Leitura e absorção
Pedro J. Bondaczuk
Absorvemos muito pouco do conteúdo de um texto se o lermos sem método, mesmo que nos concentremos ao máximo no que estivermos fazendo. Querem uma prova? Façam o teste. Releiam um livro, qualquer um, que vocês tenham lido, digamos, há dez anos, sem fazer anotações à margem e muito menos ficha de leitura. Qual o resultado? Ele lhes parecerá inédito. Apenas um trecho ou outro lhes soará como vagamente familiar. Não precisam acreditar em mim. Façam vocês mesmos a experiência.
Pior será se o conteúdo contiver idéias que divirjam das suas. Aí vocês não absorverão absolutamente nada mesmo. Por isso, não exagerei quando publiquei, recentemente, uma crônica em que defendo a tese de que “leitura é um ato de fé” (que tem, propositalmente, este título). Você tem que acreditar no autor para ler o livro até o fim. E, principalmente, para fazer a leitura de outras obras que ele tenha escrito.
Lemos, basicamente, por três motivos. O primeiro como uma forma de lazer (e para mim não há nenhuma outra que se lhe compare sequer de longe). Para tanto, escolhemos leitura amena, que não nos exija muito raciocínio, como um romance de aventura, por exemplo, ou um conto policial ou alguma novela de amor.
O segundo motivo que nos leva a ler é o desejo de enriquecimento intelectual e, sobretudo, espiritual. É a busca por beleza e transcendência. É o confronto de idéias que nos induz à reflexão e a descobertas tanto do mundo que nos cerca e das multidões que o habitam, quanto de nós mesmos. Aliás, esta última descoberta pode ser compensadora ou traumática, dependendo de como somos de fato.
Pablo Neruda advertiu a propósito: “Algum dia, em qualquer parte, em qualquer lugar, indefectivelmente, encontrar-te-ás a ti mesmo e essa, só essa, pode ser a mais feliz ou a mais amarga das tuas horas”. E pode mesmo.
Neste caso, quando a leitura se destina ao enriquecimento intelectual, espiritual e, não raro, moral, quanto mais método tivermos, melhor proveito tiraremos do que viermos a ler. É aqui que entra a questão da “fé” no autor.
E, finalmente, lemos exclusivamente para aprender. Para tanto recorremos aos livros didáticos e paradidáticos. Aqui, se nos limitarmos apenas à leitura, sem um estudo metódico, acurado e atencioso, não aprenderemos coisíssima alguma. Seremos reprovados na escola ou na faculdade e perderemos tempo, dinheiro e, pior, oportunidades de crescimento profissional na vida.
Comportamento pitoresco, referente à leitura, para o qual eu não havia atinado, levantado pelo escritor austríaco Robert Musil, em seu livro “Homem sem qualidades”, é o fato de suprimirmos, automática e subsconscientemente do texto que estivermos lendo o que não nos convém.
Fiz o teste e constatei que esse autor tem razão. Ele afirma, em determinado trecho: “O que você faz quando lê? Vou dar-lhe já a resposta: a sua leitura deixa de lado o que não lhe convém. O mesmo já fez o autor antes. Omitem-se também coisas nos sonhos e na imaginação. Daqui concluo: a beleza ou a excitação aparecem no mundo por omissão”.
Curiosa essa observação, posto que, no meu entender, verdadeira. Espero, pois, não ter escrito, nestas considerações de hoje, nada que não lhe convenha. E que, sobretudo, você deposite “fé” no que escrevo e não fuja nunca dos meus textos, por mais extensos e aparentemente complexos que sejam.
A leitura de determinados livros deve ser feita, como destaquei, sempre com método e organização, para que se aproveite o melhor do seu conteúdo, sua essência, a mensagem que o autor pretendeu passar e que motivou sua redação e publicação. Nem toda obra pode ser lida da mesma forma, com a atenção concentrada apenas no enredo, sem se atentar para nuances e sutilezas.
Por exemplo, não se pode ler um ensaio da mesma forma que se lê um romance. Esse gênero, por si só, já sugere reflexões, idéias, informações que, se bem aproveitadas, tendem a nos ser úteis não apenas em nossa atividade, mas, sobretudo, em nossa vida. O mesmo ocorre com um livro de poesias.
Poemas precisam ser “sentidos”, para serem valorizados, e não podem e nem devem ser lidos às pressas, sob pena de deixarmos escapar o que têm de melhor e, dessa forma, não fazermos justiça ao autor.
Mesmo alguns romances têm conteúdo que vai muito além do mero enredo, da ação, daquilo que o leitor desavisado entende que seja a sua essência. Muitos deles trazem citações fantásticas, que nos podem ser sumamente úteis em vários sentidos.
Ao ler um livro, com as características que destaquei, convém ter à mão uma caneta e um bloco de anotações (de preferência uma agenda destinada a esse fim). Anote, meticulosamente, as coisas interessantes que encontrar. Verá que seu proveito dessa leitura será muito maior do que se você se limitasse a fazê-la de um só “sopro”, sem interrupções.
Alguns costumam grifar o que lhes interessa no próprio livro e fazer anotações à margem. Também vale. Todavia, recomenda-se, como mais adequadas, as anotações em papéis à parte. Afinal, todas as vezes que você copia um texto, mesmo que não se aperceba, o memoriza, se não na totalidade, pelo menos em boa parte dele. Pense nisso.
