Palavra
que é um paradoxo
O que o futuro nos reserva? Esta é uma pergunta que fazemos a nós
mesmos, e aos outros, a todo o momento, sem que encontremos uma
resposta convincente, lógica ou pelo menos razoável. Há alguém
que possa responder essa questão com 100% de acerto? Obviamente que
não! E com 90%? Também não! E com 50%? Idem! E com 10%? Ainda não!
E com 1%? Talvez, mas a probabilidade de errar ainda é altíssima.
Exagero meu? Longe disso! Raciocinem comigo.
Como vocês podem dar a mínima garantia, a que mais se aproxime da
exatidão, sobre o que ainda não aconteceu e que não há a mais
remota certeza que acontecerá? “Bem, pode-se prever isso, e com
alguma chance de acerto”, dirá o leitor. Se pode mesmo? A própria
palavra “previsão” é um tremendo paradoxo, imensa contradição.
Significa, em sentido lato, “ver previamente”. Ou seja, enxergar
o que ainda não aconteceu e que, portanto, não existe. Se não
existe... não podemos ver. Podemos, somente, imaginar. Não há, por
conseguinte, nenhuma previsão de fato. Ninguém vê o abstrato, o
imaginário, o que não existe, concordam? O que há é imaginação,
adivinhação ou seja lá o que for.
A previsão, portanto, não é campo de atuação para jornalistas,
que lidam com fatos. Há, é verdade, os que se arriscam a prever
acontecimentos. Praticam, por conseguinte, o antijornalismo. O que
não aconteceu ainda, obviamente, não é notícia, matéria-prima da
sua atividade. A previsão, todavia, é campo fértil para nós,
escritores, sobretudo para os que lidam com ficção. Nós, sim,
podemos “prever” o que quisermos, pois não temos compromisso
algum com a “verdade” e nem com a “realidade”. Buscamos, ao
urdir nossas histórias, a verossimilhança. Esta, todavia, sequer é
fundamental em nossa atividade. É desejável, porém não
indispensável.
Essa questão do futuro, ou seja, do segundo seguinte ao que estamos
vivendo, sempre foi, é e será um tema fascinante para reflexões.
Por exemplo, esse tempo que ainda não chegou é sempre projetado por
nós, em nossa mente, como potencialmente melhor do que o presente.
Essas projeções, porém, são ditadas, apenas, por nossos desejos e
pela fantasia. Raramente se baseiam em fatos e sequer levamos em
conta os imprevistos.
Não se trata de ser pessimista, mas baseados na pura lógica, se
pode afirmar que o futuro, pelo menos o mais remoto (não o
imediato), caso venha a existir para nós (podemos, óbvio, morrer
antes) sempre tende a ser pior do que o presente. Por que? Porque
nele há imensa probabilidade de perdermos entes que amamos, de
pagarmos duro preço pelas oportunidades que desperdiçarmos, de
termos que conviver com frustrações e decepções que acumularmos e
da certeza de que envelheceremos, nossas forças e entusiasmo
declinarão, o mundo estará mais povoado e, por isso, mais poluído,
depredado e tenso e os problemas pessoais e sociais haverão de se
multiplicar. E, sobretudo, nele estará o nosso fim. É preciso mais
argumento?
A mera preocupação com esse tal futuro, sem prévia ação, no
sentido de “construí-lo” (reitero, ele é, antes de tudo,
abstração, pois concretamente “ainda” não existe) achando que
as coisas irão se concretizar por si sós, à nossa revelia, é uma
estupidez sem tamanho. Se quisermos que nossos projetos se
concretizem (e isso se os tivermos) temos que agir nesse sentido. E
jamais teremos certeza de sucesso. Precisamos estudar, trabalhar e
nos preparar com método, organização e aplicação, dia a dia,
anos a fio para termos alguma chance, posto que remota. Ainda assim,
não há segurança nenhuma de êxito (nunca há e para ninguém).
Reitero o que já escrevi inúmeras vezes: não temos sequer certeza
de que amanheceremos vivos amanhã, quanto mais sobre os resultados
dos nossos esforços num remoto e nebuloso futuro. Como “prever”,
ou seja, como “ver previamente”, com antecedência não importa
se de segundos ou décadas, isso que ainda não aconteceu, e acertar?
Caso venhamos a nos preparar adequadamente, se aprendermos todo o
conhecimento a que tivermos acesso, nossas possibilidades de sucesso
“talvez” cresçam, e exponencialmente. O êxito será, pelo menos
potencialmente (mas talvez minimamente), viável.
Mas não há quem não se ocupe, de uma forma ou outra, com o futuro.
Essa preocupação, desde que moderada, é saudável e desejável.
Contudo, é preciso ter em mente, reitero e insisto na reiteração,
que o futuro não passa de abstração, de mero potencial, de simples
vir-a-ser. Pode se concretizar rapidamente, transformando-se, em
infinitésimos de segundo, no presente, como pode nunca acontecer, em
decorrência da nossa mortalidade.
Sua matéria-prima, portanto, são os sonhos, as esperanças, as
projeções da mente e da imaginação. A realidade é o momento
presente, tão curtíssimo, mais rápido do que um piscar de olhos, e
o passado, caudaloso e extenso. Morris West destaca, no romance “O
Navegante”: “Vive-se um minuto depois do outro, vive-se uma hora,
vive-se um dia. O futuro é o que se sonha. A realidade é o momento
presente apenas, cada batida do coração”. Sonhemos, intensa e
profusamente. Mas nos preparemos para quando, ou se, o futuro se
fizer presente.
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