O homem contemporâneo, a despeito do magnífico avanço tecnológico que lhe permite interferir na própria natureza e deter em suas mãos até mesmo o poder de destruir em minutos o Planeta, não é o gigante que pensa ser. É, na verdade, um anão. Apresenta as dimensões gigantescas que aparenta por estar de pé nos ombros dos gênios do passado que o antecederam e que, partindo do nada, elaboraram todas as artes, a ciência e o raciocínio. Isto somente foi possível graças ao trabalho, em geral anônimo, de uma categoria sofrida, injustiçada, mas que sem ela o conhecimento adquirido simplesmente se perderia no esquecimento: a dos professores. Quem conseguiria ser um pesquisador espacial, chegar a realizar maravilhosos transplantes de órgãos, alterar genes de uma célula, ou mapear o próprio segredo da vida humana, se não contasse com um mestre que lhe desse as noções elementares da linguagem, do cálculo e das ciências?
Saturday, October 31, 2009
Onipresença da solidão
Pedro J. Bondaczuk
Viajo...
O trem
rodando
pesado
nos trilhos
e a brisa
cantando,
e o mundo
correndo,
casas,
árvores
animais
carros,
pessoas
voando, voando,
surpreendem-me
calado
e só!
Estou só... estou só... estou só...
Murmura
o bólido
deslizando
nos trilhos.
Crianças sorrindo...
Mulheres sorrindo...
Velhos sorrindo...
Profusão de sorrisos!
E o murmúrio
martela
em meu
ouvido:
Estou só...estou só...estou só...
Pessoas andando,
pessoas falando,
pessoas gritando,
pessoas que lêem:
pessoas felizes?
E o trem
murmura:
Estou só...estou só...estou só...
Jovens de mãos dadas com a esperança,
velhos de mãos dadas com a experiência,
crianças de mãos dadas com o futuro.
Contudo eu,
solitário,
sou todo ouvidos
para o estribilho:
Estou só...estou só...estou só...
Pessoas estranhas se encontram.
Olhares furtivos se cruzam.
Mãos ansiosas se enlaçam.
Lábios sequiosos se juntam.
No túnel escuro do acaso
amores se perdem, se acham.
Todavia
sigo a
ouvir:
Estou só...estou só...estou só...
O trem pára.
(a vida não pára,
apesar da morte)!
Crianças pobres vendem confeitos,
crianças felizes compram o supérfluo.
Pessoas mastigam.
Pessoas fumam.
Pessoas sorriem.
Pessoas felizes?
O trem vai partir
(como a vida?)
pro seu destino.
E volto
a ouvir:
Estou só...estou só...estou só...
Chego, afinal.
(Meu Deus, onde?!).
Saio do trem e da estação.
Subo as escadas da Luz,
com a maleta na mão.
Caminho por uma rua
entre milhares de sombras,
ariscas, velozes, opacas,
formigas apressadas
que se chocam, tontas,
anônimas, sem rumo.
Mas vago só
com meus pensamentos.
Meus passos, plangentes,
murmuram na calçada:
Es-tou só...es-tou só...es-tou só...
Caio em desespero.
Seria a loucura?!
Entro num beco.
Dou vazão ao recalque
em incontido soluço
que mais parece refrão
de algum bailado russo:
Es-es-tou sóóó...es-es-tou sóóó...es-es-tou sóóó...
Chego, afinal, em casa.
Ligo o rádio
(não existe rádio!).
Pego um livro
(eu não tenho livros!).
Somente o silêncio,
indecoroso e venal
e o vôo de uma mosca
que zumbe, monótona:
Essssstou ssssssó...esssssstou sssssó...essssstou sssssssó...
Por fim durmo.
É sono pesado
e sem sonhos:
prefiro estar só!!!
(Poema composto em Campinas, em 17 de agosto de 1965).
Pedro J. Bondaczuk
Viajo...
O trem
rodando
pesado
nos trilhos
e a brisa
cantando,
e o mundo
correndo,
casas,
árvores
animais
carros,
pessoas
voando, voando,
surpreendem-me
calado
e só!
Estou só... estou só... estou só...
Murmura
o bólido
deslizando
nos trilhos.
Crianças sorrindo...
Mulheres sorrindo...
Velhos sorrindo...
Profusão de sorrisos!
E o murmúrio
martela
em meu
ouvido:
Estou só...estou só...estou só...
Pessoas andando,
pessoas falando,
pessoas gritando,
pessoas que lêem:
pessoas felizes?
E o trem
murmura:
Estou só...estou só...estou só...
Jovens de mãos dadas com a esperança,
velhos de mãos dadas com a experiência,
crianças de mãos dadas com o futuro.
Contudo eu,
solitário,
sou todo ouvidos
para o estribilho:
Estou só...estou só...estou só...
Pessoas estranhas se encontram.
Olhares furtivos se cruzam.
Mãos ansiosas se enlaçam.
Lábios sequiosos se juntam.
No túnel escuro do acaso
amores se perdem, se acham.
Todavia
sigo a
ouvir:
Estou só...estou só...estou só...
O trem pára.
(a vida não pára,
apesar da morte)!
Crianças pobres vendem confeitos,
crianças felizes compram o supérfluo.
Pessoas mastigam.
Pessoas fumam.
Pessoas sorriem.
Pessoas felizes?
O trem vai partir
(como a vida?)
pro seu destino.
E volto
a ouvir:
Estou só...estou só...estou só...
Chego, afinal.
(Meu Deus, onde?!).
Saio do trem e da estação.
Subo as escadas da Luz,
com a maleta na mão.
Caminho por uma rua
entre milhares de sombras,
ariscas, velozes, opacas,
formigas apressadas
que se chocam, tontas,
anônimas, sem rumo.
Mas vago só
com meus pensamentos.
Meus passos, plangentes,
murmuram na calçada:
Es-tou só...es-tou só...es-tou só...
Caio em desespero.
Seria a loucura?!
Entro num beco.
Dou vazão ao recalque
em incontido soluço
que mais parece refrão
de algum bailado russo:
Es-es-tou sóóó...es-es-tou sóóó...es-es-tou sóóó...
Chego, afinal, em casa.
Ligo o rádio
(não existe rádio!).
Pego um livro
(eu não tenho livros!).
Somente o silêncio,
indecoroso e venal
e o vôo de uma mosca
que zumbe, monótona:
Essssstou ssssssó...esssssstou sssssó...essssstou sssssssó...
Por fim durmo.
É sono pesado
e sem sonhos:
prefiro estar só!!!
(Poema composto em Campinas, em 17 de agosto de 1965).
Friday, October 30, 2009
O misticismo nem sempre é devidamente entendido ou corretamente interpretado. Não se trata de alienação, como supõem os desavisados e néscios, e muito menos de práticas de rituais vazios, exóticos e sem qualquer significado. Não é, também, a autoflagelação, o prazer no sofrimento, a mortificação física como alguns idiotas masoquistas entendem. Mística é aquela pessoa que sente a divindade em si. É o indivíduo que tem a certeza da existência de um Deus (embora não tenha meios de comprovar esse conhecimento de maneira concreta e não disponha de condições de descrever nem a sua natureza e nem a extensão do seu poder) e sabe que é parte integrante Dele. É quem faz da sua vida uma obra de arte, ligado, de maneira definitiva ao transcendente. Não se atém a religiões específicas, pois sabe que todas desembocam em um único e grande caminho, que é o da busca de Deus.
Insigne alquimista
Pedro J. Bondaczuk
O tempo é implacável e não perdoa ninguém. Desgasta-nos, nos exaure e nos transforma. Por isso, devemos viver cada fase da nossa vida, principalmente a da infância, com máxima intensidade e vigor.
É certo que nem sempre os anos nos tornam piores, pelo menos do ponto de vista mental ou moral. Isso vai depender de nós, da nossa postura face ao mundo. Tanto podem nos tornar humildes, conhecedores das nossas reais possibilidades, sem manias de grandeza e sem ilusões, quanto fazer com que nos tornemos amargos e descrentes.
Está em nossas mãos fazer dos nossos últimos dias ou um período de satisfações e felicidade, ou uma fase de amarguras e frustrações. Qual o tipo de semente que estamos cultivando em nossos corações? O da humildade, ou o do cinismo e do ceticismo? Pois é, o tempo transforma, profundamente, tudo e todos e, principalmente, os que escolhem caminhos errados e desperdiçam estupidamente suas vidas.
O arrogante, por exemplo, ao cabo dos anos, faz-se humilde, ao se dar conta que não é tão importante quanto julgava. O mundo se encarrega de derrubar sua crista. O idealista torna-se cínico quando percebe quão pífio e vazio era seu ideal. Pode-se enganar os outros, mas jamais a nós mesmos. E o crente, que abraçou crença errada, passa a descrer de tudo e de todos e se transforma em empedernido céptico.
Há crenças que são nitidamente meras superstições. Daí a importância de valores adequados e metas factíveis para nossas vidas. Compete-nos valorizar adequadamente o que de fato é importante e descartar o inócuo, o fútil e o desnecessário. A atitude mais inteligente é sermos humildes sem nos humilharmos; idealistas, mas com os pés no chão e crentes no racional e transcendental.
O homem, sem que o perceba ou se dê conta, morre a cada dia para em seguida renascer. Acusam-me não raro de ser repetitivo a esse propósito. Dizem que escrevo sempre as mesmas coisas a propósito do tempo e quase com as mesmíssimas palavras. Faço e farei inúmeras vezes isso de propósito. Afinal, o que é a vida (minha e dos outros) se não monótona variação em torno do mesmo tema?
Todavia, se atentarmos bem, veremos que não é tão mitológico assim o mito da fênix, aquela ave egípcia que renasceria de suas próprias cinzas. A cada dia, somos os mesmos e no entanto somos um outro. É como minhas reflexões sobre o tempo: parecem as mesmas, no entanto são bastante diversas.
Quanto ao nosso renascimento diário, enfatizamos que todas as células do organismo, seja de que tecido forem, se "autocopiam", através da reprodução, passando para as sucessoras todas as informações de que dispunham. A cada manhã, portanto, somos pessoas renovadas, inclusive do ponto de vista físico. Em termos mentais, nem se diga.
Mudamos a cada instante. E infeliz daquele que não muda nunca, que se aferra a dogmas, a comportamentos superados pelo tempo, a maneiras arcaicas de pensar e de agir. Ninguém, todavia, "renasce" das próprias cinzas com maior intensidade e força do que o artista e, mais ainda, do que o poeta. Por isso, ele é tão especial e mágico.
Somos, todos, seres múltiplos, mutantes, diferentes hoje do que éramos ontem, e não somente no aspecto físico, reitero, dado o envelhecimento, mas, sobretudo, no plano mental. De cada pessoa com que nos relacionamos, absorvemos alguma coisa: idéias, hábitos, comportamentos, não importa o quê. E quanto maior for o nosso círculo de relacionamentos, mais mudamos, mais diferentes nos tornamos, sem que sequer nos apercebamos dessas mudanças.
Por falar em poeta, este tem o condão de, com o seu talento, transformar a coisa mais trivial e o tema mais sem sabor, em obras-primas de encantamento e beleza. Faz com que reles pedras comuns, que atravancam nosso caminho, se tornem diamantes preciosos, jóias raras, enormes pepitas de ouro.
É um mago que tem o poder de “reinventar a vida” com a sua sensibilidade e sua capacidade de enxergar beleza onde os outros não a vêem, nos induzindo a sonhar e nos indicando, com delicadeza, a rota de um paraíso de luz.
Um dia, tudo e todos haverão de se transformar de vez. É a lei da natureza. É a ação desse que foi denominado por Machado de Assis (no conto “Eterno”) de “insigne alquimista”. E o Bruxo do Cosme Velho justifica porque considera o tempo assim: “Dá-se-lhe um punhado de lodo, ele o restitui em diamantes, quando menos, em cascalhos”.
É verdade que essa transformação não pára por aí. O “insigne alquimista” toma em suas mãos os diamantes que criou e, a despeito da sua dureza, os reduz, um dia, a pó. Faz, claro, a mesmíssima coisa, e com maior facilidade ainda, com o cascalho.
Um dia, todos passaremos por essa transformação definitiva, quando voltarmos ao solo de que fomos forjados. Mas quando esse momento chegar, quando o “insigne alquimista” voltar a nos transformar, que estejamos com o coração sossegado, cientes de que fomos úteis, deixamos obras, semeamos idéias e valores que um dia haverão de brotar e se transformar em frutos, quando estivermos dispersos nos campos, águas e ar e não formos mais que lembranças.
Fernando Pessoa escreve, no poema “Sossega coração”: “Sossega, coração, contudo! Dorme!/O sossego não quer razão nem causa./Quer só a noite plácida e enorme,/a grande, universal, silente pausa/antes que tudo em tudo se transforme”. Por isso, “sossega coração preocupado”!!!
.
Pedro J. Bondaczuk
O tempo é implacável e não perdoa ninguém. Desgasta-nos, nos exaure e nos transforma. Por isso, devemos viver cada fase da nossa vida, principalmente a da infância, com máxima intensidade e vigor.
É certo que nem sempre os anos nos tornam piores, pelo menos do ponto de vista mental ou moral. Isso vai depender de nós, da nossa postura face ao mundo. Tanto podem nos tornar humildes, conhecedores das nossas reais possibilidades, sem manias de grandeza e sem ilusões, quanto fazer com que nos tornemos amargos e descrentes.
Está em nossas mãos fazer dos nossos últimos dias ou um período de satisfações e felicidade, ou uma fase de amarguras e frustrações. Qual o tipo de semente que estamos cultivando em nossos corações? O da humildade, ou o do cinismo e do ceticismo? Pois é, o tempo transforma, profundamente, tudo e todos e, principalmente, os que escolhem caminhos errados e desperdiçam estupidamente suas vidas.
O arrogante, por exemplo, ao cabo dos anos, faz-se humilde, ao se dar conta que não é tão importante quanto julgava. O mundo se encarrega de derrubar sua crista. O idealista torna-se cínico quando percebe quão pífio e vazio era seu ideal. Pode-se enganar os outros, mas jamais a nós mesmos. E o crente, que abraçou crença errada, passa a descrer de tudo e de todos e se transforma em empedernido céptico.
Há crenças que são nitidamente meras superstições. Daí a importância de valores adequados e metas factíveis para nossas vidas. Compete-nos valorizar adequadamente o que de fato é importante e descartar o inócuo, o fútil e o desnecessário. A atitude mais inteligente é sermos humildes sem nos humilharmos; idealistas, mas com os pés no chão e crentes no racional e transcendental.
