Pedro J. Bondaczuk
O País está imerso, há já alguns dias, na folia – que vai se estender por três dias (na verdade, quatro) – no início da próxima semana, com os festejos populares do Carnaval. De uns anos para cá, os foliões incorporaram mais 24 horas para se esbaldar, invadindo a Quarta-Feira de Cinzas, com os já tradicionais “arrastões” dos vários blocos e trios-elétricos, que de fato arrastam atrás de si multidões eufóricas, daí a justeza da designação.
Milhões de turistas, vindos de vários lugares do mundo, com línguas, costumes, tradições e gostos os mais diversos, se fazem presentes, nas principais cidades brasileiras, notadamente naquelas que possuem praias e que têm forte tradição carnavalesca. Muitos são atraídos para cá por fantasias sexuais, para fazer aqui o que não teriam coragem de fazer em seus países. Não raros contribuem para prostituir menininhas, em torno dos 12 ou 13 anos, (conheço casos de crianças de nove anos que, incentivadas pelos próprios pais, fizeram ou fazem esse tipo de programa), esquecidos de que essas garotas poderiam ser suas filhas ou suas netas.
Mas, o que fazer? A corrupção não depende de cultura, fortuna, classe social ou religião. É inerente ao ser humano. Autoridades prometem coibir essa prática, mas ou por incompetência, ou por incoerência, ou por ambos, deblateram, discursam, ameaçam, mas na hora da verdade fazem vistas grossas e fingem que não sabem ou que não vêem. E não estamos exagerando, esteja certo o leitor.
Em contrapartida, milhares de brasileiros desempregados fazem “bicos” e conseguem um bem vindo dinheirinho para sustentar suas famílias, obrigados a se contentar com as migalhas dos que tudo têm e tudo podem. As escolas de samba, que proporcionam o maior espetáculo popular da Terra em número de participantes, por sua vez, já se transformaram em indústrias do lazer. Empregam, por pelo menos seis meses do ano, milhares de pessoas. E esse é o lado bom do Carnaval, ou um deles, sei lá.
Belém, São Luiz, Fortaleza, Natal, Aracaju e, principalmente, Recife, Salvador e Rio de Janeiro, recebem brasileiros de todos os recantos (em especial paulistas, claro) e em geral de classe média, para suas brincadeiras de rua. Ou, no caso da Cidade Maravilhosa, para os grandiosos desfiles das escolas de samba, principalmente os de amanhã e segunda-feira, do chamado Grupo Especial, cujos ingressos são disputados a tapa. Afinal, como o designou o imortal Jorge Amado, no título do seu primeiro e consagrado romance, que o lançou para a glória e a posteridade: este é o “País do Carnaval”.
Os 10% mais ricos, que detêm mais de 60% da renda nacional, preferem outras diversões, digamos, “mais sofisticadas” e menos povão, embora não seja caso de se generalizar. Muitos gastam verdadeiras fortunas (que para eles é dinheiro de troco, ou, como diz o povo, de “pinga”) para desfilar na avenida. E são, sem dúvida, bem vindos. Há escolas de samba que têm nessas pessoas importante fonte suplementar de renda, para cobrir os custos das suas apresentações.
São Paulo, a maior cidade da América Latina e uma das mais populosas do mundo, tida e havida, até há não muito, como “túmulo do samba”, aos poucos se transforma numa segunda “Capital da Folia”. A primeira? Nem é preciso nomear. Claro que é o Rio de Janeiro! A televisão contribuiu muito para isso, apresentando, ao vivo, os desfiles paulistanos.
Um leitor me pergunta o que acho do Carnaval. Pessoalmente, não gosto e nunca gostei dele, e não por questão de moral. Quando moço, freqüentava os bailes de salão, mas não participava diretamente da folia. Preferia comprar uma mesa e apreciar os foliões à distância, para compor os personagens dos meus contos. Mas o barulho me incomodava bastante. E agora... incomoda mais ainda, é claro. Coisas da idade!
Hoje em dia, às vezes assisto, pela televisão, os desfiles de São Paulo e do Rio, mas nem sempre. Prefiro meu retiro espiritual particular, às voltas com meus livros e com outros sons, muito mais harmoniosos e inteligentes do que os dos sambas e marchinhas, cada vez piores, mais repetitivos e mais monótonos: os dos clássicos, como Tchaikowsky, Chopin, Mozart, Beethoven, Rachmaninoff e tantos outros.
E sequer se trata de questão de moral, reitero, mas de preferência estética. Por mais que as pessoas se corrompam nessas ocasiões, confio na preponderância da razão sobre os instintos. Amo, sobretudo, os mais frágeis, os mais vulneráveis, os mais expostos aos vícios e degradações. Afinal, como cristão, tenho horror ao pecado, mas compaixão pelo pecador.
Não só o Carnaval, mas toda e qualquer manifestação popular espontânea (como um show de rock, por exemplo, em que se cometem mais excessos numa só apresentação do que nos três dias de folia) não podem implicar na liberação total, cega e sem freios, dos instintos. Porque muitos não observam essa conduta de moderação, aliás, é que os balanços de ocorrências policiais, registradas nessas ocasiões, são tão sombrios e preocupantes.
Acidentes, assassinatos, estupros, abandono de filhos e infidelidade conjugal (que redunda, via de regra, em crimes passionais) são as conseqüências mais ostensivas dos abusos então cometidos. O segredo de se divertir, com segurança, e de dar vazão à alegria, sem prejudicar ninguém, está, portanto, na moderação. Ela é que proporciona o verdadeiro prazer.
Sempre insisti neste ponto de vista: não é o Carnaval, e nem é um show de rock, ou de música country, ou seja de que natureza for, que são reprováveis: são os excessos cometidos neles. Embora a quebra das normas morais receba, invariavelmente, a reprovação pública, as conseqüências das bobagens praticadas são sempre individuais. Cada pessoa arca, e sozinha, pelos seus atos. Se sabe se preservar, e se divertir com moderação, encontrará inegável satisfação, ficará feliz e sua felicidade será só sua, particular e indivisível. Em caso contrário...E depois, não adianta chorar!
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