apaixone por mulheres que nem sabem que esses indivíduos existem e que não lhes correspondem e nunca corresponderão nem um pouco. Há inúmeros desses casos por aí. Mas não é dessa paixão que vou tratar.
É de uma que também me empolga e da qual, sejam quais forem as circunstâncias, jamais abrirei mão: a da Literatura. A do mundo das letras e das idéias. A que tenho pela leitura e, por conseqüência, pela escrita. Vocês, que me acompanham fielmente nesta trajetória, certamente a compartilham comigo. Afinal, ela contagia. Mas é um contágio benigno, útil, desejável e compensador.
O Brasil (e, por extensão, o mundo) acaba de perder um dos maiores apaixonados por livros que já tive a oportunidade de conhecer. José Mindlin, o maior bibliófilo brasileiro, morreu, em 28 de fevereiro de 2010, aos 95 anos de idade, em São Paulo.
Ao longo da vida, esse homem culto e de bom-gosto comprou por volta de 40 mil livros, a maioria dos quais preciosidades, não só pela raridade (e, portanto, com imenso valor histórico), mas, e sobretudo, pelo conteúdo.
Foi, sem dúvida, sujeito de bom-gosto e vencedor por qualquer aspecto que se encare a palavra “vitória”. Mindlin era filho de imigrantes ucranianos (de ascendência eslava, como eu, que sou filho de russos), que vieram para o Brasil tentar a sorte no Novo Mundo, repleto de desafios, mas também de oportunidades.
Como empresário, destacou-se pelo tirocínio no comando da sua empresa, a Metal Leve, conceituada indústria de autopeças. Mas o que o destacou na sociedade e projetou-o em todo o Brasil, tornando-o figura ímpar, conhecidíssima (e admirada) do público, foi uma paixão. Ou seja, seu profundo amor pelos livros.
Por isso, a Academia Brasileira de Letras inovou e fez o que até então nenhuma congênere havia feito (e não tenho notícia de que qualquer outra, em qualquer tempo, o fez). Embora José Mindlin nunca tenha publicado um só livro (se escreveu algum, ou não, que tenha permanecido inédito, não se sabe) recebeu-o, de braços abertos, pelo voto da maioria dos acadêmicos, no ano de 2006, para ocupar uma das suas cadeiras. E foi, justamente, a de número 29, que anteriormente havia sido ocupada por um dos seus ex-presidentes, ninguém menos que o consagrado escritor Josué Montelo (do qual sempre fui fidelíssimo leitor), autor do romance “Os tambores de São Luís”, entre tantas obras notáveis. Nada mais justo, convenhamos.
Felizmente, sua preciosa, inestimável e rica biblioteca não corre qualquer risco de se dispersar, se deteriorar, se avariar ou se perder. Não vai acontecer com ela o que ocorreu com outras tantas, de vários intelectuais, vendidas por míseros tostões por herdeiros imbecis como “papéis velhos”, com algumas das preciosidades transacionadas a “quilos” para e por sebos e outras, nem isso.
A de José Mindlin, todavia, será preservada total e integralmente. Ele, inteligentemente (e quem lê tanto e nutre tamanha paixão por livros só pode ser inteligente, e mais do que isso, genial), doou-a, em 2006, à Universidade de São Paulo, onde anos antes havia estudado e se formado em Direito. E a USP, fazendo jus ao prestígio que goza, vem sabendo valorizar devidamente esse riquíssimo acervo, esse patrimônio cultural sem preço (como eu gostaria que fosse meu!!!!). Há já algum tempo, cada livro da biblioteca de José Mindlin vem sendo digitalizado, para que, em breve, nós, internautas, ávidos por boa literatura, tenhamos acesso a essa incomparável riqueza intelectual.
Esta, como se vê (e se exagerei, foi para menos) uma admirável, admirabilíssima e saudável paixão. Que ela nos contagie e se espalhe, como “pandemia”, por todo o País, fazendo do Brasil um lugar cada vez melhor (já é ótimo em uma infinidade de aspectos!) para se estudar, trabalhar e viver.
Pedro J. Bondaczuk
O jovem colunista do Literário, Fernando Narciso Silveira, encerra a entrevista que concedeu a esta revista eletrônica recomendando o seguinte: “Façam o que quiserem de suas vidas, mas façam com convicção e paixão”. Achei essa recomendação tão pertinente, lúcida e madura, que a escolhi como título dessa matéria e não fiz nada mais do que o óbvio. É exatamente isso o que se espera de escritores e, por extensão, de todos os agentes literários (incluindo, claro, os leitores) e por maior extensão ainda, de todas as pessoas de bom-senso, não importando a atividade que exerçam.