O homem, sem que o perceba ou se dê conta, morre a cada dia para em seguida renascer. Acusam-me não raro de ser repetitivo a esse propósito. Dizem que escrevo sempre as mesmas coisas a propósito do tempo e quase com as mesmíssimas palavras. Faço e farei inúmeras vezes isso de propósito. Afinal, o que é a vida (minha e dos outros) se não monótona variação em torno do mesmo tema?
Todavia, se atentarmos bem, veremos que não é tão mitológico assim o mito da fênix, aquela ave egípcia que renasceria de suas próprias cinzas. A cada dia, somos os mesmos e no entanto somos um outro. É como minhas reflexões sobre o tempo: parecem as mesmas, no entanto são bastante diversas.
Quanto ao nosso renascimento diário, enfatizamos que todas as células do organismo, seja de que tecido forem, se "autocopiam", através da reprodução, passando para as sucessoras todas as informações de que dispunham. A cada manhã, portanto, somos pessoas renovadas, inclusive do ponto de vista físico. Em termos mentais, nem se diga.
Mudamos a cada instante. E infeliz daquele que não muda nunca, que se aferra a dogmas, a comportamentos superados pelo tempo, a maneiras arcaicas de pensar e de agir. Ninguém, todavia, "renasce" das próprias cinzas com maior intensidade e força do que o artista e, mais ainda, do que o poeta. Por isso, ele é tão especial e mágico.
Somos, todos, seres múltiplos, mutantes, diferentes hoje do que éramos ontem, e não somente no aspecto físico, reitero, dado o envelhecimento, mas, sobretudo, no plano mental. De cada pessoa com que nos relacionamos, absorvemos alguma coisa: idéias, hábitos, comportamentos, não importa o quê. E quanto maior for o nosso círculo de relacionamentos, mais mudamos, mais diferentes nos tornamos, sem que sequer nos apercebamos dessas mudanças.
Por falar em poeta, este tem o condão de, com o seu talento, transformar a coisa mais trivial e o tema mais sem sabor, em obras-primas de encantamento e beleza. Faz com que reles pedras comuns, que atravancam nosso caminho, se tornem diamantes preciosos, jóias raras, enormes pepitas de ouro.
É um mago que tem o poder de “reinventar a vida” com a sua sensibilidade e sua capacidade de enxergar beleza onde os outros não a vêem, nos induzindo a sonhar e nos indicando, com delicadeza, a rota de um paraíso de luz.
Um dia, tudo e todos haverão de se transformar de vez. É a lei da natureza. É a ação desse que foi denominado por Machado de Assis (no conto “Eterno”) de “insigne alquimista”. E o Bruxo do Cosme Velho justifica porque considera o tempo assim: “Dá-se-lhe um punhado de lodo, ele o restitui em diamantes, quando menos, em cascalhos”.
É verdade que essa transformação não pára por aí. O “insigne alquimista” toma em suas mãos os diamantes que criou e, a despeito da sua dureza, os reduz, um dia, a pó. Faz, claro, a mesmíssima coisa, e com maior facilidade ainda, com o cascalho.
Um dia, todos passaremos por essa transformação definitiva, quando voltarmos ao solo de que fomos forjados. Mas quando esse momento chegar, quando o “insigne alquimista” voltar a nos transformar, que estejamos com o coração sossegado, cientes de que fomos úteis, deixamos obras, semeamos idéias e valores que um dia haverão de brotar e se transformar em frutos, quando estivermos dispersos nos campos, águas e ar e não formos mais que lembranças.
Fernando Pessoa escreve, no poema “Sossega coração”: “Sossega, coração, contudo! Dorme!/O sossego não quer razão nem causa./Quer só a noite plácida e enorme,/a grande, universal, silente pausa/antes que tudo em tudo se transforme”. Por isso, “sossega coração preocupado”!!!
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Thursday, October 29, 2009
As mudanças, quaisquer que sejam, assustam boa parte das pessoas que não se dão conta que elas representam a dinâmica da própria vida. Tudo muda permanentemente no universo, que não é estático, mas se move sem parar. Galáxias, constelações, estrelas, planetas e outros corpos celestes estão em contínuo movimento e constante transformação. O mesmo vale para o âmago da matéria: os átomos e seus componentes. E o dos seres vivos: as células e as substâncias que as constituem. Mudar, portanto, significa, acima de tudo, viver. Há mudanças e mudanças, é verdade. Consideramos que são bem vindas quando representam a saída de alguma situação angustiante em que estejamos envolvidos ou a que nos submeteram. Quando ocorre o contrário, ou seja, quando significam que entramos em alguma enrascada, são uma tragédia. Por isso, nosso empenho deve ser o de interferirmos nas mudanças.
Gozo total
Pedro J. Bondaczuk
A vida é bela, e fascinante, e misteriosa, por se tratar de permanente processo de renovação, embora paradoxalmente envelheçamos a cada dia que passa. É como um rio, cujas águas são sempre diferentes. A verdade é estamos permanentemente nascendo e morrendo. Por isso, o problema do tempo nos afeta mais do que os outros problemas metafísicos. Porque os outros são abstratos. O do tempo é o nosso problema.
Todo novo dia é um presente que a vida nos concede. E a melhor maneira de mostrarmos apreço e veneração por ela, por esse magnífico mistério, que é, ao mesmo tempo, privilégio e desafio, é cultivarmos a alegria. É jamais nos deixarmos abater pelo que de ruim nos aconteça, ou ocorra ao nosso redor, mas sempre extrair lições dos sofrimentos e tragédias.
É atentarmos para os pequenos episódios positivos do dia a dia que, somados, se revelam maiúsculos, mas que, muitas vezes, entregues a tolas mágoas e estúpidos rancores, não sabemos valorizar devidamente. Viver é bom, é magnífico, é transcendental, sejam quais forem as circunstâncias. A atitude sábia e sensata é gozar a vida em toda a plenitude e grandeza, ou seja, de forma erótica, poética, sensorial, espiritual e transcendental.
Nada há, por exemplo, que se compare, em termos de genuíno prazer, à sensação de havermos cumprido o que nos cabia fazer. Ou seja, de termos feito nosso dever com diligência, dedicação e competência. Façamo-lo. Aliás, há outra imensa satisfação, sim, e única. É a certeza de havermos realizado um bem, qualquer que seja, a algum semelhante – conhecido ou estranho, parente ou não –, que tenha qualquer necessidade (material ou espiritual): uma dádiva, um auxílio, uma palavra de apreço, uma orientação ou um exemplo.
Cumprirmos nosso dever e fazermos o bem são fontes inesgotáveis de alegria. Quem duvidar, basta experimentar. São satisfações “democráticas”, ao alcance de todos, e não nos exigem nada de excepcional. Em contrapartida, nos dão compensação inigualável.
Podemos (e devemos) estar permanentemente predispostos ao bom-humor, à beleza e à alegria de viver. Com esta postura, podemos, é verdade, não resolver todos os problemas que eventualmente surjam no nosso caminho (e, certamente, surgirão muitos, dos mais simples aos sumamente complexos), mas, pelo menos, não os agravaremos, o que não deixa de ser considerável ganho.
Bem diz o povo que tristeza não paga dívidas. Temos que resistir à tentação de estarmos sempre com um pé atrás em relação ao próximo, tratando, quem não conhecemos, como inimigo em potencial. Cautela e desconfiança são duas coisas muito distintas. Devemos nos manter cautelosos, sim, mas não liminarmente desconfiados.
Já o êxtase do amor é outra dádiva que está ao nosso alcance, exigindo de nós apenas o cumprimento de uma única condição: reciprocidade. Ele altera nossos parâmetros de medida do tempo e do espaço. Faz com que nos sintamos, enquanto dura, eternos e infinitos, a despeito da nossa real pequenez e efemeridade.
Trata-se de sensação mágica, única, indescritível, que os mais competentes poetas não conseguem dar a mais pálida e aproximada idéia de como de fato é. Mas quem precisa deles? Melhor do que descrever, ou do que nos deleitarmos com descrições alheias, é sentir essa sensação de êxtase, de delírio, de pleno gozo.
Não tenhamos medo de colocar nossas pretensões e nossos sonhos muito no alto, perto das estrelas, fora do alcance das nossas mãos. Não economizemos nos “empréstimos de felicidade”, jamais abrindo mão de nossas esperanças, mas recorrendo mais e mais a elas. E ousemos em nos sentir como Madre Teresa de Calcutá se sentia: “um lápis nas mãos de Deus”, para escrevermos nossa própria biografia.
Viver, embora não pareça, é uma arte. Podemos fazer da nossa vida tanto um inferno, pior do que o descrito por Dante Alighieri, na “Divina Comédia”, de infinitos sofrimentos (físicos, morais e psicológicos), quanto uma coisa bela, aprazível, gozosa e sem igual. Esse é o desafio que cada novo dia nos apresenta, mas que temos capacidade de enfrentar e de vencer.
Tenhamos fé no futuro e façamos a nossa parte para tornar o mundo melhor, mais solidário e mais justo. Sejamos, sempre, a “cabeça” do corpo social, jamais a “cauda”. E ousemos exercitar nosso talento, não no sentido de buscar glória ou fortuna, mas de justificar a nossa existência.
Há algum tempo, li um poema, intitulado “Satori”, de Luís Augusto Cassas, e dele pincei uma estrofe, que transformei, desde então, numa espécie de mantra, de oração e mais, de verdadeira intimação, por resumir tudo o que aspiro (e que, certamente, você também, meu caro leitor).. Diz o poeta no referido trecho: “Vida/dá-me o gozo total:/erótico/poético/transcendental”. É só o que lhe peço a cada amanhecer de um novo dia. O resto... conquisto sozinho.
Pedro J. Bondaczuk
A vida é bela, e fascinante, e misteriosa, por se tratar de permanente processo de renovação, embora paradoxalmente envelheçamos a cada dia que passa. É como um rio, cujas águas são sempre diferentes. A verdade é estamos permanentemente nascendo e morrendo. Por isso, o problema do tempo nos afeta mais do que os outros problemas metafísicos. Porque os outros são abstratos. O do tempo é o nosso problema.
Todo novo dia é um presente que a vida nos concede. E a melhor maneira de mostrarmos apreço e veneração por ela, por esse magnífico mistério, que é, ao mesmo tempo, privilégio e desafio, é cultivarmos a alegria. É jamais nos deixarmos abater pelo que de ruim nos aconteça, ou ocorra ao nosso redor, mas sempre extrair lições dos sofrimentos e tragédias.
É atentarmos para os pequenos episódios positivos do dia a dia que, somados, se revelam maiúsculos, mas que, muitas vezes, entregues a tolas mágoas e estúpidos rancores, não sabemos valorizar devidamente. Viver é bom, é magnífico, é transcendental, sejam quais forem as circunstâncias. A atitude sábia e sensata é gozar a vida em toda a plenitude e grandeza, ou seja, de forma erótica, poética, sensorial, espiritual e transcendental.
Nada há, por exemplo, que se compare, em termos de genuíno prazer, à sensação de havermos cumprido o que nos cabia fazer. Ou seja, de termos feito nosso dever com diligência, dedicação e competência. Façamo-lo. Aliás, há outra imensa satisfação, sim, e única. É a certeza de havermos realizado um bem, qualquer que seja, a algum semelhante – conhecido ou estranho, parente ou não –, que tenha qualquer necessidade (material ou espiritual): uma dádiva, um auxílio, uma palavra de apreço, uma orientação ou um exemplo.
Cumprirmos nosso dever e fazermos o bem são fontes inesgotáveis de alegria. Quem duvidar, basta experimentar. São satisfações “democráticas”, ao alcance de todos, e não nos exigem nada de excepcional. Em contrapartida, nos dão compensação inigualável.
Podemos (e devemos) estar permanentemente predispostos ao bom-humor, à beleza e à alegria de viver. Com esta postura, podemos, é verdade, não resolver todos os problemas que eventualmente surjam no nosso caminho (e, certamente, surgirão muitos, dos mais simples aos sumamente complexos), mas, pelo menos, não os agravaremos, o que não deixa de ser considerável ganho.
Bem diz o povo que tristeza não paga dívidas. Temos que resistir à tentação de estarmos sempre com um pé atrás em relação ao próximo, tratando, quem não conhecemos, como inimigo em potencial. Cautela e desconfiança são duas coisas muito distintas. Devemos nos manter cautelosos, sim, mas não liminarmente desconfiados.
Já o êxtase do amor é outra dádiva que está ao nosso alcance, exigindo de nós apenas o cumprimento de uma única condição: reciprocidade. Ele altera nossos parâmetros de medida do tempo e do espaço. Faz com que nos sintamos, enquanto dura, eternos e infinitos, a despeito da nossa real pequenez e efemeridade.
Trata-se de sensação mágica, única, indescritível, que os mais competentes poetas não conseguem dar a mais pálida e aproximada idéia de como de fato é. Mas quem precisa deles? Melhor do que descrever, ou do que nos deleitarmos com descrições alheias, é sentir essa sensação de êxtase, de delírio, de pleno gozo.
Não tenhamos medo de colocar nossas pretensões e nossos sonhos muito no alto, perto das estrelas, fora do alcance das nossas mãos. Não economizemos nos “empréstimos de felicidade”, jamais abrindo mão de nossas esperanças, mas recorrendo mais e mais a elas. E ousemos em nos sentir como Madre Teresa de Calcutá se sentia: “um lápis nas mãos de Deus”, para escrevermos nossa própria biografia.
Viver, embora não pareça, é uma arte. Podemos fazer da nossa vida tanto um inferno, pior do que o descrito por Dante Alighieri, na “Divina Comédia”, de infinitos sofrimentos (físicos, morais e psicológicos), quanto uma coisa bela, aprazível, gozosa e sem igual. Esse é o desafio que cada novo dia nos apresenta, mas que temos capacidade de enfrentar e de vencer.
Tenhamos fé no futuro e façamos a nossa parte para tornar o mundo melhor, mais solidário e mais justo. Sejamos, sempre, a “cabeça” do corpo social, jamais a “cauda”. E ousemos exercitar nosso talento, não no sentido de buscar glória ou fortuna, mas de justificar a nossa existência.
Há algum tempo, li um poema, intitulado “Satori”, de Luís Augusto Cassas, e dele pincei uma estrofe, que transformei, desde então, numa espécie de mantra, de oração e mais, de verdadeira intimação, por resumir tudo o que aspiro (e que, certamente, você também, meu caro leitor).. Diz o poeta no referido trecho: “Vida/dá-me o gozo total:/erótico/poético/transcendental”. É só o que lhe peço a cada amanhecer de um novo dia. O resto... conquisto sozinho.
