Wednesday, March 15, 2006

Memória embotada

Pedro J. Bondaczuk


A falta de memória do brasileiro – em termos quantitativos, pois as generalizações são sempre burras, como já dizia o saudoso Nelson Rodrigues – é bastante conhecida. A tal ponto, que, freqüentemente, são realizadas campanhas para a preservação dos monumentos nacionais, ou para a manutenção de museus ou, principalmente, para a valorização da obra dos grandes realizadores artísticos, científicos, políticos ou seja de que campo de atividade for.
O normal é nossos homens e mulheres brilhantes, que contribuem para a cultura e a civilização do País, serem esquecidos, tão logo venham a morrer. Ou, pior e mais cruel, quando ainda em vida e em plena atividade produtiva.
O jornal “O Estado de São Paulo” encomendou, há doze anos, ao Instituto Gallup, uma pesquisa de opinião, que foi publicada em 31 de janeiro de 1994, sobre as dez personalidades masculinas e as dez femininas que o brasileiro mais admirava no mundo.
Foram entrevistadas, na oportunidade, 2.546 pessoas, das mais variadas profissões, classes sociais e níveis culturais e de renda, em 159 cidades, de 21 Estados. O resultado mostrou, sobretudo, a grande influência da televisão, o que pode ser bom ou ruim, dependendo do uso dado ao veículo e da ênfase que a TV dá ao que informa ou veicula.
As respostas não foram induzidas. Ou seja, o pesquisado tinha que lembrar, sozinho, dos nomes. Entre os homens, apenas quatro brasileiros são admirados por seus conterrâneos: Pelé (6º), Roberto Carlos (7º), Sílvio Santos (8º) e Tarcísio Meira (9º).
Onde Betinho, Jorge Amado, Chico Buarque, Milton Nascimento, nossos cientistas, artistas, atletas etc? Não apareceram. Ninguém se lembrou deles. Os escolhidos, no mundo todo, foram, pela ordem: Papa João Paulo II (1º), Michael Jackson (2º), Fidel Castro (3º), Sylvester Stalone (4º), Mikhail Gorbachev (5º) e Arnold Schwarzenegger (10º).
A mulher mais popular foi Margaret Thatcher. A primeira brasileira, das quatro votadas, foi Xuxa (3º) e as outras três foram Fernanda Montenegro (4º), Cláudia Raia (7º) e Vera Fischer (9º). Elas ficaram atrás, além da citada “Dama de Ferro” inglesa, de Maddona (2º), Madre Tereza de Calcutá (5º), Lady Diana (6º), Rainha Elizabeth II (8º) e Elizabeth Taylor (10º).
Se a pesquisa fosse feita hoje, as mudanças seriam pequenas, pelo menos no que diz respeito às atividades dos que fossem lembrados. Os nomes (alguns), seriam, certamente, diferentes. Mas os escolhidos, não tenho dúvidas, seriam, na grande maioria, cantores (as), atores e atrizes de cinema e da televisão, modelos em destaque e um ou outro desportista. Não que suas atividades não sejam importantes, longe disso. Todavia, mais uma vez, não tenho dúvidas, ficariam de fora cientistas, escritores, compositores e tanta gente importante e notável, indispensável ao país e ao mundo.
O resultado dessa pesquisa de 12 anos atrás, do Gallup, destaque-se, não é nenhuma tragédia. Quando muito, reflete a falta de cultura e a alienação da nossa população, notadamente a mais jovem, que não freqüenta (pelo menos com a assiduidade que seria desejável) o chamado “Planeta Guttenberg” (o da leitura), que o canadense Marshall McLuhan garantiu, nos anos 60, que estava no fim. E parece caminhar, salvo engano, celeremente para isso...

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