Friday, February 16, 2007

Bendita rotina!


Pedro J. Bondaczuk

A maioria das pessoas que conheço, e com as quais convivo, queixa-se, amiúde, da vida rotineira que leva. As reclamações vão desde o trabalho realizado, que não seria o de seus sonhos, ao casamento, que caiu na monotonia e não raro acaba desfeito, com rusgas, ressentimentos, mágoas e sofrimentos para todos os envolvidos. E as queixas não param por aí. Passam, ainda, desde o tipo de lazer que os queixosos têm à disposição, aos seus relacionamentos de amizade. E vão por aí afora.
Essas pessoas, no entanto, reclamam, reclamam, mas não movem uma só palha para promover benéficas mudanças em suas vidas. Conformam-se com o cotidiano banal, sempre igual, rotineiro e sem graça. Mas seria mesmo assim? É possível que todos os dias sejam, de fato, “iguais”, ou pelo menos parecidos? Claro que não! Em alguns, por exemplo, o sol brilha intenso e, em outros, chove. Uns são de verão, com calor sufocante e, não raro, com chuva no final do período; outros, são de inverno (ou de primavera, ou de outono), mais frescos ou até mesmo gelados. Já aí há uma impossibilidade da existência de rotina, monotonia, marasmo.
Ademais, por mais rotineiro que seja o trabalho que a pessoa exerça, todos os dias têm coisas novas acontecendo. Basta que se esteja atento para identificá-las. São, em geral, pequenos incidentes diários (positivos ou negativos), mas que marcam nosso cotidiano. Ora é o chefe, que dá uma bronca homérica, que a pessoa que a recebe invariavelmente considera injusta, mesmo tendo cometido algum erro ou se mostrado impontual, ou desatento ou improdutivo. Ora é um colega que nos ajuda (ou nos atrapalha). Ora somos promovidos, ou preteridos numa promoção, dependendo do nosso empenho profissional, capacidade e utilidade na empresa. E, quando somos demitidos... aí sim, há uma quebra violenta de rotina. Essa mudança, porém, ninguém aprecia. Não há, pois, dois dias rigorosamente iguais.
O mesmo ocorre em casa, na escola, nos encontros com os amigos, com namoradas e em outros tantos atos da vida. Da minha parte, confesso, gosto da rotina. E vou mais longe: eu mesmo estabeleço uma, no meu dia a dia, para organizar e gerenciar tudo o que preciso fazer. Sou uma pessoa extremamente metódica (meus críticos garantem que até exagero e que sou obsessivo) e busco racionalizar meu tempo, que é o grande capital de que disponho.
Acordo sempre, invariavelmente, na mesma hora, seja dia útil ou final de semana, ou então, feriado. E cumpro todo um ritual, o mesmo por anos e anos. E ai daquele que me obrigue a deixar de cumprir um único ponto desse rito pessoal e cotidiano! Após despertar, dedico cinco minutos para meditação. Abstraio-me dos problemas e fixo-me num só tema, que analiso ângulo por ângulo.
Feito isso, antes mesmo da higiene pessoal, tomo uma xícara de café preto, bem forte, que me desperta de vez, e cuido da aparência. Tomo banho, faço barba, escovo os dentes, penteio-me e quando termino, estou prontinho para começar a jornada diária. Infelizmente, tenho o mau-hábito de não me alimentar pela manhã. O passo seguinte, pois, é ler os jornais do dia (pelo menos três) e comparar a edição de cada um deles. Faz parte da minha profissão! Sou editor há mais de quatro décadas!
Asseado e bem-informado, ligo o meu computador, para conferir a correspondência eletrônica. Separo os e-mails que precisem ser respondidos, arquivo os importantes e “deleto” (desculpem-me o neologismo, que já se incorporou à nossa linguagem comum) os spams e tantas outras bobagens que enviam para a minha caixa postal.
Atualizada a correspondência, encaminho, à redação do Comunique-se, os textos dos colunistas-fixos do dia (que são cinco de cada vez) e dos colaboradores eventuais (dois diariamente) para o espaço “Literário”, do qual sou o editor. Eles são devidamente revisados e editados na noite anterior. O passo seguinte, é a postagem da crônica e da reflexão diária, redigidos previamente na véspera, no meu blog “O Escrevinhador”, espaço que trato com o maior carinho e atenção.
Feito isso, acesso o Orkut. Posto na comunidade criada em minha homenagem uma meditação e, eventualmente, algum texto mais extenso, sempre de caráter literário, antes de conferir os scraps recebidos, que responderei à noite, quando retornar do trabalho. O passo seguinte, é a redação de crônicas (geralmente, escrevo duas por dia), que serão enviadas aos dez sites da internet em que sou cronista fixo.
A esta altura, já são 16 horas, quando preciso me aprontar para cumprir minha jornada na redação do jornal em que trabalho, como editor, que, não raro, entra pela madrugada. Ao voltar para casa, tomo um banho morno e relaxante, janto e parto para a última etapa da minha rotina. Respondo, rigorosa e meticulosamente, todos os scraps recebidos em minha página do Orkut, edito os textos que serão postados no dia seguinte no espaço Literário, seleciono a crônica e a reflexão para o meu blog e, só então, desligo o computador. Ufa! A jornada chegou ao fim! Da obrigação, parto, de imediato, para a satisfação.
Vem, então, o melhor momento do dia. Ou seja, aquele em que dou a devida e plena atenção à amada esposa, com a qual sou casado há 34 anos, que me acompanha, estimula e compreende e que tem a imensa paciência de esperar que eu cumpra, rigorosamente, sem deixar de fora nenhum passo, a minha estafante, mas bendita rotina. Cumprida a obrigação conjugal (que, claro, é a coisa mais prazerosa de todos os meus dias e da minha vida inteira), faço uma breve oração e... durmo. De imediato, como uma pedra! E sem necessidade de nenhum sonífero ou calmante! Afinal, ninguém é de ferro, não é mesmo?! O meu dia é chato? Provavelmente o leitor dirá que sim! Mas não troco essa chatice por nada deste mundo. Bendita rotina que me organiza e me fortalece!

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