Wednesday, October 28, 2009
O que o futuro nos reserva? Obviamente, aquilo que soubermos construir, com nossos esforços e capacidades! Muita coisa, no entanto, precisa mudar, quer política, quer moral, quer comportalmente, para que o homem não somente consiga sobreviver, e evitar o colapso do Planeta, mas construir uma sociedade que realmente valha a pena, sem as hediondas aberrações de hoje. É desnecessário enfatizar a necessidade, por exemplo, da humanidade banir as guerras, sejam quais forem os motivos ou os meios empregados, e ser mais justa e racional na partilha do patrimônio comum, que são os esgotáveis recursos da Terra, à beira da exaustão. É urgente, e vital, entre outras coisas, que se detenha a acelerada e criminosa depredação da natureza, acabando com a poluição das fontes de água potável, tratando adequadamente do solo para que continue fértil e produtivo, para alimentar as possíveis (e prováveis) 17 bilhões de bocas que existirão até o final do século XXI.
Inserção na realidade
Pedro J. Bondaczuk
Os que apregoam que são ferrenhamente “realistas” (e há uma infinidade de pessoas que faz isso) na maioria das vezes sequer sabem definir o que seja “realidade” e muito menos fazer distinção entre esta e meros sonhos e idealizações. Ou, o que é mais comum, não distinguem o verdadeiro, o concreto, o palpável de meras “interpretações”, sujeitas, portanto, a equívocos.
Esse pretenso realismo não passa, geralmente, de mera máscara para disfarçar o pessimismo com que esses indivíduos encaram a vida. E o pessimista, mesmo que não se dê conta, é um doente. Enquadra tudo (e todos) num prisma sempre negativo. Sofre sem necessidade e parece se comprazer com o sofrimento. Há muita gente assim, que sente prazer em sofrer, embora o negue da maneira mais enfática possível. Vá entender essas pessoas!
O que é o real? O nascimento? A morte? As pessoas e as coisas que nos cercam? Você tem certeza, mas certeza mesmo, de que tudo isso é real e não mero sonho, delirante fantasia, verossímil elucubração da mente de um poeta? Ou de um louco? Às vezes, tenho essa impressão. Ademais, não tenho certeza de nada. Nem mesmo a de estar vivo.
T. S. Eliot, em um de seus versos mais notáveis, constatou, com elegância e precisão, que “o gênero humano não suporta a realidade”. E não suporta mesmo! Daí viver criando fantasias de todos os tipos, quer para os outros, quer e, principalmente, para si próprio.
Somos o que mentalizamos. Se nos virmos como fracos, como tíbios, como doentios, nos transformaremos nesse estereótipo que criarmos. Mas o contrário também é verdade. O que cada um de nós tem que fazer é se impor. É provar, se preciso, que o mundo inteiro está errado sobre a imagem que faz de nós. É não nos deixarmos abater diante de opiniões e atitudes alheias. É inserir a nossa vontade no âmago da realidade.
Mas essa demonstração de força não se pode fazer apenas com palavras. Exige ação, muita ação, mesmo que o corpo teime em pedir repouso (o que, invariavelmente, faz). Requer energia, física, mental e, sobretudo espiritual, tirada não se sabe de onde.
Henri Bergson escreveu, em um de seus ensaios, que “cada um dos nossos atos visa uma certa inserção da nossa vontade na realidade”. Raramente conseguimos isso. Fracassamos nessa tentativa por “n” razões. Às vezes, por exemplo, esse fracasso ocorre porque a realidade se apresenta com obstáculos muito além das nossas forças para superá-los. Outras tantas, porque não somos voluntariosos o suficiente para mudar o que pode ser mudado e nos deixamos, docilmente, abater pelas circunstâncias.
Por exemplo, seria o homem capaz de compreender a relação profundíssima que tem com a Terra e mudar, em curto espaço de tempo, seu comportamento infeliz, destrutivo e absurdo, evitando (se ainda for evitável) uma catástrofe de conseqüências imprevisíveis? Em teoria, sim. Mas essa compreensão, e a conseqüente ação, dependem de força de vontade.
Para que essa mudança seja possível, é necessário, acima de tudo, educar os jovens, incutindo neles a mentalidade preservacionista. Mas não como modismo, ou bandeira "ideológica", mas como ação concreta e eficaz. Um processo como esse, porém, não se faz da noite para o dia. Demanda tempo, muito tempo. Pode durar gerações e estar sujeito a avanços e recuos. É algo demorado e que já deveria estar em andamento. Não está. A dúvida é: haverá tempo para essa conscientização? Tudo indica que não! O efeito estufa está aí para nos servir de alerta.
Ainda é possível reverter os sintomas de desgaste, de envelhecimento de "Gaia", que podem evoluir rapidamente para uma "doença" de caráter irreversível, que a leve em pouco tempo ao colapso e à morte? Sim! O ser humano pode qualquer coisa, desde que tenha vontade. Tê-la, no entanto, e da forma e no momento adequados, é que são elas.
Não seria possível produzir mais, sem poluir? Não há uma maneira racional de se explorar o que a natureza nos legou sem destruir? Claro que há! Os recursos terrestres não são como a mitológica "cornucópia da abundância", ou seja, inesgotáveis. Mas são raros os que atentam para essa realidade. E se nem ao menos lhe prestamos atenção, como poderemos inserir nossa vontade nela (se a tivermos, logicamente)? Não poderemos.
O que é realidade para mim, pode não o ser para bilhões de pessoas ao redor do mundo. Elas não vivem a mesma circunstância que vivo e sequer tomam ciência do que para mim é tão importante (e, às vezes, decisivo). A não ser que ocorra uma catástrofe planetária, como o choque de um cometa ou de um asteróide com a Terra (o que não é nada descartável), minha “realidade” é limitada ao espaço em que estou.
Não proponho, claro, que optemos por nos alienar e esconder a cabeça na areia, deixando o corpo de fora, achando que assim estaremos nos livrando dos perigos. Esta seria a pior das “soluções”. Afinal, a depredação do Planeta é, em grande parte, devida à nossa alienação. Sugiro, isto sim, vislumbrar a realidade em sua inteireza e integralidade. Ou seja,: no direito e no avesso. E inserir, nela, a nossa vontade. Caso ela nos seja penosa e ameaçadora, mudá-la. E se for benéfica e prazerosa, conservá-la e, se possível, perpetuá-la. Isto é o óbvio, porém...
Pedro J. Bondaczuk
Os que apregoam que são ferrenhamente “realistas” (e há uma infinidade de pessoas que faz isso) na maioria das vezes sequer sabem definir o que seja “realidade” e muito menos fazer distinção entre esta e meros sonhos e idealizações. Ou, o que é mais comum, não distinguem o verdadeiro, o concreto, o palpável de meras “interpretações”, sujeitas, portanto, a equívocos.
Esse pretenso realismo não passa, geralmente, de mera máscara para disfarçar o pessimismo com que esses indivíduos encaram a vida. E o pessimista, mesmo que não se dê conta, é um doente. Enquadra tudo (e todos) num prisma sempre negativo. Sofre sem necessidade e parece se comprazer com o sofrimento. Há muita gente assim, que sente prazer em sofrer, embora o negue da maneira mais enfática possível. Vá entender essas pessoas!
O que é o real? O nascimento? A morte? As pessoas e as coisas que nos cercam? Você tem certeza, mas certeza mesmo, de que tudo isso é real e não mero sonho, delirante fantasia, verossímil elucubração da mente de um poeta? Ou de um louco? Às vezes, tenho essa impressão. Ademais, não tenho certeza de nada. Nem mesmo a de estar vivo.
T. S. Eliot, em um de seus versos mais notáveis, constatou, com elegância e precisão, que “o gênero humano não suporta a realidade”. E não suporta mesmo! Daí viver criando fantasias de todos os tipos, quer para os outros, quer e, principalmente, para si próprio.
Somos o que mentalizamos. Se nos virmos como fracos, como tíbios, como doentios, nos transformaremos nesse estereótipo que criarmos. Mas o contrário também é verdade. O que cada um de nós tem que fazer é se impor. É provar, se preciso, que o mundo inteiro está errado sobre a imagem que faz de nós. É não nos deixarmos abater diante de opiniões e atitudes alheias. É inserir a nossa vontade no âmago da realidade.
Mas essa demonstração de força não se pode fazer apenas com palavras. Exige ação, muita ação, mesmo que o corpo teime em pedir repouso (o que, invariavelmente, faz). Requer energia, física, mental e, sobretudo espiritual, tirada não se sabe de onde.
Henri Bergson escreveu, em um de seus ensaios, que “cada um dos nossos atos visa uma certa inserção da nossa vontade na realidade”. Raramente conseguimos isso. Fracassamos nessa tentativa por “n” razões. Às vezes, por exemplo, esse fracasso ocorre porque a realidade se apresenta com obstáculos muito além das nossas forças para superá-los. Outras tantas, porque não somos voluntariosos o suficiente para mudar o que pode ser mudado e nos deixamos, docilmente, abater pelas circunstâncias.
Por exemplo, seria o homem capaz de compreender a relação profundíssima que tem com a Terra e mudar, em curto espaço de tempo, seu comportamento infeliz, destrutivo e absurdo, evitando (se ainda for evitável) uma catástrofe de conseqüências imprevisíveis? Em teoria, sim. Mas essa compreensão, e a conseqüente ação, dependem de força de vontade.
Para que essa mudança seja possível, é necessário, acima de tudo, educar os jovens, incutindo neles a mentalidade preservacionista. Mas não como modismo, ou bandeira "ideológica", mas como ação concreta e eficaz. Um processo como esse, porém, não se faz da noite para o dia. Demanda tempo, muito tempo. Pode durar gerações e estar sujeito a avanços e recuos. É algo demorado e que já deveria estar em andamento. Não está. A dúvida é: haverá tempo para essa conscientização? Tudo indica que não! O efeito estufa está aí para nos servir de alerta.
Ainda é possível reverter os sintomas de desgaste, de envelhecimento de "Gaia", que podem evoluir rapidamente para uma "doença" de caráter irreversível, que a leve em pouco tempo ao colapso e à morte? Sim! O ser humano pode qualquer coisa, desde que tenha vontade. Tê-la, no entanto, e da forma e no momento adequados, é que são elas.
Não seria possível produzir mais, sem poluir? Não há uma maneira racional de se explorar o que a natureza nos legou sem destruir? Claro que há! Os recursos terrestres não são como a mitológica "cornucópia da abundância", ou seja, inesgotáveis. Mas são raros os que atentam para essa realidade. E se nem ao menos lhe prestamos atenção, como poderemos inserir nossa vontade nela (se a tivermos, logicamente)? Não poderemos.
O que é realidade para mim, pode não o ser para bilhões de pessoas ao redor do mundo. Elas não vivem a mesma circunstância que vivo e sequer tomam ciência do que para mim é tão importante (e, às vezes, decisivo). A não ser que ocorra uma catástrofe planetária, como o choque de um cometa ou de um asteróide com a Terra (o que não é nada descartável), minha “realidade” é limitada ao espaço em que estou.
Não proponho, claro, que optemos por nos alienar e esconder a cabeça na areia, deixando o corpo de fora, achando que assim estaremos nos livrando dos perigos. Esta seria a pior das “soluções”. Afinal, a depredação do Planeta é, em grande parte, devida à nossa alienação. Sugiro, isto sim, vislumbrar a realidade em sua inteireza e integralidade. Ou seja,: no direito e no avesso. E inserir, nela, a nossa vontade. Caso ela nos seja penosa e ameaçadora, mudá-la. E se for benéfica e prazerosa, conservá-la e, se possível, perpetuá-la. Isto é o óbvio, porém...
Tuesday, October 27, 2009
Não se pode deixar de concordar com William Somerset Maugham quando afirma, através de um personagem, no romance "O agente britânico": "A vaidade é a mais inextirpável de todas as paixões que afligem a alma humana; e é ainda vaidade o querer negar o seu poder. É mais absorvente que o amor. Com a idade podemos libertar-nos das garras deste, mas os anos não têm o poder de arrancar-nos à tirania da vaidade. O tempo alivia as penas do amor, mas somente a morte pode curar as feridas angustiosas da vaidade. O amor é simples e não procura subterfúgios; a vaidade porém dissimula-se sob mil máscaras. É parte e parcela de toda a virtude; sem ela, não há coragem, como não há ambição. É ela que dá constância aos amantes e impassibilidade aos estóicos". Não há, pois, como deixar de chegar à conclusão de Eclesiastes, o Pregador (Salomão): "Vaidade, vaidade...Tudo no mundo é vaidade..." E como é!
Resistência das sementes
Pedro J. Bondaczuk
O homem evoluído, que tem consciência do seu papel no mundo e se empenha na sua realização (raridade em todos os tempos), sem esperar vantagem material, é, sobretudo, generoso. A evolução da espécie humana deve tudo a essas pessoas abnegadas, que surgem a cada geração, determinando saltos evolutivos desse estranho e precioso animal que pensa (ou pelo menos conta com essa capacidade), mas que nem sempre dá um sentido positivo ao pensamento.
Tais indivíduos são os responsáveis pelas descobertas científicas, pelo desenvolvimento das artes, pela Justiça, pela organização política e social, pelos sistemas econômicos e pela geração e veiculação de idéias. Sua característica marcante é a generosidade. Semeiam inteligência e princípios incansavelmente, sem sequer atentar para o "solo" onde as sementes irão cair. Dão oportunidade a todos os que queiram usufruir de sua ação, sem nenhuma espécie de preconceito ou discriminação.
Das dezenas de bilhões de pessoas que já viveram, desde o surgimento do homem na Terra, apenas alguns milhares são lembrados, e, assim mesmo, eventualmente. Os demais... O dramaturgo Berthold Brecht levanta a seguinte questão, em uma das suas peças: “Quem construiu as sete torres de Tebas? Os livros estão cheios de nomes de reis. Foram reis que arrastaram os blocos de pedra? Na noite em que a Muralha da China foi concluída aonde foram os pedreiros?”
As grandes obras, sejam de que natureza forem, portanto, não são garantias de imortalidade. Nada é! As pequenas...? Não será criando barreiras de preconceitos, nem arrotando a importância, que na verdade não se tem, e muito menos será pisando sobre os que não tiveram ou não souberam aproveitar oportunidades, que se construirão as bases para um cotidiano saudável. Serão a solidariedade, o amor e as genuínas amizades.
Khalil Gibran Khalil escreveu, em um de seus mais belos poemas: “A neve e a tempestade destroem as flores, mas nada podem contra a semente”. As guerras e as catástrofes naturais destroem as obras, mas são impotentes para destruir ideias. É isso o que precisamos “semear” vida afora.
