Friday, May 11, 2018

DIRETO DO ARQUIVO - Ônibus mais caros


Ônibus mais caros

Pedro J. Bondaczuk

As tarifas de ônibus urbanos em Campinas, que já eram muito caras a R$ 1,00 (se for levada em conta a qualidade dos serviços prestados, extremamente deficiente), vão se tornar ainda mais "salgadas" para os usuários campineiros, nas próximas horas, com a entrada em vigor, possivelmente ainda nesta semana, do reajuste de 30% determinado pelo Poder Público.

Trata-se de taxa muito elevada, altíssima, equivalente à inflação acumulada de uns três a quatro anos, mesmo se for considerado o tempo em que o custo desse serviço essencial não foi reajustado. É certo que as empresas vão ter que atender algumas condições, impostas pelo prefeito Antonio da Costa Santos, para que o novo preço das passagens passe de fato a vigorar. Ainda assim, o atendimento à população vai ter que melhorar muito, mas muito mesmo, para justificar o novo valor a ser cobrado, que ainda assim será inacessível a muitos bolsos.

Uma das contrapartidas que os empresários do setor têm que dar, para que o aumento entre em vigor, é uma ampliação considerável da frota atual, que está bastante defasada, desgastada e sobretudo envelhecida, não proporcionando o conforto (e principalmente a segurança) que o passageiro merece. E as viaturas terão que ser novas, saídas da fábrica, e não recondicionadas, como geralmente as empresas costumam fazer em circunstâncias como esta.

Outra imposição feita pela Prefeitura é a contratação de cerca de 1.500 cobradores --- função praticamente extinta com a introdução das chamadas "catracas eletrônicas" --- o que terá, pelo menos, o mérito de absorver um contingente considerável de desempregados. No aspecto social, portanto, pontos para o prefeito.

Ainda assim, o cumprimento integral dessas condições é insuficiente. É muito pouco para justificar um reajuste desse porte, provavelmente sem paralelo no País, desde a adoção do Plano Real. Até os aliados de Toninho contestam o novo preço das passagens. Entendem que esse valor poderia (e deveria) ser mais acessível ao bolso dos usuários, mesmo com os investimentos a serem feitos em melhorias (se de fato forem), para a introdução de 130 ônibus novos nas diversas linhas.

A cobrança de R$ 1,30 nas passagens é extorsiva, numa cidade do porte de Campinas. Quem, por exemplo, toma apenas um ônibus diariamente (e estes são raros), vai despender, só para ir ao trabalho, em 22 dias úteis (excluindo sábados e domingos), contando ida e volta, R$ 57,20. Se precisar (ou se quiser) sair de casa nos fins de semana, vai gastar mais R$ 20,80. E os trabalhadores que moram em bairros distantes (a maioria) e tomam de duas a três conduções, vão gastar quase que o salário inteiro apenas com a passagem de ônibus. Um absurdo! É nisso que ninguém pensou. Ou se pensou, ignorou.

O reajuste torna-se mais irreal, e politicamente pernicioso, se também for levado em conta o momento atual que o País atravessa. Os salários da grande maioria estão virtualmente "congelados", nesses sete anos de vigência do Plano Real (exceção feita aos que ganham salário mínimo, que todavia é insuficiente até para bancar a alimentação de quem precisa sobreviver com tão parca remuneração).

Ademais, embora seja redundante lembrar (já que sentimos essa dura realidade na própria carne), o Brasil atravessa mais uma das suas cíclicas e já crônicas crises. A atual é uma das piores da sua história, pois se apresenta em "dose dupla". Ou seja, é causada (como a de 1998, por exemplo, entre outras) pela extrema dependência brasileira de capitais externos, mesmo os especulativos, e pela necessidade de racionamento de energia elétrica, para evitar os temidos "apagões", cujos reflexos nas atividades econômicas mal começam a ser sentidos, com tendências a se agravar daqui até o final do ano.

O campineiro, no que diz respeito a transporte público, é, há tempos, muito mal servido. As únicas opções de que dispõe para a sua locomoção (a menos que tenha carro próprio) são os ônibus e as peruas. A cidade não conta, por exemplo, como São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Belo Horizonte, etc., com serviço, mesmo que precário, de trens urbanos. O chamado "Veículo Leve sobre Trilhos", o dispendioso e abandonado VLT, não passou de um "mico". Hoje, de possível solução, transformou-se em outro problema, e grave. Suas estações, abandonadas e em ruínas, são esconderijos de viciados e de marginais. E rios de dinheiro público foram, assim, literalmente, jogados fora. Metrô? Nem falar! Não há sequer cogitação de construir um na cidade, dado o volume de recursos que teriam de ser investidos.

Quem conta com veículo próprio --- e a cidade dispõe da segunda maior frota de automóveis, per capita, do País --- não se sente motivado em deixar o seu carro em casa, para ir ao trabalho e ao lazer de ônibus. Não quer se expor ao desconforto e, principalmente, à insegurança. O risco de ser assaltado num coletivo é muito grande. Com isso, o trânsito é que sofre. A malha viária de Campinas é inadequada para tantos veículos. E o ar da cidade está cada vez mais saturado de poluentes, altamente tóxicos, que vão, aos poucos, minando a saúde da população. Não demora, e vai estar irrespirável. É questão de tempo.

Mas tudo indica que o reajuste veio para ficar. Por isso, não adianta mais lamentar. O prefeito deve arcar com alto ônus político, impossível, neste momento, de quantificar. Certamente, sabe disso. Está ciente (ou deveria estar), que a população que o elegeu vai cobrar eficiência, qualidade e segurança nos serviços prestados pelas concessionárias, para justificar o escorchante aumento no preço das passagens. Compete-lhe, entre outras coisas, fiscalizar e cobrar as empresas, para que cumpram aquilo que se dispuseram a cumprir.


(Editorial da Folha do Taquaral de 14 de agosto de 2001).



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