Síria pode soltar reféns?
Pedro J. Bondaczuk
O presidente sírio, Hafez Assad, que jamais escondeu a sua intenção de conseguir a hegemonia para o seu país dentro do mundo árabe –, a despeito de estar apoiando o Irã, em sua guerra contra o Iraque, posição vista com maus olhos dentro da comunidade –, pode estar preparando uma cartada decisiva que o reabilite perante o Ocidente.
Há quem especule que a entrada das suas tropas na parte Ocidental de Beirute teria dupla função. Uma delas, a ostensiva e amplamente divulgada, seria a de pôr ponto final na carnificina envolvendo xiitas, drusos e comunistas libaneses. A outra (mais sutil) poderia ser a libertação dos reféns estrangeiros no Líbano, em mãos de quatro grupos extremistas.
As duas tarefas envolvem grandes riscos, principalmente aqueles inerentes à intrusão na casa alheia, mesmo que seja para separar a briga dos seus moradores. Os soldados sírios, que foram solicitados por todas as facções em litígio para entrarem em Beirute Oeste, podem se ver, subitamente, no meio de fogo cruzado. Principalmente em virtude da extrema energia que estão usando para separar as partes em conflito.
Anteontem, eles mataram três milicianos drusos. Ontem, combateram corpo a corpo com xiitas, sendo que 23 desses radicais foram mortos. Não é nada difícil, portanto, que as milícias adversárias de repente venham a se unir (afinal, não faz muito elas eram aliadas) e se voltar contra as tropas da Síria.
A desconfiança o0cidental, contudo, é a de que Hafez Assad tinha em mente algo mais valiuoso, em termos de propaganda, quando concordou em mandar suas forças à capital libanesa. Ele desejaria, na verdade, localizar e libertar os reféns estrangeiros, em especial os seis norte-americanos e o enviado da Igreja Anglicana, Terry Waite.
Caso fosse feliz nessa empreitada, novamente Reagan lhe ficaria devendo favores. E a Grã-Bretanha, que há pouco rompeu relações diplomáticas com Damasco, encararia os sírios com outros olhos. Daí a razão das meticulosas batidas dos soldados desse país nos quartéis-generais das milícias e nos redutos das organizações extremistas.
Assad, certamente, conhece todos estes refúgios. Não é a Síria, afinal, quem dá sustentação a todas essas facções contra a Organização para a Libertação da Palestina e contra os cristãos maronitas libaneses? É improvável, portanto, que mesmo sustentando uma aliança com essas entidades, desconheça onde elas se refugiem.
É verdade que, se libertasse a força os reféns, o gesto poderia ser interpretado como ato de traição pelos muçulmanos do Líbano. Mas se a operação desse certo, não valeria a pena, em função dos saldos diplomáticos que seriam colhidos com o Ocidente?
Só que o tiro pode sair pela culatra. Ao se virem acossados, nada impede que os xiitas matem os cativos. E se isso acontecer, não tenham dúvidas, a responsabilidade recairá inteirinha sobre os ombros de Hafez Assad.
(Artigo publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 26 de fevereiro de 1987).
Pedro J. Bondaczuk
O presidente sírio, Hafez Assad, que jamais escondeu a sua intenção de conseguir a hegemonia para o seu país dentro do mundo árabe –, a despeito de estar apoiando o Irã, em sua guerra contra o Iraque, posição vista com maus olhos dentro da comunidade –, pode estar preparando uma cartada decisiva que o reabilite perante o Ocidente.
Há quem especule que a entrada das suas tropas na parte Ocidental de Beirute teria dupla função. Uma delas, a ostensiva e amplamente divulgada, seria a de pôr ponto final na carnificina envolvendo xiitas, drusos e comunistas libaneses. A outra (mais sutil) poderia ser a libertação dos reféns estrangeiros no Líbano, em mãos de quatro grupos extremistas.
As duas tarefas envolvem grandes riscos, principalmente aqueles inerentes à intrusão na casa alheia, mesmo que seja para separar a briga dos seus moradores. Os soldados sírios, que foram solicitados por todas as facções em litígio para entrarem em Beirute Oeste, podem se ver, subitamente, no meio de fogo cruzado. Principalmente em virtude da extrema energia que estão usando para separar as partes em conflito.
Anteontem, eles mataram três milicianos drusos. Ontem, combateram corpo a corpo com xiitas, sendo que 23 desses radicais foram mortos. Não é nada difícil, portanto, que as milícias adversárias de repente venham a se unir (afinal, não faz muito elas eram aliadas) e se voltar contra as tropas da Síria.
A desconfiança o0cidental, contudo, é a de que Hafez Assad tinha em mente algo mais valiuoso, em termos de propaganda, quando concordou em mandar suas forças à capital libanesa. Ele desejaria, na verdade, localizar e libertar os reféns estrangeiros, em especial os seis norte-americanos e o enviado da Igreja Anglicana, Terry Waite.
Caso fosse feliz nessa empreitada, novamente Reagan lhe ficaria devendo favores. E a Grã-Bretanha, que há pouco rompeu relações diplomáticas com Damasco, encararia os sírios com outros olhos. Daí a razão das meticulosas batidas dos soldados desse país nos quartéis-generais das milícias e nos redutos das organizações extremistas.
Assad, certamente, conhece todos estes refúgios. Não é a Síria, afinal, quem dá sustentação a todas essas facções contra a Organização para a Libertação da Palestina e contra os cristãos maronitas libaneses? É improvável, portanto, que mesmo sustentando uma aliança com essas entidades, desconheça onde elas se refugiem.
É verdade que, se libertasse a força os reféns, o gesto poderia ser interpretado como ato de traição pelos muçulmanos do Líbano. Mas se a operação desse certo, não valeria a pena, em função dos saldos diplomáticos que seriam colhidos com o Ocidente?
Só que o tiro pode sair pela culatra. Ao se virem acossados, nada impede que os xiitas matem os cativos. E se isso acontecer, não tenham dúvidas, a responsabilidade recairá inteirinha sobre os ombros de Hafez Assad.
(Artigo publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 26 de fevereiro de 1987).
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