Há pessoas que vivem 80 anos ou mais e quando morrem não têm nada para deixar, não apenas aos familiares, mas à comunidade em que viveram. Outras, deixam rastros de destruição, de ódio e de rancor e, quando são lembradas, as lembranças são de um pesadelo que passou.
Outras, todavia, desaparecem prematuramente, com uma bagagem de realizações tão grande que chega a ser desproporcional aos anos que viveram. Tenhamos em mente que foram as ideias (não foi a força), que tiraram o homem das cavernas, com a maior revolução já ocorrida em todos os tempos: a descoberta da agricultura.
Foi a ciência, e não o comércio, que ampliou os anos de vida desse animal frágil, exposto a um número incontável de doenças, e lhe proporcionou conforto e segurança. Foram as artes, e não as guerras, que deram sentido à vida, com a revelação da beleza. No entanto, tudo isso está sendo deixado de lado, trocado por acúmulo de "bens", que na verdade são "males".
Seria saudável a cada pessoa se, ao despertar, ela pensasse que esse dia pode ser o último de sua passagem na Terra. Pode parecer mórbido, mas não é. É um exercício de humildade. Da humildade que o homem perdeu e precisa recuperar. Esqueceu-se da sua efemeridade, arrotando um poder que em verdade não possui.
Falta ao ser humano – pelo menos à maioria – descobrir seu verdadeiro papel e exercitá-lo. Só assim este macabro inferno de violência, de injustiças e de egoísmo, poderá ser transformado em um lugar bom para se viver...
As boas ideias, as que são embriões das grandes obras e que, não raro, até revolucionam o mundo, surgem de repente, quando menos esperamos, como que por acaso. Devemos estar atentos, e, sobretudo, preparados, para não deixar escapar essas preciosas oportunidades, que raramente voltam a aparecer.
Alguns, chamam esses momentos especiais de “inspirações”, que de nada valem, frise-se, se não vierem acompanhados de ações, de esforços, de atos concretos e competentes. Ou seja, de “transpiração”. Tenhamos em mente que nossas ideias nos personalizam, elevam, depreciam ou engrandecem, dependendo do seu teor e intensidade.
Se positivas e altruístas, desde que praticada, nos perpetuam no coração dos que se beneficiam, direta ou indiretamente, delas e promovem progresso, grandeza e transcendência. São aquela semente a que Gibran se refere, que nem a neve e nem as tempestades têm o poder de destruir.
Se nossas ideias, contudo, forem destrutivas, corruptoras, malévolas e chulas, despertarão horror e ira nos mais sensatos e, caso venham a ser aplicadas pelos tíbios e sem-personalidade, resultarão em intensos sofrimentos e desgraças para um número incontável de pessoas. Afinal, elas podem nos apequenar (e aos que as compartilharem) ou engrandecer.
São as ideias que, de fato, governam o mundo. Por isso devem ser policiadas, dia e noite, e filtradas, para que só as construtivas prevaleçam. Não há como, pois, não dar razão a Victor Hugo, quando alerta: “Estamos nas mãos desses deuses, desses monstros, desses gigantes: nossas ideias”. Tornemos as nossas em armas eficazes do bem e da justiça. Façamo-las sementes indestrutíveis contra as quais a neve, a tempestade e quaisquer outros fatores sejam impotentes.
Pedro J. Bondaczuk
O homem evoluído, que tem consciência do seu papel no mundo e se empenha na sua realização (raridade em todos os tempos), sem esperar vantagem material, é, sobretudo, generoso. A evolução da espécie humana deve tudo a essas pessoas abnegadas, que surgem a cada geração, determinando saltos evolutivos desse estranho e precioso animal que pensa (ou pelo menos conta com essa capacidade), mas que nem sempre dá um sentido positivo ao pensamento.
Tais indivíduos são os responsáveis pelas descobertas científicas, pelo desenvolvimento das artes, pela Justiça, pela organização política e social, pelos sistemas econômicos e pela geração e veiculação de idéias. Sua característica marcante é a generosidade. Semeiam inteligência e princípios incansavelmente, sem sequer atentar para o "solo" onde as sementes irão cair. Dão oportunidade a todos os que queiram usufruir de sua ação, sem nenhuma espécie de preconceito ou discriminação.
Das dezenas de bilhões de pessoas que já viveram, desde o surgimento do homem na Terra, apenas alguns milhares são lembrados, e, assim mesmo, eventualmente. Os demais... O dramaturgo Berthold Brecht levanta a seguinte questão, em uma das suas peças: “Quem construiu as sete torres de Tebas? Os livros estão cheios de nomes de reis. Foram reis que arrastaram os blocos de pedra? Na noite em que a Muralha da China foi concluída aonde foram os pedreiros?”
As grandes obras, sejam de que natureza forem, portanto, não são garantias de imortalidade. Nada é! As pequenas...? Não será criando barreiras de preconceitos, nem arrotando a importância, que na verdade não se tem, e muito menos será pisando sobre os que não tiveram ou não souberam aproveitar oportunidades, que se construirão as bases para um cotidiano saudável. Serão a solidariedade, o amor e as genuínas amizades.
Khalil Gibran Khalil escreveu, em um de seus mais belos poemas: “A neve e a tempestade destroem as flores, mas nada podem contra a semente”. As guerras e as catástrofes naturais destroem as obras, mas são impotentes para destruir ideias. É isso o que precisamos “semear” vida afora.
Há pessoas que vivem 80 anos ou mais e quando morrem não têm nada para deixar, não apenas aos familiares, mas à comunidade em que viveram. Outras, deixam rastros de destruição, de ódio e de rancor e, quando são lembradas, as lembranças são de um pesadelo que passou.
Outras, todavia, desaparecem prematuramente, com uma bagagem de realizações tão grande que chega a ser desproporcional aos anos que viveram. Tenhamos em mente que foram as ideias (não foi a força), que tiraram o homem das cavernas, com a maior revolução já ocorrida em todos os tempos: a descoberta da agricultura.
Foi a ciência, e não o comércio, que ampliou os anos de vida desse animal frágil, exposto a um número incontável de doenças, e lhe proporcionou conforto e segurança. Foram as artes, e não as guerras, que deram sentido à vida, com a revelação da beleza. No entanto, tudo isso está sendo deixado de lado, trocado por acúmulo de "bens", que na verdade são "males".
Seria saudável a cada pessoa se, ao despertar, ela pensasse que esse dia pode ser o último de sua passagem na Terra. Pode parecer mórbido, mas não é. É um exercício de humildade. Da humildade que o homem perdeu e precisa recuperar. Esqueceu-se da sua efemeridade, arrotando um poder que em verdade não possui.
Falta ao ser humano – pelo menos à maioria – descobrir seu verdadeiro papel e exercitá-lo. Só assim este macabro inferno de violência, de injustiças e de egoísmo, poderá ser transformado em um lugar bom para se viver...
As boas ideias, as que são embriões das grandes obras e que, não raro, até revolucionam o mundo, surgem de repente, quando menos esperamos, como que por acaso. Devemos estar atentos, e, sobretudo, preparados, para não deixar escapar essas preciosas oportunidades, que raramente voltam a aparecer.
Alguns, chamam esses momentos especiais de “inspirações”, que de nada valem, frise-se, se não vierem acompanhados de ações, de esforços, de atos concretos e competentes. Ou seja, de “transpiração”. Tenhamos em mente que nossas ideias nos personalizam, elevam, depreciam ou engrandecem, dependendo do seu teor e intensidade.
Se positivas e altruístas, desde que praticada, nos perpetuam no coração dos que se beneficiam, direta ou indiretamente, delas e promovem progresso, grandeza e transcendência. São aquela semente a que Gibran se refere, que nem a neve e nem as tempestades têm o poder de destruir.
Se nossas ideias, contudo, forem destrutivas, corruptoras, malévolas e chulas, despertarão horror e ira nos mais sensatos e, caso venham a ser aplicadas pelos tíbios e sem-personalidade, resultarão em intensos sofrimentos e desgraças para um número incontável de pessoas. Afinal, elas podem nos apequenar (e aos que as compartilharem) ou engrandecer.
São as ideias que, de fato, governam o mundo. Por isso devem ser policiadas, dia e noite, e filtradas, para que só as construtivas prevaleçam. Não há como, pois, não dar razão a Victor Hugo, quando alerta: “Estamos nas mãos desses deuses, desses monstros, desses gigantes: nossas ideias”. Tornemos as nossas em armas eficazes do bem e da justiça. Façamo-las sementes indestrutíveis contra as quais a neve, a tempestade e quaisquer outros fatores sejam impotentes.
Monday, October 26, 2009
"A virtude está no meio", diz um dito popular. E o que isso significa? Simples: que tudo aquilo que é em excesso, mesmo o que é comprovadamente bom, se torna mau. O raciocínio vem a calhar quando se trata da vaidade, tida e havida como um dos maiores defeitos humanos. Mas é um comportamento saudável, desde que equilibrado, sem exageros, na dose certa. Em relação à aparência física, por exemplo, não se pode condenar uma pessoa asseada, bem vestida, limpa, perfumada, que cuida da pele, dos dentes, dos cabelos e do vestuário. Ou seja, saudavelmente vaidosa e que, sobretudo, se ame. É sempre agradável o convívio com gente bonita. Faz bem aos olhos e conseqüentemente ao espírito. O que é condenável é o exagero, a exacerbação, a vaidade levada a limites extremos.
Motor do espírito
Pedro J. Bondaczuk
“A curiosidade é a mãe da sabedoria”, diz conhecido dito popular. Trata-se de verdade óbvia, da qual poucos se dão conta. Quem não é curioso, no bom sentido, não se sente motivado a aprender coisa alguma, por mais que necessite desse aprendizado, mesmo que invista nele todos os recursos de que dispõe. Até aprende, mas com inaudito sacrifício, com muito esforço e, não raro, com imenso sofrimento.
Este deveria ser, portanto, princípio básico da educação. A criança precisa, desde tenra idade, ter sua curiosidade despertada, espicaçada e estimulada, em relação a tudo o que a cerca, não importa se a coisas concretas ou a idéias abstratas, se a pessoas ou a objetos, se a acontecimentos ou se a princípios. Não é, infelizmente, o que ocorre.
A curiosidade ilimitada, a ânsia por descobrir novidades a cada instante da nossa vida (úteis ou inúteis, não importa, já que saber não ocupa lugar), é fonte inesgotável de experiências e de sabedoria. Nossa existência é relativamente curta e precisaríamos ter milhares de vidas para aprender, e entender, tudo o que o mundo tem a nos ensinar.
Há quem busque tolher essa volúpia por informações, entendendo que se trata de um defeito. Não posso concordar com quem age assim. Temos que fazer de cada instante um renascimento, sem deixarmos tempo livre para emoções negativas, como a cobiça, a inveja, a ira, a vingança e tantas outras que só tendem a levar sofrimento aos outros.
A vida consiste em uma contínua descoberta, desde o nascimento até a morte. A partir do útero materno, quando nosso sistema nervoso e, por conseqüência, nosso cérebro estão formados, já temos consciência, embora sem possibilidades de externar esse conhecimento, de que existimos e nos encontramos em um ambiente muito bem protegido e acolhedor. Pelo menos é o que dizem os especialistas.
Aliás, isto é comprovável, mediante o processo da regressão. Trata-se da primeira descoberta de uma sucessão que cada indivíduo terá no correr de sua existência, de acordo com a sua realidade e sua personalidade. E todas são frutos desse poderoso motor do espírito, que é a curiosidade. Ao morrer, descobriremos o quanto foram tolos os dogmas e valores aos quais nos aferramos. Mas então já será tarde...
Por ser curioso, o ser humano conquistou o átomo, embora não tenha feito sempre o melhor uso dessa ciência. Pela mesma razão, descobriu e mapeou os códigos genéticos, responsáveis pelas características de todos os seres. Também movido por esse “motor”, aprendeu a duplicar animais e vegetais.
O casal primitivo desobedeceu o Criador e comeu o fruto da Árvore do Bem e do Mal. Por que? Foi, também, por “curiosidade”, posto que mórbida, para ver o que acontecia, mesmo intuindo qual seria o resultado. Perdeu a inocência original, embora conquistasse o potencial de saber de tudo. Ou quase tudo.
Só um conhecimento, e para o seu próprio bem, lhe foi vedado (e para sempre): O do mistério da essência da vida. Caso o conhecesse, provavelmente conduziria à extinção da espécie. Tentaria imitar o Criador e certamente criaria monstros que o destruiriam.
Algumas verdades, pré-existentes, mas que por alguma razão, não conseguimos alcançar em determinado período da nossa trajetória vital, de repente, emergem diante de nós, se desnudam aos nossos olhos, se revelam à nossa consciência.
Muitas são óbvias, mas encaramo-las dessa maneira apenas depois de consumadas. Esta consumação, em geral, ocorre com a aquisição da experiência, que é resultado de muitos anos de empirismo, de sucessivas tentativas e erros. E de uma permanente sede de saber, uma constante, incalculável e persistente curiosidade. Às vezes, isso nos redime, às vezes, nos decepciona, deprime e condena.
Uma descoberta, por exemplo, que é complicada quando a fazemos, por ferir nosso amor próprio, é a das nossas limitações. Mas ela é importante. Se quisermos empreender conquistas, é indispensável sabermos onde estamos, o que somos, o que queremos e o quanto podemos, até para podermos escolher a estratégia e os meios para a nossa evolução.
Não é necessário, todavia, alardear nossas deficiências. Mas é indispensável que as identifiquemos e nos disponhamos a corrigir o que estiver incorreto. O dramaturgo Auguste Strindberg sintetiza essa postura: "Para mim, a alegria de viver está na dura e cruel luta pela vida. O aprender algo é para mim uma alegria". Mas para que esse aprendizado se torne possível, e, sobretudo alegre, é preciso manter sempre ligado esse poderoso “motor” do espírito, que é a curiosidade, por tudo e todos. .
Pedro J. Bondaczuk
“A curiosidade é a mãe da sabedoria”, diz conhecido dito popular. Trata-se de verdade óbvia, da qual poucos se dão conta. Quem não é curioso, no bom sentido, não se sente motivado a aprender coisa alguma, por mais que necessite desse aprendizado, mesmo que invista nele todos os recursos de que dispõe. Até aprende, mas com inaudito sacrifício, com muito esforço e, não raro, com imenso sofrimento.
Este deveria ser, portanto, princípio básico da educação. A criança precisa, desde tenra idade, ter sua curiosidade despertada, espicaçada e estimulada, em relação a tudo o que a cerca, não importa se a coisas concretas ou a idéias abstratas, se a pessoas ou a objetos, se a acontecimentos ou se a princípios. Não é, infelizmente, o que ocorre.
