Sunday, July 16, 2006
Toque de amor
Pedro J. Bondaczuk
As vidas dos grandes ídolos – sejam artistas, jogadores de futebol, esportistas bem-sucedidos de outras modalidades ou escritores de renome – são amiúde devassadas, sem cerimônias, por determinados órgãos de comunicação, como se, pelo fato de serem figuras públicas, não tivessem nenhum direito à privacidade. Claro que têm. Multiplicam-se, inclusive, revistas e sites da internet voltados exclusivamente para esse tipo de matéria. E cada uma é mais escandalosa (e fútil) do que a outra.
É bastante conhecida, por exemplo, a ojeriza dos famosos para com os tais “paparazzi”, que não medem esforços para flagrar suas vítimas em atitudes grotescas ou comprometedoras. E quase sempre conseguem. A perseguição dos tais fotógrafos freelancers foi, inclusive, uma das causas do acidente que redundou na morte da princesa Diana, em Paris.
Boa parte das matérias dessas revistas enfoca somente banalidades. E, infelizmente, há quem goste desse tipo de informação. Afinal...há gosto para tudo (ou quase tudo). Raramente, porém, essas publicações especializadas em fofocas revelam ao público fatos realmente relevantes, que mostrem um outro lado dos ídolos e revelem como eles de fato são. Divulgam-se, apenas, seus namoros (não raro inventados), aventuras extraconjugais, brigas e outras tantas bobagens do gênero, que deveriam interessar somente aos envolvidos.
Num determinado dia de abril de 1990 (cuja data exata, infelizmente, não registrei), a Rede Globo exibiu, na sessão “Corujão”, que passa de madrugada, o filme “Toque de Amor”, cujo enredo é baseado num fato verídico, envolvendo o cantor Elvis Presley. Sei disso porque o registrei em meu diário (embora, não sei por que cargas d’água, deixei de mencionar o dia exato da exibição da película), tamanha foi a impressão que o enredo me causou.
A história enfocava a ação de uma aprendiz de enfermagem, que fazia estágio numa instituição de recuperação de crianças deficientes. Uma das pacientes internadas era Karen, menina linda, de cerca de 13 anos de idade, acometida de paralisia cerebral. Sua doença estava em estágio tão avançado, que a garotinha era considerada doente terminal. Os médicos a haviam desenganado, garantindo que a adolescente não tinha qualquer possibilidade de melhora, e muito menos de cura. Tinha, somente, vida vegetativa. Não se comunicava com ninguém.
A jovem enfermeira, porém, discordava do diagnóstico. Tanto que decidiu tentar quebrar a barreira de silêncio que a garotinha havia estabelecido e penetrar em seu mundo, para saber o que sentia, o que queria e o que a fazia feliz. Por que? Não sabia explicar. Talvez por pura piedade. As primeiras tentativas que fez, de comunicação com a menina, foram frustrantes. A paciente não correspondeu aos seus esforços e nem deu sinal de que havia entendido o que ela lhe dizia.
A enfermeira não desistiu. Mudou de estratégia. Era um desafio que exigia não apenas muita paciência, mas, sobretudo, dedicação e amor, já que não tinha nenhuma experiência em lidar com esse tipo de caso. Afinal, era a primeira vez que cuidava de doentes. Tanto ela tentou, porém, penetrar no mundo da garotinha, que num determinado dia ocorreu um “milagre”. Karen respondeu, com clareza e concisão, a uma pergunta da interlocutora, que não cabia em si de contente.
Em suma, a enfermeira conseguiu não apenas que a adolescente se comunicasse com ela, como a levou a se interessar pelo mundo e a lutar pela vida, mesmo que a luta fosse vã. No correr dos contatos, a garotinha confessou, entre outras coisas, que tinha adoração pelo cantor Elvis Presley e que o seu maior sonho era se corresponder com o ídolo.
Estava aí outro desafio para a jovem enfermeira, quem sabe ainda maior do que o de se comunicar com Karen. Suas colegas chegaram a tentar demovê-la de sequer tentar estabelecer contato com o “rei do rock”, para não se frustrar. “Imagine se ele vai dar atenção a uma menina doente, ele que é assediado por tantas fãs e que tem tantos compromissos!”, lhe diziam, incrédulas. A enfermeira, todavia, não desanimou. Moveu céus e terra para obter o endereço do cantor. Assim que conseguiu, escreveu-lhe uma carta, em nome de Karen (foi a garotinha que ditou o que queria dizer ao ídolo) e a pôs no correio.
Os dias passavam, e nada de resposta. A ansiedade fez com que o estado da garotinha piorasse. Num belo dia, contudo, para surpresa geral, eis que chegou uma carta para a menina. E adivinhem de quem? Isso mesmo, de Elvis Presley! E o roqueiro não se limitou a uma simples e formal resposta, dessas impressas que os ídolos costumam enviar aos fãs. Teve, pelo contrário, muita sensibilidade para entender o drama de Karen e passou, desde então, a se corresponder regularmente com ela. É verdade que a doença evoluiu. Os médicos tinham razão: não havia a mínima possibilidade de melhora, quanto mais de cura. A garotinha, de fato, morreu. Mas serenamente, apertando no peito uma das tantas cartas que havia recebido do seu ídolo.
Confesso que até assistir o filme desconhecia o episódio. E olhem que havia lido centenas, quiçá milhares, de reportagens sobre o “rei do rock”, do qual era (e agora sou muitíssimo mais) admirador, a ponto de ter adquirido todos os discos que ele lançou. Por que, em vez das tantas fofocas que publicaram, essas revistas ditas “especializadas” não trouxeram a público essa história? Talvez porque não envolvesse nenhum escândalo! Perderam, dessa forma, a oportunidade de exercer o verdadeiro jornalismo. Pois, para mim, considero a atenção que Elvis dedicou a Karen a maior das suas bem-sucedidas obras. Ou não foi?!
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