Tuesday, February 02, 2010




Tempo livre de verdade

Pedro J. Bondaczuk

O que é, na sua concepção, dispor de “tempo livre”, amável leitor? Afinal, a falta de momentos em que não haja obrigações a cumprir é reclamada por quase todos, até pelos que não fazem nada o dia todo, por todas as semanas, meses e até anos da sua vida.
Há muita gente assim, que é pior do que aquelas plantas parasitas, que necessitam de hospedeiros para sobreviver. Alguns, é verdade, são ociosos em decorrência de incapacidade física e/ou mental. Muitos, todavia, são vagabundos de carteirinha por convicção, por absoluta opção pessoal.
As pessoas verdadeiramente ativas, que têm ideais, ambições, projetos e sonhos e que saem em busca da concretização de tudo isso, reclamam que não dispõem do tal “tempo livre”. Estão enredadas em imensas teias de compromissos e obrigações, que não lhes dão, sequer, tempo para respirar.
Quem se planeja devidamente, contudo, consegue multiplicar as horas de um dia e fazer muito, sem cansaços ou estresse. São raros os que agem assim? Nem tanto! Conheço muitos que se desdobram e fazem as coisas com alegria e naturalidade.
Há compromissos tolos que assumimos, muitas vezes impulsivamente, apenas para sermos simpáticos aos que no-los impõem e que são verdadeiros ralos por onde se escoa nosso preciosíssimo tempo. E ele tende a ser irrecuperável ou a nos impor sacrifícios inusitados para queimar etapas, na tentativa de recuperar o que poderíamos ter poupado.
Sou um desses sujeitos que detestam dizer não aos outros e que, por isso, me vejo, volta e meia, metido em armadilhas das quais não consigo escapar. Vou a festas que não gostaria e não precisaria ir, a eventos que não me dizem respeito e que nada têm a ver com meus gostos e minhas atividades, faço favores dos quais nunca terei retribuição e sequer um formal agradecimento e vai por aí afora.
A idade e a experiência, contudo, vêm me tornando mais atento a esse desperdício tolo de tempo, fazendo com que seja menos freqüente. Por conseqüência, já venho conseguindo pôr em andamento alguns projetos que eram de longo prazo, mas que chegou o momento de executá-los ou de abandoná-los de vez (para minha extrema frustração, caso o fizesse).
Um deles, por exemplo, é a redação das memórias, coisa que cheguei a duvidar que faria, mas que venho fazendo com afinco e regularidade. Elas irão contar alguma coisa para alguém? Não sei! Nunca sabemos se nossos atos, ou quais deles, serão eficazes ou não passarão, também, a entrar no rol das coisas que se caracterizam como perda de tempo. Aqui conta a questão da confiança.
Confio no meu talento de escritor e na capacidade de observação que desenvolvi ao longo dos anos. Por isso, estou convicto que minhas memórias serão atrativas, vão redundar em um ou mais livros e irão servir de exemplo a muitas pessoas que venham a passar por idênticos caminhos que passei. Certeza, certeza mesmo, porém, não tenho nenhuma. Ninguém tem e de nada.
Não respondi, todavia, a pergunta que lhe fiz no início destas elucubrações: o que é tempo livre? É o repouso? É o lazer? Ou são aqueles raros momentos de ócio, de explícita preguiça, com que nos brindamos em determinados domingos e feriados? Não é nada disso.
Deixo a resposta para esta questão a alguém muito mais experiente, gabaritado e habilitado do que eu: ao escritor George Bernard Shaw que, entre tantas outras coisas, conquistou um Prêmio Nobel de Literatura, o que, por si só, o qualifica e o credencia a opinar sobre o que quiser: “O tempo livre não significa repouso. O repouso, como o sono, é obrigatório. O verdadeiro tempo livre é apenas a liberdade de fazermos o que queremos, mas não de permanecermos no ócio”.
Pois é, meus amigos, é isso aí. Querem resposta mais clara, direta, objetiva e convincente do que esta? Tempo livre não é, nem de longe, o tempo perdido em ociosidade e preguiça. É isso o que faço neste momento, ao escrever estas considerações que sequer sei se alguém vai ler, quanto mais apreciar.
Ninguém, absolutamente ninguém me impôs este texto, ao contrário de tantos outros, escritos para atender obrigações (não raro contratuais). Ao escrevê-lo, contei com o desejável “tempo livre”. Creio que a questão ficou mais do que respondida (com a providencial ajuda, claro, de um decano da Literatura).






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