A curiosidade ilimitada, a ânsia por descobrir novidades a cada instante da nossa vida (úteis ou inúteis, não importa, já que saber não ocupa lugar), é fonte inesgotável de experiências e de sabedoria. Nossa existência é relativamente curta e precisaríamos ter milhares de vidas para aprender, e entender, tudo o que o mundo tem a nos ensinar.
Há quem busque tolher essa volúpia por informações, entendendo que se trata de um defeito. Não posso concordar com quem age assim. Temos que fazer de cada instante um renascimento, sem deixarmos tempo livre para emoções negativas, como a cobiça, a inveja, a ira, a vingança e tantas outras que só tendem a levar sofrimento aos outros.
A vida consiste em uma contínua descoberta, desde o nascimento até a morte. A partir do útero materno, quando nosso sistema nervoso e, por conseqüência, nosso cérebro estão formados, já temos consciência, embora sem possibilidades de externar esse conhecimento, de que existimos e nos encontramos em um ambiente muito bem protegido e acolhedor. Pelo menos é o que dizem os especialistas.
Aliás, isto é comprovável, mediante o processo da regressão. Trata-se da primeira descoberta de uma sucessão que cada indivíduo terá no correr de sua existência, de acordo com a sua realidade e sua personalidade. E todas são frutos desse poderoso motor do espírito, que é a curiosidade. Ao morrer, descobriremos o quanto foram tolos os dogmas e valores aos quais nos aferramos. Mas então já será tarde...
Por ser curioso, o ser humano conquistou o átomo, embora não tenha feito sempre o melhor uso dessa ciência. Pela mesma razão, descobriu e mapeou os códigos genéticos, responsáveis pelas características de todos os seres. Também movido por esse “motor”, aprendeu a duplicar animais e vegetais.
O casal primitivo desobedeceu o Criador e comeu o fruto da Árvore do Bem e do Mal. Por que? Foi, também, por “curiosidade”, posto que mórbida, para ver o que acontecia, mesmo intuindo qual seria o resultado. Perdeu a inocência original, embora conquistasse o potencial de saber de tudo. Ou quase tudo.
Só um conhecimento, e para o seu próprio bem, lhe foi vedado (e para sempre): O do mistério da essência da vida. Caso o conhecesse, provavelmente conduziria à extinção da espécie. Tentaria imitar o Criador e certamente criaria monstros que o destruiriam.
Algumas verdades, pré-existentes, mas que por alguma razão, não conseguimos alcançar em determinado período da nossa trajetória vital, de repente, emergem diante de nós, se desnudam aos nossos olhos, se revelam à nossa consciência.
Muitas são óbvias, mas encaramo-las dessa maneira apenas depois de consumadas. Esta consumação, em geral, ocorre com a aquisição da experiência, que é resultado de muitos anos de empirismo, de sucessivas tentativas e erros. E de uma permanente sede de saber, uma constante, incalculável e persistente curiosidade. Às vezes, isso nos redime, às vezes, nos decepciona, deprime e condena.
Uma descoberta, por exemplo, que é complicada quando a fazemos, por ferir nosso amor próprio, é a das nossas limitações. Mas ela é importante. Se quisermos empreender conquistas, é indispensável sabermos onde estamos, o que somos, o que queremos e o quanto podemos, até para podermos escolher a estratégia e os meios para a nossa evolução.
Não é necessário, todavia, alardear nossas deficiências. Mas é indispensável que as identifiquemos e nos disponhamos a corrigir o que estiver incorreto. O dramaturgo Auguste Strindberg sintetiza essa postura: "Para mim, a alegria de viver está na dura e cruel luta pela vida. O aprender algo é para mim uma alegria". Mas para que esse aprendizado se torne possível, e, sobretudo alegre, é preciso manter sempre ligado esse poderoso “motor” do espírito, que é a curiosidade, por tudo e todos. .
Sunday, October 25, 2009
Em manhãs luminosas, ensolaradas e de céu azul, aguardando a hora de dirigir-me ao trabalho, sinto o ar embalsamado de perfumes e a alma vibrante, em contato com a natureza. Ouço o canto dos bem-te-vis, que existem em grande quantidade em Campinas, a cidade em que resido e sinto-me renascido. Mas percebo o quanto estou fora do meu verdadeiro meio. Sou homem telúrico, ligado à terra, onde finco minhas raízes, e não o típico burguês urbano, acostumado à correria, poluição e barulho. Nasci num lugar aprazível da coxilha gaúcha, sem o burburinho da metrópole e nem as suas complicações. Por aqui, minha alma não consegue sair ao sol, em um pomar verde e ouro ou nos campos abertos e sem fim da minha terra natal. Esse, infelizmente, é o preço que se paga para usufruir os confortos de uma grande cidade, tendo que se submeter aos ônus que deles decorrem. Será que vale a pena? Tenho minhas dúvidas. E você, o que acha?
Impunidade estimula novas ditaduras
Pedro J. Bondaczuk
Os ditadores, assim que são depostos, raramente permanecem em seus países para responder pelos desmandos que cometeram quando estavam no poder. Ou conseguem fugir, limpando, antes, os cofres públicos, indo viver, no “doce ócio”, em algum dos tantos recantos aprazíveis, destinados aos milionários, que há no mundo. Ou são exilados pelos líderes dos golpes que os depõem, sob o pretexto de que o novo regime instalado não deseja proceder com revanchismo.
De qualquer forma, quase sempre terminam impunes. Não respondem perante Justiça alguma por seus delitos. A razão disso é muito simples. Quase todos eles contam com o respaldo de alguma superpotência para permanecer por tantos anos no poder, em troca de determinados “favores”.
Dessa forma, o caudilhismo, criticado por todos, continua sobrevivendo no mundo, praticamente nos albores de um novo milênio. Jean-Claude Duvallier, em 7 de fevereiro de 1986, conseguiu fugir para a França, onde vive até hoje, sem maiores incômodos. Esboçou-se um arremedo de processo contra ele, objetivando forçar o ditador haitiano a devolver o que teria tirado de seu povo. A alegria e os anos de sofrimento, assim como a vida de seus opositores, obviamente, nem ele e nem ninguém podem jamais devolver. A tentativa de levar Baby Doc à julgamento não deu em nada.
A mesma coisa aconteceu com o filipino Ferdinand Marcos, que caiu, em 26 de fevereiro de 1986. Hoje, sua família luta para conseguir permissão para que esse bandido possa, pelo menos, morrer na terra natal, que ele não soube respeitar enquanto a governou com mão de ferro. O ditador é réu num processo nos Estados Unidos e seus bens estão bloqueados na Suíça.
Mas é muito duvidoso que o governo das Filipinas consiga reaver aquilo que pertence ao seu povo. Ontem, foi a vez de duas advogadas paraguaias entrarem com ação contra o ex-todopoderoso caudilho do Paraguai, general Alfredo Stroessner. Ambas querem que as novas autoridades do país requeiram a extradição do ex-ditador, que goza as delícias do Planalto Central, em Itumbiara, no Estado de Goiás, cumprindo exílio determinado pelo general Andrés Rodriguez, que o depôs.
Como Baby Doc e Ferdinand Marcos, Stroessner também caiu em um mês de fevereiro, fatídico para os cínicos e abjetos “gorilas” que tratam seus respectivos países como propriedade particular, pelo menos nos dois últimos anos.
A exemplo dos ditadores do Haiti e das Filipinas, o do Paraguai também vai acabar, quase que certamente, sendo simplesmente esquecido, como um mau sonho, um pesadelo que se tem e que não se deseja mais nem mesmo lembrar. E, mais uma vez, os crimes, desmandos e atos de corrupção que lhes são atribuídos vão ficar sem nenhuma punição.
Não se reivindica nenhuma espécie de revanchismo, obviamente, mas se quer, simplesmente, que seja feita justiça. Se um cidadão comum que delinqüe tem de se haver com a lei, por que não dar o mesmo tratamento a um governante, que trai a confiança do seu povo?
(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 17 de fevereiro de 1989).
Pedro J. Bondaczuk
Os ditadores, assim que são depostos, raramente permanecem em seus países para responder pelos desmandos que cometeram quando estavam no poder. Ou conseguem fugir, limpando, antes, os cofres públicos, indo viver, no “doce ócio”, em algum dos tantos recantos aprazíveis, destinados aos milionários, que há no mundo. Ou são exilados pelos líderes dos golpes que os depõem, sob o pretexto de que o novo regime instalado não deseja proceder com revanchismo.
De qualquer forma, quase sempre terminam impunes. Não respondem perante Justiça alguma por seus delitos. A razão disso é muito simples. Quase todos eles contam com o respaldo de alguma superpotência para permanecer por tantos anos no poder, em troca de determinados “favores”.
Dessa forma, o caudilhismo, criticado por todos, continua sobrevivendo no mundo, praticamente nos albores de um novo milênio. Jean-Claude Duvallier, em 7 de fevereiro de 1986, conseguiu fugir para a França, onde vive até hoje, sem maiores incômodos. Esboçou-se um arremedo de processo contra ele, objetivando forçar o ditador haitiano a devolver o que teria tirado de seu povo. A alegria e os anos de sofrimento, assim como a vida de seus opositores, obviamente, nem ele e nem ninguém podem jamais devolver. A tentativa de levar Baby Doc à julgamento não deu em nada.
A mesma coisa aconteceu com o filipino Ferdinand Marcos, que caiu, em 26 de fevereiro de 1986. Hoje, sua família luta para conseguir permissão para que esse bandido possa, pelo menos, morrer na terra natal, que ele não soube respeitar enquanto a governou com mão de ferro. O ditador é réu num processo nos Estados Unidos e seus bens estão bloqueados na Suíça.
Mas é muito duvidoso que o governo das Filipinas consiga reaver aquilo que pertence ao seu povo. Ontem, foi a vez de duas advogadas paraguaias entrarem com ação contra o ex-todopoderoso caudilho do Paraguai, general Alfredo Stroessner. Ambas querem que as novas autoridades do país requeiram a extradição do ex-ditador, que goza as delícias do Planalto Central, em Itumbiara, no Estado de Goiás, cumprindo exílio determinado pelo general Andrés Rodriguez, que o depôs.
Como Baby Doc e Ferdinand Marcos, Stroessner também caiu em um mês de fevereiro, fatídico para os cínicos e abjetos “gorilas” que tratam seus respectivos países como propriedade particular, pelo menos nos dois últimos anos.
A exemplo dos ditadores do Haiti e das Filipinas, o do Paraguai também vai acabar, quase que certamente, sendo simplesmente esquecido, como um mau sonho, um pesadelo que se tem e que não se deseja mais nem mesmo lembrar. E, mais uma vez, os crimes, desmandos e atos de corrupção que lhes são atribuídos vão ficar sem nenhuma punição.
Não se reivindica nenhuma espécie de revanchismo, obviamente, mas se quer, simplesmente, que seja feita justiça. Se um cidadão comum que delinqüe tem de se haver com a lei, por que não dar o mesmo tratamento a um governante, que trai a confiança do seu povo?
(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 17 de fevereiro de 1989).
Saturday, October 24, 2009
Robert Louis Stevenson faz interessante observação sobre a melhor forma de se viver. Afirma: "Todos podem executar seu trabalho, por difícil que seja, por um dia. Todos podem viver com doçura, paciência, ternura e pureza até que o Sol se ponha. E isso é tudo o que a vida realmente significa". Nós é que a complicamos com nossos temores, iras, ambições e egoísmo. Para muitos, essa constatação pode ser uma descoberta. Outros, do alto da sua arrogância, podem ironizá-la e jamais assimilá-la. Para os conscientes, é um roteiro de conduta, que os torna agradáveis aos olhos dos que convivem com eles. Para os inconscientes...
Lições no tempo
Pedro J. Bondaczuk
A estrela azul dos meus sonhos
aos poucos se perde nas trevas
e o brilho fugaz de seus olhos
estão sepultos no passado.
A garça que busca o seu ninho,
a rosa que perde seu viço,
e o sol, vagando distante,
são visões do nosso afeto...
O Tempo, ímpio tirano,
aniquila tudo o que fomos
e nos prende pela alma
com seus grilhões de saudade...
Se a doce lembrança de ontem
criar cristais em seus olhos
fazendo o orvalho brotar,
sorria pras estrelas distantes,
fabrique nova ilusão,
não se detenha no tempo
que a vida não pode parar...!
(Poema composto em Campinas, em 1 de março de 1967 e publicado na "Gazeta do Rio Pardo", em 28 de abril de 1968).
Pedro J. Bondaczuk
A estrela azul dos meus sonhos
aos poucos se perde nas trevas
e o brilho fugaz de seus olhos
estão sepultos no passado.
A garça que busca o seu ninho,
a rosa que perde seu viço,
e o sol, vagando distante,
são visões do nosso afeto...
O Tempo, ímpio tirano,
aniquila tudo o que fomos
e nos prende pela alma
com seus grilhões de saudade...
Se a doce lembrança de ontem
criar cristais em seus olhos
fazendo o orvalho brotar,
sorria pras estrelas distantes,
fabrique nova ilusão,
não se detenha no tempo
que a vida não pode parar...!
(Poema composto em Campinas, em 1 de março de 1967 e publicado na "Gazeta do Rio Pardo", em 28 de abril de 1968).
Friday, October 23, 2009
Uma propaganda (muito bem feita, por sinal) para uma vida de melhor qualidade, que foi veiculada pela televisão, se não me engano em 2002, foi a do Açúcar União. O anúncio em questão dava uma “receita” inteligente e bem-humorada para se viver 200 anos. Claro que tamanha longevidade é exagerada. Mas que vai melhorar a “qualidade de vida” de quem a adotar, disso não resta dúvida. Entre as recomendações do anúncio estão, por exemplo: “não levarmos nada muito a sério; rirmos mais, especialmente de nós mesmos; abraçarmos mais aos que gostamos; nos entregarmos mais vezes às pequenas, porém relevantes sensações (físicas e emocionais); nos apaixonarmos mais vezes, mesmo que seja sempre pela mesma pessoa” etc.etc.etc. Isto é, devemos viver plenamente o presente, já que não sabemos qual será nosso amanhã, sem nos descuidarmos do futuro.
Palavra cavada no silêncio
Pedro J. Bondaczuk
O verão, em Campinas, tem dias maravilhosos, como uma pintura de hábil artista (isto, quando não chove), não raro os mais bonitos do ano. Num dos poucos sábados livres que tenho, saio para dar uma volta pelo centro da cidade, razoavelmente tranqüilo nesta tarde, bem diferente do que ocorre durante a semana, quando o trânsito caótico, as multidões apressadas e a ação dos trombadinhas tornam o simples ato de andar distraído pelas calçadas verdadeira aventura.