Pedro J. Bondaczuk
Absorvemos muito pouco do conteúdo de um texto se o lermos sem método, mesmo que nos concentremos ao máximo no que estivermos fazendo. Querem uma prova? Façam o teste. Releiam um livro, qualquer um, que vocês tenham lido, digamos, há dez anos, sem fazer anotações à margem e muito menos ficha de leitura. Qual o resultado? Ele lhes parecerá inédito. Apenas um trecho ou outro lhes soará como vagamente familiar. Não precisam acreditar em mim. Façam vocês mesmos a experiência.
Pior será se o conteúdo contiver idéias que divirjam das suas. Aí vocês não absorverão absolutamente nada mesmo. Por isso, não exagerei quando publiquei, recentemente, uma crônica em que defendo a tese de que “leitura é um ato de fé” (que tem, propositalmente, este título). Você tem que acreditar no autor para ler o livro até o fim. E, principalmente, para fazer a leitura de outras obras que ele tenha escrito.
Lemos, basicamente, por três motivos. O primeiro como uma forma de lazer (e para mim não há nenhuma outra que se lhe compare sequer de longe). Para tanto, escolhemos leitura amena, que não nos exija muito raciocínio, como um romance de aventura, por exemplo, ou um conto policial ou alguma novela de amor.
O segundo motivo que nos leva a ler é o desejo de enriquecimento intelectual e, sobretudo, espiritual. É a busca por beleza e transcendência. É o confronto de idéias que nos induz à reflexão e a descobertas tanto do mundo que nos cerca e das multidões que o habitam, quanto de nós mesmos. Aliás, esta última descoberta pode ser compensadora ou traumática, dependendo de como somos de fato.
Pablo Neruda advertiu a propósito: “Algum dia, em qualquer parte, em qualquer lugar, indefectivelmente, encontrar-te-ás a ti mesmo e essa, só essa, pode ser a mais feliz ou a mais amarga das tuas horas”. E pode mesmo.
Neste caso, quando a leitura se destina ao enriquecimento intelectual, espiritual e, não raro, moral, quanto mais método tivermos, melhor proveito tiraremos do que viermos a ler. É aqui que entra a questão da “fé” no autor.
E, finalmente, lemos exclusivamente para aprender. Para tanto recorremos aos livros didáticos e paradidáticos. Aqui, se nos limitarmos apenas à leitura, sem um estudo metódico, acurado e atencioso, não aprenderemos coisíssima alguma. Seremos reprovados na escola ou na faculdade e perderemos tempo, dinheiro e, pior, oportunidades de crescimento profissional na vida.
Comportamento pitoresco, referente à leitura, para o qual eu não havia atinado, levantado pelo escritor austríaco Robert Musil, em seu livro “Homem sem qualidades”, é o fato de suprimirmos, automática e subsconscientemente do texto que estivermos lendo o que não nos convém.
Fiz o teste e constatei que esse autor tem razão. Ele afirma, em determinado trecho: “O que você faz quando lê? Vou dar-lhe já a resposta: a sua leitura deixa de lado o que não lhe convém. O mesmo já fez o autor antes. Omitem-se também coisas nos sonhos e na imaginação. Daqui concluo: a beleza ou a excitação aparecem no mundo por omissão”.
Curiosa essa observação, posto que, no meu entender, verdadeira. Espero, pois, não ter escrito, nestas considerações de hoje, nada que não lhe convenha. E que, sobretudo, você deposite “fé” no que escrevo e não fuja nunca dos meus textos, por mais extensos e aparentemente complexos que sejam.
A leitura de determinados livros deve ser feita, como destaquei, sempre com método e organização, para que se aproveite o melhor do seu conteúdo, sua essência, a mensagem que o autor pretendeu passar e que motivou sua redação e publicação. Nem toda obra pode ser lida da mesma forma, com a atenção concentrada apenas no enredo, sem se atentar para nuances e sutilezas.
Por exemplo, não se pode ler um ensaio da mesma forma que se lê um romance. Esse gênero, por si só, já sugere reflexões, idéias, informações que, se bem aproveitadas, tendem a nos ser úteis não apenas em nossa atividade, mas, sobretudo, em nossa vida. O mesmo ocorre com um livro de poesias.
Poemas precisam ser “sentidos”, para serem valorizados, e não podem e nem devem ser lidos às pressas, sob pena de deixarmos escapar o que têm de melhor e, dessa forma, não fazermos justiça ao autor.
Mesmo alguns romances têm conteúdo que vai muito além do mero enredo, da ação, daquilo que o leitor desavisado entende que seja a sua essência. Muitos deles trazem citações fantásticas, que nos podem ser sumamente úteis em vários sentidos.
Ao ler um livro, com as características que destaquei, convém ter à mão uma caneta e um bloco de anotações (de preferência uma agenda destinada a esse fim). Anote, meticulosamente, as coisas interessantes que encontrar. Verá que seu proveito dessa leitura será muito maior do que se você se limitasse a fazê-la de um só “sopro”, sem interrupções.
Alguns costumam grifar o que lhes interessa no próprio livro e fazer anotações à margem. Também vale. Todavia, recomenda-se, como mais adequadas, as anotações em papéis à parte. Afinal, todas as vezes que você copia um texto, mesmo que não se aperceba, o memoriza, se não na totalidade, pelo menos em boa parte dele. Pense nisso.
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