Sunday, February 19, 2006

Dia das eleições

Pedro J. Bondaczuk


“O que há de belo na democracia é que ela é uma conquista cotidiana”. Estas palavras foram ditas pelo saudoso Tancredo Neves, numa entrevista concedida em 4 de março de 1978 e servem de corolário para o espetáculo de cidadania dado, ontem, por cerca de 83 milhões de brasileiros, que foram às urnas para compor o Congresso que terá, entre outras tarefas relevantes, a responsabilidade de revisar a Constituição.
Denúncias de fraudes, antes, durante e depois da votação, não faltaram e, certamente, não faltarão. Algumas podem até ser procedentes, as que se referem, principalmente, ao abuso do poder econômico por parte de alguns candidatos. Ainda há, infelizmente, aqueles que não entenderam o significado e o valor da prática democrática. São infiéis (porquanto fraudulentos) no pouco e, sem dúvida alguma, serão também no muito.
Cabe ao eleitor, todavia, na cabine indevassável, dar o cartão vermelho a esses corruptos, que entendem que a vida pública é um eventual prêmio para supostas virtudes pessoais – que eles, paranoicamente, acreditam ter – e não uma tarefa, uma missão, um sacerdócio cívico.
Qualquer pessoa inteligente conclui, com facilidade, sem que ninguém precise lhe dizer, que se alguém gasta rios de dinheiro para se eleger, contrariando a legislação eleitoral brasileira, é porque conta com um retorno multiplicado daquilo que gastou.
Basta, portanto, na hora de votar, que sequer se lembre do nome desse subornador. Não há castigo maior para gente desse tipo do que o ostracismo, o esquecimento, o banimento da política. Somente assim construiremos uma democracia autêntica, um sistema imune a corrupções de toda a sorte.
Não será com a polícia que isso ocorrerá, já que o fraudulento dificilmente deixa rastros do seu delito. O povo tem em suas mãos o instrumento ideal de moralização da vida pública. Basta que não venda o seu voto, mas exerça esse direito de escolha com competência e responsabilidade.
Credibilidade e confiança são fundamentais entre administradores e administrados, entre representantes e representados, pois como disse Tancredo Neves, elas são “as fontes da esperança”. Parodiando esse político, que marcou seu nome na história pela capacidade de conciliação, algum estrangeiro, que tenha passado pelo País ontem e visto o magnífico espetáculo das eleições, poderá dizer, ao regressar à sua pátria: “Vou dizer que hoje o Brasil é uma democracia”.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 4 de outubro de 1990)

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