Caminho, despreocupado, pelo Largo do Rosário, apreciando o revoar das pombas ao redor dos prédios e das marquises da praça. Sinto sede. Resolvo dar uma paradinha no Éden Bar para uma cervejinha estupidamente gelada.
Não tarda muito, aparece um conhecido, ferrenho torcedor do São Paulo, que logo me acena. Tento fingir que não o vi, mas volto atrás, para não cometer uma indelicadeza com essa pessoa. Afinal, quando não fala sobre futebol, ele até que é um bom sujeito.Cumprimentamo-nos, trocamos as palavras formais de sempre. “Como vai?”, pergunta o tal conhecido, “você anda sumido”, acrescenta. “É o meu trabalho no jornal”, respondo. “Não encontro tempo sequer para respirar”, explico, torcendo para que a conversa se atenha, apenas, ao terreno neutro das amenidades. Ou que o meu interlocutor enverede para aquilo que é a minha especialidade enquanto jornalista, a política, com as suas nuances, digamos, nem sempre éticas.
A questão que eu temia, porém, não se fez esperar muito. “E a Macaca? Quase caiu, mais uma vez, do galho”, sapecou o sampaulino fanático, para o meu desgosto, em alusão à péssima campanha, no Segundo Turno do Campeonato Brasileiro, recém-encerrado, do meu time do coração, a Ponte Preta. Foi tão mal, que só escapou do rebaixamento no último jogo, ao derrotar o rebaixado Brasiliense, no Majestoso, por 3 a 1, em um jogo tenso e dramático.
Como se vê, lá vinha ele com mais uma das tantas piadinhas que circularam, nos dias que antecederam essa partida, em geral respondidas com palavrões. Afinal, o que responder? O time tinha decepcionado mesmo!
Claro que ainda estou de cabeça inchada por mais esse fracasso do meu clube de coração, uma das minhas paixões que, como todas as que temos, é ilógica e irracional. Pois é, mais uma vez, a falta de planejamento e de organização (e, principalmente, de dinheiro) nos atropelou. E lá vai a Ponte Preta, detentora da maior torcida da cidade (apesar de uma certa pesquisa ter mostrado o contrário) tentar montar outro time, completamente novo e desentrosado, para não dar vexame no Campeonato Paulista de 2006.
“Onde ficou a recuperação que você escreveu que haveria?”, perguntou o chato, em tom de chacota. Eu havia publicado, na metade do Segundo Turno, em uma das minhas colunas de esportes que escrevo para jornais de bairro, que a equipe iria dar a volta por cima e permanecer distante das últimas colocações. Não permaneceu. Mas escapou (por um triz) do rebaixamento. Ufa! Que alívio!
“Bem, embora goste muito de futebol, não sou especialista dessa área”, respondi, meio que com vontade de espantar o chato para longe. “Por essa razão, não tenho necessidade de ser neutro. E não sou. Na qualidade de simples torcedor, acreditei até o final. Não é este o único papel da torcida?”, acrescentei, sentindo que não estava sendo nada convincente e incomodado com o papo, que estava se tornando cada vez mais desagradável.
Ninguém gosta de ficar em desvantagem, seja lá no que for, e eu não precisava me aborrecer sem necessidade. Ainda mais num sábado tão bonito de verão, como era esse. Emborquei, rapidamente, o último copo de cerveja, sem sequer saborear o paladar da bebida, olhei para o relógio, dando a entender que estava atrasado para um compromisso (que na verdade não tinha), dei um tapinha nas costas do sãopaulino chato, mas cuja amizade queria preservar, e segui adiante, General Osório abaixo, rumo à Praça Carlos Gomes.
Andei apressado, quase correndo, pelo primeiro quarteirão, temendo que o conhecido quisesse me acompanhar. Não quis. Ufa! Reduzi o passo e voltei às minhas reflexões. Senti o quanto esta cidade faz parte de mim, o quanto tem me influenciado positivamente. Não se diz que o homem é produto do meio em que vive? Talvez não seja assim, mas que este tem lá sua influência, ah, isso tem!Lembro-me, a propósito, de uma crônica de Wilson Luiz Sanvitto, publicada no Jornal da Tarde, que diz, em determinado trecho, algo que me marcou e que, sempre que posso, costumo citar: “Após uma longa vida, o homem é um pouco uma fusão de todas as pessoas que conheceu, todos os livros que leu, todos os crepúsculos que admirou, todas as obras de arte que apreciou, todas as músicas que ouviu...De sorte que eu concordo com quem disse: cada homem que morre é uma biblioteca que arde”.Pois é, um pouco desta tarde também ficará incorporado em mim. Espero, apenas, que a parte do encontro com o sampaulino se apague da mente. Que atrevimento vir me gozar por causa da Ponte Preta! Justo ele, que é campineiro de nascimento, mas que sequer torce para algum clube da sua cidade natal! Também sou cidadão desta metrópole, mas por opção. Mas...deixa para lá!
Não é a primeira vez que o time viveu situações como essa e sempre (ou quase sempre) deu um jeito de se safar. Afinal, já foi vice-campeão por quatro vezes! Só no Brasil o segundo lugar não tem valor algum.
O poeta italiano, G. Ungaretti, tem um verso que, não sei por qual razão, me vem à memória, enquanto perambulo, preguiçosamente, pela Praça Carlos Gomes: “Quando encontro/neste meu silêncio/uma palavra/cavo nela minha vida/como um abismo”, escreveu o poeta.
Qual é a minha palavra? Olho ao redor, vejo tantas caras estranhas e conhecidas, alegres e tristes, feias e bonitas, e lugares tão familiares desta cidade, que já é um pedaço de mim. Já sei qual é...”Na palavra ‘amor’, cavo minha vida, como um abismo”, digo aos meus botões, parodiando Ungaretti...
Pedro J. Bondaczuk
O verão, em Campinas, tem dias maravilhosos, como uma pintura de hábil artista (isto, quando não chove), não raro os mais bonitos do ano. Num dos poucos sábados livres que tenho, saio para dar uma volta pelo centro da cidade, razoavelmente tranqüilo nesta tarde, bem diferente do que ocorre durante a semana, quando o trânsito caótico, as multidões apressadas e a ação dos trombadinhas tornam o simples ato de andar distraído pelas calçadas verdadeira aventura.
Caminho, despreocupado, pelo Largo do Rosário, apreciando o revoar das pombas ao redor dos prédios e das marquises da praça. Sinto sede. Resolvo dar uma paradinha no Éden Bar para uma cervejinha estupidamente gelada.
Não tarda muito, aparece um conhecido, ferrenho torcedor do São Paulo, que logo me acena. Tento fingir que não o vi, mas volto atrás, para não cometer uma indelicadeza com essa pessoa. Afinal, quando não fala sobre futebol, ele até que é um bom sujeito.Cumprimentamo-nos, trocamos as palavras formais de sempre. “Como vai?”, pergunta o tal conhecido, “você anda sumido”, acrescenta. “É o meu trabalho no jornal”, respondo. “Não encontro tempo sequer para respirar”, explico, torcendo para que a conversa se atenha, apenas, ao terreno neutro das amenidades. Ou que o meu interlocutor enverede para aquilo que é a minha especialidade enquanto jornalista, a política, com as suas nuances, digamos, nem sempre éticas.
A questão que eu temia, porém, não se fez esperar muito. “E a Macaca? Quase caiu, mais uma vez, do galho”, sapecou o sampaulino fanático, para o meu desgosto, em alusão à péssima campanha, no Segundo Turno do Campeonato Brasileiro, recém-encerrado, do meu time do coração, a Ponte Preta. Foi tão mal, que só escapou do rebaixamento no último jogo, ao derrotar o rebaixado Brasiliense, no Majestoso, por 3 a 1, em um jogo tenso e dramático.
Como se vê, lá vinha ele com mais uma das tantas piadinhas que circularam, nos dias que antecederam essa partida, em geral respondidas com palavrões. Afinal, o que responder? O time tinha decepcionado mesmo!
Claro que ainda estou de cabeça inchada por mais esse fracasso do meu clube de coração, uma das minhas paixões que, como todas as que temos, é ilógica e irracional. Pois é, mais uma vez, a falta de planejamento e de organização (e, principalmente, de dinheiro) nos atropelou. E lá vai a Ponte Preta, detentora da maior torcida da cidade (apesar de uma certa pesquisa ter mostrado o contrário) tentar montar outro time, completamente novo e desentrosado, para não dar vexame no Campeonato Paulista de 2006.
“Onde ficou a recuperação que você escreveu que haveria?”, perguntou o chato, em tom de chacota. Eu havia publicado, na metade do Segundo Turno, em uma das minhas colunas de esportes que escrevo para jornais de bairro, que a equipe iria dar a volta por cima e permanecer distante das últimas colocações. Não permaneceu. Mas escapou (por um triz) do rebaixamento. Ufa! Que alívio!
“Bem, embora goste muito de futebol, não sou especialista dessa área”, respondi, meio que com vontade de espantar o chato para longe. “Por essa razão, não tenho necessidade de ser neutro. E não sou. Na qualidade de simples torcedor, acreditei até o final. Não é este o único papel da torcida?”, acrescentei, sentindo que não estava sendo nada convincente e incomodado com o papo, que estava se tornando cada vez mais desagradável.
Ninguém gosta de ficar em desvantagem, seja lá no que for, e eu não precisava me aborrecer sem necessidade. Ainda mais num sábado tão bonito de verão, como era esse. Emborquei, rapidamente, o último copo de cerveja, sem sequer saborear o paladar da bebida, olhei para o relógio, dando a entender que estava atrasado para um compromisso (que na verdade não tinha), dei um tapinha nas costas do sãopaulino chato, mas cuja amizade queria preservar, e segui adiante, General Osório abaixo, rumo à Praça Carlos Gomes.
Andei apressado, quase correndo, pelo primeiro quarteirão, temendo que o conhecido quisesse me acompanhar. Não quis. Ufa! Reduzi o passo e voltei às minhas reflexões. Senti o quanto esta cidade faz parte de mim, o quanto tem me influenciado positivamente. Não se diz que o homem é produto do meio em que vive? Talvez não seja assim, mas que este tem lá sua influência, ah, isso tem!Lembro-me, a propósito, de uma crônica de Wilson Luiz Sanvitto, publicada no Jornal da Tarde, que diz, em determinado trecho, algo que me marcou e que, sempre que posso, costumo citar: “Após uma longa vida, o homem é um pouco uma fusão de todas as pessoas que conheceu, todos os livros que leu, todos os crepúsculos que admirou, todas as obras de arte que apreciou, todas as músicas que ouviu...De sorte que eu concordo com quem disse: cada homem que morre é uma biblioteca que arde”.Pois é, um pouco desta tarde também ficará incorporado em mim. Espero, apenas, que a parte do encontro com o sampaulino se apague da mente. Que atrevimento vir me gozar por causa da Ponte Preta! Justo ele, que é campineiro de nascimento, mas que sequer torce para algum clube da sua cidade natal! Também sou cidadão desta metrópole, mas por opção. Mas...deixa para lá!
Não é a primeira vez que o time viveu situações como essa e sempre (ou quase sempre) deu um jeito de se safar. Afinal, já foi vice-campeão por quatro vezes! Só no Brasil o segundo lugar não tem valor algum.
O poeta italiano, G. Ungaretti, tem um verso que, não sei por qual razão, me vem à memória, enquanto perambulo, preguiçosamente, pela Praça Carlos Gomes: “Quando encontro/neste meu silêncio/uma palavra/cavo nela minha vida/como um abismo”, escreveu o poeta.
Qual é a minha palavra? Olho ao redor, vejo tantas caras estranhas e conhecidas, alegres e tristes, feias e bonitas, e lugares tão familiares desta cidade, que já é um pedaço de mim. Já sei qual é...”Na palavra ‘amor’, cavo minha vida, como um abismo”, digo aos meus botões, parodiando Ungaretti...
Thursday, October 22, 2009
Victor Hugo escreveu: "Todo o segredo dos grandes corações está nesta palavra: 'perseverar'. A constância diz que espécie de homem há dentro de nós, qual é a nossa personalidade, a dimensão da nossa coragem. Os constantes são os sublimes. Quem é apenas bravo tem só um assomo, quem é apenas valente tem só um temperamento, quem é apenas corajoso tem só uma virtude; o tenaz, porém, tem a grandeza". Tenacidade é sinônimo de persistência. Só ela conduz ao verdadeiro heroísmo. E este consiste em vencermos nossas deficiências e em conquistarmos os nossos sonhos... Persistir, persistir e persistir. Este é o segredo dos vencedores. Deixo-lhe esta reflexão para iluminar e inspirar seu dia.
Conhecimento e educação
Pedro J. Bondaczuk
No livro “Megatendências”, John Naisbit constatou a existência de uma grande contradição na sociedade norte-americana. Enquanto o país se encaminha para se transformar num produtor e exportador de informações – no seu entender o grande “produto” do século XXI – o sistema educacional dos Estados Unidos atravessa uma enorme crise, especialmente de qualidade. Embora a obra tenha sido escrita em 1982, o quadro não evoluiu para melhor e até se deteriorou. Pesquisas revelam que a educação também atravessa momentos críticos em outras partes do mundo. No Brasil, nem se diga!
Conclui-se que, enquanto a tecnologia teve avanços rapidíssimos e até miraculosos, o sistema educacional estagnou e não acompanhou esse progresso. Naisbit ressalta, na página 31 do seu livro: “Torna-se cada vez mais evidente que os graduados nos colégios, e mesmo nas universidades, não conseguem escrever um inglês aceitável, ou mesmo trabalhar com simples aritmética. Pela primeira vez na história americana, a geração de jovens que chega à idade adulta tem menos capacidade que seus pais”.
Se nos Estados Unidos e na Europa o quadro é esse, o que dizer do Brasil, onde, além de tudo, os educadores são sobrecarregados de serviços, em virtude de salários humilhantes, e sequer encontram tempo para preparar aulas decentes, quanto mais para passar por indispensáveis e periódicas reciclagens didáticas?! De uns anos para cá, tanto em nosso País, quanto em outras partes do mundo ocidental, de onde abundam informações a respeito, os educadores e, principalmente, os responsáveis pelas políticas educacionais vêm confundindo educação com mera acumulação de conhecimentos.
Opta-se pela formação de repetidores de conceitos alheios, de meros papagaios, alguns, verdadeiras enciclopédias vivas, em detrimento dos pensadores. De pessoas capazes de adotar postura crítica face qualquer informação e, sobretudo, aptas a acrescentar algo de próprio a ela. Desestimula-se o raciocínio. Em muitas partes, as escolas têm praticamente o mesmo perfil autoritário e medieval de três, quatro ou mais séculos atrás. Mas o mundo mudou muito desde então. Conhecimentos são acumulados hoje de maneira muito mais rápida, eficiente e organizada em memórias de computadores do que no cérebro humano. Ao homem compete saber como usar esse acervo para melhorar sua vida e a da comunidade em que se insere.
