País mais sombrio
Pedro J. Bondaczuk
O Brasil tornou-se, nos
últimos dias, literalmente, um país mais sombrio, em todos os
sentidos. Carece, cada vez mais, de luz. Não bastassem as sucessivas
denúncias de corrupção dos políticos, em todos os níveis da vida
pública; a escalada da inflação; o incremento da violência e até
a sofrível performance da Seleção Brasileira de futebol, na
iminência de ficar, pela primeira vez na história, fora de uma Copa
do Mundo, agora as ruas, avenidas, parques e monumentos das
principais cidades do País também estão (no período noturno), na
penumbra.
Isto é consequência das
medidas recém-adotadas pelo governo federal, algumas já postas em
prática, de poupança de energia elétrica, numa desesperada
tentativa de evitar os temidos "apagões". Os bandidos,
evidentemente, "agradecem". A população, que sustenta o
Estado com impostos nada suaves, e que elegeu os atuais governantes,
na presunção de que eles eram competentes e aptos para evitar essa
dramática situação (e muitas outras), acaba, mais uma vez, sendo
responsabilizada pelo que não fez. E é penalizada, em todos os
sentidos, sem ter para quem reclamar.
Além de não poder contar com
o conforto da eletricidade farta e barata, para satisfazer plenamente
suas necessidades (afinal, paga, e muito, pelo fornecimento) conforme
promessa feita quando do início do processo de privatização das
empresas geradoras de energia elétrica, se vê ameaçada pelo
crescimento da violência urbana e da criminalidade. O próprio
governo deu a entender, em passado ainda recente, que a má
iluminação das ruas das grandes cidades era, senão um incentivo,
pelo menos uma facilidade para o aumento do número de roubos,
assaltos e outros delitos contra a vida e contra o patrimônio.
Tanto que um dos principais
pontos do alardeado (e fracassado) plano "Antiviolência",
anunciado no ano passado, com grande estardalhaço e farta
publicidade, pelo Ministério da Justiça, era o "Reluz".
Ou seja, a liberação de verbas federais aos Estados e municípios,
destinadas a financiar obras tendentes a iluminar melhor nossas
principais metrópoles, assegurando, dessa forma, maior segurança à
população.
No entanto, agora, não só
esse projeto é deixado de lado, como a iluminação pública acaba
sendo reduzida, e muito, (em no mínimo 35%). Vai ser uma festa para
os ladrões! É, ou não é, uma incoerência, para não dizer outra
coisa? A vida, por isso, tende a se tornar muito mais difícil do que
já é, durante o tempo em que durar esse racionamento (só Deus sabe
quanto!). Todos os espetáculos públicos, no período noturno, por
exemplo, como jogos de futebol, basquete ou vôlei; espetáculos de
circo, rodeios e parques de diversão, etc., estão proibidos. Fica,
pois, comprometido o lazer popular. E os profissionais que atuam
nessas atividades estão em sérias dificuldades...
Além de tudo, cada brasileiro
está sendo "intimado" (é esse o termo exato para as
medidas, anunciadas na semana passada, pelo que já foi apelidado de
"Ministério do Apagão") a pagar a conta, como se fosse um
grande gastador, um irresponsável perdulário, um notório
desperdiçador de energia elétrica. Evidentemente, não é!
Estatísticas internacionais, da maior confiabilidade, mostram que o
País está situado no 82º lugar no ranking mundial de consumo per
capita de eletricidade! Mesmo com uma população de menos da metade
da dos Estados Unidos, O Brasil consome, em média, por ano, dez
vezes menos energia elétrica do que a grande superpotência. Este é
um dado irrefutável!
Ademais, a demanda residencial
representa apenas 27% da total. A economia que deve gerar, portanto,
não resolverá, com toda a certeza, o problema atual. Só vai causar
profundo (e compreensível) desgaste político no governo, nas
vésperas da sucessão presidencial, além de imensos contratempos a
toda a população. As multas a serem cobradas das famílias que não
alcançarem a cota de 20% de economia, imposta pelo Ministério do
Apagão, se constituem em clamoroso abuso (senão numa flagrante
ilegalidade). Tais medidas, provavelmente, serão derrubadas na
Justiça, antes mesmo de entrarem em vigor, dado o bom senso do nosso
Judiciário.
Quem deveria pagar essa conta
toda, frise-se, seriam os verdadeiros responsáveis: os mentores do
atual modelo energético do País. A culpa dessa situação, prevista
há mais de dez anos (e que o presidente Fernando Henrique Cardoso
disse que o surpreendeu) tem sido lançada, principalmente, sobre São
Pedro, que não teria mandado chuvas suficientes, durante o verão,
para encher os reservatórios de água das nossas principais
hidrelétricas. Como desculpa, para os leigos, até que soa
aceitável. Mas não se sustenta diante das evidências. A rigor,
(embora as autoridades deem a entender que não), o problema
energético brasileiro não está na deficiência de geração de
eletricidade. O Sul e o Norte do País têm energia em abundância!
Tanto que estão livres das medidas de contenção. O que falta são
linhas de transmissão, para aproveitar esses preciosos quilowatts
excedentes, nas regiões em que eles são escassos: Sudeste, Nordeste
e Centro Oeste. Onde estão os investimentos prometidos durante o
processo de privatização? O que tem sido feito para ampliar a
oferta de energia? A quem competia evitar a atual situação? A São
Pedro? À população? Ou aos (ir)responsáveis pela política
energética do País?!?
(Editorial da Folha do
Taquaral de 22 de maio de 2001).
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