Sunday, October 04, 2009

DIRETO DO ARQUIVO


Década pode ser das mudanças

Pedro J. Bondaczuk


A derradeira década deste milênio, a julgar pelo panorama que se desenha, vai ter como principal característica a mudança, depois de um longo período de estagnação do pós-guerra, quando vencedores e vencidos curavam as suas feridas e tratavam de reconstruir o que foi destruído. Tais reformas, no entanto, que ninguém se iluda, nem sempre irão acontecer de maneira pacífica, como se verificaram numa parte do Leste europeu, embora o processo esteja muito longe de ter terminado, tamanhos são os problemas de reversão de um sistema ideológico para outro. Na Romênia, por exemplo, as alterações se deram a poder de armas. E a sociedade romena ainda está longe, muito distante de se considerar pacificada.

Mas não é somente a Europa o palco das reformas políticas, econômicas e sociais que virtualmente "explodiram" na segunda metade do ano passado praticamente em todo o mundo. O Sul da África passa por idêntico fenômeno, embora ali ainda tudo esteja virtualmente no terreno das possibilidades. A Namíbia conquistou a independência, mas isto ainda é pouco. Os sul-africanos, certamente, viverão momentos de grande tensão, que se torce não venham a descambar para a violência, expediente que apenas retarda as autênticas soluções. A liberação do líder nacionalista Nelson Mandela, por parte do presidente Frederik de Klerk, foi um importante passo, um gesto de boa-vontade em relação à maioria racial. Mas ninguém pode dizer, em sã consciência, que o intolerável sistema do "apartheid" tenha sido ao menos abalado em sua essência, nos seus fundamentos. Portanto, o processo reformista na África do Sul nem mesmo começou. Ainda está na fase do cumprimento das promessas básicas para que haja negociação.

Na Ásia, a China retrocedeu, num ano, tudo o que havia caminhado rumo a um sistema mais aberto e humano, em dez anos. Mesmo as conquistas no terreno econômico tiveram forte retroação. Não se concebe, porém, que um único partido, mesmo que conte com 50 milhões de membros, como é o PC chinês, controle para sempre a vida de 1,2 bilhão de pessoas. Isto não é lógico, não faz sentido, não se enquadra dentro do padrão de comportamento dos povos que se pode pinçar na história.

Por isso, não será nenhum ato de adivinhação prever que o país mais populoso do Planeta deverá passar, mesmo que a médio prazo, por uma tremenda convulsão. Suas proporções, pela quantidade de indivíduos que envolve, podem ser aterradoras. A América Latina, por seu turno, também deverá mudar, e muito. Da forma como as coisas estão, certamente não poderão continuar. O caráter dessas mudanças e a sua forma dependerão, em muito, do fato delas serem consensuais ou não. No primeiro caso, os resultados tendem a ser compensadores. No segundo...Nem é bom pensar!

(Artigo publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 22 de março de 1990)

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