O pensador Jiddu Krishnamurti traçou, com clareza, numa entrevista dada há alguns anos, a diferença entre educar e acumular informações. Sentenciou: “As escolas existem principalmente para conseguir uma transformação profunda nos seres humanos, e a responsabilidade do educador é tremenda. Há muita diferença entre aprender e acumular conhecimentos. Aprender eleva a inteligência, acumular conhecimentos apenas embota a mente e não pode solucionar nossos problemas espirituais”.
O homem é educado para a liberdade ou a servidão, o altruísmo ou o egoísmo, a solidariedade ou o isolamento dos semelhantes – que Santo Tomás de Aquino atribuía a uma deformação de caráter e condenava quem agisse assim, como se fosse uma ilha solitária e dissociada dos outros seres humanos. Qual o caminho que o Brasil vai escolher?
Somos “adestrados”, à nossa revelia, para integrar determinados sistemas políticos e sociais, sem que se levem em conta nossas vontades, aptidões e natureza. Uma entidade abstrata, o “Estado”, ganha maior relevância (praticamente absoluta) do que seus membros, concretos, concretíssimos e mais, vivos, que sentem fome, dor, saudade, alegrias, tristezas, ira, solidão etc.
Os meios para se chegar a uma vida digna e produtiva (os bens materiais) são colocados como fins, sutilmente, na cabeça das pessoas, o que as desorienta, ainda mais quando o sistema “interpreta”, as seu bel-prazer, a realidade e a distorce, de modos a que seja favorecido. A educação no sentido lato do termo é a que nos prepara para a vida e não apenas para o exercício de uma profissão.
Pedro J. Bondaczuk
No livro “Megatendências”, John Naisbit constatou a existência de uma grande contradição na sociedade norte-americana. Enquanto o país se encaminha para se transformar num produtor e exportador de informações – no seu entender o grande “produto” do século XXI – o sistema educacional dos Estados Unidos atravessa uma enorme crise, especialmente de qualidade. Embora a obra tenha sido escrita em 1982, o quadro não evoluiu para melhor e até se deteriorou. Pesquisas revelam que a educação também atravessa momentos críticos em outras partes do mundo. No Brasil, nem se diga!
Conclui-se que, enquanto a tecnologia teve avanços rapidíssimos e até miraculosos, o sistema educacional estagnou e não acompanhou esse progresso. Naisbit ressalta, na página 31 do seu livro: “Torna-se cada vez mais evidente que os graduados nos colégios, e mesmo nas universidades, não conseguem escrever um inglês aceitável, ou mesmo trabalhar com simples aritmética. Pela primeira vez na história americana, a geração de jovens que chega à idade adulta tem menos capacidade que seus pais”.
Se nos Estados Unidos e na Europa o quadro é esse, o que dizer do Brasil, onde, além de tudo, os educadores são sobrecarregados de serviços, em virtude de salários humilhantes, e sequer encontram tempo para preparar aulas decentes, quanto mais para passar por indispensáveis e periódicas reciclagens didáticas?! De uns anos para cá, tanto em nosso País, quanto em outras partes do mundo ocidental, de onde abundam informações a respeito, os educadores e, principalmente, os responsáveis pelas políticas educacionais vêm confundindo educação com mera acumulação de conhecimentos.
Opta-se pela formação de repetidores de conceitos alheios, de meros papagaios, alguns, verdadeiras enciclopédias vivas, em detrimento dos pensadores. De pessoas capazes de adotar postura crítica face qualquer informação e, sobretudo, aptas a acrescentar algo de próprio a ela. Desestimula-se o raciocínio. Em muitas partes, as escolas têm praticamente o mesmo perfil autoritário e medieval de três, quatro ou mais séculos atrás. Mas o mundo mudou muito desde então. Conhecimentos são acumulados hoje de maneira muito mais rápida, eficiente e organizada em memórias de computadores do que no cérebro humano. Ao homem compete saber como usar esse acervo para melhorar sua vida e a da comunidade em que se insere.
O pensador Jiddu Krishnamurti traçou, com clareza, numa entrevista dada há alguns anos, a diferença entre educar e acumular informações. Sentenciou: “As escolas existem principalmente para conseguir uma transformação profunda nos seres humanos, e a responsabilidade do educador é tremenda. Há muita diferença entre aprender e acumular conhecimentos. Aprender eleva a inteligência, acumular conhecimentos apenas embota a mente e não pode solucionar nossos problemas espirituais”.
O homem é educado para a liberdade ou a servidão, o altruísmo ou o egoísmo, a solidariedade ou o isolamento dos semelhantes – que Santo Tomás de Aquino atribuía a uma deformação de caráter e condenava quem agisse assim, como se fosse uma ilha solitária e dissociada dos outros seres humanos. Qual o caminho que o Brasil vai escolher?
Somos “adestrados”, à nossa revelia, para integrar determinados sistemas políticos e sociais, sem que se levem em conta nossas vontades, aptidões e natureza. Uma entidade abstrata, o “Estado”, ganha maior relevância (praticamente absoluta) do que seus membros, concretos, concretíssimos e mais, vivos, que sentem fome, dor, saudade, alegrias, tristezas, ira, solidão etc.
Os meios para se chegar a uma vida digna e produtiva (os bens materiais) são colocados como fins, sutilmente, na cabeça das pessoas, o que as desorienta, ainda mais quando o sistema “interpreta”, as seu bel-prazer, a realidade e a distorce, de modos a que seja favorecido. A educação no sentido lato do termo é a que nos prepara para a vida e não apenas para o exercício de uma profissão.
Wednesday, October 21, 2009
O passado tem, claro, a sua importância para todos nós, já que a nossa vida é uma continuidade, um todo, uma somatória de tempos. Mas só terá utilidade se o utilizarmos como parâmetro, como medida, como termo de comparação, para evitar que venhamos a tropeçar nos mesmos obstáculos que nos derrubaram um dia. Ou para impedir que cometamos os mesmos erros que nos tornaram infelizes ou frustraram algum dos nossos projetos. Ou para prevenir-nos de decepções que sejam evitáveis. É certo que devemos ter um projeto de vida, para ordenar nossa conduta. Mas não pode ser nada muito rígido. E nem muito de longo prazo. Ou sequer de médio. Para sermos práticos, não convém projetarmos um futuro além do dia seguinte que, mesmo assim, não temos certeza de que estaremos vivos.
Sons da infância
Pedro J. Bondaczuk
A vida pode ser definida, também, (pois há inúmeras definições possíveis e nenhuma delas definitiva) como conjunto de sons: ternos ou dramáticos, angustiantes ou eufóricos, harmoniosos ou dissonantes etc. Expressam, em sua variedade, todos os sentimentos e situações pelas quais passamos, positivas ou negativas, alegres ou tristes, cômicas ou dramáticas, de vida ou de morte. Eles são, em última análise, a forma como todos os animais (não apenas os ditos racionais) se comunicam.
Os sons que se calam com maior profundidade, e com mais intensidade, em nossa memória são os mais remotos possíveis, de muitos anos atrás, em alguns casos os de décadas: são os da infância. São os daquela fase encantada de formação, de descobertas, de pasmo e de espanto face ao mundo e tudo o que nele há. São os risos francos e cristalinos das crianças a brincarem no pátio de uma escola. São seus gritos de alegria, de protesto, de dor ou de raiva. São seu choro convulsivo ou somente de birra.
Sons...A vida é repleta de sons...E não somente os espontâneos, os que destoam, os que agridem os tímpanos e machucam a alma. Tempos atrás, escrevi uma crônica, fartamente divulgada por jornais e páginas da internet, em que abordei um dos aspectos dessa parafernália sonora (o tema é tão vasto que creio que jamais se esgotaria).
Em determinado trecho constatei: “Todos temos, em maior ou menor grau, determinadas canções que nos evocam, sempre que executadas, momentos marcantes, bons ou maus, da vida. Elas formam, em conjunto, uma espécie de “trilha sonora” desses acontecimentos, como nos filmes, com a diferença de que não se trata de ficção, mas da realidade nua e crua, mesmo que a fantasiemos, na medida do nosso temperamento e da nossa personalidade”.
E citei várias dessas canções, populares ou não, gravadas fundamente na memória e que, sempre que tocadas, me evocam emoções, alegres ou tristes, positivas ou negativas que, embora adormecidas, não morreram como podem parecer. Permanecem ali, mais vivas do que nunca, e que afloram quando menos espero, pois só vão morrer no dia em que eu deixar de vez este mundo para me reincorporar à natureza. “És pó e ao pó retornarás”, nos alertam, com realismo, os pregadores de várias religiões. São “gatilhos” que, sempre que acionados, trazem de volta, com variáveis intensidades, esses sentimentos que ajudam a compor nossa personalidade.
Entre as composições citadas, mencionei peças de Chopin, de Wagner, de Bach, de Liszt, de Rachmaninoff, de Brahms, de Mozart, de Tchaikowski, de Jacques Offenbach (principalmente a “Barcarola”, da série “Les contes d”Hoffmann”) e, em especial de Beethoven. Citei, também, canções que me embalaram a adolescência, principalmente aquelas dos chamados “anos dourados”, como “Jambalaya”, com Brenda Lee; “Love letters in the sand” e “Only you”, com os The Platers; “Minha namorada”, com Carlos Lyra, “Noite do meu bem”, de Dolores Duran, com Maysa Matarazzo e “Hino ao amor”, tanto com a Edith Piaff, no original em francês, como na versão que vendeu toneladas de discos, na voz de Wilma Bentivegna, entre outras, marcaram instantes memoráveis.
Estranhamente, porém, omiti aquela que mais me toca, sempre que ouço, que revela, sobretudo, minha principal característica: o apego às pessoas e o desapego às coisas. Trata-se de “Peixe Vivo”, cantiga folclórica, cujo autor e época em que foi composta são desconhecidos que, certamente, brotou espontânea da alma popular, dadas as suas características.
O ex-presidente Juscelino Kubitschek fez dela sua trilha sonora. Provavelmente, essa cantiga de roda originou-se em Portugal, em alguma remota região de pastoreio (conclusão óbvia, levando em conta o que diz a segunda parte da letra), trazida para o País, notadamente para Minas
Gerais, pelos colonizadores portugueses.
“Como pode o peixe vivo
viver fora da água fria?
Como pode o peixe vivo
viver fora da água fria?
Como poderei viver,
como poderei viver
sem a tua, sem a tua,
sem a tua companhia?”.
Quanta evocação essa cantiga me traz! De maneira simples e ingênua, diz o que há anos venho tentando dizer, em milhares e milhares de crônicas e em outros tantos de versos, e jamais consegui. Ou seja, expressa o meu apego atávico aos meus pais, aos meus filhos e à minha amada. Declara a necessidade física, psicológica e, sobretudo afetiva, dos amigos, sem que importe o tempo, a característica (se virtual ou presencial) e a intensidade dessas amizades. Exprime a importância dos leitores, contumazes ou ocasionais, deste constante desnudamento emocional em público que pratico há tantos anos através dos textos que produzo.
“Os pastores desta aldeia
já me fazem zombaria,
os pastores desta aldeia
já me fazem zombaria
por me ver andar sozinho,
por me ver andar sozinho,
sem a tua, sem a tua,
sem a tua companhia”.
São sons da infância que me lembram, a todo o momento, que o menino que um dia fui não morreu. Continua mais vivo do que nunca. Que apesar dessa máscara de adulto sério, compenetrado, aparentemente cético, com profundas cicatrizes no corpo e na alma, ainda é o mesmo: ingênuo, carente de atenção e de afeto, inocente e deslumbrado.
Só posso concluir estas confidências com as palavras do mestre de todos nós, Rubem Braga, que na crônica “A Navegação da Casa” (inserida em seu livro “A Borboleta Amarela”), desabafou: “Oh! Deuses miseráveis da vida, por que nos obrigais ao incessante assassínio de nós mesmos e a esse interminável desperdício de ternuras?”...”Como poderei viver, como poderei viver, sem a tua, sem a tua, sem a tua companhia” anônimo leitor que me prestigia com a tua atenção?!!
Pedro J. Bondaczuk
A vida pode ser definida, também, (pois há inúmeras definições possíveis e nenhuma delas definitiva) como conjunto de sons: ternos ou dramáticos, angustiantes ou eufóricos, harmoniosos ou dissonantes etc. Expressam, em sua variedade, todos os sentimentos e situações pelas quais passamos, positivas ou negativas, alegres ou tristes, cômicas ou dramáticas, de vida ou de morte. Eles são, em última análise, a forma como todos os animais (não apenas os ditos racionais) se comunicam.
Os sons que se calam com maior profundidade, e com mais intensidade, em nossa memória são os mais remotos possíveis, de muitos anos atrás, em alguns casos os de décadas: são os da infância. São os daquela fase encantada de formação, de descobertas, de pasmo e de espanto face ao mundo e tudo o que nele há. São os risos francos e cristalinos das crianças a brincarem no pátio de uma escola. São seus gritos de alegria, de protesto, de dor ou de raiva. São seu choro convulsivo ou somente de birra.
Sons...A vida é repleta de sons...E não somente os espontâneos, os que destoam, os que agridem os tímpanos e machucam a alma. Tempos atrás, escrevi uma crônica, fartamente divulgada por jornais e páginas da internet, em que abordei um dos aspectos dessa parafernália sonora (o tema é tão vasto que creio que jamais se esgotaria).
Em determinado trecho constatei: “Todos temos, em maior ou menor grau, determinadas canções que nos evocam, sempre que executadas, momentos marcantes, bons ou maus, da vida. Elas formam, em conjunto, uma espécie de “trilha sonora” desses acontecimentos, como nos filmes, com a diferença de que não se trata de ficção, mas da realidade nua e crua, mesmo que a fantasiemos, na medida do nosso temperamento e da nossa personalidade”.
E citei várias dessas canções, populares ou não, gravadas fundamente na memória e que, sempre que tocadas, me evocam emoções, alegres ou tristes, positivas ou negativas que, embora adormecidas, não morreram como podem parecer. Permanecem ali, mais vivas do que nunca, e que afloram quando menos espero, pois só vão morrer no dia em que eu deixar de vez este mundo para me reincorporar à natureza. “És pó e ao pó retornarás”, nos alertam, com realismo, os pregadores de várias religiões. São “gatilhos” que, sempre que acionados, trazem de volta, com variáveis intensidades, esses sentimentos que ajudam a compor nossa personalidade.