É isso aí, Fernando. Convicção e paixão são as principais estratégias dos vencedores. É verdade que nem todos se apaixonam pelo que lhes seja adequado, conveniente ou mesmo útil. Há quem nutra, por exemplo, fanática paixão por clubes de futebol e fazem dela a razão de ser de suas vidas. Não passam de tolos, de rematados imbecis, de alienados.
Há, ainda, quem se apaixone por mulheres que nem sabem que esses indivíduos existem e que não lhes correspondem e nunca corresponderão nem um pouco. Há inúmeros desses casos por aí. Mas não é dessa paixão que vou tratar.
É de uma que também me empolga e da qual, sejam quais forem as circunstâncias, jamais abrirei mão: a da Literatura. A do mundo das letras e das idéias. A que tenho pela leitura e, por conseqüência, pela escrita. Vocês, que me acompanham fielmente nesta trajetória, certamente a compartilham comigo. Afinal, ela contagia. Mas é um contágio benigno, útil, desejável e compensador.
O Brasil (e, por extensão, o mundo) acaba de perder um dos maiores apaixonados por livros que já tive a oportunidade de conhecer. José Mindlin, o maior bibliófilo brasileiro, morreu, em 28 de fevereiro de 2010, aos 95 anos de idade, em São Paulo.
Ao longo da vida, esse homem culto e de bom-gosto comprou por volta de 40 mil livros, a maioria dos quais preciosidades, não só pela raridade (e, portanto, com imenso valor histórico), mas, e sobretudo, pelo conteúdo.
Foi, sem dúvida, sujeito de bom-gosto e vencedor por qualquer aspecto que se encare a palavra “vitória”. Mindlin era filho de imigrantes ucranianos (de ascendência eslava, como eu, que sou filho de russos), que vieram para o Brasil tentar a sorte no Novo Mundo, repleto de desafios, mas também de oportunidades.
Como empresário, destacou-se pelo tirocínio no comando da sua empresa, a Metal Leve, conceituada indústria de autopeças. Mas o que o destacou na sociedade e projetou-o em todo o Brasil, tornando-o figura ímpar, conhecidíssima (e admirada) do público, foi uma paixão. Ou seja, seu profundo amor pelos livros.
Por isso, a Academia Brasileira de Letras inovou e fez o que até então nenhuma congênere havia feito (e não tenho notícia de que qualquer outra, em qualquer tempo, o fez). Embora José Mindlin nunca tenha publicado um só livro (se escreveu algum, ou não, que tenha permanecido inédito, não se sabe) recebeu-o, de braços abertos, pelo voto da maioria dos acadêmicos, no ano de 2006, para ocupar uma das suas cadeiras. E foi, justamente, a de número 29, que anteriormente havia sido ocupada por um dos seus ex-presidentes, ninguém menos que o consagrado escritor Josué Montelo (do qual sempre fui fidelíssimo leitor), autor do romance “Os tambores de São Luís”, entre tantas obras notáveis. Nada mais justo, convenhamos.
Felizmente, sua preciosa, inestimável e rica biblioteca não corre qualquer risco de se dispersar, se deteriorar, se avariar ou se perder. Não vai acontecer com ela o que ocorreu com outras tantas, de vários intelectuais, vendidas por míseros tostões por herdeiros imbecis como “papéis velhos”, com algumas das preciosidades transacionadas a “quilos” para e por sebos e outras, nem isso.
A de José Mindlin, todavia, será preservada total e integralmente. Ele, inteligentemente (e quem lê tanto e nutre tamanha paixão por livros só pode ser inteligente, e mais do que isso, genial), doou-a, em 2006, à Universidade de São Paulo, onde anos antes havia estudado e se formado em Direito. E a USP, fazendo jus ao prestígio que goza, vem sabendo valorizar devidamente esse riquíssimo acervo, esse patrimônio cultural sem preço (como eu gostaria que fosse meu!!!!). Há já algum tempo, cada livro da biblioteca de José Mindlin vem sendo digitalizado, para que, em breve, nós, internautas, ávidos por boa literatura, tenhamos acesso a essa incomparável riqueza intelectual.
Esta, como se vê (e se exagerei, foi para menos) uma admirável, admirabilíssima e saudável paixão. Que ela nos contagie e se espalhe, como “pandemia”, por todo o País, fazendo do Brasil um lugar cada vez melhor (já é ótimo em uma infinidade de aspectos!) para se estudar, trabalhar e viver.
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