Entre as composições citadas, mencionei peças de Chopin, de Wagner, de Bach, de Liszt, de Rachmaninoff, de Brahms, de Mozart, de Tchaikowski, de Jacques Offenbach (principalmente a “Barcarola”, da série “Les contes d”Hoffmann”) e, em especial de Beethoven. Citei, também, canções que me embalaram a adolescência, principalmente aquelas dos chamados “anos dourados”, como “Jambalaya”, com Brenda Lee; “Love letters in the sand” e “Only you”, com os The Platers; “Minha namorada”, com Carlos Lyra, “Noite do meu bem”, de Dolores Duran, com Maysa Matarazzo e “Hino ao amor”, tanto com a Edith Piaff, no original em francês, como na versão que vendeu toneladas de discos, na voz de Wilma Bentivegna, entre outras, marcaram instantes memoráveis.
Estranhamente, porém, omiti aquela que mais me toca, sempre que ouço, que revela, sobretudo, minha principal característica: o apego às pessoas e o desapego às coisas. Trata-se de “Peixe Vivo”, cantiga folclórica, cujo autor e época em que foi composta são desconhecidos que, certamente, brotou espontânea da alma popular, dadas as suas características.
O ex-presidente Juscelino Kubitschek fez dela sua trilha sonora. Provavelmente, essa cantiga de roda originou-se em Portugal, em alguma remota região de pastoreio (conclusão óbvia, levando em conta o que diz a segunda parte da letra), trazida para o País, notadamente para Minas
Gerais, pelos colonizadores portugueses.
“Como pode o peixe vivo
viver fora da água fria?
Como pode o peixe vivo
viver fora da água fria?
Como poderei viver,
como poderei viver
sem a tua, sem a tua,
sem a tua companhia?”.
Quanta evocação essa cantiga me traz! De maneira simples e ingênua, diz o que há anos venho tentando dizer, em milhares e milhares de crônicas e em outros tantos de versos, e jamais consegui. Ou seja, expressa o meu apego atávico aos meus pais, aos meus filhos e à minha amada. Declara a necessidade física, psicológica e, sobretudo afetiva, dos amigos, sem que importe o tempo, a característica (se virtual ou presencial) e a intensidade dessas amizades. Exprime a importância dos leitores, contumazes ou ocasionais, deste constante desnudamento emocional em público que pratico há tantos anos através dos textos que produzo.
“Os pastores desta aldeia
já me fazem zombaria,
os pastores desta aldeia
já me fazem zombaria
por me ver andar sozinho,
por me ver andar sozinho,
sem a tua, sem a tua,
sem a tua companhia”.
São sons da infância que me lembram, a todo o momento, que o menino que um dia fui não morreu. Continua mais vivo do que nunca. Que apesar dessa máscara de adulto sério, compenetrado, aparentemente cético, com profundas cicatrizes no corpo e na alma, ainda é o mesmo: ingênuo, carente de atenção e de afeto, inocente e deslumbrado.
Só posso concluir estas confidências com as palavras do mestre de todos nós, Rubem Braga, que na crônica “A Navegação da Casa” (inserida em seu livro “A Borboleta Amarela”), desabafou: “Oh! Deuses miseráveis da vida, por que nos obrigais ao incessante assassínio de nós mesmos e a esse interminável desperdício de ternuras?”...”Como poderei viver, como poderei viver, sem a tua, sem a tua, sem a tua companhia” anônimo leitor que me prestigia com a tua atenção?!!
Tuesday, October 20, 2009
Há quem insista em ficar refém do passado, como se a vida houvesse acabado, tanto diante de algum fracasso, como se tudo estivesse irremediavelmente perdido; quanto face ao sucesso, julgando que sua cota de contribuição à sociedade já esteja cumprida e não haja mais nada a fazer. As duas situações são equivocadas. A luta do ser humano (aquele que vive plenamente a sua humanidade), suas obrigações e obras, só terminam com a morte. E esta (felizmente) não sabemos como, onde e principalmente quando vai acontecer. Tanto pode ser várias décadas à frente, quanto no segundo seguinte. Nossa obrigação só expira com nosso último suspiro.
Inteligência e bondade
Pedro J. Bondaczuk
A bondade, ou seja, a capacidade de ajudar o próximo, de maneira espontânea e desprendida, só para vê-lo seguro, alegre ou pelo menos equilibrado, sem esperar a mínima espécie de reconhecimento (nenhuma, sequer a sua gratidão) – e essa ajuda nem mesmo precisa ser de caráter material, bastando, não raro, um simples minuto de atenção, que pode fazer a diferença entre a vida e a morte de alguém –, é o que verdadeiramente distingue o homem, na verdadeira acepção do termo, dos demais animais.
É através de gestos dessa espécie que ele faz luzir sua racionalidade. Essa atitude, embora os néscios, os gananciosos e os egoístas não percebam (e não admitam), é que lhe confere superioridade moral, ascendência afetiva e credibilidade. Os maus, que movem guerras, conquistam cidades e causam dor e aflição, ficam, muitas vezes, para sempre nos livros de história. Seus nomes são lembrados, em geral com horror e asco, para todo o sempre, como são os casos de grandes guerreiros de todos os tempos, como Átila, Alarico, Alexandre, o Grande, Júlio César, Napoleão, Hitler, Stalin e tantos e tantos outros, de todos os tempos e lugares.
Figuras bondosas, todavia, têm recompensa muito maior: são alçadas à santidade! E, mesmo depois de mortas, são invocadas por fiéis, para interceder por eles, em suas preces, junto à divindade (e sequer interessa saber se essa intercessão tem ou não o mínimo efeito prático). É o caso, por exemplo, de São Francisco de Assis (apenas para citar um desses seres abnegados, todos bondade e compreensão que, esquecidos das próprias necessidades e aflições, só pensam na valorização e na preservação da vida, humana ou não).
O caso mais recente, nesse aspecto, é, sem dúvida, o de Madre Teresa de Calcutá. Pessoas dessa espécie podem não constar das páginas da História – esse desfile de aberrações, brutalidade e loucura –, que registra a trajetória de povos e nações, com seus dramas e contradições. Mas se perpetuam na “memória” de gerações. Suas ações são reconhecidas e exaltadas por séculos afora. Seus feitos são aumentados pelo imaginário popular. Tornam-se lendas, sagas e mitos. São santificadas. São inteligentes, porquanto boas.
O compositor Ludwig van Beethoven afirmou que “não existe verdadeira inteligência sem bondade”. O sacerdote dominicano francês, Padre Jean Baptiste Henri Dominique Lacordaire (1802-1861) foi ainda mais explícito, e mais enfático nessa constatação. Escreveu, em um de seus tantos livros, voltados à orientação moral e espiritual da juventude: “Não é o gênio, nem a glória, nem o amor que medem a elevação de nossa alma. É a bondade”.
O poeta Vinícius de Moraes coloca essa verdade de forma ainda mais simples e direta, ao escrever, na letra de uma de suas tantas canções, em parceria com Antonio Carlos Jobim: “A vida só dá para quem se deu”. Claro que a pessoa dotada de bondade não faz o bem esperando qualquer espécie de recompensa. Age assim porque é sábia. Porque isso lhe dá prazer. Porque “pode” ajudar e por isso não se faz de rogada: ajuda.
Em Campinas, nos últimos anos, cresceu bastante o movimento do voluntariado. Dezenas, talvez centenas de pessoas reservam um pouco do que têm, e parcela considerável do seu tempo, para ajudar creches, asilos, hospitais, orfanatos e outras tantas entidades assistenciais, que lutam com enormes dificuldades para sobreviver. Levam carinho, conforto, esperança e alegria aos que precisam.
Seus nomes não freqüentam as manchetes dos jornais e nem mesmo as colunas sociais. Seu trabalho, em geral anônimo, todavia, é inestimável. Ajudam porque sentem prazer. Desdobram-se em benefício do próximo porque têm consciência da importância, da transcendência e da grandeza da vida. São solidárias porque são, verdadeiramente, inteligentes. O dramaturgo inglês, William Shakespeare, escreveu: “O futuro do homem não está nas estrelas, mas sim na sua vontade”.
Michel Quoist, que nos legou magníficas orações em forma de poemas (ou seria o contrário? Não importa!), fez a seguinte (e pertinente) constatação: “Na nossa vida há duas soluções: amar a si próprio até o esquecimento total dos outros ou amar os outros até o esquecimento total de si”.
Quem faz a primeira opção, pode até enriquecer. Conquista fama, fortuna e poder (quando conquista, é claro), mas nunca consegue a desejável paz de espírito. E quando morre, não leva nada disso consigo. A fortuna fica para os herdeiros, que não raro a malbaratam. A fama...é enganadora e logo se esvai. E o poder? Bem, que poder é esse que nada pode contra a morte? Quem faz a segunda escolha, no entanto, pode atravessar a vida sofrendo toda a espécie de privações (e via de regra atravessa). Mas é dotado de sabedoria. Conquista o mundo! Ascende à santidade!
Pedro J. Bondaczuk
A bondade, ou seja, a capacidade de ajudar o próximo, de maneira espontânea e desprendida, só para vê-lo seguro, alegre ou pelo menos equilibrado, sem esperar a mínima espécie de reconhecimento (nenhuma, sequer a sua gratidão) – e essa ajuda nem mesmo precisa ser de caráter material, bastando, não raro, um simples minuto de atenção, que pode fazer a diferença entre a vida e a morte de alguém –, é o que verdadeiramente distingue o homem, na verdadeira acepção do termo, dos demais animais.
É através de gestos dessa espécie que ele faz luzir sua racionalidade. Essa atitude, embora os néscios, os gananciosos e os egoístas não percebam (e não admitam), é que lhe confere superioridade moral, ascendência afetiva e credibilidade. Os maus, que movem guerras, conquistam cidades e causam dor e aflição, ficam, muitas vezes, para sempre nos livros de história. Seus nomes são lembrados, em geral com horror e asco, para todo o sempre, como são os casos de grandes guerreiros de todos os tempos, como Átila, Alarico, Alexandre, o Grande, Júlio César, Napoleão, Hitler, Stalin e tantos e tantos outros, de todos os tempos e lugares.
Figuras bondosas, todavia, têm recompensa muito maior: são alçadas à santidade! E, mesmo depois de mortas, são invocadas por fiéis, para interceder por eles, em suas preces, junto à divindade (e sequer interessa saber se essa intercessão tem ou não o mínimo efeito prático). É o caso, por exemplo, de São Francisco de Assis (apenas para citar um desses seres abnegados, todos bondade e compreensão que, esquecidos das próprias necessidades e aflições, só pensam na valorização e na preservação da vida, humana ou não).
O caso mais recente, nesse aspecto, é, sem dúvida, o de Madre Teresa de Calcutá. Pessoas dessa espécie podem não constar das páginas da História – esse desfile de aberrações, brutalidade e loucura –, que registra a trajetória de povos e nações, com seus dramas e contradições. Mas se perpetuam na “memória” de gerações. Suas ações são reconhecidas e exaltadas por séculos afora. Seus feitos são aumentados pelo imaginário popular. Tornam-se lendas, sagas e mitos. São santificadas. São inteligentes, porquanto boas.
O compositor Ludwig van Beethoven afirmou que “não existe verdadeira inteligência sem bondade”. O sacerdote dominicano francês, Padre Jean Baptiste Henri Dominique Lacordaire (1802-1861) foi ainda mais explícito, e mais enfático nessa constatação. Escreveu, em um de seus tantos livros, voltados à orientação moral e espiritual da juventude: “Não é o gênio, nem a glória, nem o amor que medem a elevação de nossa alma. É a bondade”.
O poeta Vinícius de Moraes coloca essa verdade de forma ainda mais simples e direta, ao escrever, na letra de uma de suas tantas canções, em parceria com Antonio Carlos Jobim: “A vida só dá para quem se deu”. Claro que a pessoa dotada de bondade não faz o bem esperando qualquer espécie de recompensa. Age assim porque é sábia. Porque isso lhe dá prazer. Porque “pode” ajudar e por isso não se faz de rogada: ajuda.
Em Campinas, nos últimos anos, cresceu bastante o movimento do voluntariado. Dezenas, talvez centenas de pessoas reservam um pouco do que têm, e parcela considerável do seu tempo, para ajudar creches, asilos, hospitais, orfanatos e outras tantas entidades assistenciais, que lutam com enormes dificuldades para sobreviver. Levam carinho, conforto, esperança e alegria aos que precisam.
Seus nomes não freqüentam as manchetes dos jornais e nem mesmo as colunas sociais. Seu trabalho, em geral anônimo, todavia, é inestimável. Ajudam porque sentem prazer. Desdobram-se em benefício do próximo porque têm consciência da importância, da transcendência e da grandeza da vida. São solidárias porque são, verdadeiramente, inteligentes. O dramaturgo inglês, William Shakespeare, escreveu: “O futuro do homem não está nas estrelas, mas sim na sua vontade”.
Michel Quoist, que nos legou magníficas orações em forma de poemas (ou seria o contrário? Não importa!), fez a seguinte (e pertinente) constatação: “Na nossa vida há duas soluções: amar a si próprio até o esquecimento total dos outros ou amar os outros até o esquecimento total de si”.
Quem faz a primeira opção, pode até enriquecer. Conquista fama, fortuna e poder (quando conquista, é claro), mas nunca consegue a desejável paz de espírito. E quando morre, não leva nada disso consigo. A fortuna fica para os herdeiros, que não raro a malbaratam. A fama...é enganadora e logo se esvai. E o poder? Bem, que poder é esse que nada pode contra a morte? Quem faz a segunda escolha, no entanto, pode atravessar a vida sofrendo toda a espécie de privações (e via de regra atravessa). Mas é dotado de sabedoria. Conquista o mundo! Ascende à santidade!
Monday, October 19, 2009
O foco das nossas preocupações tem que ser sempre o momento presente, enquanto tal, sem retornos inúteis (senão impossíveis) ao passado e nem projeções (hipotéticas) em um tempo que não sabemos sequer se estaremos vivos. A sabedoria consiste em viver um dia de cada vez e da melhor maneira possível, de acordo com as condições que tivermos e as circunstâncias que se nos apresentarem. Não é saudável e nem inteligente reviver angústias e frustrações que já superamos, que já ficaram para trás, que dificilmente voltarão a gerar conseqüências. A memória é importante, não nego, mas somente como balizadora de atos, para impedir que venhamos a reincidir nos mesmos erros cometidos anos atrás. Por isso, considero cada aniversário, embora sem absoluta convicção, uma vitória, uma conquista e uma etapa de vida vencida.
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